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[Re]visitando a antropologia e a educação de meados do século 20: o Projeto Columbia de Anísio Teixeira a Josildeth Gomes Consorte

[Re]visiting Anthropology and Education in the mid-20th century: Anísio Teixeira’s Columbia Project to Josildeth Gomes Consorte

[Re]visitando la antropología y la educación a mediados del siglo XX: el Proyecto Columbia de Anísio Teixeira a Josildeth Gomes Consorte

Resumo:

O artigo tem o objetivo de compreender por meio da trajetória da antropóloga baiana Josildeth Gomes Consorte as articulações entre a antropologia e a educação nas décadas de 1940 e 1950 no Brasil, sobretudo, a importância do Projeto Columbia como uma experiência fundamental para a posterior criação do Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais (CBPE) por Anísio Teixeira. Analisam-se entrevistas com a autora e artigos em que ela retoma o período da década de 1940-1950 e a temática da educação como objetos de reflexão, além de debates acadêmicos de cunho histórico-documental sobre o Projeto Columbia. Dessa forma, a Bahia e a circulação de intelectuais derivada direta ou indiretamente do projeto promoveram a iniciação na antropologia para muitos pesquisadores e a concretização de pesquisas doutorais, não só com a vinda de estrangeiros, mas com a ida de brasileiro(a)s para os Estados Unidos, sendo a trajetória de Josildeth elucidativa desse movimento.

Palavras-chave:
antropologia; educação; história da educação; Projeto Columbia

Abstract:

This study seeks to understand through the trajectory of Brazilian anthropologist Josildeth Gomes Consorte the links between Anthropology and Education in the 1940s and 1950s in Brazil, especially, the importance of the Columbia Project as a fundamental experience for the later creation of the Brazilian Center of Education Research (CBPE) by Anísio Teixeira. Interviews with the author and articles in which she revisits the period from the 1940s to 1950s and the theme of education as a topic of consideration are analyzed, in addition to historical-documentary academic debates about the Columbia Project. Therefore, the state of Bahia and the circulation of intellectuals derived directly or indirectly from the Columbia Project promoted for many researchers the initiation into anthropology, as well as the materialization of doctoral research degrees, not only due to an influx of foreigners, but with an outflow of Brazilians to the United States, as Josildeth's academic trajectory elucidated.

Keywords:
anthropology; education; education history; Columbia Project

Resumen:

El artículo tiene como objetivo comprender, por medio de la trayectoria de la antropóloga bahiana Josildeth Gomes Consorte, las articulaciones entre antropología y educación en las décadas de 1940 y 1950 en Brasil, especialmente la importancia del Proyecto Columbia como experiencia fundamental para la posterior creación del Centro Brasileño de Investigación Educativa por Anísio Teixeira. Se analizan entrevistas con la autora y artículos en los que revisita el periodo de 1940 a 1950y el tema de la educación como objeto de reflexión, además de los debates académicos históricos y documentales sobre el Proyecto Columbia. Así, Bahía y la circulación de intelectuales derivada directa o indirectamente del proyecto promovieron la iniciación en la antropología de muchos investigadores y la realización de tesis doctorales, no sólo con la llegada de extranjeros, sino con la salida de brasileños a los Estados Unidos, siendo la trayectoria de Josildeth dilucida a este movimiento.

Palabras clave:
antropología; educación; historia de la educación; Proyecto Columbia

Introdução

O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) é um nome que, se vocalizado em público, ainda que as pessoas não saibam exatamente como funciona ou desde quando, tem um reconhecimento maior que o Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais (CBPE). Escrevo em agosto de 2022 e fiz um singelo experimento: digitei em um site usual de busca na web a palavra “Inep”, e todos os resultados da primeira página se referem à autarquia federal vinculada ao Ministério da Educação.

Deixando de lado o importante fato de que o Inep continua em exercício, e isso é fundamental para o algoritmo de busca, considero interessante mencionar os resultados quando digito “CBPE”. Para ficar apenas na primeira página de resultados, temos os seguintes: “Congresso Brasileiro de Planejamento Energético”, “Convenção Batista de Pernambuco”, “Congresso Brasileiro de Pontes e Estruturas”, “Confederação Brasileira de Pesca Esportiva” e “Congresso Brasileiro de Professores de Espanhol”.

Talvez a sigla CBPE evoque mais significados que Inep, mas continua um bom exemplo para o que quero chamar a atenção. Na história das antropologias no Brasil, mais precisamente nos diálogos entre a antropologia e educação, algumas tradições de pesquisas e personagens importantes pouco têm aparecido. A ironia é que, neste momento, apesar de começar escrevendo sobre o CBPE, o Centro não constitui o foco deste trabalho, embora ocupe um lugar especial na minha narrativa. Meu objetivo é refletir sobre uma certa articulação entre intelectuais brasileiros e estadunidenses, o governo da Bahia e os Estados Unidos, a Universidade da Bahia e a Universidade de Columbia nos anos finais da década de 1940. Essa articulação se mostrou fundamental para um tipo de pesquisa aplicada denominada “estudos de comunidade” e como essa metodologia se relacionou com a educação e, posteriormente, culminou na criação do CBPE.

Nessa linha, com base no trabalho de Neusa Gusmão (1997GUSMÃO, N. M. M. Antropologia e educação: origens de um diálogo. Cadernos Cedes , Campinas, SP, v. 18, n. 43, p. 8-25, dez. 1997.), Oliveira (2015OLIVEIRA, A. Sobre o lugar da educação na antropologia brasileira. Revista Temas em Educação, João Pessoa, v. 24, n. 1, p. 40-50, jan./jun. 2015.) observa que, nesses estudos de comunidade, os antropólogos e as antropólogas “esbarraram” com a escola. Eu me interesso por essa articulação chamada de Programa de Pesquisa em Ciências Sociais do Estado da Bahia - Columbia University (Projeto Columbia) de 1949 e por Josildeth Gomes Consorte, uma jovem pesquisadora das trilhas etnográficas. Em qual medida esse encontro nos ajuda a refletir sobre a antropologia e a educação no Brasil?

Pensando sobre trajetórias de intelectuais, inspiro-me em Velho (1994VELHO, G. Projeto e metamorfose: antropologia das sociedades complexas. Rio de Janeiro: Zahar, 1994.) e Abu-Lughod (2020)ABU-LUGHOD, L. A escrita dos mundos de mulheres: história beduínas. Tradução de Maria Claudia Coelho. Rio de Janeiro: Papéis Selvagens, 2020., para quem as histórias de vida não são narrativas lineares, mas relacionais. Nesse sentido, um projeto coletivo como o Projeto Columbia nunca é homogêneo, e as trajetórias individuais são sempre marcadas por ambiguidades, frustrações, desejos situados social e historicamente. Levo em consideração a advertência de David Graeber de que tradições de pesquisa são derivadas de um meio intelectual, “que emergiu de conversas infindáveis e argumentos envolvendo centenas de pessoas” (Graeber, 2011GRAEBER, D. Fragmentos de uma antropologia anarquista. Porto Alegre: Deriva, 2011., p. 11), e não algo que derivou da genialidade de um indivíduo.

O objetivo deste trabalho é compreender o Projeto Columbia por meio da participação de Josildeth e analisar a trajetória dela mediante esse projeto. O indivíduo e o coletivo não se relacionam de forma contínua e uniforme, tanto um quanto o outro evocam muitos sentidos que não se encerram ou se esgotam em cada limite, biográfico ou institucional. Dessa forma, procedo com uma análise de entrevistas já publicadas com a autora e artigos escritos pela própria antropóloga baiana, em que ela retoma o período da década de 1940-1950 e a temática da educação como objetos de reflexão, além de debates acadêmicos de cunho histórico-documental sobre o Projeto Columbia.

Subsequente à introdução, o artigo está dividido em três seções e algumas considerações finais. Os subtítulos podem enganar porque sugerem que discuto a trajetória de Josildeth, depois o Projeto Columbia e, por fim, sua ida à Universidade de Columbia de forma separada. De fato, essas são abordagens centrais de cada seção, mas em vários momentos eu borro essas fronteiras. Por exemplo, determinados aspectos da trajetória da antropóloga serão mais bem compreendidos na discussão geral do Projeto Columbia, assim como alguns antecedentes desse projeto se relacionam, de alguma forma, com o início do percurso formativo de Josildeth. Há uma separação didática em três seções, mas os conteúdos se tocam na mesma medida que as temporalidades circulam.

