Acessibilidade / Reportar erro

Doença diverticular dos cólons: evolução da abordagem terapêutica e papel da tomografia computadorizada nos quadros agudos

A doença diverticular dos cólons é uma enfermidade extremamente comum no mundo ocidental, com incidência estimada em 5% em pessoas de meia-idade (quarta década de vida), podendo atingir até 60% em pacientes com mais de 80 anos(11 Elisei W, Tursi A. Recent advances in the treatment of colonic diverticular disease and prevention of acute diverticulitis. Ann Gastroenterol. 2016;29:24-32.). Esta condição tem sido associada com baixa ingestão de fibras, aumento do tempo de trânsito colônico e da pressão intraluminal no cólon, levando ao desenvolvimento dos divertículos(22 Aldoori WH, Giovannucci EL, Rockett HRH, et al. A prospective study of dietary fiber types and symptomatic diverticular disease in men. J Nutr. 1998;128:714-9.).

É importante a correta definição dos termos "diverticulose" e "doença diverticular". O primeiro refere-se à ocorrência de divertículos, independente da presença de sintomas, geralmente associada a alterações parietais do cólon como deposição de elastina, espessamento do músculo liso, encurtamento das tenias e consequente redução da luz intestinal(33 Flor N, Maconi G, Cornalba G, et al. The current role of radiologic and endoscopic imaging in the diagnosis and follow-up of colonic diverticular disease. AJR Am J Roentgenol. 2016;207:15-24.). Já a doença diverticular refere-se à presença dos divertículos associada a sintomas importantes, constituindo quadros como a diverticulite aguda ou associada a condições crônicas. A diverticulite aguda pode ser dividida em complicada ou não complicada.

Embora a possibilidade de doença diverticular possa ser aventada pelos sintomas e sinais clínicos, a acuidade diagnóstica do quadro clínico e exame físico é baixa. Além disto, mesmo quando o diagnóstico clínico é bastante sugestivo, a extensão do processo inflamatório não é bem caracterizada clinicamente. Deste modo, exames subsidiários como a endoscopia e métodos de imagem desempenham papel importante na condução destes casos(22 Aldoori WH, Giovannucci EL, Rockett HRH, et al. A prospective study of dietary fiber types and symptomatic diverticular disease in men. J Nutr. 1998;128:714-9.,44 Klarenbeek BR, de Korte N, van der Peet DL, et al. Review of current classifications for diverticular disease and a translation into clinical practice. Int J Colorectal Dis. 2012;27:207-14.). Uma série de estudos recentes na literatura radiológica brasileira tem demonstrado a importância da tomografia computadorizada (TC) na avaliação das doenças dos cólons(55 Vermelho MBF, Correia AS, Michailowsky TCA, et al. Abdominal alterations in disseminated paracoccidioidomycosis: computed tomography findings. Radiol Bras. 2015;48:81-5.

6 Melo ELA, Paula FTM, Siqueira RA, et al. Biliary colon: an unusual case of intestinal obstruction. Radiol Bras. 2015;48:127-8.

7 Gava P, Melo ASA, Marchiori E, et al. Intestinal and appendiceal paracoccidioidomycosis. Radiol Bras. 2015;48:126-7.

8 Rocha EL, Pedrassa BC, Bormann RL, et al. Abdominal tuberculosis: a radiological review with emphasis on computed tomography and magnetic resonance imaging findings. Radiol Bras. 2015;48:181-91.

9 Fajardo L, Ramin GA, Penachim TJ, et al. Abdominal manifestations of extranodal lymphoma: pictorial essay. Radiol Bras. 2016;49:397-402.

10 Sala MAS, Ligabô ANSG, Arruda MCC, et al. Intestinal malrotation associated with duodenal obstruction secondary to Ladd's bands. Radiol Bras. 2016;49: 271-2.
-1111 Nicolodi GC, Trippia CR, Caboclo MFFS, et al. Intestinal perforation by an ingested foreign body. Radiol Bras. 2016;49:295-9.).

