Acessibilidade / Reportar erro

Injustiças Testemunhais Institucionalizadas: A Construção do Mito da Confissão1 1 Esse artigo foi publicado originalmente no Journal of Dialectics of Nature (número especial sobre Injustiça Epistêmica), editado por Huiren Bai, sendo autorizada a republicação. A tradução inglês-português de “Institutionalized Testimonial Injustices: The Construction of a Confession Mith” foi realizada por Natalia von Rondow e Michael Guedes.

Institutionalized Testimonial Injustices: The Construction of a Confession Myth

Resumo

Embora as injustiças testemunhais tenham sido pensadas originalmente por Miranda Fricker apenas como redução de credibilidade, neste texto a autora assume a redefinição proposta por Jennifer Lackey para incluir, dentro das injustiças testemunhais, também a hipótese de excesso de credibilidade causada por uma injustiça agencial, isto é, quando a injustiça é cometida por se atribuir excesso de credibilidade a declarações precisamente quando a agência epistêmica do sujeito (as condições de agir como um sujeito de conhecimento) foi obstruída. A partir de sua preocupação com as instituições, Fricker tanto examina o contexto da justiça criminal que propicia as falsas confissões como propõe reflexões sobre as mudanças que são necessárias para a implementação de mais justiça epistêmica no interior dos sistemas de justiça criminal.

Palavr1s-chave
Injustiça testemunhal; injustiça agencial; injustiça testemunhal institucionalizada; excesso de credibilidade

Abstract

Although testimonial injustice was originally conceived as a prejudiced and unwarranted reduction of credibility, in this text the concept is expanded according to Jennifer Lackey’s proposal to include excess credibility caused by agential epistemic injustice as part of the concept. Agential epistemic injustice occurs when excessive credibility is attributed to a person’s statements precisely when the subject’s epistemic agency (the condition of acting as a subject of knowledge) has been obstructed. From a concern with institutional reform, the article both examines the context of criminal justice systems that facilitate false confessions and proposes reflections on the changes that are necessary for the implementation of more epistemic justice within those systems.

Keywords
Testimonial injustice; agencial Injustice; institutionalized testimonial Injustice; credibility excess

Introdução

É uma honra ser convidada a contribuir para esta edição especial sobre injustiça epistêmica. A fim de registrar algo de meus próprios esforços a esse respeito, começarei com alguns comentários resumidos sobre o que pensei estar fazendo no livro de 2007 e, em seguida, oferecerei algumas novas reflexões sobre os vícios epistêmicos institucionais e, em particular, uma forma sinistramente importante de vício epistêmico institucionalizado no contexto do procedimento e treinamento policial padrão nos Estados Unidos. Saltando do trabalho recente em epistemologia social de Jennifer Lackey, e, particularmente, do trabalho em psicologia empírica de Saul Kassin, argumentarei que certos aspectos desses procedimentos exemplificam uma série de três etapas de injustiças testemunhais institucionalizadas.

Reintroduzindo Injustiça Epistêmica

Na filosofia acadêmica britânica de tradição amplamente anglófona, ao longo dos anos 1990 e início dos anos 2000, o panorama intelectual tinha uma forma curiosamente debilitada para qualquer um que tivesse uma mentalidade analítica e, ao mesmo tempo, fosse atraído por questões sobre como a desigualdade de poder social pode se relacionar com assuntos da epistemologia. Embora existissem vários debates sobre tais questões dentro da filosofia feminista — notadamente na teoria do ponto de vista, no pós-modernismo feminista e no feminismo psicanalítico francês — na epistemologia analítica, ao contrário, parecia haver uma total falta de recursos teóricos até mesmo para articular tais questões. A filosofia européia, sob as primeiras influências historicizadoras e politizadoras de Hegel e Marx, há muito centrou essas questões como essenciais para a forma como nos imaginamos no mundo; mas a tradição analítica parecia ter inteiramente contornado essas influências, preferindo um a-historicismo que fizesse esses temas parecerem “meramente empíricos” — assunto da sociologia ou da política feminista, mas não da filosofia (como estudante de pós-graduação, eu era repetidamente questionada “Então sua dissertação é em sociologia do conhecimento, certo?” ou “O que a torna filosofia?”. Eu ainda não sabia como responder; embora quisesse). Existiam vertentes vitais da epistemologia feminista pressionando as questões socializadas, frequentemente em termos de debates entre o empirismo feminista, cujas raízes estavam na filosofia feminista da ciência; a teoria feminista do ponto de vista, cujas primeiras raízes estavam na sociologia, espalhando-se rapidamente para a filosofia; e o pós-modernismo feminista e a crítica pós-colonial, cujas raízes estavam no pensamento pós-estruturalista e pós-moderno na tradição europeia.3 3 Para uma noção atualizada do panorama, ver os resumos oferecidos por Anderson (2020) e por Grasswick (2019). Foi a partir dos diferentes panoramas desses debates que meu próprio interesse cresceu na possibilidade de teorizar — no território aparentemente insular da epistemologia analítica — o que vim a conceber em termos de “injustiça epistêmica”. Esse território teórico forneceu uma boa proporção de minha educação e sensibilidade filosóficas, e geralmente funcionou com uma concepção de senso comum do conhecimento cotidiano (uma concepção factiva) que eu compartilhava, e que também sentia ser necessária para qualquer tipo realista de teorização sobre injustiça. No entanto, a insistência em uma concepção maximamente abstrata do sujeito cognoscente — uma concepção resolutamente pressuposta repetidas vezes em questões definidoras (“O que é necessário a S para saber que p?”, “O que é necessário para S estar justificado em acreditar que p?”, e daí por diante) — me pareceu uma escolha teórica manifestamente inibidora, e de forma alguma o ponto principal da epistemologia propriamente dita como se acreditava ser.

Eu também estava ansiosa em abordar as questões do ponto de vista da experiência cotidiana da injustiça epistêmica (a filósofa da ciência e teórica da teoria feminista do ponto de vista, Sandra Harding, capturou memoravelmente esse compromisso metodológico em seu slogan “começar o pensamento a partir de vidas marginalizadas” — como se vê, por exemplo, em Harding 1991Harding, Sandra (1991) Whose Science? Whose Knowledge? (Milton Keynes: Open University Press). A socióloga e teórica da teoria feminista do ponto de vista Patrícia Hill Collins pensa a partir das multiplas opressões da experiência social das mulheres negras, teorizando, entre outras coisas, em termos de viver como um “forasteiro de dentro” — como se vê, por exemplo, em Collins 1990Collins, Patricia Hill (2000) Black Feminist Thought: Knowledge, Consciousness, and the Politics of Empowerment 2nd ed. (New York & London: Routledge)). Existem diferentes abordagens metodológicas para iniciar o pensamento filosófico do ponto de vista da experiência marginalizada, mas a minha era um tanto literária em sua orientação, porque acredito que romances, roteiros e biografias podem revelar aspectos filosoficamente relevantes da vida de maneiras ricas em imaginação. Por esta razão, estava interessada na possibilidade de fazer um tipo de texto filosófico mais híbrido — uma miscelânea de trechos substanciais ao longo do livro, às vezes mais de um trecho do mesmo romance ou roteiro em capítulos diferentes, que informariam a filosofia e forneceriam algumas fronteiras úteis para a discussão. Usando biografia e ficção, desenhei ilustrações de peças que eu esperava fornecerem à imaginação filosófica algumas texturas mais ricas de experiência vivida do que geralmente é possível com ilustrações da familiar variedade da experiência mental (Fricker 2007Fricker, Miranda (2007) Epistemic Injustice: Power and the Ethics of Knowing (Oxford: Oxford University Press), p. 23). Em contraste, o Estado de Natureza — um tipo muito diferente de ficção do qual também fiz uso substancial — está deliberadamente totalmente ausente das texturas diárias da vida, sendo um modelo despojado e altamente abstrato das necessidade epistêmicas mais simples e universais (como a necessidade de compartilhar informações). Dessa forma, vários tipos contrastantes de ficção foram empregados, e uma noção das implicações filosóficas substanciais contidas neste ou naquele estilo de ficção permeou o método do livro como um todo.

Um argumento abrangente do livro dizia respeito ao conteúdo do conceito de conhecimento. O argumento era que há pelo menos uma concepção plausível do conceito de conhecimento — nomeadamente, a concepção funcionalista avançada de Edward Craig (Craig, 1990Craig, Edward Knowledge and the State of Nature. An Essay in Conceptual Synthesis (Oxford: Clarendon Press, 1990)), de acordo com a qual o conceito de conhecimento tem a ideia de um “bom informante” no seu “núcleo” — de tal modo que as preocupações filosóficas feministas sobre o poder e a exclusão das práticas epistêmicas acabam sendo características do núcleo de nosso conceito propriamente compreendido e, portanto, o cerne da epistemologia analítica. Se o núcleo de nosso conceito de conhecimento é entendido funcionalmente em termos que requerem ser reconhecido como um “bom informante”, então tudo o que precisamos acrescentar aos aspectos motivacionais não ideais já incorporados ao cenário do Estado de Natureza por Craig (motivos para mentir e ocultar) é um proto-preconceito básico, como o proto-preconceito que os nativos tendem a ter contra forasteiros, por exemplo. Isso é suficiente para gerar o risco de que alguém (um forasteiro) seja injustamente impedido de participar da própria prática que, no quadro de Craig, gera o conteúdo central de nosso conceito de conhecimento. Isso, argumentei, traz o risco de déficit de credibilidade prejudicial — por exemplo, ser desacreditado meramente porque alguém é estranho ao grupo — essencial para entender o conteúdo central do conceito de conhecimento. E segue-se que a proto-virtude corretiva desse déficit de credibilidade prejudicial, a justiça testemunhal, está igualmente presente no Estado de Natureza, de modo que se revela como uma das “virtudes da verdade” básicas, na expressão de Bernard WilliamsWilliams, Bernard (2002) Truth and Truthfulness. An Essay in Genealogy (Princeton: Princeton University Press).4 4 Matthieu Queloz oferece uma discussão útil sobre esse ponto no capítulo 8 de Queluz (2021). O ponto recebeu tratamento mais proeminente, em razão de mais isolado, em Fricker (1998). Concebidas dessa maneira, então, tais perspectivas socializadoras não podem ser consideradas marginais à epistemologia analítica; não pode ser considerado como decorrente de um conjunto de preocupações próprias exclusivamente da sociologia do conhecimento ou da política feminista; mas, sim, deve ser considerada como pertencente a um conjunto localizado no cerne do projeto analítico em epistemologia. Pois o próprio conteúdo do conceito de conhecimento acaba por incluir, em seu núcleo, medidas para corrigir o preconceito endêmico que, de outra forma, obstruiria o compartilhamento de boas informações e provas. Em outras palavras, o conteúdo central do conceito de conhecimento acaba por incluir medidas para prevenir a injustiça testemunhal. Em suma, um argumento abrangente do livro era que, se você está preocupado com o conteúdo e a estrutura do conceito de conhecimento, então você já está preocupado com o risco de injustiça testemunhal.5 5 Por isso, o material sobre o preconceito, as percepções estereotipadas das testemunhas por meio da operação de heurísticas em nossa sensibilidade testemunhal, a natureza endêmica da injustiça testemunhal, a consideração à virtude epistemológica do testemunho, proto-conhecimento e boa informação no Estado de Natureza, e a presença da proto-virtude da justiça testemunhal no Estado de Natureza, ocuparam seis dos sete capítulos. Portanto, essas preocupações epistemológicas feministas devem ser entendidas como centrais para as preocupações epistemológicas analíticas.

