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Terapia com estrogênio após a menopausa reduz o risco de calcificação na artéria coronária

PANORAMA INTERNACIONAL

GINECOLOGIA

Terapia com estrogênio após a menopausa reduz o risco de calcificação na artéria coronária

José M. Aldrighi; Alessandra Lorenti Ribeiro

Em recente estudo (WHI Coronary-Artery Calcium Study-WHI-CACS), Manson et al. (2007)1 avaliaram em mulheres após a menopausa (entre 50 e 59 anos) o impacto do estrogênio conjugado eqüino (0,625mg/dia) sobre o risco de calcificação de artérias coronárias. Sabidamente, calcificações coronárias se correlacionam positivamente com a extensão da placa de ateroma e a ocorrência de eventos cardiovasculares. Nesse estudo, foi observado de forma clara e surpreendente significativa redução (42%, p=0.03) no número de calcificações nas artérias coronárias das usuárias de estrogênios, quando comparadas ao grupo placebo.

O WHI-CACS incluiu 1.064 mulheres com média etária de 55 anos, com antecedentes de histerectomia e que foram tratadas com estrogênios por 7,4 anos (média).

Comentário

Os resultados do WHI-CACS coincidem com os obtidos em investigações básicas, bem como os do próprio braço do WHI em que se utilizou o estrogênio isolado e ainda com os decorrentes de uma reanálise recente do WHI que, além de constatar menor número de eventos relacionados à doença coronária cardíaca, descortinou significativa redução (30%) na mortalidade2.

O WHI-CACS confirmou a "hipótese do tempo" para a terapia com estrogênios, que estabelece que os benefícios na prevenção da aterosclerose ocorrem somente quando ela é iniciada antes do desenvolvimento da aterosclerose avançada, ou seja, em idades mais precoces, quando a parede vascular ainda exibe alterações discretas.

Muitas possibilidades estão sendo exploradas para entender como as características biológicas da parede vascular e como os efeitos cardiovasculares dos estrogênios diferem entre mulheres numa fase inicial da pós-menopausa e aquelas cujas menopausas ocorreram há muito tempo. Assim, admite-se que a expressão dos receptores de estrogênios ocorre em diferentes graus nos vasos sanguíneos, à medida que a aterosclerose progride.

Ademais, a regulação de genes específicos, mediada pelos estrogênios, pode ter conseqüências diferentes nos vasos jovens e nos envelhecidos; como exemplo, a indução mediada pelos estrogênios de metaloproteinases, enzimas que degradam os componentes da matriz extracelular, pode ajudar a preservar a luz vascular na aterosclerose precoce, mas também pode desestabilizar um vaso com doença mais avançada, produzindo erosão e ruptura da placa.

O WHI-CACS também enfatiza a importância de compreender outros mecanismos pelos quais os estrogênios inibem a calcificação vascular, como os mediados por vários genes que regulam a homeostasia cálcica nas células vasculares, com destaque para o da osteoprotegerina.

Os resultados do WHI-CACS associados aos da reanálise do WHI podem justificar o uso de estrogênios nas mulheres com poucos anos de pós-menopausa (de 5 a 9 anos) e que necessitam a terapia hormonal para o alívio dos sintomas climatéricos. Do exposto, torna-se fácil entender a falha da terapia hormonal na redução da incidência dos eventos cardiovasculares no primeiro estudo WHI, visto que os resultados foram extraídos principalmente de mulheres acima de 60 anos, momento em que a aterosclerose se encontra em fase avançada e que, portanto, o estrogênio aumenta o risco de ruptura de placa aterosclerótica por sua ação sobre as metaloproteinases.

O WHI-CACS veio contribuir para um maior suporte aos consensos das grandes sociedades de menopausa que respaldam a "hipótese do tempo", ou seja, reconhecem os potenciais efeitos benéficos cardiovasculares da terapia hormonal em mulheres menopáusicas jovens (entre 50 e 59 anos) e que necessitam da terapia hormonal para alívio dos sintomas climatéricos.

Estes efeitos benéficos estão sendo analisados em ensaios clínicos, como o estudo de prevenção precoce com estrogênios de Kronos (KEEPS) e o de intervenção precoce e tardia com estradiol (ELITE), além de estudos futuros sobre os efeitos de novas formulações hormonais3.

Apesar do WHI-CACS confirmar a hipótese de que o estrogênio pode reduzir o risco da DCV em mulheres entre 50 a 59 anos de idade, é importante enfatizar que a terapia hormonal não deve ser considerada como uma estratégia para prevenir a DCV, pois há outras provadas e que ainda são pouco utilizadas em mulheres.

Talvez, no futuro, a terapia estrogênica possa ser indicada como prevenção para risco cardiovascular num grupo seleto de mulheres: jovens, sem fatores de risco para aterosclerose subclínica, como a resistência insulínica, ou após serem submetidas a algum método de avaliação do grau (estágio) da aterosclerose que a mulher apresente.

Mas, como a transferência de conhecimentos da investigação básica para a clínica requer um processo cooperativo e interativo conduzido com paciência e persistência, entendemos que ainda é prudente aguardar os resultados dos estudos em andamento.

Referências

1. Manson JE, Allison MA, Rossouw JE, Carr JJ, Langer RD, Hsia J, et al. Estrogen therapy and coronary: artery calcified. N Engl J Med. 2007;356(25):2591-602.

2. Rossow JE, La Croix AZ, Kooperberg C, Stefanick ML, et al. Risks and benefits of estrogen plus progestin in healthy postmenopausal women: principal results From the Women's Health Initiative randomized controlled trial. JAMA. 2004;288(3):321-33.

3. Stefanicks ML, Hendrix SL, Rodabouch RJ, Paskett ED, et al. Effects of conjugated equine estrogens on breast cancer and mammography screening in postmenopausal women with hysterectomy. JAMA. 2006;295(14):1647-57.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Set 2007
  • Data do Fascículo
    Ago 2007
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