Neste número da Radiologia Brasileira, Naves et al.(1212 Naves AA, D'Ippolito G, Souza LRMF, et al. What radiologists should know about tomographic evaluation of acute diverticulitis of the colon. Radiol Bras. 2017; 50:126-31.) discutem o papel dos métodos de imagem, particularmente a TC, na avaliação da diverticulite aguda dos cólons (DAC). Considerada como método de imagem de escolha na avaliação da DAC, a TC possibilita, além da confirmação diagnóstica, a distinção entre DAC não complicada daquela associada a complicações. Esta última, desde 1978 é classificada segundo a descrição de Hinchey(1313 Hinchey EJ, Schaal PG, Richards GK. Treatment of perforated diverticular disease of the colon. Adv Surg. 1978;12:85-109.), porém, como existem importantes limitações desta classificação, por exemplo, a diferenciação entre Hinchey III e IV só possível pela laparoscopia ou, eventualmente, laparotomia, recentemente outras tentativas de estratificar a DAC têm surgido(44 Klarenbeek BR, de Korte N, van der Peet DL, et al. Review of current classifications for diverticular disease and a translation into clinical practice. Int J Colorectal Dis. 2012;27:207-14.) e este tema também é apreciado pelos autores(1212 Naves AA, D'Ippolito G, Souza LRMF, et al. What radiologists should know about tomographic evaluation of acute diverticulitis of the colon. Radiol Bras. 2017; 50:126-31.).

Além da discussão sobre as principais complicações da DAC, amplamente ilustrada, Naves et al.(1212 Naves AA, D'Ippolito G, Souza LRMF, et al. What radiologists should know about tomographic evaluation of acute diverticulitis of the colon. Radiol Bras. 2017; 50:126-31.) também focam uma questão extremamente relevante que é o diagnóstico diferencial entre DAC e neoplasia colorretal, uma vez que estas duas condições são relativamente comuns em pacientes idosos e, portanto, não raro coexistem(1414 Schultz JK, Yaqub S, Øresland T. Management of diverticular disease in Scandinavia. J Clin Gastroenterol. 2016; 50 Suppl 1:S50-2.,1515 Lips LM, Cremers PT, Pickhardt PJ, et al. Sigmoid cancer versus chronic diverticular disease: differentiating features at CT colonography. Radiology. 2015;275:127-35.). Esta diferenciação torna-se particularmente difícil quando a doença diverticular cursa com espessamento parietal e redução luminal significativos. A coexistência destas duas condições levou vários grupos a indicarem a realização de colonoscopia após a resolução de um episódio de diverticulite aguda, geralmente avaliado por TC(1616 Choi YH, Koh SJ, Kim JW, et al. Do we need colonoscopy following acute diverticulitis detected on computed tomography to exclude colorectal malignancy? Dig Dis Sci. 2014;59:2236-42.). Porém, mais recentemente, alguns estudos e uma meta-análise sugerem que não há dados para suportar esta indicação(1717 Sai VF, Velayos F, Neuhaus J, et al. Colonoscopy after CT diagnosis of diverticulitis to exclude colon cancer: a systematic literature review. Radiology. 2012; 263:383-90.).

A DAC complicada era, na maioria das vezes, indicação de tratamento cirúrgico(11 Elisei W, Tursi A. Recent advances in the treatment of colonic diverticular disease and prevention of acute diverticulitis. Ann Gastroenterol. 2016;29:24-32.,1818 Templeton AW, Strate LL. Updates in diverticular disease. Curr Gastroenterol Rep. 2013;15:339.). No entanto, recentemente, as indicações cirúrgicas são mais restritas e novos algoritmos de instituições internacionais preconizam opções mais conservadoras, reservando a cirurgia para casos mais agudos que requeiram medidas mais incisivas(1919 Fingerhut A, Veyrie N. Complicated diverticular disease: the changing paradigm for treatment. Rev Col Bras Cir. 2012;39:322-7.). Nesta abordagem, a definição da extensão do processo inflamatório é crucial, requerendo um exame de TC dedicado a este objetivo, com protocolo específico. Outra contribuição da TC, nesta nova concepção terapêutica da DAC, é que o tratamento de eventuais coleções infectadas secundárias à diverticulite deixou de ser uma indicação cirúrgica absoluta, sendo realizada por abordagem percutânea, guiada por TC ou ultrassonografia, sempre que possível.

A abordagem terapêutica da DAC, condição extremamente prevalente, vem sendo objeto de constantes discussões, com recentes e importantes mudanças de paradigmas nos últimos anos(2020 Gehrman J, Angenete E, Björholt I, et al. Health economic analysis of laparoscopic lavage versus Hartmann's procedure for diverticulitis in the randomized DILALA trial. Br J Surg. 2016;103:1539-47.). No entanto, em todas as opções sugeridas, mantém-se como central o papel da TC, como importante meio de diagnóstico e extensão da avaliação do processo inflamatório, cabendo ao radiologista um papel bem definido e importante nesta abordagem multidisciplinar.