Dessa forma, ouvindo os sussurros em notas de rodapé, lendo as indicações levantadas sobre as relações entre professoras primárias e as pesquisas educacionais (Oliveira; Brúrigo; Boin, 2016OLIVEIRA, A.; BÚRIGO, B. D.; BOIN, F. A antropologia, os antropólogos e a educação no Brasil. Revista Anthropológicas, Recife, v. 27, n, 1, p. 21-44, 2016.) e as camadas de silêncio que envolvem a educação como tema de pesquisa na antropologia, conheci Josildeth Gomes Consorte.

A trajetória para a antropologia

O meu intuito não é dar voz à antropóloga. Ela não precisa, inclusive. Busco, por outro lado, aprender com sua trajetória e abordagens de pesquisa, esboçando provocações para entendermos a marginalidade da educação na antropologia. O silêncio começa a ser rompido pela própria autora, aproveitando a recuperação do debate nos anos de 1990, que revisitou as relações entre os estudos de comunidade e a educação, bem como a própria figura de Anísio Teixeira como um ente importante nessa etapa histórica da educação no Brasil.

Encontrei poucos trabalhos de antropólogos ou antropólogas que destacassem o pioneirismo de Josildeth na pesquisa antropológica em educação. Rocha e Tosta (2009ROCHA, G.; TOSTA, S. P. Antropologia & educação. Belo Horizonte: Autêntica, 2009. (Coleção Temas & Educação).) fazem referência a um artigo de Josildeth sobre o culturalismo no Brasil, e Gusmão (2008GUSMÃO, N. M. M. Antropologia, estudos culturais e educação: desafios da modernidade. Pro-Posições, Campinas, SP, v. 19, n. 3, p. 47-82, set./dez. 2008.) discute a antropologia em interface com os estudos culturais e a educação, que abre um diálogo com a antropóloga baiana na retomada das discussões dos estudos de comunidade. Josildeth foi professora de Neusa na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), no início da década de 1970.

No campo da educação, Ferreira (2013FERREIRA, M. S. Josildeth Consorte e a antropologia na escola excludente. Revista HISTEDBR On-line , Campinas, SP, v. 13, n. 53, p. 380-390, out. 2013.) aponta que a atuação de Josildeth, no CBPE, significou uma forma ainda inédita, até então, de pensar a escola e a educação a partir da antropologia. Entre antropólogos e antropólogas, apenas sussurros, quase silêncios.

Entre 1956 e 1959, Josildeth Consorte teve uma sequência de importantes artigos, que foram publicados na Revista Educação e Ciências Sociais do CBPE, os quais refletem sobre como os estudos de comunidade pensaram a educação, a escolha do magistério público como profissão, a criança favelada e a escola pública.

Josildeth da Silva Gomes nasceu no dia 21 do mês de junho de 1930, na cidade de Salvador, pobre e de cor, como se dizia na época e como diz a própria autora. Fez o magistério, atuando como professora primária e, em 1949, por volta dos 19 anos, ingressou no curso de História e Geografia na Universidade da Bahia. O encontro com a antropologia ocorreu por meio da disciplina Introdução à Antropologia, ministrada por Thales de Azevedo. A escolha das Humanidades (geografia e história), diz a antropóloga, é uma escolha de pobres (não de vocação) que precisam de um mercado para trabalhar depois da graduação (Consorte, 2009CONSORTE, J. G. Os 60 anos do Programa de Pesquisas Sociais do Estado da Bahia e Universidade de Columbia. [Entrevista concedida a] Érika Figueiredo, Isabela Oliveira e Janaína Damasceno. Cadernos de Campo, São Paulo, v. 18, n. 18, p. 201-217, 2009.).

Essa questão da escolha demonstra uma forma mais oculta de desigualdade. O contexto baiano dos anos 1940 tem muita relação com o contexto francês, estudado por Pierre Bourdieu e Jean-Claude Passeron nos anos 1960. A distribuição desigual das chances escolares entre moças e rapazes cresce na medida em que estão em classes mais baixas. Porém, independentemente da origem social, em função dos modelos tradicionais da divisão do trabalho e dos “dons” entre os sexos, argumentam os autores franceses, as moças têm maior probabilidade de estudar nas faculdades de letras e ciências que preparam para a atividade docente, percurso seguido pela Josildeth como evidenciado. Assim, “a restrição das escolhas impõe-se mais às classes baixas que às classes privilegiadas e mais às estudantes que aos estudantes, a desvantagem sendo ainda mais acentuada para as moças de origem mais baixa” (Bourdieu; Passeron, 2014BOURDIEU, P.; PASSERON, J.-C. Os herdeiros: os estudantes e a cultura. Tradução de Ione Ribeiro Valle e Nilton Valle. Florianópolis: EdUFSC, 2014., p. 22). A depender da origem social, a faculdade de letras e suas disciplinas (sociologia, psicologias, línguas) podem ser uma escolha forçada ou um refúgio. A origem social (condições de vida e trabalho) é o fator de diferenciação de maior influência no meio estudantil em detrimento de outros (idade, sexo, religião). Contudo, certamente a questão racial, que não aparece no clássico estudo Os herdeiros, é algo que se soma à classe social e ao gênero para compreender a restrição e a intensificação das desigualdades sociais refletidas nas escolhas universitárias do contexto baiano.

As aulas de antropologia de Thales de Azevedo eram influenciadas pela antropologia física, principalmente os pressupostos antropométricos e a antropologia cultural de Franz Boas. Ainda durante o primeiro ano de graduação, Josildeth foi convidada por Thales de Azevedo para participar do Projeto Columbia. Antes, ela “já havia participado de uma experiência de campo em Salvador, auxiliando Dr. Thales, mas, em situação bem diversa - a pesquisa do Estaleiro, uma área invadida por famílias de baixa renda no bairro da Madragoa, em Itagipe” (Consorte, 2007CONSORTE, J. G. Recordações de um aprendizado antropológico. In: SANSONE, L.; PEREIRA, C. (Org.). Projeto Unesco no Brasil: textos críticos. Salvador: EdUFBA, 2007. p. 81-93., p. 85). Agora, no entanto, a pesquisa tinha outra dimensão.

Em 1947, Anísio Teixeira assumiu a Secretaria de Educação e Saúde do Estado da Bahia, na gestão de Otávio Mangabeira. No ano seguinte, encomendou um anteprojeto a Charles Wagley (Universidade de Columbia) feito em parceria com Eduardo Galvão (primeiro antropólogo brasileiro a obter o doutorado na Universidade de Columbia) sobre uma pesquisa com o objetivo de aprofundar o conhecimento da realidade interiorana da Bahia, no intuito de desenvolver um planejamento educacional e estratégias de saúde pública para a população do estado. O pedido de Anísio coincide com o momento em que os antropólogos de Columbia pretendiam aplicar o método community study em sociedades ditas complexas ao longo da América Latina. Entretanto, essas relações profissionais (e, por que não?, epistemológicas) foram construídas nas décadas anteriores.

A entrada do culturalismo no Brasil remonta à década de 1930, no processo de expansão da antropologia cultural, por meio da segunda geração de orientandos e orientandas diretos de Franz Boas. No Brasil, a reflexão culturalista aparece, nesse primeiro momento, para pensar sobre os imigrantes europeus e asiáticos no Sul e Sudeste do Brasil e os descendentes de africanos, com implicações da temática educativa, conforme nos diz Josildeth Consorte:

Quais são as preocupações que uns e outros suscitam junto àqueles que têm que organizar o sistema educacional? [...] De um lado, o abrasileiramento dos descendentes de imigrantes, de sorte que não viessem a constituir quistos culturais capazes de ameaçar a unidade nacional; do outro, a erradicação das tradições culturais de origem africana, uma ameaça permanente ao projeto de construção de um país branco, ocidental e cristão (Consorte, 1997CONSORTE, J. G. Culturalismo e educação nos anos 50: o desafio da diversidade. Cadernos Cedes, Campinas, SP, v. 18, n. 43, p. 26-37, dez. 1997., p. 27).