De interesse mais proeminente para a maioria dos leitores talvez tenham sido as definições amplas de dois tipos propostos de injustiça epistêmica, além do rótulo genérico de “injustiça epistêmica” em si. Busquei situar e explicar os fenômenos que eles captam em uma estrutura teórica integrada, oferecendo uma taxonomia expansível de tipos e subtipos. Assim, por exemplo, tanto a injustiça testemunhal quanto a injustiça hermenêutica são apresentadas como tendo subtipos que são “sistemáticos” e “incidentais”, respectivamente. No meu esquema de coisas, esta é uma importante distinção, e eu gostaria de destacar novamente aqui, porque a distinção permite diferenciar entre aquelas formas que são parte integrante de um determinado sistema de injustiça estrutural e aquelas que não são, mantendo constante a estrutura básica do próprio erro epistêmico. O interesse orientador em teorizar as dimensões epistêmicas da injustiça estrutural me levou a lançar as formas sistemáticas de injustiça epistêmica como “centrais” do ponto de vista do livro. É crucialmente o aspecto sistemático — bem como a pura severidade e persistência no tempo — que pode tornar apto o termo opressão epistêmica (Fricker 1999Fricker, Miranda (1999) ‘Epistemic Oppression and Epistemic Privilege’ Canadian Journal of Philosophy Supp. Vol. 25: 191-210; 2007 pp. 59-156).6 6 Para uma discussão sobre opressão epistêmica e, em particular, uma distinção entre formas redutíveis e irredutíveis, ver Dotson 2014. Um aspecto da marginalização hermenêutica, particularmente enfatizado por Dotson (2012), Mason (2011) e Pohlhaus (2012), e que normalmente faz parte e é parcela dos casos sistemáticos, é o interesse que os poderosos têm em manter o status quo conceitual. É assim no meu exemplo do assediador sexual para quem obviamente convém ao seu propósito que haja uma ausência geral de um conceito capaz de capturar sua conduta sob a luz crítica apropriada (Fricker 2007, p. 151). Mas o que outros enfatizaram com razão é a resistência ativa a novos conceitos e ferramentas interpretativas que esse interesse provavelmente produzirá. Isso representa a principal área de sobreposição, a meu ver, entre as injustiças epistêmicas como as concebi e a ideia de Charles Mills de “ignorância branca” (ver Mills 2007 e 2015; exploro essa área de sobreposição em Fricker 2016).

A categoria de injustiça testemunhal foi expandida por vários filósofos e, neste artigo, desejo oferecer um desenvolvimento adicional da ideia de que pode haver formas de injustiça testemunhal que envolvem não o déficit de credibilidade prejudicial, mas, sim, o excesso de credibilidade prejudicial. Minha proposta incidirá sobre uma certa forma institucionalizada de excesso de credibilidade prejudicial, e a desastrosa contribuição que dá à injustiça estrutural e jurídica quando franqueada por práticas institucionalizadas de déficit de credibilidade prejudicial. A ideia de que alguns tipos de excesso de credibilidade deveriam ser incluídos em uma concepção ampliada de injustiça testemunhal foi apresentada pela primeira vez por José MedinaJosé Medina (2021) ‘Capital vices, institutional failures, and epistemic neglect in a county jail’ in I. J. Kidd, H. Battaly & Q. Cassam eds. Vice Epistemology (Abingdon: Routledge) como uma linha de objeção construtiva ao meu trabalho. Posteriormente, artigos de Emmalon Davis, Audrey Yap, e Jennifer Lackey representam outras contribuições construtivas e distintas para o debate em andamento.7 7 Ver Medina (2011); Davis (2016); Yap (2017); Lackey (2020). Em meu livro, depois de alguma reflexão, finalmente cheguei à conclusão de que apenas um déficit prejudicial correspondia ao erro distintivo que eu queria enfatizar com o conceito de injustiça testemunhal. Cheguei a essa conclusão porque estava particularmente interessada, como expliquei acima, em isolar o tipo de subestimação injusta de alguém como doador de conhecimento que é plausivelmente entendida como endêmica na prática epistêmica central que gera nosso próprio conceito de conhecimento (ou seja, boa informação no Estado de Natureza).

No entanto, se uma exploração das variedades de injustiça testemunhal for realizada separadamente desse projeto analítico altamente específico, então as coisas ficam bastante livres e os propósitos para os quais se pode colocar o conceito de injustiça testemunhal podem obviamente se ampliar. De qualquer maneira, gostaria de contribuir com um pensamento adicional entre as várias sugestões na literatura e, em particular, aproveitar a recente sugestão de Jennifer Lackey de que existe um tipo distinto e importante de injustiça testemunhal que ela chama de “injustiça testemunhal agencial”, que é exemplificada no fenômeno da falsa confissão no contexto de interrogatório policial. Isso é o que devo construir para promover a ideia de injustiças testemunhais institucionalizadas e mostrar que no método de interrogatório policial para o qual Lackey chamou nossa atenção epistemológica crítica precisamos posicionar tanto o déficit quanto o excesso de credibilidade em cena, e, além disso, roteirizar o drama epistêmico que eles representam não principalmente em termos de julgamentos individuais de credibilidade, mas, sim, no nível do processo institucionalizado. Só então, afirmo, seremos capazes de ver em sua perspectiva adequada a escala da tragédia epistêmica que é tão institucionalizada.8 8 Para uma noção de injustiça testemunhal estrutural, ver Elizabeth Anderson (2012).

Injustiças Testemunhais Institucionalizadas

Com nosso resumo das principais ideias ético-epistêmicas sobre a mesa, podemos agora voltar nossa atenção para o quadro político. Ou seja, o quadro do poder institucional. As instituições podem incorporar virtudes e vícios epistêmicos de diferentes maneiras. Amplamente falando, um hábito institucional arraigado pode assumir a forma de um conjunto de métodos ou processos epistêmicos (bons ou ruins) e/ou um conjunto de valores epistêmicos (bons ou ruins) que constituem um ethos. Um exemplo de um processo epistemicamente disfuncional pode ser uma prática que envolve a confiança em provas inadequadas ou a avaliação de provas por meio de lentes prejudiciais. Um exemplo de um conjunto de valores epistemicamente ruim pode ser o cuidado insuficiente com a verdade ou a valorização muito alta de um determinado alvo, de modo que comprometa a avaliação da prova e, consequentemente, a integridade da investigação. As interações cotidianas com várias instituições — agências de notícia, práticas médicas, publicidade e assim por diante — nos tornam inteiramente familiarizados com a ideia de que uma instituição pode envolver uma ou ambas estas coisas — bons/maus processos epistêmicos e/ou bom/mau ethos epistêmico. Se processos e/ou ethos são temporalmente e contrafactualmente estáveis no corpo institucional, então eles carregam todas as marcas de um traço de caráter epistêmico institucional e, portanto, de um vício ou virtude epistêmica institucional, dependendo do valor ou desvalor epistêmico da característica.9 9 Para uma explicação mais detalhada desse modelo de virtude e vício epistêmico em instituições, com foco na Corporação Britânica de Radiodifusão, ver Fricker (2021). Em outro trabalho, argumentei que devemos pensar em más características epistêmicas como indicativos de vício apenas se a má conduta for culpável. Mas aqui permaneço neutra nesta questão e, claro, há espaço para diferentes pontos de vista sobre este e outros aspectos.10 10 Explorei os modelos de virtudes e vícios institucionais em mais detalhes em Fricker (2010) e especificamente o de inércia inferencial em Fricker (2021). Para modelos alternativos de vício epistêmico em particular, ver Battaly (2014), Crerar (2017), e Cassam (2016 e 2019); ver também os artigos em eds. Battaly, Kidd & Cassam (2021); e Tanesini (2018 e 2021). Para outra discussão recente, ver de Bruin e de Rooij (2022).

Ainda que eu tenha colocado este breve esboço sobre virtude e vício institucional em pauta a fim de estabelecer o que vem a seguir, não há nada que eu defenda aqui que dependa disso, pois embora seja apropriado conceber a injustiça testemunhal institucionalizada em termos de vício epistêmico institucional, certamente isso não é compulsório. Alguns leitores podem preferir concebê-la em termos teoricamente mais neutros de disfunção epistêmica institucional simples, por exemplo. Meu objetivo é modelar certos processos epistêmicos institucionalizados Com o objetivo de destacar sua importância para a injustiça epistêmica e, por implicação prática imediata, a injustiça legal, uma vez que a injustiça epistêmica funciona como uma porta de entrada para a injustiça legal. No entanto, embora o quadro teórico da virtude e vício epistêmicos não seja compulsório, ainda assim, eu insisto que, quando estamos preocupados com alguns de nossos valores mais importantes, como não condenar inocentes ou a proporcionalidade das decisões judiciais, a linguagem mais eticamente carregada da discussão sobre virtude e vício institucionais é certamente apta. Isso porque, pelo menos no que diz respeito às funções primárias das instituições de justiça, nos preocupamos não apenas com os próprios procedimentos e resultados funcionais, mas também com os valores institucionais dos quais eles decorrem. Em suma, nos preocupamos não somente com o que tais instituições fazem, mas igualmente com que ethos as caracteriza.

