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Sistemas óticos com dois espelhos

Optical systems with two mirrors

Resumos

Estudam-se vários sistemas óticos formados por dois espelhos.

ótica geométrica; espelhos; cavidades óticas; microscópios e telescópios refletores


Some optical systems with two mirrors are studied.

geometrical optics; mirrors; optical cavities; reflecting microscopes and telescopes


ARTIGOS GERAIS

Sistemas óticos com dois espelhos

Optical systems with two mirrors

M.F. Ferreira da Silva1 1 E-mail: mffs@ubi.pt.

Departamento de Física, Universidade da Beira Interior, Covilhã, Portugal

RESUMO

Estudam-se vários sistemas óticos formados por dois espelhos.

Palavras-chave: ótica geométrica, espelhos, cavidades óticas, microscópios e telescópios refletores.

ABSTRACT

Some optical systems with two mirrors are studied.

Keywords: geometrical optics, mirrors, optical cavities, reflecting microscopes and telescopes.

1. Introdução

No ensino tradicional da ótica geométrica, é usual encontrar nos livros de texto o estudo dos espelhos. Naturalmente, esse estudo começa pelos espelhos planos, e mostra-se que tais espelhos produzem apenas imagens virtuais, direitas e com o mesmo tamanho do objeto. Um dos exemplos mais comuns relativos a espelhos planos é o de dois espelhos situados um à frente do outro; para um objeto colocado entre os espelhos, este sistema dá origem a uma sucessão infinita de imagens virtuais, todas direitas e com o mesmo tamanho do objeto, situadas em posições cada vez mais afastadas.

Quando o estudo dos espelhos é generalizado de forma a incluir os espelhos esféricos, mostra-se que estes espelhos podem produzir imagens reais ou virtuais, direitas ou invertidas, e maiores ou menores do que o objeto.

Entre os exemplos, contudo, dificilmente encontramos mais do que um espelho esférico. A grande maioria dos manuais [1-10] combinam, mais tarde, espelhos com lentes, mas exemplos com dois ou mais espelhos esféricos são muito raros [11-15].

Neste trabalho mostram-se alguns exemplos simples com dois espelhos esféricos. Além de possuírem um interesse pedagógico genuíno, estes exemplos levam a algumas aplicações interessantes, como as cavidades óticas de ressonância, e podem servir de preâmbulo para o estudo de algumas outras aplicações concretas, como os telescópios refletores de Newton, Gregory ou Cassegrain e o microscópio de reflexão de Burch.

2. Formulação do problema

À semelhança do exemplo referido de dois espelhos planos, vamos pôr os espelhos esféricos um à frente do outro. Cada imagem formada por um dos espelhos vai ser um objeto para o outro espelho, pelo que devemos esperar também infinitas imagens.

Tendo em conta o caráter mais diversificado das imagens produzidas por um espelho esférico, as primeiras perguntas naturais são, então, as seguintes: Como serão estas infinitas imagens? Reais ou virtuais? Direitas ou invertidas? Maiores ou menores do que o objeto? Outra pergunta que poderia surgir é esta: As imagens vão aparecer em pontos cada vez mais afastados, como no caso de dois espelhos planos? Ou vão manter-se perto dos espelhos indefinidamente? (Esta questão pode ser importante se desejarmos observar as imagens em detalhe.) Claro que, se isto fosse realmente possível, seria de esperar uma situação algo complexa, com as imagens demasiado perto umas das outras, o que poderia dificultar a sua visualização. Finalmente, depois de pensar um pouco sobre o assunto, poderia surgir uma nova pergunta: Haverá alguma maneira de evitar que se produzam infinitas imagens, de forma a não obter um aglomerado confuso de imagens?

Serão estas algumas das perguntas a que tentaremos responder aqui. Em particular, interessar-nos-á a última destas questões. É claro que, se desejamos que o número de imagens seja finito, teremos de procurar imagens que se repitam, isto é, imagens que coincidam com objetos anteriores. Esse será, efetivamente, o nosso objetivo principal.

Para reduzir o enorme espetro de possibilidades, e simplificar um pouco o problema, consideraremos apenas pares de espelhos semelhantes, ou seja, espelhos que tenham a mesma distância focal em valor absoluto (|f|). E tomaremos |f| = 1, o que equivale a escolher uma escala de distâncias específica. Seguiremos as convenções usuais [1-10] para os sinais da distância objeto (que designaremos o), distância imagem (que designaremos i) e aumento lateral (que designaremos m), faremos uso implícito da aproximação paraxial e ignoraremos os efeitos de aberração esférica.