De 1931 a 1935, Arthur Ramos foi chefe da seção de Ortofrenia e Higiene Mental (Divisão de Pesquisas Educacionais) a convite de Anísio, quando era secretário de Educação e Cultura do Distrito Federal. Arthur Ramos imaginava o atraso do Brasil, sobretudo na educação, em função do que considerava ser o pensamento mágico e pré-lógico das populações negras.

Gusmão (1997GUSMÃO, N. M. M. Antropologia e educação: origens de um diálogo. Cadernos Cedes , Campinas, SP, v. 18, n. 43, p. 8-25, dez. 1997.), ao tratar das origens dos diálogos entre a antropologia e a educação, iniciados no século 19, menciona o interesse antropológico pela infância e a adolescência, bem como a relação com as psicologias e a psicanálise. No Brasil, talvez Arthur Ramos seja o autor que aglutina esses interesses e áreas, como se evidencia nas pesquisas que realizou nas escolas do Distrito Federal, publicando, em 1939, o artigo “A criança problema: a higiene mental na escola primária”. Quatro anos antes, em obra mais conhecida intitulada O negro brasileiro, também discute processos educativos e, de forma mais direta, ainda em 1934, publica um artigo intitulado “Educação e psicanálise” (Consorte, 2018CONSORTE, J. G. Democracia e educação: os pilares da construção do nosso futuro em Anísio Teixeira. In: BATISTA, E. L.; ORSO, P. J.; COSTA, B. B. (Org.). Os intelectuais e a defesa da educação brasileira. Uberlândia: Navegando Publicações, 2018. p. 27-46.; Oliveira, 2019OLIVEIRA, A. Arthur Ramos e a rotinização da antropologia através de seu ensino. Civitas: Revista de Ciências Sociais, Porto Alegre, v. 19, n. 3, p. 659-674, set./dez. 2019.).

Consorte (2018CONSORTE, J. G. Democracia e educação: os pilares da construção do nosso futuro em Anísio Teixeira. In: BATISTA, E. L.; ORSO, P. J.; COSTA, B. B. (Org.). Os intelectuais e a defesa da educação brasileira. Uberlândia: Navegando Publicações, 2018. p. 27-46.) aponta que, para Anísio Teixeira, os impasses e os atrasos do Brasil diante do cenário mundial não eram por fatores raciais como evidenciavam (com pressupostos racistas) Gilberto Freyre e Arthur Ramos, mas uma questão de falta de acesso à educação. Dessa forma, o “culturalismo à brasileira” não se preocupava com uma valorização e relativização das diferenças (questão fundamental de Boas), mas em como unificar esses diferentes matizes (europeus, africanos e indígenas) por meio da educação em um projeto de nacionalização do ensino.

Em 1935, Anísio solicita exoneração do cargo de diretor na Secretaria de Educação e Cultura do Distrito Federal, como forma de diminuir os ataques ao governo do prefeito do Rio de Janeiro Pedro Ernesto Batista. O educador baiano era acusado de subversivo pelos conservadores da época, católicos e integralistas, sofrendo processos de incriminação e tentativas de prisão articuladas pela alta cúpula católica no Brasil e na França (Viana Filho, 1990VIANA FILHO, L. Anísio Teixeira: a polêmica da educação. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1990.). Após a ditadura civil de Vargas, a Constituição de 1946 desencadeia maior autonomia para as secretarias de educação dos respectivos estados da federação. É a partir desse contexto que Anísio volta para a vida pública após um hiato de mais de dez anos e, como gestor público na Bahia em 1947, promove: 1) a abertura de concurso público para professor primário (primeira relação profissional com a Educação de Josildeth, que atuava como professora primária na cidade de Salvador, Bahia); 2) um novo programa de ensino no estado chamado “Programa Experimental”; 3) a inauguração do Centro Educacional Carneiro Ribeiro, a “Escola Parque”; 4) o Programa de Pesquisa em Ciências Sociais do Estado da Bahia - Columbia University; 5) em função do andamento do Projeto Columbia, o apoio ao Projeto Unesco e 6) a criação da Fundação para o Desenvolvimento da Ciência (Consorte, 2018CONSORTE, J. G. Democracia e educação: os pilares da construção do nosso futuro em Anísio Teixeira. In: BATISTA, E. L.; ORSO, P. J.; COSTA, B. B. (Org.). Os intelectuais e a defesa da educação brasileira. Uberlândia: Navegando Publicações, 2018. p. 27-46.).

Assim, voltamos para o Programa de Pesquisa em Ciências Sociais do Estado da Bahia - Columbia University. “Que significado tem o silêncio sobre o Projeto Columbia e sua invisibilidade tanto para as ciências sociais como para a educação?” (Consorte, 2014CONSORTE, J. G. O “Projeto Columbia”: um resgate necessário. Revista HISTEDBR On-line , Campinas, SP, v. 14, n. 56, p. 17-25, maio 2014., p. 23). Em 2009, Josildeth Consorte coordenou uma pesquisa sobre desenvolvimento nacional e educação. A pesquisa revisitou os estudos realizados pelo Projeto Columbia, envolvendo quatro universidades: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb), Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e Universidade do Estado da Bahia (Uneb). Derivados dessa pesquisa, encontrei duas reflexões da autora: “O ‘Projeto Columbia’: um resgate necessário”, de 2014, e “Democracia e educação: os pilares da construção do nosso futuro em Anísio Teixeira”, de 2018.

O argumento central da autora é que o Projeto Columbia é negligenciado diante de sua importância para diferentes vertentes de pesquisas sociais, apesar de abordar temáticas importantes, como: educação, relações raciais no Brasil, estudos de comunidade, políticas públicas e o desenvolvimento nacional (Consorte, 2014CONSORTE, J. G. O “Projeto Columbia”: um resgate necessário. Revista HISTEDBR On-line , Campinas, SP, v. 14, n. 56, p. 17-25, maio 2014.). Como veremos, o Projeto Columbia será fundamental como uma espécie de laboratório e estreitamento de laços na construção posterior do CBPE.

Além disso, o próprio Anísio Teixeira aparece como uma figura central nas reflexões da antropóloga baiana, principalmente nas relações do educador com as Ciências Sociais. Consorte (2009CONSORTE, J. G. Os 60 anos do Programa de Pesquisas Sociais do Estado da Bahia e Universidade de Columbia. [Entrevista concedida a] Érika Figueiredo, Isabela Oliveira e Janaína Damasceno. Cadernos de Campo, São Paulo, v. 18, n. 18, p. 201-217, 2009.) destaca três momentos principais dessa aproximação: 1) quando Anísio era diretor-geral da Instrução, no Rio de Janeiro, e convida Arthur Ramos, nos anos 1930, para dirigir o Serviço de Higiene e Ortofrenia; 2) na formulação do Projeto Columbia; e 3) na criação do Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais (CBPE).

Eu gostaria de ter tido mais maturidade na ocasião para ser capaz de perceber tudo isso, mas com o tempo você vai acordando para todas essas conexões e fica se perguntando: afinal que relação tem tudo isso com o desenvolvimento das ciências sociais? Mas não só com o desenvolvimento das ciências sociais, mas com a relação da educação com as ciências sociais ou das ciências sociais com a educação. Uma relação que até hoje é muito pouco explorada, pouco trabalhada (Consorte, 2009CONSORTE, J. G. Os 60 anos do Programa de Pesquisas Sociais do Estado da Bahia e Universidade de Columbia. [Entrevista concedida a] Érika Figueiredo, Isabela Oliveira e Janaína Damasceno. Cadernos de Campo, São Paulo, v. 18, n. 18, p. 201-217, 2009., p. 207).

Dessa forma, o Projeto Columbia foi construído numa relação entre Secretaria do Estado da Bahia, a Universidade de Colúmbia e a Universidade da Bahia. Além de Charles Wagley, também coordenaram o projeto: Thales de Azevedo (Universidade da Bahia) e Luiz Aguiar da Costa Pinto (Universidade do Brasil). Charles Wagley navegou pelo Atlântico e atracou na Bahia com três orientandos: Marvin Harris, Harry Hutchinson e Benjamin Zimmerman.