REFERENCES

  • 1
    Elisei W, Tursi A. Recent advances in the treatment of colonic diverticular disease and prevention of acute diverticulitis. Ann Gastroenterol. 2016;29:24-32.
  • 2
    Aldoori WH, Giovannucci EL, Rockett HRH, et al. A prospective study of dietary fiber types and symptomatic diverticular disease in men. J Nutr. 1998;128:714-9.
  • 3
    Flor N, Maconi G, Cornalba G, et al. The current role of radiologic and endoscopic imaging in the diagnosis and follow-up of colonic diverticular disease. AJR Am J Roentgenol. 2016;207:15-24.
  • 4
    Klarenbeek BR, de Korte N, van der Peet DL, et al. Review of current classifications for diverticular disease and a translation into clinical practice. Int J Colorectal Dis. 2012;27:207-14.
  • 5
    Vermelho MBF, Correia AS, Michailowsky TCA, et al. Abdominal alterations in disseminated paracoccidioidomycosis: computed tomography findings. Radiol Bras. 2015;48:81-5.
  • 6
    Melo ELA, Paula FTM, Siqueira RA, et al. Biliary colon: an unusual case of intestinal obstruction. Radiol Bras. 2015;48:127-8.
  • 7
    Gava P, Melo ASA, Marchiori E, et al. Intestinal and appendiceal paracoccidioidomycosis. Radiol Bras. 2015;48:126-7.
  • 8
    Rocha EL, Pedrassa BC, Bormann RL, et al. Abdominal tuberculosis: a radiological review with emphasis on computed tomography and magnetic resonance imaging findings. Radiol Bras. 2015;48:181-91.
  • 9
    Fajardo L, Ramin GA, Penachim TJ, et al. Abdominal manifestations of extranodal lymphoma: pictorial essay. Radiol Bras. 2016;49:397-402.
  • 10
    Sala MAS, Ligabô ANSG, Arruda MCC, et al. Intestinal malrotation associated with duodenal obstruction secondary to Ladd's bands. Radiol Bras. 2016;49: 271-2.
  • 11
    Nicolodi GC, Trippia CR, Caboclo MFFS, et al. Intestinal perforation by an ingested foreign body. Radiol Bras. 2016;49:295-9.
  • 12
    Naves AA, D'Ippolito G, Souza LRMF, et al. What radiologists should know about tomographic evaluation of acute diverticulitis of the colon. Radiol Bras. 2017; 50:126-31.
  • 13
    Hinchey EJ, Schaal PG, Richards GK. Treatment of perforated diverticular disease of the colon. Adv Surg. 1978;12:85-109.
  • 14
    Schultz JK, Yaqub S, Øresland T. Management of diverticular disease in Scandinavia. J Clin Gastroenterol. 2016; 50 Suppl 1:S50-2.
  • 15
    Lips LM, Cremers PT, Pickhardt PJ, et al. Sigmoid cancer versus chronic diverticular disease: differentiating features at CT colonography. Radiology. 2015;275:127-35.
  • 16
    Choi YH, Koh SJ, Kim JW, et al. Do we need colonoscopy following acute diverticulitis detected on computed tomography to exclude colorectal malignancy? Dig Dis Sci. 2014;59:2236-42.
  • 17
    Sai VF, Velayos F, Neuhaus J, et al. Colonoscopy after CT diagnosis of diverticulitis to exclude colon cancer: a systematic literature review. Radiology. 2012; 263:383-90.
  • 18
    Templeton AW, Strate LL. Updates in diverticular disease. Curr Gastroenterol Rep. 2013;15:339.
  • 19
    Fingerhut A, Veyrie N. Complicated diverticular disease: the changing paradigm for treatment. Rev Col Bras Cir. 2012;39:322-7.
  • 20
    Gehrman J, Angenete E, Björholt I, et al. Health economic analysis of laparoscopic lavage versus Hartmann's procedure for diverticulitis in the randomized DILALA trial. Br J Surg. 2016;103:1539-47.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar-Apr 2017
Publicação do Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem Av. Paulista, 37 - 7º andar - conjunto 71, 01311-902 - São Paulo - SP, Tel.: +55 11 3372-4541, Fax: 3285-1690, Fax: +55 11 3285-1690 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: radiologiabrasileira@cbr.org.br