Começaremos apresentando dois casos particulares muito importantes. Estes casos irão servir não só para percebermos melhor o problema, mas também para preparar o caminho para o estudo de outros exemplos mais gerais.

3. Primeiro caso especial: um sistema simétrico e confocal

Dois espelhos côncavos A e B de distância focal f = +1 são colocados um à frente do outro, separados por uma distância d = 2f = r = +2 (raio de curvatura de cada espelho). Desta forma o centro de curvatura C dum espelho coincide com o vértice V do outro espelho, e o foco F do espelho A coincide com o foco do espelho B (diz-se que o sistema é confocal). O objeto O (real) coloca-se a uma distância o do vértice VA do espelho A. Supõe-se 0 < o < 1 (ver Fig. 1). Começamos por analisar os raios que partem do objeto em direção ao espelho A.


• Primeira reflexão no espelho A. Temos

Esta primeira imagem é virtual (i1 < 0), pelo que se encontra à direita do espelho A. Vejamos o seu tamanho.

A primeira imagem é direita, maior que o objeto.

Esta imagem vai exercer o papel de objeto (real) para o espelho B:

• Primeira reflexão no espelho B. Temos

Esta segunda imagem é real (i2 > 0), pelo que se encontra à direita do espelho B. Mais precisamente, como i2+ o = 2 = d, ela está localizada na mesma posição do objeto. Vejamos o tamanho desta imagem.

A segunda imagem está invertida e tem o mesmo tamanho do objeto.

Esta imagem vai exercer o papel de objeto (real) para o espelho A; como a sua posição e tamanho coincidem com o próprio objeto (a única diferença é que está invertida), todos os cálculos anteriores serão aproveitados a seguir.

• Segunda reflexão no espelho A. Temos

Esta terceira imagem é virtual, está situada no mesmo lugar (e tem o mesmo tamanho) da primeira imagem, mas está invertida. Vai exercer o papel de objeto (real) para o espelho B.

• Segunda reflexão no espelho B. Temos

Esta quarta imagem é real, está situada no mesmo lugar (e tem o mesmo tamanho) do objeto e é direita. Ou seja, coincide precisamente com o objeto.

Como a quarta imagem e o objeto coincidem, as posteriores reflexões nos espelhos A e B não vão produzir novas imagens.

Na Fig. 1 mostra-se o objeto e as suas quatro imagens (I1, I2, I3, I4) através de um diagrama de raios. Desta figura deve ficar claro, usando o princípio de inversão dos raios luminosos, que não vale a pena analisar os raios que partem do objeto na direção do espelho B: eles vão simplesmente gerar as mesmas imagens já descritas, só que numa ordem inversa (, , , ).

Assim, conclui-se que este sistema de dois espelhos dá origem a apenas quatro imagens: duas reais (uma idêntica ao objeto e outra na mesma posição dele, mas invertida) e duas virtuais (uma direita e outra invertida, localizadas por trás do espelho mais próximo do objeto e maiores do que ele).

Os sistemas de espelhos que produzem um número finito de imagens, em vez de um número infinito como seria de esperar, recebem o nome de ressonantes.

O que é verdadeiramente curioso neste sistema de espelhos é que a posição do objeto entre os dois espelhos é totalmente arbitrária. Ou seja, não somos obrigados a colocar o objeto numa posição especial para que a ressonância ocorra.

Entre as aplicações mais importantes desta configuração específica podemos referir as cavidades óticas ressonantes confocais [16-19], normalmente usadas na implementação de lasers para os quais se deseja obter um modo transversal de grande pureza.

4. Segundo caso especial: um sistema simétrico e concêntrico

Dois espelhos côncavos A e B de distância focal f = +1 são colocados um à frente do outro, separados por uma distância d = 4f = 2r = +4 (diâmetro de curvatura de cada espelho). Desta forma o centro de curvatura C do espelho A coincide com o centro de curvatura do espelho B (diz-se que o sistema é concêntrico). O objeto O (real) coloca-se precisamente no centro C (ver Fig. 2).


Analisaremos os raios que partem do objeto em direção ao espelho A; por simetria, não é preciso analisar os raios que partem do objeto em direção ao espelho B.

• Primeira reflexão no espelho A. Temos

Esta primeira imagem é real (i1 > 0) e encontra-se na mesma posição do objeto. Vejamos o seu tamanho.

A primeira imagem é invertida e tem o mesmo tamanho do objeto.

Esta imagem vai exercer o papel de objeto (real) para o espelho B:

• Primeira reflexão no espelho B. Temos

Esta segunda imagem é real (i2 > 0) e encontra-se, novamente, na mesma posição do objeto. Vejamos o tamanho desta imagem.