O Projeto Columbia

Em 2014, a Revista HISTEDBR on-line, do Grupo de Estudos e Pesquisas em “História, Sociedade e Educação no Brasil” (HISTEDBR), vinculada à Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas, publicou um número especial denominado “Dossiê Projeto Colúmbia”, organizado pelo Grupo de Trabalho História, Sociedade e Educação, Secção Bahia (HISTEDBA), com diversos trabalhos que discutiram o convênio entre a Secretaria de Educação e Saúde do Estado da Bahia e o Departamento de Antropologia da Universidade de Columbia, realizado no final da década de 1940. Além do trabalho de Josildeth Consorte presente nesse dossiê, outras pesquisas são interessantes para avaliarmos a importância desse momento para a antropologia no Brasil.

A pesquisa de caráter histórico documental empreendida pelo grupo HISTERDBR envolveu uma ampla equipe de pesquisadores: da iniciação científica a doutores, articulando diversas universidades, como a Uesb, a Uneb, a Unicamp e a PUC-SP. Além de vários recortes temáticos que relacionavam o Projeto Columbia com discussões sobre a educação, a democracia racial, a ideologia desenvolvimentista, o panorama intelectual e político do período, as trajetórias de pesquisadores envolvidos no projeto, foi também reunido um amplo acervo do material etnográfico, derivado dos estudos de comunidade realizados no Projeto Columbia, atualmente disponível para consulta no Museu Pedagógico da Uesb ( Magalhães; Lombardi; Casimiro, 2014MAGALHÃES, L. D. R.; LOMBARDI, J. C.; CASIMIRO, A. P. B. S. Projeto de pesquisa “Revisitando o Projeto Colúmbia”. Revista HISTEDBR On-line , Campinas, SP, v. 14, n. 56, p. 6-16, maio 2014. ). Esse acervo carece ainda de uma análise e leitura antropológicas, visto que as investigações sobre esse período possuem um caráter historiográfico, sendo necessário também retomar esses trabalhos enquanto etnografias 1 1 Até o momento, o material etnográfico resgatado pelos pesquisadores e pesquisadoras do Projeto Columbia consiste nos seguintes estudos: Race and Class in rural Brazil (Paris: Unesco, 1952), organizado por Charles Wagley com artigos de Marvin Harris, W. H. Hutchinson e Bem Zimmerman; Les élites de couleur dans une ville brésilienne (Paris: Unesco, 1953, reeditado em português pela Editora Nacional, Rio de Janeiro, 1955, Série Brasiliana), de Thales de Azevedo, além de outros; também o próprio prefácio de Thales de Azevedo sobre A revolução brasileira: uma análise da mudança social desde 1939 (Salvador: Livraria Progresso e Fundação para o Desenvolvimento da Ciência da Bahia, s/d), no livro de Charles Wagley; assim como também, entre outras, as obras: Town and Country in Brazil, de Marvin Harris; Village and Plantation Life in Northeastern Brazil, de Harry W. Hutchinson; uma pesquisa sobre a vida social no estado da Bahia, de Wagley, Azevedo e Costa Pinto; e os artigos sobre métodos de campo no estudo da comunidade de Wagley e Azevedo; Povoamento das Lavras Diamantinas, de Josildeth Consorte; Notas preliminares ao estudo da família no Brasil, de Carmelita Junqueira Ayres Hutchinson; Estrutura de uma comunidade do Nordeste açucareiro e Comunidades e fazendas, de H. W. Hutchinson; inéditos estão, ainda, Princesa do sertão: uma história de Feira de Santana, de Rollie E. Popino; Economic cycles in Brazil: the persistence of a total culture-pattern, de Anthony Leeds, e Um candomblé de caboclo da ilha de Itaparica, de Carlos Costaldi (Thales (s/d) In: Wagley, Prefácio), que se tornaram referenciais obrigatórios para o estudo realizado” (Magalhães; Lombardi; Casimiro, 2014, p. 9). .

Continuando no dossiê, Lombardi (2014LOMBARDI, J. C. Educação e nacional-desenvolvimentismo (1946-1964). Revista HISTEDBR On-line , Campinas, SP, v. 14, n. 56, p. 26-45, maio 2014.) faz uma reflexão sobre o momento histórico do final da década de 1940, em que a questão educacional é cada vez mais atrelada a um ponto de interesse nacional e científico. Com a Constituição Brasileira de 1946, duas discussões são fundamentais: a educação como direito do cidadão/cidadã e a estatização do ensino no País. Anísio Teixeira faz parte de um grupo de intelectuais que se identifica com as premissas de uma ideologia nacional desenvolvimentista, e são essas ideias que movimentam o Projeto Columbia. Nos bastidores, é claro, outros elementos são importantes. A política externa dos Estados Unidos da América (EUA), por meio do Plano Marshall, da Lei McCarran-Nixon e da School of the Americas no Panamá, constitui a expansão imperialista do Tio Sam na Europa e América Latina, marcada por intensas atividades contra organizações ou simpatizantes do comunismo, além de atentados e golpes em governos que foram democraticamente eleitos (Lombardi, 2014)LOMBARDI, J. C. Educação e nacional-desenvolvimentismo (1946-1964). Revista HISTEDBR On-line , Campinas, SP, v. 14, n. 56, p. 26-45, maio 2014.. A complexidade desse momento é intrigante. Anísio Teixeira insere-se em premissas liberais pragmatistas para refletir sobre uma educação como projeto de reconstrução nacional. Nesse contexto de meados do século 20, o educador baiano é próximo diplomaticamente dos Estados Unidos, embora, ao que parece, não reflita criticamente sobre o imperialismo. Contudo, enquanto defensor da escola pública, era estigmatizado como comunista pelos defensores da escola privada (conservadores e católicos) no Brasil.

Nesse sentido, Magalhães (2014MAGALHÃES, L. D. R. O Projeto Columbia na Bahia: confluências convergentes e complementares ao seu contexto nacional/internacional. Revista HISTEDBR On-line , Campinas, SP, v. 14, n. 56, p. 66-74, maio 2014.) demonstra que a cooperação entre o governo da Bahia e o departamento de Antropologia da Universidade de Columbia está diretamente relacionada com as intervenções políticas e culturais dos Estados Unidos na América Latina. É fundamental atentar que o contexto do final da década de 1940 corresponde aos desdobramentos iniciais, após a Segunda Guerra Mundial. Isso quer dizer um processo cada vez mais intenso de relações e interferências políticas, sociais e culturais dos Estados Unidos no Brasil. A afinidade política e intelectual de Anísio Teixeira com a intelectualidade estadunidense remonta ao final da década de 1920, tendo ele estudado, inclusive, na Universidade de Columbia, quando foi inspetor-geral do Ensino da Bahia, onde obteve o título de master of arts, em 1929. Trinta e quatro anos depois, recebeu a Medalha por Serviços Relevantes, a mais alta condecoração do Teachers College, onde havia estudado. Assim, nossas relações antropológicas e educacionais possuem uma longa história com a Universidade de Columbia (Bernardes, 2020BERNARDES, M. Notas para uma antropologia da educação a partir de Anísio Teixeira. In: REUNIÃO BRASILEIRA DE ANTROPOLOGIA, 32., 2020, Rio de Janeiro. Anais Eletrônicos… Rio de Janeiro: ABA, 2020. Disponível em: <Disponível em: https://www.32rba.abant.org.br/arquivo/downloadpublic?q=YToyOntzOjY6InBhcmFtcyI7czozNToiYToxOntzOjEwOiJJRF9BUlFVSVZPIjtzOjQ6IjMxNDYiO30iO3M6MToiaCI7czozMjoiNGYzMWNiZDBhZjgxY2Q4MDQzOWU3ZTkzMTYwOTI2YTAiO30%3D >. Acesso em: 21 jun. 2023.
https://www.32rba.abant.org.br/arquivo/d...
).