Podemos agora explorar os contornos de uma institucionalização particularmente problemática de vício epistêmico — que combina dois tipos de injustiça testemunhal — conforme consagrado em normas institucionalmente prescritas de investigação criminal no policiamento dos Estados Unidos. Atualmente nos Estados Unidos, a polícia tem o direito jurídico em todos os cinquenta estados de mentir para suspeitos adultos quando eles são detidos para interrogatório, e esse direito de mentir, confundir e induzir o suspeito à autoincriminação é amplamente visto na aplicação do direito como uma ferramenta legítima para obter uma confissão (a maioria dos estados permite isso não apenas em relação a adultos como também em relação a menores11 11 Em 2021, Illinois e Oregon proibiram a polícia de mentir para menores (menores de 18 anos) em interrogatório, embora permaneça perfeitamente jurídico mentir para adultos. Sobre isso, ver, por exemplo, https://innocenceproject.org/illinois-first-state-to-ban-police-lying/ e https://prismreports.org/2021/08/30/lying-to-police-suspects-is-banned-in-several-countries-why-is-it-still-legal-in-the-u-s/ ). Muitos adultos, e sobretudo as crianças, não sabem que a polícia está legalmente autorizada a enganá-los desta forma, essa ignorância os torna especialmente vulneráveis à manipulação no interrogatório. Para usar a expressão de Carel e Kidd, essa situação exemplifica a “opacidade institucional” e esta opacidade “vulnerabiliza epistemicamente”12 12 “Vulnerabilidades”, Carel e Kidd informam, é um termo emprestado de Shelley Tremain (2021). aqueles pegos em processos institucionais (Carel e Kidd 2021Carel, Havi & Kidd, Ian James (2021) ‘Institutional Opacity, Epistemic Vulnerability, and Institutional Testimonial Justice’, International Journal of Philosophical Studies 29(4): 473-96).

É claro que todos têm direito a um advogado em situações de interrogatório, e uma parte crucial do trabalho de um advogado é impedir que um suspeito diga qualquer coisa que possa incriminá-lo. No entanto, alguns renunciam ao direito a um advogado, e os inocentes são especialmente propensos a fazerem isso, talvez devido a uma atitude honesta de não ter nada a esconder e de abertura para ajudar a polícia em suas investigações. Isto pode ser catastrófico, pois se alguém está de fato sendo tratado como suspeito, então os interrogatórios ocorrem sob uma presunção de culpa, de modo que esta mesma abertura pode levar à autoincriminação, até mesmo à falsa confissão. Como escreve Saul Kassin:

A fenomenologia da inocência pode estar enraizada em uma crença generalizada e talvez motivada em um mundo justo em que os seres humanos recebem o que merecem e merecem o que recebem…Isso pode se originar de… uma “ilusão de transparência”, uma tendência das pessoas de superestimar a extensão em que seus verdadeiros pensamentos, emoções e outros estados internos podem ser vistos pelos outros

(Kassin 2005Kassin, S. M. (2005) ‘On the Psychology of Confessions: Does Innocence Put Innocents at Risk?’ American Psychologist: 215-228, p. 218).13 13 Sobre a fenomenologia da inocência, ver também Jordan & Hartwig (2012). 14 14 Tradução livre dos tradutores. No original: “The phenomenology of innocence may be rooted in a generalized and perhaps motivated belief in a just world in which human beings get what they deserve and deserve what they get… It may also stem from…an ‘illusion of transparency,’ a tendency for people to over-estimate the extent to which their true thoughts, emotions, and other inner states can be seen by others (Kassin 2005, p. 218).”

Em um trabalho recente e em um livro que será publicado em breve, Jennifer Lackey explora este terreno, e propõe que o emprego de um conceito de injustiça testemunhal como déficit de credibilidade prejudicial não pode dar um quadro completo do que está indo mal com os julgamentos de credibilidade nestas situações. Ela argumenta (e eu concordo) que também devemos olhar para o que acontece com a credibilidade atribuída ao suspeito no momento da sua confissão sob interrogatório. LackeyLackey, Jennifer (forthcoming) Criminal Testimonial Injustice propõe uma expansão da ideia de injustiça testemunhal para que seja incluída a “injustiça testemunhal agencial”: “onde um excesso injustificado de credibilidade é concedido ao falante quando sua agência epistêmica foi negada ou subvertida na obtenção de seu testemunho” (Lackey 2020Lackey, Jennifer (2020) ‘False Confessions and Testimonial Injustice’ Journal of Criminal Law and Criminology 110 (1): 43-68, p. 43)15 15 Tradução livre dos tradutores. No original: “where an unwarranted credibility excess is afforded to speakers when their epistemic agency has been denied or subverted in the obtaining of their testimony (Lackey 2020, p.43).” . Além da especial vulnerabilidade dos inocentes, já mencionada, Lackey descreve vários “fatores de disposição” que tornam um suspeito particularmente e injustamente vulnerável a confessar falsamente, citando em particular o “status juvenil” e a “deficiência mental, incluindo deficiências de desenvolvimento e doenças mentais” (Lackey 2020Lackey, Jennifer (2020) ‘False Confessions and Testimonial Injustice’ Journal of Criminal Law and Criminology 110 (1): 43-68, p. 48). Ser inocente, ser jovem ou ter uma deficiência mental de qualquer tipo torna alguém especialmente vulnerável às pressões policiais nos interrogatórios, de modo que quando esse alguém é colocado sob a poderosa combinação de sofrimento físico, emocional e informativo, acaba confessando. Alguns inocentes que acabaram confessando algo que não fizeram estão respondendo, em desespero visceral, a promessas de alívio por um breve momento da situação de interrogatório e vão geralmente procurar (em vão) retratar sua confissão logo depois da confissão; outros internalizam a ideia de que são culpados e tendem a abraçar a narrativa do interrogador.16 16 Na taxonomia de três vias da falsa confissão previamente desenvolvida por Kassin e Wrightsman (1985) a primeira é rotulada como tipo de falsa confissão “coerciva’, enquanto a segunda é “coerciva-internalizada” (seu terceiro tipo é “voluntária” o que pode ser explicado pelo desejo de proteger outra pessoa, ou por um “desejo mórbido de notoriedade”, ou várias outras possibilidades). Veja a discussão adicional no capítulo 4 de Gudjonsson (2018), e no recente livro de Kassin (Kassin 2022, pp. 11-14).

O Mito da Confissão

Tudo isso nos ensina que (o que poderíamos chamar de) o Mito da Confissão — a suposição popular de que as pessoas não confessam crimes que não cometeram — é seriamente equivocado. É um mito influente que, apesar de estar completamente enfraquecido pelas descobertas de mais de duas décadas de pesquisa psicológica, continua a influenciar não apenas a imaginação popular, mas também os principais procedimentos institucionais de investigação criminal nos Estados Unidos. As proporções épicas da atuação deste mito só podem ser totalmente compreendidas quando consideramos a impossibilidade institucional de se retratar uma confissão. Uma confissão, uma vez feita, é praticamente irreversível, pois é o objetivo principal do interrogatório, e funciona como um dos tipos de provas mais fortes — o “padrão ouro das provas”, como diz Lackey (Lackey 2020Lackey, Jennifer (2020) ‘False Confessions and Testimonial Injustice’ Journal of Criminal Law and Criminology 110 (1): 43-68; p. 43). Como explica Kassin: “Uma vez que um suspeito confessa, a polícia geralmente encerra a investigação, considerando o caso resolvido, e ignora informações exculpatórias — mesmo que a confissão seja internamente inconsistente, contraditória por provas externas, ou produto de um interrogatório coercivo” (Kassin 2012Kassin, S. M. (2012) ‘Why Confessions Trump Innocence’ American Psychologist Vol. 67, No. 6: 431-45 p. 433)17 17 Tradução livre dos tradutores. No original: “Once a suspect confesses, police often close the investigation, deem the case solved, and overlook exculpatory information—even if the confession is internally inconsistent, contradicted by external evidence, or the product of coercive interrogation (Kassin 2012 p. 433).” .18 18 Ver também Drizin e Leo 2004, como observado por Kassin; e Gudjonsson (2018) para uma explicação, principalmente com referência a casos em que ele esteve envolvido na Islândia e no Reino Unido.

Esta norma de ignorar informações exculpatórias e assim por diante é parte integrante da Técnica Reid, o método de nove etapas de interrogatório policial comumente usado para treinamento policial nos EUA. Entre os detetives, parece que há níveis extraordinariamente elevados de confiança em sua capacidade de discernir, antes de um interrogatório, quem é inocente e quem é culpado. Nesse sentido, Kassin relata:

Vários anos atrás, eu estava em uma conferência de aplicação da lei em Montreal, na qual Joseph Buckley — presidente da John E. Reid & Associates — deu uma palestra sobre a influente, embora controversa, técnica Reid de interrogatório…Posteriormente, um membro da plateia perguntou a Buckley se ele estava preocupado que seus métodos às vezes levassem pessoas inocentes a confessar. Sua resposta foi: “Não, porque não interrogamos pessoas inocentes”.

Perdi a conta de quantos detetives já ouvi dizerem a mesma coisa

(Kassin 2022Kassin, S. M. (2022) Duped: Why Innocent People Confess—and Why We Believe Their Confessions (Amherst/New York: Prometheus Books), p. 55).19 19 Tradução livre dos tradutores. No original: “Several years ago, I was at a law enforcement conference in Montreal, where Joseph Buckley—president of John E. Reid & Associates – lectured on the influential but controversial Reid technique of interrogation…Afterward, an audience member asked Buckley if he was concerned that his methods might at times cause innocent people to confess. His reply: “No, because we don’t interrogate innocent people.”. I’ve lost track of how many detectives I’ve heard say the same thing (Kassin 2022, p. 55).”

O que, então, é a Técnica Reid, e como ela se compara com outras formas de interrogatório policial? Podemos comparar proveitosamente os princípios básicos da Técnica Reid com o Modelo PEACE de procedimento policial em situações de interrogatório, pois como Gudjonsson explica, o Modelo PEACE foi desenvolvido e implantado no Reino Unido em 1993 como um programa nacional de treinamento para agentes policiais. Ele foi desenvolvido como resposta a uma série de casos notórios de erros judiciais graves com os quais foi possível aprender e fazer melhorias procedimentais. Também foi adotado na Noruega e na Nova Zelândia. Gudjonsson escreve:

O Modelo PEACE [Preparation and planning, Engage and explain, Account, Closure, and Evaluation] foi desenvolvido com base em princípios psicológicos sólidos, que se seguiram de um valioso trabalho colaborativo entre acadêmicos, psicólogos, profissionais da polícia e advogados. A intenção era levar em conta a vulnerabilidade de alguns entrevistados, com o objetivo de minimizar o risco de uma falsa confissão (Shawyer et al., 2009Shawyer A., Milne B., & Bull, R. (2009) ‘Investigative interviewing in the UK’, in T. Williamson, B. Milne, & S. P. Savage eds. International developments in investigative interviewing (Cullompton, Devon: Wilan Publishing) pp. 24-37). O foco está na equidade, abertura, trabalhabilidade, accountability e descoberta verdadeira dos fatos, em vez de meramente obter uma confissão. Perguntas direcionadas, forte pressão, e manipulação psicológica são evitadas, potencialmente reduzindo o risco de falsa confissão enquanto ainda se produzem confissões verdadeiras

(Shawyer et al., 2009Shawyer A., Milne B., & Bull, R. (2009) ‘Investigative interviewing in the UK’, in T. Williamson, B. Milne, & S. P. Savage eds. International developments in investigative interviewing (Cullompton, Devon: Wilan Publishing) pp. 24-37).