Vemos então que a segunda imagem coincide totalmente com o objeto. Logo, as posteriores reflexões nos espelhos A e B não vão produzir novas imagens.

Assim, este sistema dá origem a apenas duas imagens reais, uma idêntica ao objeto e outra na mesma posição dele, mas invertida. É também um sistema ressonante. Não é tão curioso como o caso anterior porque a ressonância só ocorre numa posição muito particular do objeto: quando este é colocado no ponto médio entre os dois espelhos.

As cavidades óticas ressonantes concêntricas [16-19] constituem uma das principais aplicações deste sistema (mais uma vez, na implementação de lasers).

Na Fig. 2 mostra-se o objeto e as suas imagens através dum diagrama de raios. As imagens I1 e I2 resultam das reflexões que começam no espelho A; as imagens e resultam das reflexões que começam no espelho B.

5. Um caso mais geral: sistema simétrico

Dois espelhos côncavos A e B de distância focal f = +1 são colocados um à frente do outro, separados por uma distância d. O objeto O (real) coloca-se a uma distância o do vértice do espelho A (ver Fig. 3).


Este sistema constitui uma extensão dos dois sistemas anteriores. Como antes, começamos por analisar os raios que partem do objeto em direção ao espelho A.

• Primeira reflexão no espelho A. Temos

Dependendo do valor de o, esta primeira imagem poderá ser real ou virtual, e maior ou menor do que o objeto. Em qualquer caso, ela vai exercer o papel de objeto para o espelho B

• Primeira reflexão no espelho B. Temos

Impomos agora a condição de que esta imagem se forme na mesma posição do objeto; o que se pretende é evitar que se produzam infinitas imagens:

e após uma álgebra simples obtém-se

Esta equação fica automaticamente satisfeita, para qualquer valor de o, se d = 2; é esse o caso confocal já analisado na seção 3. Suponhamos que d ≠ 2. Então

Esta equação só terá soluções se d > 4. A situação d = 4 corresponde ao caso concêntrico já estudado na seção 4 (se d = 4, obtém-se como única solução o = 2). Suponhamos d > 4; nesse caso, resultam duas soluções distintas para o

Estas duas posições para o objeto estão à mesma distância do ponto médio entre os espelhos (centro do sistema), e satisfazem as seguintes relações, facilmente demonstráveis a partir das Eqs. (20) e (21)

Assim, a posição o- está entre o foco e o centro de curvatura do espelho A, enquanto que o+ está entre o centro de curvatura e o foco do espelho B. No limite d → 4+, estas posições aproximam-se dos centros de curvatura respetivos; no limite d → +∞, elas aproximam-se dos focos respetivos. As relações (22)-(25) permitem-nos considerar estas duas posições como posições complementares.

Estudemos primeiro a posição o = o-. Temos, substituindo a primeira das relações (21) nas Eqs. (13), (14), (16) e (17), e usando as Eqs. (22) a (24),

As expressões (26) e (27) mostram que a primeira imagem ocorre na posição o+. É uma imagem real, situada entre o centro de curvatura e o foco do espelho B. É uma imagem invertida e maior do que o objeto (se d → 4+, o seu tamanho aproxima-se do do objeto, e se d → +∞ torna-se tão grande quanto quisermos).

As expressões (28) e (29) mostram que a segunda imagem ocorre na posição do objeto (por construção; convém observar que d - o+ = o-). É uma imagem real, situada entre o centro de curvatura e o foco do espelho A. É uma imagem direita e maior que o objeto (quando d → 4+ o seu tamanho aproxima-se do tamanho do objeto, e quando d → +∞ torna-se tão grande quanto quisermos).

Assim, colocando o objeto na posição o- (mais perto do espelho A) e após duas reflexões (começando pelo espelho A), resultam duas imagens reais, ambas maiores do que o objeto, uma invertida na posição complementar e a outra direita na mesma posição do objeto. As reflexões posteriores não farão mais do que repetir este mecanismo: inversão e ampliação (o fator de aumento em cada reflexão é igual a - o+/o-). Conclui-se que este sistema permite-nos amplificar consideravelmente o tamanho das imagens de um objeto, sendo o único limite natural fixado pelas dimensões dos espelhos.

Passemos a estudar agora a posição o = o+. Substituindo a segunda das relações (21) novamente nas Eqs. (13), (14), (16) e (17), e após usarmos as Eqs. (22) a (24), obtemos

Logo, a primeira imagem ocorre na posição o-. É uma imagem real e invertida, localizada entre o centro de curvatura e o foco do espelho A. A segunda imagem ocorre na posição do objeto. É uma imagem real e direita, situada entre o centro de curvatura e o foco do espelho B. Ambas as imagens são menores do que o objeto (quando d → 4+ os seus tamanhos aproximam-se do tamanho do objeto, e quando d → +∞ tornam-se tão pequenas quanto quisermos).