Anísio Teixeira participou da criação da Unesco e foi nomeado conselheiro de Ensino Superior em 1946. Isso demonstra o quanto o educador baiano estava articulado com as principais agências internacionais responsáveis pelas políticas educacionais à periferia do capitalismo. Sobre os usos políticos da antropologia, a Unesco e a Universidade de Columbia, José Almeida escreve:

De histórica tradição nas Ciências Sociais, com destaque para a etnografia, a historiografia e a antropologia (no que coincide com os eixos temáticos da Unesco), a Columbia University sempre gozou de inegável influência na esfera política dos EUA, fato comprovado pela presença de um de seus reitores (1948-1953) na Presidência da República (1953-1961): Dwight D. Einsenhower, apesar da falta de qualificação acadêmica por este apresentada (Almeida, 2014ALMEIDA, J. R. M. Columbia University: projeto de uma modernidade conservadora. Revista HISTEDBR On-line, Campinas, SP, v. 14, n. 56, p. 46-65, maio 2014., p. 59).

Aprofundando esse debate, Almeida (2014ALMEIDA, J. R. M. Columbia University: projeto de uma modernidade conservadora. Revista HISTEDBR On-line, Campinas, SP, v. 14, n. 56, p. 46-65, maio 2014.) entende que o Projeto Columbia estava sob o domínio do grande capital estadunidense. Expondo alguns desdobramentos que o Projeto Columbia teve, Almeida (2014)ALMEIDA, J. R. M. Columbia University: projeto de uma modernidade conservadora. Revista HISTEDBR On-line, Campinas, SP, v. 14, n. 56, p. 46-65, maio 2014. destaca a intensificação da exploração de petróleo e gás na cidade de São Francisco do Conde, no Recôncavo da Bahia, ao longo da década de 1950. A descoberta do cobiçado “ouro negro” em terras baianas, na cidade de Candeias, data de dezembro de 1941. Portanto, extremamente atual para o contexto que estamos discutindo.

Para o governo de Otávio Mangabeira, o Projeto Columbia significava uma estratégia para entender o “enigma baiano”, que indicava o atraso do estado em termos industriais. De certa forma, segundo Santos (2014SANTOS, J. D. F. Ecos da cultura política brasileira: o programa de ciências sociais no estado da Bahia - Columbia University - como vetor para uma modernização conservadora baiana. Revista HISTEDBR On-line , Campinas, SP, v. 14, n. 56, p. 95-107, maio 2014. ), esse momento pode ser considerado a gênese do processo de modernização na Bahia, ainda que seja uma “modernização conservadora”, que articulava o industrialismo ao autoritarismo político.

Além do petróleo e gás natural cujo processo estava em curso e se intensificando (durante três décadas, o recôncavo baiano seria o único produtor nacional de petróleo), foram feitas sinalizações para a introdução de tecnologia movida a motor, em substituição às oficinas domiciliares em Rio de Contas, na Chapada Diamantina (Almeida, 2014ALMEIDA, J. R. M. Columbia University: projeto de uma modernidade conservadora. Revista HISTEDBR On-line, Campinas, SP, v. 14, n. 56, p. 46-65, maio 2014.; Santos, 2014SANTOS, J. D. F. Ecos da cultura política brasileira: o programa de ciências sociais no estado da Bahia - Columbia University - como vetor para uma modernização conservadora baiana. Revista HISTEDBR On-line , Campinas, SP, v. 14, n. 56, p. 95-107, maio 2014. ). As pautas sobre saúde e educação, assim como o conhecimento estratégico de diversas áreas no Brasil, contribuíram para a administração de uma política intervencionista dos EUA na América Latina, informada pelos chamados “antropólogos do governo”.

No mesmo período do Projeto Columbia, outro antropólogo da Universidade de Columbia, Julian Steward, em colaboração com Puerto Ricanos, estava planejando um projeto semelhante em Puerto Rico, segundo Isabel Wagley Kottak, filha de Charles Wagley. Outro antropólogo, com formação em Columbia, Oscar Lewis, desenvolvia um projeto para estudar o impacto do processo revolucionário nos contextos rurais em Cuba. Contudo, no final dos anos de 1960, um ano depois de iniciada a pesquisa, o projeto foi cancelado pelo governo com a justificativa de que as informações poderiam ser utilizadas pelas agências de inteligência dos Estados Unidos (Cordovés Santiesteban, 2017CORDOVÉS SANTIESTEBAN, A. A. Caminantes y caminos que se hacen al andar: trajetórias de professoras/es de ensino médio em Cuba. 2017. 376 f. Tese (Doutorado em Antropologia Social) - Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2017.). Como estamos vendo, realmente não se trata de teoria da conspiração: os “antropólogos de governo”, de forma intencional ou não, acabaram gerando várias informações estratégicas que permitiram e facilitaram a influência cultural e econômica dos Estados Unidos na América Latina.

A leitura de Almeida (2014ALMEIDA, J. R. M. Columbia University: projeto de uma modernidade conservadora. Revista HISTEDBR On-line, Campinas, SP, v. 14, n. 56, p. 46-65, maio 2014.), contudo, sugere quase uma completa passividade dos sujeitos diante das instituições (governo, o grande capital, leis, projetos). Embora não discorde que o imperialismo dos Estados Unidos se molde em diferentes instâncias, inclusive por meio da Unesco, isso não quer dizer que Anísio Teixeira era um facilitador passivo do domínio ianque. Menezes (2014MENEZES, J. M. F. Projeto Columbia, Projeto Unesco: pesquisa social aplicada, educação e mudança cultural no Brasil. Revista HISTEDBR On-line , Campinas, SP, v. 14, n. 56, p. 75-94, maio 2014.), por exemplo, mediante análises de cartas entre o educador baiano e o governador Otávio Mangabeira, mostra que Anísio não recebeu o convite de Julian Huxley, representante da Unesco, de forma apaixonada. Decidiu inclusive, no final da década de 1940, atuar politicamente na Bahia em detrimento da Unesco.

Agora, como secretário de Educação e Saúde da Bahia, Anísio Teixeira enxerga uma oportunidade de elaborar um diagnóstico social de diferentes comunidades, sobretudo rurais, no intuito de fortalecer e subsidiar projetos de desenvolvimento regional, tomando por base a noção de que o atraso brasileiro era fruto de um passado colonial que deveria ser superado com um modelo de gestão inspirado nos países capitalistas ditos desenvolvidos. As fontes dos recursos do Projeto Columbia foram “provenientes das organizações norte-americanas (Social Science Research Council, Viking Fund, Werner Green Foundation, Dougherty Fund) e os liberados pelo governo do Estado, por meio da Secretaria Estadual de Educação e Saúde” (Santos, 2014SANTOS, J. D. F. Ecos da cultura política brasileira: o programa de ciências sociais no estado da Bahia - Columbia University - como vetor para uma modernização conservadora baiana. Revista HISTEDBR On-line , Campinas, SP, v. 14, n. 56, p. 95-107, maio 2014. , p. 102). Paralela às pesquisas, a gestão de Anísio se destacou pela criação de escolas rurais e centros de educação popular.

Esses estudos estavam preocupados com o fator da mudança social e cultural, a partir das noções de tradicional/moderno ou tradição/progresso. Durante o ano acadêmico de 1949-1950, antes do início da pesquisa de campo, Thales de Azevedo e seus estudantes iniciaram uma pesquisa de levantamento de dados geográficos, históricos e sociológicos no estado da Bahia, enquanto na Universidade de Columbia eram realizados seminários. Foi mediante esse levantamento que a Bahia foi dividida em seis regiões ecológicas: Recôncavo, Sertão, Florestas do Sul, Planalto Central, Planalto Ocidental e Vale do São Francisco. O conceito de “regiões ecológicas” foi desenvolvido por Donald Pierson, nesse momento professor da Escola de Sociologia e Política de São Paulo e bolsista do Instituto Smithsonian, responsável pelo estudo da região Vale do São Francisco. Ao Projeto Columbia, coube o estudo das seguintes áreas com seus respectivos pesquisadores responsáveis: o Recôncavo (Harry William [“Bill”] Hutchinson), a Chapada Diamantina (Marvin Harris) e o Sertão Semiárido (Ben Zimmerman), comparando duas localidades vizinhas que representassem o arcaico e o moderno, segundo os parâmetros dos estudos de comunidade. Anthony Leeds, orientado por Julian Steward, fez também pesquisas sobre a zona do cacau na Bahia.