Em contraste com o Modelo PEACE, a Técnica Reid, que é influente nos EUA, incentiva os entrevistadores a usar um processo de entrevista em duas etapas (Gudjonsson & Pearse, 2011Gudjonsson, G. H. & Pearse, J. (2011) ‘Suspect interviews and false confessions’ Current Directions in Psychological Science, 20: 33-37; Inbau, Reid, Buckley, & Jayne, 2013Inbau, F. E., Reid, J. E., Buckley, J. P., & Jayne, B. C. (2013) Criminal interrogation and confessions (5th ed.) (Burlington: Jones and Bartlett Learning)). A primeira etapa é uma entrevista não acusatória, na qual são obtidas informações gerais sobre o suspeito, uma relação de rapport e confiança são construídas, e uma determinação é feita sobre se o suspeito está ou não mentindo sobre a ofensa. Se for considerado que o suspeito está mentindo, a entrevista prossegue para uma abordagem acusatória de nove etapas (presunção de culpa), normalmente chamada de “interrogatório” (Inbau et al., 2013Inbau, F. E., Reid, J. E., Buckley, J. P., & Jayne, B. C. (2013) Criminal interrogation and confessions (5th ed.) (Burlington: Jones and Bartlett Learning)). Kassin e Gudjonsson (2004)Kassin, S. M., & Gudjonsson, G. H. (2004) ‘The psychology of confessions. A review of the literature and issues’ Psychological Science in the Public Interest 5: 33-67 argumentam que a Técnica Reid de nove etapas pode ser reduzida a três fases gerais: “custódia e isolamento” (ou seja, o suspeito é detido e isolado, ansiedade e incerteza são geradas a fim de enfraquecer a resistência); “confronto” (ou seja, a culpa do suspeito é assumida e ele ou ela é confrontado com supostas provas incriminatórias que podem ou não ser genuínas, as negações são rejeitadas, mesmo que sejam verdadeiras, e a conseqüência da negação contínua é enfatizada); e “minimização” (ou seja, o interrogador tenta ganhar a confiança do suspeito e fornece desculpas para justificar o crime, inclusive sugerindo que foi um acidente ou que a vítima merecia). Em contraste com o Modelo PEACE, a Técnica Reid tem sido associada ao aumento do risco de falsa confissão (Gudjonsson & Pearse, 2011Gudjonsson, G. H. & Pearse, J. (2011) ‘Suspect interviews and false confessions’ Current Directions in Psychological Science, 20: 33-37; Pearse & Gudjonsson, 1999Pearse, J. & Gudjonsson, G. H. (1999) ‘Measuring influential police interviewing tactics: A factor analytic approach’ Legal and Criminological Psychology 4: 221-238; Snook, Luther, & Barron, 2016Snook, B., Luther, K., & Barron, T. (2016) ‘Interviewing suspects in Canada’ in D. Walsh, G. E. Oxburgh, A. D. Redlich, & T. Mykelburts (eds.) International developments and practices in investigative interviewing and interrogation Volume 2: Suspects (pp. 229-239) (London: Routledge))

(Gudjonsson 2018Gudjonsson, Gisli H. (2018) The Psychology of Confessions: Forty Years of Science and Practice (Chichester: John Wiley & Sons); p. 47).20 20 Tradução livre dos tradutores. No original: “The PEACE Model Preparation and planning, Engage and explain, Account, Closure, and Evaluation] was developed on sound psychological principles, which followed valuable collaborative work between academics, psychologists, police practitioners, and lawyers. It was intended to take into account the vulnerability of some interviewees, with the aim of minimizing the risk of a false confession (Shawyer et al., 2009). The focus is on fairness, openness, workability, accountability, and fact (truth) finding rather than merely obtaining a confession. Leading questions, heavy pressure, and psychological manipulation are avoided, thereby potentially reducing the risk of false confession while still producing true confessions (Shawyer et al, 2009). In contrast to the PEACE Model, the Reid Technique, which is influential in the USA, encourages interviewers to use a two-stage interview process (Gudjonsson & Pearse, 2011; Inbau, Reid, Buckley, & Jayne, 2013). The first stage is a nonaccusatory interview, in which general background information about the suspect is obtained, rapport and trust are built, and a determination is made about whether or not the suspect is lying about the offence. If the suspect is judged to be lying, then the interview progresses to a nine-step accusatory (presumption of guilt) approach, typically referred to as ‘interrogation’ (Inbau et al., 2013). Kassin and Gudjonsson (2004) argue that the nine-step Reid Technique can be reduced to three general phases: ‘custody and isolation’ (i.e. the suspect is detained and isolated, anxiety and uncertainty are generated in order to weaken resistance); ‘confrontation’ (i.e. the suspect’s guilt is assumed and he or she is confronted with alleged incriminating evidence that may or may not be genuine, denials are rejected, even if they happen to be true, and the consequence of continued denial is emphasized); and ‘minimization’ (i.e. the interrogator tries to gain the suspect’s trust and provides face-saving excuses for the crime, including suggesting that it was an accident or that the victim deserved it). In contrast to the PEACE Model, the Reid Technique has been associated with increased risk of false confession (Gudjonsson & Pearse, 2011; Pearse & Gudjonsson, 1999; Snook, Luther, & Barron, 2016) (Gudjonsson 2018; p. 47).”

Cito detalhadamente o resumo de Gudjonsson, incluindo suas citações incorporadas, para expor estes fatos básicos sobre técnicas de entrevista/interrogatório e assim deixar claro como a Técnica Reid que é habitualmente utilizada no treinamento policial nos EUA tem a presunção de culpa explicitamente construída na fase de interrogatório como um preconceito metodológico institucionalmente incorporado.21 21 É claro que não é um quadro sem exceções. Em 2017, tendo ensinado a Técnica Reid por mais de 30 anos, a Wicklander-Zulawski & Associates, uma das maiores agências privadas de treinamento policial do mundo, divulgou um comunicado à imprensa anunciando que estava descontinuando a técnica: https://www.prweb.com/releases/2017/03/prweb14123356.htm. Agradeço a Jennifer Lackey em relação a esse ponto. Isso constitui um preconceito na medida em que envolve um deslocamento motivado da prova: a motivação é a vontade pré-determinada de obter uma condenação a partir do interrogatório, idealmente uma confissão; o deslocamento da prova é inerente ao fato de não ser uma abordagem de inquirição com a mente aberta, mas sim uma tentativa direta e autoconsciente de obter alguma coisa autoincriminatória do suspeito.22 22 Na minha definição, qualquer preconceito que deprima a credibilidade produz uma injustiça epistêmica. Noto que Lackey tem uma visão que chama de “Visão Padrão” segundo a qual o preconceito deve ser um preconceito identitário. A Visão Padrão, então, seria aquela que considera aquilo que eu chamo de “injustiça testemunhal sistemática” como o único tipo de injustiça testemunhal. Do meu ponto de vista, isso seria uma truncagem infeliz, pois excluiria precisamente os casos em que, por exemplo, a simples vontade obstinada de obter uma condenação independentemente da contraprova constituiria um preconceito apto a produzir uma injustiça testemunhal. De qualquer forma, na minha opinião isso certamente produz uma injustiça testemunhal, razão pela qual, se consagrada em procedimentos institucionais da maneira aqui descrita, produz uma injustiça testemunhal institucional. É notavelmente deslocada da prova no momento da conclusão (confissão), na medida em que o método permite aos interrogadores “ignorar informações exculpatórias” ou outra contraprova. A confissão prevalece sobre tudo.

Até agora, o manual sobre a Técnica Reid chocantemente permanece desconectado de qualquer coisa que se pareça com uma investigação genuína, embora claramente seja para isso utilizado. Mas o que eu gostaria de destacar, no entanto, é um outro ponto. A presunção preconceituosa de culpa que caracteriza a fase de “interrogatório” é super assistida pelo poder de manipulação epistêmica inerente ao direito legal do interrogador de mentir. No caso notório de Marty Tankleff — o jovem de 17 anos que em 1989 foi acusado de assassinar seus pais — a polícia lhe disse, entre outras mentiras, que seu pai havia emergido brevemente do coma para apontar Marty como seu agressor (ver Lackey 2020Lackey, Jennifer (2020) ‘False Confessions and Testimonial Injustice’ Journal of Criminal Law and Criminology 110 (1): 43-68, citando Kassin et al 2010Kassin, S. M., Drizin, Steven A., Grisso, Thomas, Gudjonsson, Gisli H., Leo, Richard A., Redlich, Allison D., (2010) ‘Police-Induced Confessions: Risk Factors and Recommendations’ Law Hum Behav 34: 3-38). Condenado apenas com base na confissão, este adolescente, órfão por um duplo assassinato, cumpriu dezenove anos de prisão até sua exoneração. Outro caso infame e trágico é o dos cinco adolescentes negros e latinos exonerados — Antron McCray, Kevin Richardson, Yusef Salaam, Raymond Santana e Korey Wise — que foram enganados para confessar falsamente o estupro e espancamento de uma mulher que estava fazendo jogging no Central Park de Nova York em 1989.23 23 A premiada dramatização, “When They See Us”, foi criada e dirigida por Ava DuVernay em 2019 (série limitada da Netflix). Ver também o documentário de Ken Burns, “The Central Park Five”, de 2012. Como Kassin et al descrevem:

Cada menino retratou sua declaração imediatamente após a prisão, dizendo que havia confessado porque esperava ir depois para casa. Todos os meninos foram condenados e enviados à prisão para serem exonerados apenas em 2002, quando o verdadeiro estuprador deu uma confissão, de forma precisamente detalhada, que foi confirmada por provas de DNA

(Kassin et al 2010Kassin, S. M., Drizin, Steven A., Grisso, Thomas, Gudjonsson, Gisli H., Leo, Richard A., Redlich, Allison D., (2010) ‘Police-Induced Confessions: Risk Factors and Recommendations’ Law Hum Behav 34: 3-38, p. 4).24 24 Tradução livre dos tradutores. No original: “Each boy retracted his statement immediately upon arrest, saying he had confessed because he expected to go home afterward. All the boys were convicted and sent to prison only to be exonerated in 2002 when the real rapist gave a confession, accurately detailed, that was confirmed by DNA evidence (Kassin et al 2010, p. 4).”