Assim, colocando o objeto na posição o+ (mais longe do espelho A) e após duas reflexões (começando pelo espelho A), resultam duas imagens reais, ambas menores do que o objeto, uma invertida na posição complementar e a outra direita na mesma posição do objeto. Todas as reflexões posteriores limitam-se a repetir este mecanismo: inversão e redução (o fator de redução em cada reflexão é igual a - o-/o+). Conclui-se que este sistema permite-nos reduzir consideravelmente o tamanho das imagens de um objeto.

E o que é que podemos dizer dos raios que vão na direção do espelho B? A relação o- + o+ = d permite-nos concluir que a solução o = o- para os raios que viajam do objeto para o espelho B corresponderá à solução o = o+ para os raios que viajam do objeto para o espelho A; e a solução o = o+ para os raios que viajam do objeto para o espelho B corresponderá à solução o = o- para os raios que viajam do objeto para o espelho A. Dito de outra forma: não temos de analisar os raios que vão para o espelho B, porque esses raios vão produzir as mesmas imagens que acabámos de encontrar.

Concluamos então: ao colocar um objeto entre os dois espelhos, numa das posições o- e o+ encontradas (para d > 4), as reflexões que começam no espelho mais próximo do objeto dão origem a uma sucessão de imagens cada vez maiores, enquanto que as reflexões que começam no espelho mais afastado do objeto dão origem a uma sucessão de imagens cada vez menores. Todas estas (infinitas) imagens são reais e estão localizadas na mesma posição do objeto (sendo imagens direitas) ou na posição complementar (sendo imagens invertidas). A Fig. 3 resume todos estes resultados.

6. Outro caso mais geral: sistema assimétrico

Um espelho côncavo A de distância focal fA = +1 e um espelho convexo B de distância focal fB = -1 são colocados um à frente do outro, separados por uma distância d. O objeto O (real) coloca-se a uma distância o do vértice do espelho A (ver Fig. 4). Começamos por estudar os raios que partem do objeto na direção do espelho A.


• Primeira reflexão no espelho A. Temos

Esta primeira imagem vai exercer o papel de objeto para o espelho B:

• Primeira reflexão no espelho B. Temos

Impomos a condição de que esta imagem se forme na mesma posição do objeto

e após um cálculo simples obtém-se

Só há soluções se d > 2. O caso d = 2 não tem interesse físico (se d = 2, obtém-se como única solução o = 2: o objeto teria de ser colocado no vértice do espelho B). Suponhamos d > 2; resultam então duas soluções distintas para o

Apenas uma destas soluções (o-) representa uma posição possível para um objeto real. As seguintes relações são facilmente demonstráveis a partir das Eqs. (40) e (41)

Assim, a posição o- está entre os dois espelhos, e a posição o+ está à esquerda do espelho B. No limite d → 2+, ambas as posições aproximam-se do vértice de B (o- pela direita e o+ pela esquerda); no limite d → +∞, o- aproxima-se do foco do espelho A pela esquerda, e o+ aproxima-se do foco do espelho B pela direita. Ou seja, o- está sempre entre o foco e o centro de curvatura do espelho A, enquanto que o+ está sempre entre o vértice e o foco do espelho B.

Coloquemos, pois, o objeto na posição o = o-. Substituindo a primeira das relações (41) nas Eqs. (34), (35), (37) e (38), e usando as Eqs. (42) a (44), resulta

Destas expressões podem obter-se alguns resultados. A primeira imagem ocorre na posição o+. É uma imagem virtual pois está por trás do espelho B, entre o vértice e o foco desse espelho. É uma imagem invertida e maior do que o objeto (se d → 2+, o seu tamanho aproxima-se do do objeto, e se d → +∞, torna-se tão grande quanto quisermos). A segunda imagem ocorre na posição do objeto (por construção; além disso, é fácil verificar que i2 + o- = d). É uma imagem real, situada entre o foco e o centro de curvatura do espelho A. É uma imagem invertida e maior do que o objeto (se d → 2+, o seu tamanho aproxima-se do do objeto, e se d → +∞, torna-se tão grande quanto quisermos).

A segunda imagem vai exercer o papel de objeto (real) para o espelho A; como a sua posição coincide com o próprio objeto (a única diferença é que está invertida), todos os cálculos anteriores serão aproveitados a seguir.