Os dois projetos (Projeto Columbia e o Projeto do Vale São Francisco), em curso na Bahia, fortaleceram o Projeto Unesco - que envolveu pesquisas sobre as relações raciais - e começou a ser implementado no Brasil no início da década de 1950. O Projeto Unesco, dessa forma, utiliza os pesquisadores e as pesquisadoras que já estavam em campo nessas pesquisas na Bahia e adicionam essa feição racial àqueles estudos de comunidade. Contudo, outro pioneirismo deve ser destacado. Antes do Projeto Unesco, já estava em curso a pesquisa de Thales de Azevedo sobre as elites de cor na Bahia, com a participação da Josildeth.

Voltando ao Projeto Columbia, o objetivo era determinar a dinâmica das mudanças em cada região ecológica, percebendo as diferenças e semelhanças nos locais em uma dimensão comparativa. A abordagem do estudo de comunidade entrelaça, portanto, a dicotomia moderna/tradicional, a delimitação de pequenas áreas para observação e análise, a comparação dessas áreas para um diagnóstico social (de interesse direto da Secretaria de Educação e Saúde e do governo ianque) e a produção de etnografias em comunidades interioranas na Bahia (de interesse da antropologia e do governo ianque). Ambos de sentido político, se observarmos aspectos mais amplos em torno das relações entre instituições estrangeiras, nacionais e o capitalismo dependente do Brasil.

Josildeth estava em seu primeiro ano de graduação e foi auxiliar de pesquisa de Marvin Harris, na cidade de Rio de Contas, na Chapada Diamantina. Antes da chegada dos antropólogos de Columbia, ela teve uma intensa formação no estudo da língua inglesa. Além de Josildeth, outros estudantes auxiliaram na pesquisa: Maria Raimunda Guerra de Macedo e um aluno do curso de Ciências Sociais da Universidade do Brasil, Nilo Garcia. Josildeth conta que foi um escândalo na família para que pudesse fazer a pesquisa de campo e só conseguiu por causa da presença de outra mulher, sua colega, Maria Macedo. Para elas, a designação foi de cobrir a “área feminina” da pesquisa, envolvendo-se com temas sobre trabalho domiciliar (produtivo e reprodutivo) e a educação das crianças.

Em 1956, Marvin Harris publica o livro Town & Country in Brazil. Porém, alguns desses estudos foram publicados apenas em formato de tese de doutorado em Columbia, pois nem todo o material colhido foi analisado (Consorte, 2014CONSORTE, J. G. O “Projeto Columbia”: um resgate necessário. Revista HISTEDBR On-line , Campinas, SP, v. 14, n. 56, p. 17-25, maio 2014.). Esse material foi transferido para a Fundação para o Desenvolvimento da Ciência na Bahia, órgão responsável pelo convênio. Durante a ditadura empresarial militar, parte do acervo “desapareceu e nenhuma publicação conclusiva em termos dos subsídios para a educação e a saúde na Bahia, esperados dos estudos de comunidade, resultou de todo aquele esforço, que, não obstante, resultaria em outros ganhos” (Consorte, 2014CONSORTE, J. G. O “Projeto Columbia”: um resgate necessário. Revista HISTEDBR On-line , Campinas, SP, v. 14, n. 56, p. 17-25, maio 2014., p. 22).

Antes de falar dos ganhos, vamos às perdas ou silêncios. O desaparecimento desses arquivos é algo sintomático. A ditadura empresarial militar, de fato, foi uma produtora ativa de silenciamentos de arquivos, de expressões, de corpos e, nesse caso em específico, trata-se de um silenciamento na composição do fato, na própria elaboração dos arquivos (Trouillot, 2016TROUILLOT, M.-R. Silenciando o passado: poder e a produção da história. Tradução de Sebastião Nascimento. Curitiba: Huya, 2016.).

Sobre a educação, Josildeth destaca que os antropólogos, àquela época, tiveram dificuldades de perceber as especificidades da escola de cada região. O próprio lugar da educação não era um objeto privilegiado para Marvin Harris, apesar de a pesquisa ser subsidiada por uma Secretaria de Educação. Tanto que o tema foi repassado para Josildeth, até então auxiliar de pesquisa, cursando ainda o segundo ano de graduação. Esse momento envolve controvérsias interessantes assinaladas pela antropóloga baiana:

Uma das questões levantadas na pesquisa em que agora estou envolvida, revisitando o Projeto de Pesquisas Sociais Estado da Bahia/Universidade de Colúmbia, é por que um programa de estudos de comunidade com a intenção de fornecer subsídios à atuação do Secretário de Educação e Saúde se estes estudos levariam tanto tempo que ele não teria condições de se beneficiar dos resultados enquanto estivesse no cargo. Há outra coisa. Anísio, no mesmo momento em que dava início ao projeto de pesquisas com a Universidade de Colúmbia, punha em prática seu projeto de educação com o Centro Educacional Carneiro Ribeiro, que incluía a famosa Escola Parque. Isto nos faz pensar que seu objetivo com o projeto dos estudos de comunidade não era propriamente fornecer subsídios para sua atuação, mas buscar este conhecimento com qualidade mais ampla. É o que me parece. (Consorte; Pereira, 2010CONSORTE, J. G.; PEREIRA, J. B. B. Estudos de comunidade: um encontro. Entrevistadora: Lilian de Lucca Torres. Ponto Urbe: Revista do Núcleo de Antropologia Urbana da USP, São Paulo, v. 6, p. 1-22, 2010., p. 9).

É interessante a sugestão inferida. Mesmo sendo um estadista da educação, Anísio Teixeira não buscava o imediatismo tão valorizado no mundo político. Oportunizar uma pesquisa para conhecer o interior do estado da Bahia, até hoje, de certa forma, carente de investigações aprofundadas que informem sobre as histórias e identidades, os modos de produção e consumo locais, aparece como um elemento-chave de que essa experiência se trata de uma perspectiva mais abrangente. Ou seja, Anísio Teixeira tinha a necessidade de conhecer profundamente os problemas do Brasil (e não o Brasil das capitais e grandes centros urbanos) para a construção de uma prática educativa mais efetiva. O argumento encontra ressonância na medida em que Anísio não criou apenas o CBPE, mas a partir dele foram criados centros regionais de pesquisa também.

E, nessa busca, a antropologia e a educação aparecem como duas áreas fundamentais da política anisiana, como nos diz Josildeth Gomes Consorte:

O projeto tinha uma duração muito restrita, por isso era necessário que fosse institucionalizado, que tivesse continuidade, que as publicações pudessem ser feitas e que outros trabalhos resultassem disso. Foi criada a Fundação, que recebeu todo o material. Entretanto, durante a ditadura, a Fundação foi um dos alvos preferidos e todo este material se perdeu. Tenho estado muito empenhada em recuperar o que ficou. Certa vez escrevi para Cecília Wagley perguntando-lhe o que havia. Mandou-me algumas coisas. Recentemente, a filha de Wagley trouxe-me a carta do doutor Anísio à chefia do Departamento de Antropologia da Universidade de Colúmbia confirmando a realização do convênio. É o atestado de nascimento do projeto. O interesse que deu origem ao projeto foi a educação. Anísio Teixeira era um grande educador. O que se queria com aqueles estudos de comunidade? Que informassem a respeito da temática central: a mudança. Mudanças que estavam em curso e viriam por conta da grande transformação pela qual o mundo estava passando. (Consorte; Pereira, 2010CONSORTE, J. G.; PEREIRA, J. B. B. Estudos de comunidade: um encontro. Entrevistadora: Lilian de Lucca Torres. Ponto Urbe: Revista do Núcleo de Antropologia Urbana da USP, São Paulo, v. 6, p. 1-22, 2010., p. 12).

Dessa forma, o Projeto Columbia, por um lado, aparece como uma experiência de pesquisa fundamental na trajetória acadêmica da Josildeth Gomes Consorte e, de outro, torna-se uma espécie de laboratório de pesquisa e estreitamento de relações pessoais e profissionais que permitiu a criação posterior do CBPE. Charles Wagley e Thales de Azevedo, além da Josildeth Consorte foram nomes que participaram, anos depois, ativamente, do CBPE.