Este ponto sobre a impossibilidade de retração é uma parte crucial do quadro de vício epistêmico institucional. Se olharmos para a filosofia para aplicar as categorias de injustiça testemunhal a este cenário de interrogatório, então sugiro que o que precisamos é de uma moldura diacrônica que apresente três fases. Primeiro, uma fase de injustiça testemunhal institucionalizada (déficit de credibilidade prejudicial institucionalizado) onde, no mínimo, a metodologia institucional de presunção de culpa é, em si mesma, um preconceito incorporado na prescrição do método Reid de interrogatório. Esta presunção-de-culpa-preconceituosa pode muitas vezes ser combinada com outros preconceitos, mais especificamente com o racismo, intensificando o erro epistêmico e introduzindo outros erros para além daqueles que apresentam uma estrutura sistemática.25 25 A produção acadêmica sobre encarceramento em massa nos Estados Unidos é abundante em sua exposição do sistema carcerário americano como uma dimensão organizada do racismo estrutural. Entre os principais trabalhos e perspectivas influentes estão Alexander (2010), Coates (2017), Davis (2003), Gilmore (2022). Para um livro de memórias comovente ver Allen (2017). A segunda fase é aquela que Lackey categoriza como injustiça testemunhal agencial, na qual a agência intelectual do suspeito é “negada ou subvertida”, de modo que ele é deixado mais suscetível à confusão, sugestionabilidade, desinformação sobre as conseqüências da confissão, e/ou em total desespero para sair da situação. Esta fase, como bem enfatiza Lackey, é de excesso de credibilidade, embora ela prefira não a considerar como inerentemente o produto do preconceito, enquanto em minha opinião vejo o objetivo institucional da incriminação através da presunção de culpa como constituindo em si um preconceito institucional. Também enfatizaria os benefícios de considerar o excesso de credibilidade envolvido em acreditar numa confissão extraída não apenas no nível dos julgamentos de credibilidade dos interrogadores individuais, mas também — e do ponto de vista da crítica institucional, primariamente — no nível do processo institucional. Porque faz pouca diferença o que qualquer interrogador pode ou não acreditar pessoalmente sobre o confessor se o processo que são treinados a encenar é dirigido a levar o suspeito a ser considerado culpado ao final do interrogatório. Finalmente, devemos acrescentar a terceira fase, que marca a impossibilidade de retratação, e que conduz ao retorno da injustiça testemunhal institucionalizada na variedade de déficit de credibilidade prejudicial quando o suspeito reafirma sua inocência.

O que nos confronta, então, é um processo institucional trifásico epistemicamente vicioso, movido pelo preconceito metodológico de culpa presumida. O processo é caracterizado por um padrão de déficit de credibilidade funcional, depois excesso, depois déficit novamente, e é o resultado direto de um método de interrogatório prescrito institucionalmente, na verdade literalmente um “livro didático”, projetado para assegurar a confissão, ou, falhando isso, alguma forma mais fraca de incriminação. Trata-se de um modelo trifásico de diferentes injustiças testemunhais institucionalizadas através do qual podemos ver formas de injustiça epistêmica funcionando como uma desastrosa porta de entrada injusta para a injustiça legal da confissão extraída e da condenação injusta.26 26 Para duas perspectivas sobre a injustiça epistêmica em relação a diferentes aspectos do sistema carcerário, ver, por exemplo, Medina (2021) e Pitts (2019).

Um superpoder da construção social constitutiva

Há uma outra característica deste processo trifásico que merece ser notada, e que se integra ao nosso modelo filosófico. Vimos que o método de interrogatório prescrito pela Técnica Reid envolve a presunção de culpa combinada com ferramentas poderosas para produzir provas institucionalmente conclusivas de culpabilidade — notadamente, o direito legal de manipular epistemicamente o suspeito. Com base no fato de que isto confere aos interrogadores uma capacidade maciçamente aprimorada de assegurar confissões dos presumidamente culpados, então o que vem à tona, uma vez dissipado o Mito da Confissão, é que a polícia tem assim um quase super-poder de construção social constitutiva. Este tipo de construção social envolve um poder de fazer alguém ou algo contar como tendo uma característica F em um contexto, tratando-o como se tivesse uma característica F no contexto. Aqui, o poder social construtivo possuído pela polícia é fazer com que um suspeito conte como culpado no contexto institucional legal, via uma confissão irreversível, tratando-o como culpado com o objetivo de levá-lo a apresentar a prova institucionalmente conclusiva de que ele é realmente culpado. E o particular contexto institucional no qual um suspeito vem a ser considerado culpado por ser tratado de tal forma é o único contexto que importa, já que é o contexto no qual as autoridades relevantes irão proferir uma sentença de prisão ou pior. Este tipo de construção social é significativamente diferente da construção social causal, que é um poder de fazer algo ou alguém realmente vir a possuir a característica F no contexto. Não importa o quanto o direito permita a polícia utilizar ferramentas capazes de produzir uma confissão, mesmo dos inocentes, essas ferramentas nunca podem fazer com que os inocentes sejam de fato culpados do crime que supostamente cometeram. Mas há pouco conforto nisso. Somos simplesmente lembrados do fato sinistro de que, em alguns contextos autoritários, é o que você conta que determina seu destino.

Para resumir este modelo filosófico diacrônico de um método padrão de interrogatório policial nos Estados Unidos, sugeri que uma primeira fase é a injustiça testemunhal institucionalizada produzida pelo método da suposta culpa, aqui representada como um preconceito institucionalmente arraigado que produz déficits de credibilidade. Em seguida, invoquei a concepção de Lackey de injustiça testemunhal agencial (abordei a questão do preconceito) como a fase intermediária na qual a confissão de um suspeito cuja agência epistêmica tenha sido ativamente violada é imediatamente considerada como crível. Finalmente, a terceira fase diz respeito à irreversibilidade da confissão, outro preconceito institucionalmente arraigado que produz déficits de credibilidade. Esta norma conduz ao retorno da primeira forma de injustiça testemunhal institucionalizada, pois as tentativas do suspeito de retratar-se da confissão através de novas afirmações de inocência são, mais uma vez, consideradas não críveis como uma questão de preconceito epistêmico institucionalizado. Todas estas normas e processos são inteiramente contingentes, e poderiam ser alterados diante da vontade política. Enquanto escrevo, no estado de Nova York há um projeto de lei pendente, o Projeto de Lei do Senado 324, patrocinado por Zellnor Myrie, que propõe a proibição do engano policial nos interrogatórios e exige que os tribunais avaliem a confiabilidade das confissões antes de admiti-las.27 27 A descrição é: “Refere-se a excluir declarações inadmissíveis feitas por réus devido a informações falsas e requer a coleta de dados dos interrogatórios gravados”. https://www.nysenate.gov/legislation/bills/2021/S324

É importante reiterar que nenhuma parte da crítica epistêmica institucional que ofereço situa-se ou recai sobre o reflexo exato dos julgamentos de credibilidade dos interrogadores individualmente ou de outros oficiais. As normas epistêmicas institucionalizadas não governam diretamente o que os indivíduos podem pessoalmente acreditar; elas governam o que conta como crível ou não crível nos processos institucionais adotados. Talvez um interrogador individual acredite na confissão, ou na tentativa de retração, ou talvez não acredite; talvez não tenha certeza, ou talvez não se importe. Não faz diferença para o modelo, porque o que estamos rastreando aqui é um processo epistêmico institucional trifásico que determina se o suspeito será considerado culpado aos olhos da lei. Se o sistema considerar que você confessou, isso é suficiente para a culpa, salvo e até que uma exoneração de DNA possa um dia ser realizada.28 28 Kassin lembra: “Quando Scheck e Neufeld Barry Scheck e Peter Neufeld fundaram o Innocence Project em 1992, que se tornou a Rede de Inocência de quase 70 organizações legais no mundo inteiro] relataram suas primeiras exonerações de DNA, eles tiveram a perspicácia de fazer uma “autópsia” dos arquivos do caso para determinar o que causou essas condenações errôneas. O que descobriram foi uma predominância de reconhecimentos errôneos de testemunhas oculares, falsas confissões, informantes que mentiram, e aplicações errôneas da ciência forense. Estes fatores foram anotados, arquivados e publicados em seu site na Internet. Para espanto de todos, as falsas confissões contribuíram para 29 por cento desses casos. Além disso, esse número aumenta para mais de 60% no subconjunto de casos de homicídios da PI” (Kassin 2022, p. 24). Tradução livre dos tradutores. No original: “When Scheck and Neufeld Barry Scheck and Peter Neufeld founded the Innocence Project in 1992, which became the Innocence Network of nearly 70 legal organizations globally] reported on their first few DNA exonerations, they had the foresight to “autopsy” the case files to determine what caused these wrongful convictions. What they discovered was a predominance of mistaken eyewitness identifications, false confessions, informants who lied, and misapplications of forensic science. These factors were noted, archived, and posted on their web site. To everyone’s astonishment, false confessions contributed to 29 percent of these cases. What’s more, that number increases to over 60 percent in the IP’s subset of homicide cases (Kassin 2022, p. 24).” Portanto, o modelo trifásico é oferecido como o retrato de algo no nível da realidade institucional ao invés de algo que representa necessariamente as atitudes proposicionais de indivíduos que são treinados para executar processos determinantes. O superpoder social construtivo para fazer um suspeito ser considerado como legalmente culpado não é algo possuído por qualquer indivíduo. É um poder embutido nas práticas arraigadas do corpo institucional — práticas que precisam ser urgentemente informadas pelas descobertas psicológicas que há muito têm exposto o Mito da Confissão como um complexo preconceito institucionalizado que não serve nem à verdade nem à justiça.29 29 Sou grata a Saul Kassin pela conversa inestimável com a qual aprendi muito, assim como aprendi com a leitura do seu trabalho; e a Jennifer Lackey pelo seu trabalho filosófico pioneiro sobre estas questões e pelos comentários sobre um rascunho anterior. Sou também grata a Maria Hartwig que, há alguns anos atrás em conversa, chamou minha atenção pela primeira vez para a realidade institucional da presunção de culpa.