• Segunda reflexão no espelho A. Temos

Esta terceira imagem é virtual, está no mesmo lugar que a primeira imagem, mas é maior e está direita. Vai exercer o papel de objeto (virtual) para o espelho B.

• Segunda reflexão no espelho B. Temos

Esta quarta imagem é real, está localizada na mesma posição do objeto, e é direita e maior do que ele.

Assim, colocando o objeto na posição o- e após quatro reflexões (começando pelo espelho A) resultam quatro imagens (duas reais e duas virtuais), todas maiores do que o objeto; duas imagens são invertidas, as outras duas são direitas. As reflexões posteriores não farão senão repetir este mecanismo de inversão e ampliação a cada duas reflexões, sendo o fator de aumento em cada duas reflexões sempre igual a -(o+/o-)2. Conclui-se que este sistema permite-nos aumentar consideravelmente o tamanho das imagens de um objeto; o único limite natural é fixado pelas dimensões dos espelhos.

Neste momento deve ser claro, usando o princípio de inversão dos raios luminosos, que não vale a pena analisar os raios que partem do objeto na direção do espelho B: eles simplesmente vão gerar imagens semelhantes às já descritas, só que numa ordem inversa e com redução em vez de ampliação. Na Fig. 4 mostra-se o objeto e algumas das suas imagens sucessivas.

Conclusão final: ao colocar um objeto entre um espelho côncavo (f = +1) e outro convexo (f = -1), na posição o- encontrada (para d > 2), as reflexões que começam no espelho côncavo dão origem a uma sucessão de imagens cada vez maiores, enquanto que as reflexões que começam no espelho convexo dão origem a uma sucessão de imagens cada vez menores. Todas estas (infinitas) imagens estão localizadas na mesma posição do objeto (sendo, portanto, reais) ou noutra posição por trás do espelho convexo (sendo, portanto, virtuais). Metade das imagens são direitas, a outra metade são invertidas.

7. Dificuldades e aplicações concretas

Os dois exemplos anteriores mostram que, com um arranjo de dois espelhos esféricos, poderia construir-se, em princípio, um sistema que ampliasse (reduzisse) o tamanho das imagens de um objeto. A análise efetuada permite concluir que, para conseguirmos uma ampliação ou redução considerável sem aumentar a distância entre os espelhos, devem ocorrer várias reflexões sucessivas.

No entanto, os dois exemplos apresentam dificuldades sérias na sua implementação. Um problema evidente resulta da impossibilidade de projetar num ecrã qualquer uma das imagens virtuais produzidas; outro problema é que, se tentamos projetar uma das imagens reais, o ecrã passará a constituir um obstáculo para os raios luminosos e impedirá que ocorram múltiplas reflexões. Para complicar ainda mais, teríamos de descobrir uma maneira de separar as imagens ampliadas das imagens reduzidas (e também as imagens ampliadas entre si, e as imagens reduzidas entre si). Nenhum destes três problemas é de fácil resolução.

Felizmente, o engenho tem permitido superar, pelo menos parcialmente, estas barreiras. O microscópio de reflexão de Burch (ver Fig. 5) e os telescópios refletores desenhados por Newton, Gregory ou Cassegrain são alguns dos exemplos que o leitor interessado pode agora estudar em detalhe [13, 20, 21]. Estas aplicações apresentam uma vantagem significativa em relação aos microscópios e telescópios de refração: estão livres de aberração cromática, já que as caraterísticas da imagem não dependem do comprimento de onda da luz usada.


8. Conclusões

Foram apresentados alguns exemplos de sistemas com dois espelhos esféricos. Apesar de terem um claro interesse pedagógico, este tipo de exemplos não é comum nos livros de texto de física geral ou de ótica geométrica.

Depois de analisar dois casos particulares (refletores confocais e refletores concêntricos), estudámos dois casos mais gerais, um simétrico e outro assimétrico.

Mencionámos a relação entre os primeiros dois casos e as cavidades óticas de ressonância confocal e concêntrica, respetivamente as suas duas principais aplicações; referimos também as dificuldades inerentes à aplicação dos dois casos mais gerais no desenho de sistemas de ampliação e redução. Finalmente, indicámos que algumas destas dificuldades têm sido ultrapassadas, nomeadamente no microscópio de reflexão de Burch e nos telescópios de reflexão (Newton, Gregory, Cassegrain), cuja análise pode encontrar-se facilmente na literatura.

Recebido em 10/5/2011; Aceito em 29/8/2012; Publicado em 21/11/2012

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Dez 2012
    • Data do Fascículo
      Set 2012

    Histórico

    • Recebido
      10 Maio 2011
    • Aceito
      29 Ago 2012
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