Do Projeto Columbia à Universidade de Columbia

A experiência e dedicação de Josildeth durante o Projeto Columbia chamou a atenção dos antropólogos envolvidos e de Anísio Teixeira. Com o fim do projeto e já formada no bacharelado em Geografia e História pela Universidade da Bahia, em 1951, Josildeth iria em direção a Nova Iorque. Antes, porém, ela estudou dois semestres na Escola de Sociologia e Política de São Paulo que a habilitaram, posteriormente, a ingressar como aluna de pós-graduação no Departamento de Antropologia da Universidade de Columbia, em setembro de 1953 (Consorte, 2007CONSORTE, J. G. Recordações de um aprendizado antropológico. In: SANSONE, L.; PEREIRA, C. (Org.). Projeto Unesco no Brasil: textos críticos. Salvador: EdUFBA, 2007. p. 81-93.).

A Universidade de Columbia é o berço da antropologia nos Estados Unidos, e a década de 1950 marca o crepúsculo da sua expressão mais importante: o culturalismo. Josildeth chega nesse momento de crítica a Franz Boas e de expansão de uma nova vertente, o neoevolucionismo, com Morton Fried, Marshal Sahlins, Marvin Harris e Anthony Leeds. O particularismo histórico, aos poucos, cedia lugar a uma abordagem histórica de longo alcance.

Os anos de 1953 a 1955 foram intensos para Josildeth. Com a possibilidade de realização do doutorado, pois fora dispensada do mestrado por excelência acadêmica, ela cursou o máximo de créditos que conseguiu e não só em Columbia. Por conta da passagem pela Escola de Sociologia e Política da Universidade de São Paulo (USP), Josildeth conhecera as discussões provenientes da Escola de Chicago, influenciada pela antropologia social inglesa de Radcliffe-Brown. Ela fez três disciplinas nessa escola com Lloyd Warner, Sol Tax e Robert Redfield. Existia uma distância (rivalidade) entre Columbia e Chicago e ela transitou nesses mundos. Essa formação se mostrou fundamental para o balanço crítico que posteriormente realizou dos estudos de comunidade, além das pesquisas desenvolvidas na área da educação por meio do CBPE.

A esta altura, tendo sido beneficiada pela dispensa da tese de mestrado (facilidade ou prêmio concedido aos bons alunos), estava na metade do caminho. No meu caso, porém, o prêmio acabou redundando em prejuízo, na medida em que tendo que retornar ao Brasil, por razões ligadas a mudanças de governo, em meados de 1955, voltei com todos os créditos já referidos para o doutorado, mas sem qualquer título, um banho de água fria que se transformaria numa imensa frustração, que demorou muito para passar. [...] Foi muito difícil para mim entender a sua atitude [de Anísio] naquele momento. Investira-se na minha formação, é certo, mas, não no nível de qualificação que obteria como doutor e isto para mim, como para tantos mais, não parecia fazer sentido. Foi um momento de grande angústia e perplexidade. Ainda estava longe um projeto brasileiro para a pós-graduação. A contragosto, aceitei o lugar que ele me oferecia como pesquisadora na área de educação [no CBPE], com a qual acabaria por me envolver, profundamente, por alguns anos e onde muito aprendi (Consorte, 2007CONSORTE, J. G. Recordações de um aprendizado antropológico. In: SANSONE, L.; PEREIRA, C. (Org.). Projeto Unesco no Brasil: textos críticos. Salvador: EdUFBA, 2007. p. 81-93., p. 91-92).

Em outra entrevista, Josildeth fala novamente dessa decepção:

E foi aí que eu causei uma grande decepção ao Dr. Anísio. Porque eu voltei com um projeto de pesquisa que não interessou a ele. O projeto dele, por outro lado, também não me interessou. Porque eu não tinha nenhum interesse em trabalhar com educação naquele momento (Consorte, 2009CONSORTE, J. G. Os 60 anos do Programa de Pesquisas Sociais do Estado da Bahia e Universidade de Columbia. [Entrevista concedida a] Érika Figueiredo, Isabela Oliveira e Janaína Damasceno. Cadernos de Campo, São Paulo, v. 18, n. 18, p. 201-217, 2009., p. 210).

A intenção de Josildeth era fazer uma pesquisa de campo no norte do Paraná, para entender as relações entre os nordestinos que estavam chegando e os colonos europeus já estabelecidos. Posteriormente, ela retornaria então à Universidade de Columbia para a defesa da tese. Por isso, a decepção foi mútua, já que ela não conseguiu concretizar sua intenção nem retornar a Columbia. É curioso, porém, que a antropóloga enfatize a decepção que causou e não a sofrida. Por que outros pesquisadores, principalmente homens brancos, como Eduardo Galvão (na Universidade de Columbia, inclusive) por exemplo, tiveram a possibilidade de completar integralmente a pós-graduação e a Josildeth não?

Após a frustração que “demorou muito a passar”, Josildeth relativiza o momento, lembrando que os estudos de comunidade estavam em declínio e já não tinham o mesmo financiamento de antes. Uma nova fase para a antropologia começava a surgir no Brasil por meio do CBPE. E não foi só Josildeth que começou a trabalhar no CBPE a contragosto. Era bem evidente que a educação, talvez reduzida também à noção de escola, era um objeto de pouquíssimo interesse e prestígio. Quando Josildeth ingressa no CBPE, Darcy Ribeiro diz para ela: “o que você está fazendo lá? Deixa isto para lá. Educação é muito chato” (Consorte, 2009CONSORTE, J. G. Os 60 anos do Programa de Pesquisas Sociais do Estado da Bahia e Universidade de Columbia. [Entrevista concedida a] Érika Figueiredo, Isabela Oliveira e Janaína Damasceno. Cadernos de Campo, São Paulo, v. 18, n. 18, p. 201-217, 2009., p. 212).

Eu queria voltar pra São Paulo ou pra Bahia. Mas não consegui nem uma coisa, nem outra. E o Dr. Anísio, que era quem podia me abrir as portas, abriu efetivamente, mas abriu para que eu viesse trabalhar no projeto dele, não no meu projeto. E eu demorei muito pra aceitar isso. Eu fui como quem vai pro cadafalso. Porque eu não queria trabalhar na área de educação, então eu fui porque eu precisei ir, mas acabei me envolvendo profundamente com ela (Consorte, 2009CONSORTE, J. G. Os 60 anos do Programa de Pesquisas Sociais do Estado da Bahia e Universidade de Columbia. [Entrevista concedida a] Érika Figueiredo, Isabela Oliveira e Janaína Damasceno. Cadernos de Campo, São Paulo, v. 18, n. 18, p. 201-217, 2009., p. 212).

Nessa impossibilidade dos seus planos de doutorado, Josildeth descobre que o novo “outro” nesse Brasil de preocupação mais urbana não é mais o homem rural, o “outro” agora é o favelado. Até 1961, desenvolverá pesquisas pioneiras sobre a criança favelada e o sistema educacional. Tanto ela, quanto Darcy Ribeiro, depois de uma relutância inicial, uma vez como pesquisadora no CBPE, serão responsáveis por inaugurar uma tradição de pesquisa original para compreender os processos educativos no País.

Como visto, o Projeto Columbia é um demarcador fundamental na trajetória de Josildeth. De forma geral, envolveu um longo processo que transformou a Bahia em um polo magnético de campo etnográfico. Em 1970, Charles Wagley e Cecília Wagley fazem um importante balanço desse período no artigo intitulado “Serendipity in Bahia, 1950-70”. O termo de origem etimológica inglesa significa a sorte em encontrar coisas boas sem querer e tem correspondência no português como serendipidade. Charles Wagley e Cecília Wagley resgatam o termo de Robert Merton, que o usava no sentido de uma descoberta de algo não procurado, mas que necessita de uma mente preparada teoricamente para perceber. O componente de serendipidade é o processo imprevisto que pode gerar novas hipóteses. Os autores ampliam o termo para também designar motivações para novas pesquisas empíricas, atraindo pesquisadores para uma determinada área de pesquisa, a exemplo do caso do Bahia State Columbia University Social Science Research Program.