  • 1
    Esse artigo foi publicado originalmente no Journal of Dialectics of Nature (número especial sobre Injustiça Epistêmica), editado por Huiren Bai, sendo autorizada a republicação. A tradução inglês-português de “Institutionalized Testimonial Injustices: The Construction of a Confession Mith” foi realizada por Natalia von Rondow e Michael Guedes.
  • 3
    Para uma noção atualizada do panorama, ver os resumos oferecidos por Anderson (2020)Anderson, Elizabeth (2020) ‘Feminist Epistemology and Philosophy of Science’ Stanford Encyclopedia of Philosophy (Spring 2020 edition), Edward N. Zalta (ed.) URL = https://plato.stanford.edu/archives/spr2020/entries/feminism-epistemology/
    https://plato.stanford.edu/archives/spr2...
    e por Grasswick (2019)Grasswick, Heidi (2019) ‘Feminist Social Epistemology’ Stanford Encyclopedia of Philosophy (Fall 2018 edition), Edward N. Zalta (ed.) https://plato.stanford.edu/archives/fall2018/entries/feminist-social-epistemology/
    https://plato.stanford.edu/archives/fall...
    .
  • 4
    Matthieu Queloz oferece uma discussão útil sobre esse ponto no capítulo 8 de Queluz (2021)Queloz, Matthieu (2021) The Practical Origins of Ideas (Oxford: Oxford University Press). O ponto recebeu tratamento mais proeminente, em razão de mais isolado, em Fricker (1998)Fricker, Miranda (1998) ‘Rational Authority and Social Power: Towards A Truly Social Epistemology’ Proceedings of the Aristotelian Society Vol. XVIII Pt. 2: 159-77.
  • 5
    Por isso, o material sobre o preconceito, as percepções estereotipadas das testemunhas por meio da operação de heurísticas em nossa sensibilidade testemunhal, a natureza endêmica da injustiça testemunhal, a consideração à virtude epistemológica do testemunho, proto-conhecimento e boa informação no Estado de Natureza, e a presença da proto-virtude da justiça testemunhal no Estado de Natureza, ocuparam seis dos sete capítulos.
  • 6
    Para uma discussão sobre opressão epistêmica e, em particular, uma distinção entre formas redutíveis e irredutíveis, ver Dotson 2014Dotson, Kristie (2014) ‘Conceptualizing Epistemic Oppression’ Social Epistemology: A Journal of Knowledge, Culture and Policy 28(2): 115-138. Um aspecto da marginalização hermenêutica, particularmente enfatizado por Dotson (2012)Dotson, Kristie (2012) ‘A Cautionary Tale: On Limiting Epistemic Oppression’ Frontiers 33(1): 24–47, Mason (2011)Mason, Rebecca (2011) ‘Two Kinds of Unknowing’ Hypatia 26 (2): 294-307 e Pohlhaus (2012)Pohlhaus, Gaile (2012) ‘Relational Knowing and Epistemic Injustice: Toward a Theory of Willful Hermeneutical Ignorance’ Hypatia 27 (3): 715-735, e que normalmente faz parte e é parcela dos casos sistemáticos, é o interesse que os poderosos têm em manter o status quo conceitual. É assim no meu exemplo do assediador sexual para quem obviamente convém ao seu propósito que haja uma ausência geral de um conceito capaz de capturar sua conduta sob a luz crítica apropriada (Fricker 2007Fricker, Miranda (2007) Epistemic Injustice: Power and the Ethics of Knowing (Oxford: Oxford University Press), p. 151). Mas o que outros enfatizaram com razão é a resistência ativa a novos conceitos e ferramentas interpretativas que esse interesse provavelmente produzirá. Isso representa a principal área de sobreposição, a meu ver, entre as injustiças epistêmicas como as concebi e a ideia de Charles MillsMills, Charles (2015) ‘Global White Ignorance’. In Matthias Gross and Linsey McGoey (eds.) Routledge International Handbook of Ignorance Studies. London/NY: Routledge de “ignorância branca” (ver Mills 2007Mills, Charles (2007) ‘White Ignorance’. In Race and Epistemologies of Ignorance, ed. Shannon Sullivan and Nancy Tuana. NY: SUNY Press e 2015; exploro essa área de sobreposição em Fricker 2016Fricker, Miranda (2016) ‘Epistemic Injustice and the Preservation of Ignorance’ The Epistemic Dimensions of Ignorance eds. M. Blaauw & R. Peels (Cambridge: Cambridge University Press)).
  • 7
    Ver Medina (2011)Medina, José (2011) ‘The Relevance of Credibility Excess in a Proportional View of Epistemic Injustice: Differential Epistemic Authority and the Social Imaginary’, Social Epistemology Special Issue 25/1: 15-35; Davis (2016)Davis, Emmalon (2016) ‘Typecasts, Tokens, and Spokespersons: A Case for Credibility Excess as Testimonial Injustice’ Hypatia Vol. 31, No. 3 (Summer 2016); Yap (2017)Yap, Audrey (2017) ‘Credibility Excess and the Social Imaginary in Cases of Sexual Assault’, Feminist Philosophy Quarterly 3(4): 1-24; Lackey (2020)Lackey, Jennifer (2020) ‘False Confessions and Testimonial Injustice’ Journal of Criminal Law and Criminology 110 (1): 43-68.
  • 8
    Para uma noção de injustiça testemunhal estrutural, ver Elizabeth Anderson (2012)Anderson, Elizabeth (2012) ‘Epistemic Justice as a Virtue of Social Institutions’ Social Epistemology 20(2): 163-73.
  • 9
    Para uma explicação mais detalhada desse modelo de virtude e vício epistêmico em instituições, com foco na Corporação Britânica de Radiodifusão, ver Fricker (2021)Fricker, Miranda (2021) ‘Institutional Epistemic Vices: The Case of Inferential Inertia’ in eds. Heather Battaly and Ian J. Kidd Epistemic Vice (Routledge) pp. 89-107.
  • 10
    Explorei os modelos de virtudes e vícios institucionais em mais detalhes em Fricker (2010)Fricker, Miranda (2010) ‘Can There Be Institutional Virtues?’ Oxford Studies in Epistemology Vol. 3 eds. T. S. Gendler & J. Hawthorne: 235-252 e especificamente o de inércia inferencial em Fricker (2021)Fricker, Miranda (2021) ‘Institutional Epistemic Vices: The Case of Inferential Inertia’ in eds. Heather Battaly and Ian J. Kidd Epistemic Vice (Routledge) pp. 89-107. Para modelos alternativos de vício epistêmico em particular, ver Battaly (2014)Battaly, Heather (2014) ‘Varieties of Epistemic Vice’ in J. Matheson & R. Vitz (eds.) The Ethics of Belief (OUP), Crerar (2017)Crerar, Charlie (2017) ‘Motivational Approaches to Intellectual Vice’ Australasian Journal of Philosophy 96(4): 753-766, e Cassam (2016Cassam, Quassim (2016) ‘Vice Epistemology’ The Monist 99: 159-180 e 2019)Cassam, Quassim (2019) Vices of the Mind (Oxford: Oxford University Press); ver também os artigos em eds. Battaly, Kidd & Cassam (2021)Battaly, Heather, Kidd, Ian J., and Cassam, Quassim (2021) Vice Epistemology (London: Routledge); e Tanesini (2018Tanesini, Alessandra (2018) ‘Epistemic Vice and Motivation’ Metaphilosophy 49(3): 350-67 e 2021)Tanesini, Alessandra (2021) The Mismeasure of the Self: A study in vice epistemology (Oxford: Oxford University Press). Para outra discussão recente, ver de Bruin e de Rooij (2022)Boudewijn de Bruin and Barend de Rooij (2022) ‘Real Life Collective Epistemic Virtue and Vice’ in Mark Alfano, Colin Klein, and Jeroen De Ridder (eds.) Social Virtue Epistemology (London & New York: Routledge): 396-423.
  • 11
    Em 2021, Illinois e Oregon proibiram a polícia de mentir para menores (menores de 18 anos) em interrogatório, embora permaneça perfeitamente jurídico mentir para adultos. Sobre isso, ver, por exemplo, https://innocenceproject.org/illinois-first-state-to-ban-police-lying/ e https://prismreports.org/2021/08/30/lying-to-police-suspects-is-banned-in-several-countries-why-is-it-still-legal-in-the-u-s/
  • 12
    “Vulnerabilidades”, Carel e Kidd informam, é um termo emprestado de Shelley Tremain (2021)Tremain, Shelley (forthcoming) ‘Philosophy of Disability, Conceptual Engineering, and the Nursing-Home Industrial Complex in Canada’ International Journal of Critical Diversity Studies.
  • 13
    Sobre a fenomenologia da inocência, ver também Jordan & Hartwig (2012)Jordan, Sarah & Hartwig, Maria (2013) ‘On the phenomenology of innocence: The role of Belief in a Just World’ Psychiatry, Psychology and the Law 20(5): 749-760.
  • 14
    Tradução livre dos tradutores. No original: “The phenomenology of innocence may be rooted in a generalized and perhaps motivated belief in a just world in which human beings get what they deserve and deserve what they get… It may also stem from…an ‘illusion of transparency,’ a tendency for people to over-estimate the extent to which their true thoughts, emotions, and other inner states can be seen by others (Kassin 2005Kassin, S. M. (2005) ‘On the Psychology of Confessions: Does Innocence Put Innocents at Risk?’ American Psychologist: 215-228, p. 218).”
  • 15
    Tradução livre dos tradutores. No original: “where an unwarranted credibility excess is afforded to speakers when their epistemic agency has been denied or subverted in the obtaining of their testimony (Lackey 2020Lackey, Jennifer (2020) ‘False Confessions and Testimonial Injustice’ Journal of Criminal Law and Criminology 110 (1): 43-68, p.43).”
  • 16
    Na taxonomia de três vias da falsa confissão previamente desenvolvida por Kassin e Wrightsman (1985)Kassin, S. M. and Wrightsman, L. S. (1985) ‘Confession evidence’ in S. M. Kassin & L. S. Wrightsman (eds.) The psychology of evidence and trial procedures: 67-94 (London: Sage) a primeira é rotulada como tipo de falsa confissão “coerciva’, enquanto a segunda é “coerciva-internalizada” (seu terceiro tipo é “voluntária” o que pode ser explicado pelo desejo de proteger outra pessoa, ou por um “desejo mórbido de notoriedade”, ou várias outras possibilidades). Veja a discussão adicional no capítulo 4 de Gudjonsson (2018)Gudjonsson, Gisli H. (2018) The Psychology of Confessions: Forty Years of Science and Practice (Chichester: John Wiley & Sons), e no recente livro de Kassin (Kassin 2022Kassin, S. M. (2022) Duped: Why Innocent People Confess—and Why We Believe Their Confessions (Amherst/New York: Prometheus Books), pp. 11-14).
  • 17
    Tradução livre dos tradutores. No original: “Once a suspect confesses, police often close the investigation, deem the case solved, and overlook exculpatory information—even if the confession is internally inconsistent, contradicted by external evidence, or the product of coercive interrogation (Kassin 2012Kassin, S. M. (2012) ‘Why Confessions Trump Innocence’ American Psychologist Vol. 67, No. 6: 431-45 p. 433).”
  • 18
    Ver também Drizin e Leo 2004Drizin, S. A. & Leo, R. A. (2004) ‘The problem of false confessions in the post-DNA world’, North Carolina Law Review 82: 891-1007, como observado por Kassin; e Gudjonsson (2018)Gudjonsson, Gisli H. (2018) The Psychology of Confessions: Forty Years of Science and Practice (Chichester: John Wiley & Sons) para uma explicação, principalmente com referência a casos em que ele esteve envolvido na Islândia e no Reino Unido.
  • 19