No artigo, Wagley e Wagley (1970WAGLEY, C.; WAGLEY, C. R. Serendipity in Bahia, 1950-70. Universitas, Salvador, n. 6/7, p. 29-41, 1970.) descrevem o serendipity component como as atividades inesperadas do projeto. Para os autores, aquela época trazia um ar de “inocência”, diferentemente do que acontecia durante a escrita do seu artigo. Pelo conhecimento que eles tinham do Brasil, esse comentário deve remeter aos horrores da ditadura militar. Nos Estados Unidos, a Guerra do Vietnã havia terminado há pouco tempo, mas todos os conflitos indiretos da Guerra Fria continuavam queimando populações inteiras em diversos pontos do planeta. Contudo, a década de 1940, além da intensificação dos imperialismos nos continentes africanos e asiáticos, foi palco de duas bombas atômicas intencionalmente despejadas no Japão (para matar civis) pelo governo dos Estados Unidos, quando a guerra mundial já havida acabado. Não me parece uma “época de inocência”.

Sobre as atividades inesperadas que fugiam ao planejamento inicial, os autores destacam alguns pontos interessantes. A pesquisa de viés histórico de Rollie Poppino sobre Feira de Santana, por exemplo, que foi adicionada ao Projeto Columbia pela importância da cidade para o estado da Bahia, mesmo sendo da Universidade de Stanford. Outro componente de alteração em relação ao plano original envolveu o estudante Nilo Garcia, designado para acompanhar Marvin Harris, que acabou regressando para o Rio de Janeiro antes de iniciar a pesquisa de campo. Dessa forma, Josildeth Consorte e Maria Macedo são convidadas para acompanhar Marvin Harris na comunidade chamada de forma fictícia de Minas Velhas, que já sabemos se tratar de Rio de Contas.

Em 1951, Anthony Leeds chega à Bahia atraído pelas repercussões do Projeto Columbia. Embora seus estudos não tenham seguido o planejamento original, Leeds desenvolverá importante pesquisa na região sul da Bahia, patrocinada pela Fundação para o Desenvolvimento da Ciência na Bahia. Outro desdobramento que não era previsto foi a pesquisa sobre problemas urbanos e cultos afro-brasileiros na cidade de Itaparica por Cario Castaldi, em 1953; a pesquisa de Maria Isaura Pereira de Queiroz sobre um movimento religioso messiânico no norte da Bahia, patrocinada pelo Projeto Columbia; além do estudo de uma comunidade próxima a Salvador, chamada Abrantes, estudada por Maria David de Azevedo Brandão (Wagley; Wagley, 1970WAGLEY, C.; WAGLEY, C. R. Serendipity in Bahia, 1950-70. Universitas, Salvador, n. 6/7, p. 29-41, 1970.).

Os autores chamam a atenção para uma consequência direta do Projeto Columbia: a partir de 1962, novas pesquisas foram realizadas no estado da Bahia, agora envolvendo as Universidades de Columbia, Cornell, Havard e Illinois (Wagley; Wagley, 1970WAGLEY, C.; WAGLEY, C. R. Serendipity in Bahia, 1950-70. Universitas, Salvador, n. 6/7, p. 29-41, 1970.). Muitas pesquisas foram realizadas em diversas cidades na Bahia e não foram publicadas, os manuscritos e relatórios estão empoeirados nas bibliotecas dessas universidades à espera de novas leituras. Para indicar apenas uma pesquisa que envolve diretamente a antropologia e a educação, menciono o trabalho de Lenore Veigt, intitulado An Experiment in Brazilian Education: a study of the Centro Educacional Carneiro Ribeiro in Salvador, Bahia (1965). Trata-se de um estudo sobre uma das mais importantes realizações de Anísio Teixeira que é a Escola Parque em um período em que o educador baiano ainda estava vivo. Fico me perguntando qual a Bahia que foi vista e descrita por esses antropólogos e antropólogas estrangeiros em meados do século 20.

“Certamente, o elemento de desenvolvimento humano desencadeado pelo plano de pesquisa original de 1949 foi um de seus resultados mais importantes” (Wagley; Wagley, 1970WAGLEY, C.; WAGLEY, C. R. Serendipity in Bahia, 1950-70. Universitas, Salvador, n. 6/7, p. 29-41, 1970., p. 36, tradução nossa)2 2 No original: Surely, the element of human development set off by the original research plan of 1949 was one of its most important results. . A Bahia e a circulação de intelectuais derivada direta ou indiretamente do Projeto Columbia promoveram a iniciação na antropologia para muitos pesquisadores, a concretização de pesquisas doutorais, não só com a vinda de estrangeiros, mas com a ida de brasileiros e brasileiras para os Estados Unidos, sendo a trajetória de Josildeth elucidativa desse movimento.

Josildeth Gomes Consorte passou pelas principais instituições de ensino e pesquisa em antropologia do Brasil - o que hoje são: a Universidade Federal da Bahia (UFBA), a Universidade de São Paulo (USP) e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e dos Estados Unidos (Universidade de Columbia e Universidade de Chicago). Em 1966, ingressou na PUC-SP como professora de antropologia, onde também defendeu sua tese de doutorado em 1973. Além do seu pioneirismo nos estudos sobre infância e educação, também desenvolveu importantes pesquisas sobre religiões de matriz africana, a condição da mulher nesse contexto religioso e questões gerais sobre o racismo no Brasil.

Algumas considerações finais

O Projeto Columbia é uma espécie de caleidoscópio que revela múltiplos sentidos de histórias das antropologias no Brasil. Introduziu pesquisadores em trabalhos de campo da iniciação científica ao doutorado, por meio de uma equipe internacional e interinstitucional. Em termos de pesquisa, deu subsídios importantes para o desenvolvimento de investigações em diferentes cidades no estado da Bahia. Tudo isso constitui uma pequena parte de uma longa história entre a Universidade de Columbia e o desenvolvimento da relação entre antropologia e educação no Brasil.

Essa articulação foi um dos palcos centrais de aplicação dos estudos de comunidade, além de um aglutinador e laboratório social para a criação do CBPE por Anísio Teixeira. Nos três pontos de convergência entre o educador baiano e as ciências sociais - com Arthur Ramos, no Projeto Columbia e no CBPE - citados por Josildeth, a presença da antropologia é notoriamente mais forte do que outras áreas. Como foi discutido, isso funda uma tradição de pesquisa no Brasil. Esses três momentos ainda carecem de maiores aprofundamentos tanto em relação ao papel de Anísio Teixeira, quanto das diferentes presenças de antropólogos e antropólogas nesses projetos e pesquisas.

A antropologia para Anísio parece ser uma área, ao mesmo tempo, de fascínio e confiança para revelar os problemas da realidade educacional brasileira. A aproximação é de uma só vez epistemológica e política. Cercado de tantos antropólogos e antropólogas, sendo amigos de muitos deles, dialogando sobre vários projetos envolvendo a área, mesmo que ele não tenha se preocupado em escrever algo dentro da área da antropologia, essa influência vai aparecer nos seus escritos de alguma forma. Isso quer dizer que, por um lado, as trajetórias de antropólogos e antropólogas e tradições de pesquisa que envolveram a antropologia e educação, passando pelo Projeto Columbia, culminaram na criação do CBPE. Por outro lado, Anísio Teixeira sendo uma peça fundamental nessa estória, imagino que de forma paralela, e muitas vezes fazendo curvas e construindo encruzilhadas, seja possível afirmar que há uma antropologia da educação na práxis anisiana.

Por fim, a análise da trajetória de Josildeth Gomes Consorte nas décadas de 1940 e 1950 resulta em provocadores para repensar vários aspectos da antropologia e/da educação no Brasil: 1) a importância da antropologia e/da educação para além dos programas de pós-graduação, com especial atenção para as relações entre pesquisadores/pesquisadoras e órgãos do governo, centros de pesquisa aplicada, secretarias de educação, museus e associações de intelectuais; 2) redimensionar o impacto do CBPE e, por consequência, o papel de Anísio Teixeira na antropologia da educação no Brasil; 3) a trajetória de professoras primárias como pesquisadoras em ciências sociais e o papel das antropólogas na construção historiográfica da disciplina no País; e 4) a negligência histórica da temática da educação pela antropologia.

  • ABU-LUGHOD, L. A escrita dos mundos de mulheres: história beduínas. Tradução de Maria Claudia Coelho. Rio de Janeiro: Papéis Selvagens, 2020.
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    No original: Surely, the element of human development set off by the original research plan of 1949 was one of its most important results.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Set 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    16 Out 2022
  • Aceito
    11 Abr 2023
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