    Tradução livre dos tradutores. No original: “Several years ago, I was at a law enforcement conference in Montreal, where Joseph Buckley—president of John E. Reid & Associates – lectured on the influential but controversial Reid technique of interrogation…Afterward, an audience member asked Buckley if he was concerned that his methods might at times cause innocent people to confess. His reply: “No, because we don’t interrogate innocent people.”. I’ve lost track of how many detectives I’ve heard say the same thing (Kassin 2022Kassin, S. M. (2022) Duped: Why Innocent People Confess—and Why We Believe Their Confessions (Amherst/New York: Prometheus Books), p. 55).”
  • 20
    Tradução livre dos tradutores. No original: “The PEACE Model Preparation and planning, Engage and explain, Account, Closure, and Evaluation] was developed on sound psychological principles, which followed valuable collaborative work between academics, psychologists, police practitioners, and lawyers. It was intended to take into account the vulnerability of some interviewees, with the aim of minimizing the risk of a false confession (Shawyer et al., 2009Shawyer A., Milne B., & Bull, R. (2009) ‘Investigative interviewing in the UK’, in T. Williamson, B. Milne, & S. P. Savage eds. International developments in investigative interviewing (Cullompton, Devon: Wilan Publishing) pp. 24-37). The focus is on fairness, openness, workability, accountability, and fact (truth) finding rather than merely obtaining a confession. Leading questions, heavy pressure, and psychological manipulation are avoided, thereby potentially reducing the risk of false confession while still producing true confessions (Shawyer et al, 2009Shawyer A., Milne B., & Bull, R. (2009) ‘Investigative interviewing in the UK’, in T. Williamson, B. Milne, & S. P. Savage eds. International developments in investigative interviewing (Cullompton, Devon: Wilan Publishing) pp. 24-37). In contrast to the PEACE Model, the Reid Technique, which is influential in the USA, encourages interviewers to use a two-stage interview process (Gudjonsson & Pearse, 2011Gudjonsson, G. H. & Pearse, J. (2011) ‘Suspect interviews and false confessions’ Current Directions in Psychological Science, 20: 33-37; Inbau, Reid, Buckley, & Jayne, 2013Inbau, F. E., Reid, J. E., Buckley, J. P., & Jayne, B. C. (2013) Criminal interrogation and confessions (5th ed.) (Burlington: Jones and Bartlett Learning)). The first stage is a nonaccusatory interview, in which general background information about the suspect is obtained, rapport and trust are built, and a determination is made about whether or not the suspect is lying about the offence. If the suspect is judged to be lying, then the interview progresses to a nine-step accusatory (presumption of guilt) approach, typically referred to as ‘interrogation’ (Inbau et al., 2013Inbau, F. E., Reid, J. E., Buckley, J. P., & Jayne, B. C. (2013) Criminal interrogation and confessions (5th ed.) (Burlington: Jones and Bartlett Learning)). Kassin and Gudjonsson (2004)Kassin, S. M., & Gudjonsson, G. H. (2004) ‘The psychology of confessions. A review of the literature and issues’ Psychological Science in the Public Interest 5: 33-67 argue that the nine-step Reid Technique can be reduced to three general phases: ‘custody and isolation’ (i.e. the suspect is detained and isolated, anxiety and uncertainty are generated in order to weaken resistance); ‘confrontation’ (i.e. the suspect’s guilt is assumed and he or she is confronted with alleged incriminating evidence that may or may not be genuine, denials are rejected, even if they happen to be true, and the consequence of continued denial is emphasized); and ‘minimization’ (i.e. the interrogator tries to gain the suspect’s trust and provides face-saving excuses for the crime, including suggesting that it was an accident or that the victim deserved it). In contrast to the PEACE Model, the Reid Technique has been associated with increased risk of false confession (Gudjonsson & Pearse, 2011Gudjonsson, G. H. & Pearse, J. (2011) ‘Suspect interviews and false confessions’ Current Directions in Psychological Science, 20: 33-37; Pearse & Gudjonsson, 1999Pearse, J. & Gudjonsson, G. H. (1999) ‘Measuring influential police interviewing tactics: A factor analytic approach’ Legal and Criminological Psychology 4: 221-238; Snook, Luther, & Barron, 2016) (Gudjonsson 2018Gudjonsson, Gisli H. (2018) The Psychology of Confessions: Forty Years of Science and Practice (Chichester: John Wiley & Sons); p. 47).”
  • 21
    É claro que não é um quadro sem exceções. Em 2017, tendo ensinado a Técnica Reid por mais de 30 anos, a Wicklander-Zulawski & Associates, uma das maiores agências privadas de treinamento policial do mundo, divulgou um comunicado à imprensa anunciando que estava descontinuando a técnica: https://www.prweb.com/releases/2017/03/prweb14123356.htm. Agradeço a Jennifer Lackey em relação a esse ponto.
  • 22
    Na minha definição, qualquer preconceito que deprima a credibilidade produz uma injustiça epistêmica. Noto que Lackey tem uma visão que chama de “Visão Padrão” segundo a qual o preconceito deve ser um preconceito identitário. A Visão Padrão, então, seria aquela que considera aquilo que eu chamo de “injustiça testemunhal sistemática” como o único tipo de injustiça testemunhal. Do meu ponto de vista, isso seria uma truncagem infeliz, pois excluiria precisamente os casos em que, por exemplo, a simples vontade obstinada de obter uma condenação independentemente da contraprova constituiria um preconceito apto a produzir uma injustiça testemunhal. De qualquer forma, na minha opinião isso certamente produz uma injustiça testemunhal, razão pela qual, se consagrada em procedimentos institucionais da maneira aqui descrita, produz uma injustiça testemunhal institucional.
  • 23
    A premiada dramatização, “When They See Us”, foi criada e dirigida por Ava DuVernay em 2019 (série limitada da Netflix). Ver também o documentário de Ken Burns, “The Central Park Five”, de 2012.
  • 24
    Tradução livre dos tradutores. No original: “Each boy retracted his statement immediately upon arrest, saying he had confessed because he expected to go home afterward. All the boys were convicted and sent to prison only to be exonerated in 2002 when the real rapist gave a confession, accurately detailed, that was confirmed by DNA evidence (Kassin et al 2010Kassin, S. M., Drizin, Steven A., Grisso, Thomas, Gudjonsson, Gisli H., Leo, Richard A., Redlich, Allison D., (2010) ‘Police-Induced Confessions: Risk Factors and Recommendations’ Law Hum Behav 34: 3-38, p. 4).”
  • 25
    A produção acadêmica sobre encarceramento em massa nos Estados Unidos é abundante em sua exposição do sistema carcerário americano como uma dimensão organizada do racismo estrutural. Entre os principais trabalhos e perspectivas influentes estão Alexander (2010)Alexander, Michelle (2010) The New Jim Crow: Mass Incarceration in the Age of Colorblindness (New York: The New Press), Coates (2017)Coates, Ta-Nehisi (2017) ‘The black family in the age of mass incarceration’ in We Were Eight Years In Power: An American Tragedy (New York: One World), Davis (2003)Davis, Angela (2003) Are Prisons Obsolete? (New York: Seven Stories Press), Gilmore (2022)Gilmore, Ruth Wilson (2022) Abolition Geography: Essays Towards Liberation (New York: Verso). Para um livro de memórias comovente ver Allen (2017)Allen, Danielle (2017) Cuz: Or the life and times of Michael A. (New York: Liveright Publishing Corporation).
  • 26
    Para duas perspectivas sobre a injustiça epistêmica em relação a diferentes aspectos do sistema carcerário, ver, por exemplo, Medina (2021)Medina, José (2011) ‘The Relevance of Credibility Excess in a Proportional View of Epistemic Injustice: Differential Epistemic Authority and the Social Imaginary’, Social Epistemology Special Issue 25/1: 15-35 e Pitts (2019)Andrea J. Pitts (2019) ‘Carceral Medicine and Prison Abolition: Trust and Truth-Telling in Correctional healthcare’ ch. 13 in Benjamin R. Sherman and Stacey Goguen (eds.) Overcoming Epistemic Injustice: Social and Psychological Perspectives.
  • 27
    A descrição é: “Refere-se a excluir declarações inadmissíveis feitas por réus devido a informações falsas e requer a coleta de dados dos interrogatórios gravados”. https://www.nysenate.gov/legislation/bills/2021/S324
  • 28
    Kassin lembra: “Quando Scheck e Neufeld Barry Scheck e Peter Neufeld fundaram o Innocence Project em 1992, que se tornou a Rede de Inocência de quase 70 organizações legais no mundo inteiro] relataram suas primeiras exonerações de DNA, eles tiveram a perspicácia de fazer uma “autópsia” dos arquivos do caso para determinar o que causou essas condenações errôneas. O que descobriram foi uma predominância de reconhecimentos errôneos de testemunhas oculares, falsas confissões, informantes que mentiram, e aplicações errôneas da ciência forense. Estes fatores foram anotados, arquivados e publicados em seu site na Internet. Para espanto de todos, as falsas confissões contribuíram para 29 por cento desses casos. Além disso, esse número aumenta para mais de 60% no subconjunto de casos de homicídios da PI” (Kassin 2022Kassin, S. M. (2022) Duped: Why Innocent People Confess—and Why We Believe Their Confessions (Amherst/New York: Prometheus Books), p. 24). Tradução livre dos tradutores. No original: “When Scheck and Neufeld Barry Scheck and Peter Neufeld founded the Innocence Project in 1992, which became the Innocence Network of nearly 70 legal organizations globally] reported on their first few DNA exonerations, they had the foresight to “autopsy” the case files to determine what caused these wrongful convictions. What they discovered was a predominance of mistaken eyewitness identifications, false confessions, informants who lied, and misapplications of forensic science. These factors were noted, archived, and posted on their web site. To everyone’s astonishment, false confessions contributed to 29 percent of these cases. What’s more, that number increases to over 60 percent in the IP’s subset of homicide cases (Kassin 2022Kassin, S. M. (2022) Duped: Why Innocent People Confess—and Why We Believe Their Confessions (Amherst/New York: Prometheus Books), p. 24).”
  • 29
    Sou grata a Saul Kassin pela conversa inestimável com a qual aprendi muito, assim como aprendi com a leitura do seu trabalho; e a Jennifer Lackey pelo seu trabalho filosófico pioneiro sobre estas questões e pelos comentários sobre um rascunho anterior. Sou também grata a Maria Hartwig que, há alguns anos atrás em conversa, chamou minha atenção pela primeira vez para a realidade institucional da presunção de culpa.
  • Declaration of originality: este artigo foi publicado originalmente no Journal of Dialectics of Nature (número especial sobre Injustiça Epistêmica), editado por Huiren Bai, sendo autorizada a republicação. A tradução inglês-português de “Institutionalized Testimonial Injustices: The Construction of a Confession Mith” foi realizada por Natalia von Rondow e Michael Guedes; the author attests that there is no third party plagiarism or self-plagiarism.

How to cite (ABNT Brazil):

  • FRICKER, Miranda. Injustiças Testemunhais Institucionalizadas: A construção do Mito da Confissão. Revista Brasileira de Direito Processual Penal, vol. 9, n. 1, p. 39-64, jan./abr. 2023. https://doi.org/10.22197/rbdpp.v9i1.820

Bibliografia

  • Allen, Danielle (2017) Cuz: Or the life and times of Michael A. (New York: Liveright Publishing Corporation)
  • Alexander, Michelle (2010) The New Jim Crow: Mass Incarceration in the Age of Colorblindness (New York: The New Press)
  • Anderson, Elizabeth (2020) ‘Feminist Epistemology and Philosophy of Science’ Stanford Encyclopedia of Philosophy (Spring 2020 edition), Edward N. Zalta (ed.) URL = https://plato.stanford.edu/archives/spr2020/entries/feminism-epistemology/
    » https://plato.stanford.edu/archives/spr2020/entries/feminism-epistemology/
  • Anderson, Elizabeth (2012) ‘Epistemic Justice as a Virtue of Social Institutions’ Social Epistemology 20(2): 163-73
  • Battaly, Heather, Kidd, Ian J., and Cassam, Quassim (2021) Vice Epistemology (London: Routledge)
  • Battaly, Heather (2014) ‘Varieties of Epistemic Vice’ in J. Matheson & R. Vitz (eds.) The Ethics of Belief (OUP)
  • Boudewijn de Bruin and Barend de Rooij (2022) ‘Real Life Collective Epistemic Virtue and Vice’ in Mark Alfano, Colin Klein, and Jeroen De Ridder (eds.) Social Virtue Epistemology (London & New York: Routledge): 396-423
  • Carel, Havi & Kidd, Ian James (2021) ‘Institutional Opacity, Epistemic Vulnerability, and Institutional Testimonial Justice’, International Journal of Philosophical Studies 29(4): 473-96
  • Cassam, Quassim (2016) ‘Vice Epistemology’ The Monist 99: 159-180
  • Cassam, Quassim (2019) Vices of the Mind (Oxford: Oxford University Press)
  • Coates, Ta-Nehisi (2017) ‘The black family in the age of mass incarceration’ in We Were Eight Years In Power: An American Tragedy (New York: One World)
  • Collins, Patricia Hill (2000) Black Feminist Thought: Knowledge, Consciousness, and the Politics of Empowerment 2nd ed. (New York & London: Routledge)
  • Craig, Edward Knowledge and the State of Nature. An Essay in Conceptual Synthesis (Oxford: Clarendon Press, 1990)
  • Crerar, Charlie (2017) ‘Motivational Approaches to Intellectual Vice’ Australasian Journal of Philosophy 96(4): 753-766
  • Davis, Angela (2003) Are Prisons Obsolete? (New York: Seven Stories Press)
  • Davis, Emmalon (2016) ‘Typecasts, Tokens, and Spokespersons: A Case for Credibility Excess as Testimonial Injustice’ Hypatia Vol. 31, No. 3 (Summer 2016)
  • Dotson, Kristie (2012) ‘A Cautionary Tale: On Limiting Epistemic Oppression’ Frontiers 33(1): 24–47
  • Dotson, Kristie (2014) ‘Conceptualizing Epistemic Oppression’ Social Epistemology: A Journal of Knowledge, Culture and Policy 28(2): 115-138
  • Drizin, S. A. & Leo, R. A. (2004) ‘The problem of false confessions in the post-DNA world’, North Carolina Law Review 82: 891-1007
  • Fricker, Miranda (1998) ‘Rational Authority and Social Power: Towards A Truly Social Epistemology’ Proceedings of the Aristotelian Society Vol. XVIII Pt. 2: 159-77
  • Fricker, Miranda (1999) ‘Epistemic Oppression and Epistemic Privilege’ Canadian Journal of Philosophy Supp. Vol. 25: 191-210
  • Fricker, Miranda (2007) Epistemic Injustice: Power and the Ethics of Knowing (Oxford: Oxford University Press)
  • Fricker, Miranda (2010) ‘Can There Be Institutional Virtues?’ Oxford Studies in Epistemology Vol. 3 eds. T. S. Gendler & J. Hawthorne: 235-252
  • Fricker, Miranda (2016) ‘Epistemic Injustice and the Preservation of Ignorance’ The Epistemic Dimensions of Ignorance eds. M. Blaauw & R. Peels (Cambridge: Cambridge University Press)
  • Fricker, Miranda (2021) ‘Institutional Epistemic Vices: The Case of Inferential Inertia’ in eds. Heather Battaly and Ian J. Kidd Epistemic Vice (Routledge) pp. 89-107
  • Gilmore, Ruth Wilson (2022) Abolition Geography: Essays Towards Liberation (New York: Verso)
  • Grasswick, Heidi (2019) ‘Feminist Social Epistemology’ Stanford Encyclopedia of Philosophy (Fall 2018 edition), Edward N. Zalta (ed.) https://plato.stanford.edu/archives/fall2018/entries/feminist-social-epistemology/
    » https://plato.stanford.edu/archives/fall2018/entries/feminist-social-epistemology/
  • Gudjonsson, Gisli H. (2018) The Psychology of Confessions: Forty Years of Science and Practice (Chichester: John Wiley & Sons)
  • Gudjonsson, G. H. & Pearse, J. (2011) ‘Suspect interviews and false confessions’ Current Directions in Psychological Science, 20: 33-37
  • Harding, Sandra (1991) Whose Science? Whose Knowledge? (Milton Keynes: Open University Press)
  • Inbau, F. E., Reid, J. E., Buckley, J. P., & Jayne, B. C. (2013) Criminal interrogation and confessions (5th ed.) (Burlington: Jones and Bartlett Learning)
  • Jordan, Sarah & Hartwig, Maria (2013) ‘On the phenomenology of innocence: The role of Belief in a Just World’ Psychiatry, Psychology and the Law 20(5): 749-760
  • Kassin, S. M. (2022) Duped: Why Innocent People Confess—and Why We Believe Their Confessions (Amherst/New York: Prometheus Books)
  • Kassin, S. M., & Gudjonsson, G. H. (2004) ‘The psychology of confessions. A review of the literature and issues’ Psychological Science in the Public Interest 5: 33-67
  • Kassin, S. M. (2005) ‘On the Psychology of Confessions: Does Innocence Put Innocents at Risk?’ American Psychologist: 215-228
  • Kassin, S. M., Drizin, Steven A., Grisso, Thomas, Gudjonsson, Gisli H., Leo, Richard A., Redlich, Allison D., (2010) ‘Police-Induced Confessions: Risk Factors and Recommendations’ Law Hum Behav 34: 3-38
  • Kassin, S. M. (2012) ‘Why Confessions Trump Innocence’ American Psychologist Vol. 67, No. 6: 431-45
  • Kassin, S. M. and Wrightsman, L. S. (1985) ‘Confession evidence’ in S. M. Kassin & L. S. Wrightsman (eds.) The psychology of evidence and trial procedures: 67-94 (London: Sage)
  • Lackey, Jennifer (2020) ‘False Confessions and Testimonial Injustice’ Journal of Criminal Law and Criminology 110 (1): 43-68
  • Lackey, Jennifer (forthcoming) Criminal Testimonial Injustice
  • Mason, Rebecca (2011) ‘Two Kinds of Unknowing’ Hypatia 26 (2): 294-307
  • Medina, José (2011) ‘The Relevance of Credibility Excess in a Proportional View of Epistemic Injustice: Differential Epistemic Authority and the Social Imaginary’, Social Epistemology Special Issue 25/1: 15-35
  • Medina, José (2013) Epistemologies of Resistance: Gender and Racial Oppression, Epistemic Injustice, and Resistant Imaginations (Oxford: Oxford University Press)
  • José Medina (2021) ‘Capital vices, institutional failures, and epistemic neglect in a county jail’ in I. J. Kidd, H. Battaly & Q. Cassam eds. Vice Epistemology (Abingdon: Routledge)
  • Mills, Charles (2007) ‘White Ignorance’. In Race and Epistemologies of Ignorance, ed. Shannon Sullivan and Nancy Tuana. NY: SUNY Press
  • Mills, Charles (2015) ‘Global White Ignorance’. In Matthias Gross and Linsey McGoey (eds.) Routledge International Handbook of Ignorance Studies. London/NY: Routledge
  • Pearse, J. & Gudjonsson, G. H. (1999) ‘Measuring influential police interviewing tactics: A factor analytic approach’ Legal and Criminological Psychology 4: 221-238
  • Andrea J. Pitts (2019) ‘Carceral Medicine and Prison Abolition: Trust and Truth-Telling in Correctional healthcare’ ch. 13 in Benjamin R. Sherman and Stacey Goguen (eds.) Overcoming Epistemic Injustice: Social and Psychological Perspectives
  • Pohlhaus, Gaile (2012) ‘Relational Knowing and Epistemic Injustice: Toward a Theory of Willful Hermeneutical Ignorance’ Hypatia 27 (3): 715-735
  • Shawyer A., Milne B., & Bull, R. (2009) ‘Investigative interviewing in the UK’, in T. Williamson, B. Milne, & S. P. Savage eds. International developments in investigative interviewing (Cullompton, Devon: Wilan Publishing) pp. 24-37
  • Snook, B., Luther, K., & Barron, T. (2016) ‘Interviewing suspects in Canada’ in D. Walsh, G. E. Oxburgh, A. D. Redlich, & T. Mykelburts (eds.) International developments and practices in investigative interviewing and interrogation Volume 2: Suspects (pp. 229-239) (London: Routledge)
  • Tanesini, Alessandra (2018) ‘Epistemic Vice and Motivation’ Metaphilosophy 49(3): 350-67
  • Tanesini, Alessandra (2021) The Mismeasure of the Self: A study in vice epistemology (Oxford: Oxford University Press)
  • Tremain, Shelley (forthcoming) ‘Philosophy of Disability, Conceptual Engineering, and the Nursing-Home Industrial Complex in Canada’ International Journal of Critical Diversity Studies
  • Queloz, Matthieu (2021) The Practical Origins of Ideas (Oxford: Oxford University Press)
  • Williams, Bernard (2002) Truth and Truthfulness. An Essay in Genealogy (Princeton: Princeton University Press)
  • Yap, Audrey (2017) ‘Credibility Excess and the Social Imaginary in Cases of Sexual Assault’, Feminist Philosophy Quarterly 3(4): 1-24

Editado por

Editorial team

  • Editor-in-chief: 1 (VGV)

  • Associated-editor: 2 (JM, AP)

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Maio 2023
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2023

Histórico

  • Recebido
    07 Mar 2023
  • Aceito
    15 Mar 2023
Instituto Brasileiro de Direito Processual Penal Av. Praia de Belas, 1212 - conj 1022 - Praia de Belas, Porto Alegre - RS / Brasil. CEP 90110-000., +55 (51) 3406-1478 - Porto Alegre - RS - Brazil
E-mail: revista@ibraspp.com.br