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Geografia e saúde coletiva: análise da dinâmica epidemiológica das meningites no Brasil, entre os anos de 2010 e 2019

RESUMO

Objetivo:

Analisar a dinâmica epidemiológica espaçotemporal das meningites no Brasil, entre os anos de 2010 e 2019.

Métodos:

Estudo ecológico descritivo com os casos e óbitos por meningites no Brasil (2010–2019) no Sistema de Informações de Agravos de Notificação. Realizaram-se (I) análises de frequências dos casos e óbitos, taxas de prevalência, mortalidade, letalidade, testes de exato de Fisher e qui-quadrado; (II) regressão de Prais-Winsten; e (III) índice de Moran global, local e densidade de Kernel.

Resultados:

Notificaram-se 182.126 casos de meningites no Brasil, dos quais 16.866 (9,26%) evoluíram para óbito, com taxas de prevalência de 9,03/100.000/habitantes, mortalidade de 0,84/100.000/habitantes e letalidade de 9,26%. Destaca-se a tendência de decrescimento das taxas de prevalência (−9,5%, intervalo de confiança de 95% — IC95% −13,92; −4,96, p<0,01) e mortalidade (−11,74%, IC95% −13,92; −9,48, p<01,01), enquanto a letalidade se manteve estacionária (−2,08%, IC95% −4,9; 0,8; p<0,1941). A maioria dos casos foi de meningites virais (45,7%), entre 1 e 9 anos (32,2%), enquanto a maior parcela dos óbitos foi por meningites bacterianas (68%), entre 40 e 59 anos (26,3%). Nos mapas de Moran e Kernel das taxas de prevalência e mortalidade, destacaram-se com altas taxas os municípios do sul, sudeste e a capital de Pernambuco, no nordeste; já na letalidade, evidenciaram-se o norte, o nordeste e o litoral do sudeste.

Conclusão:

Encontrou-se decréscimo dos casos e óbitos por meningites neste estudo, entretanto a taxa de letalidade foi maior em áreas com menor prevalência, reforçando a necessidade do aprimoramento das ações de identificação, vigilância e assistência em saúde dos casos, bem como da ampliação da cobertura vacinal.

Palavras-chave:
Meningite; Doenças preveníveis por vacina; Saúde pública; Fatores epidemiológicos; Estudos de séries temporais; Análise espacial

ABSTRACT

Objective:

To analyze the spatiotemporal epidemiological dynamics of meningitis in Brazil, between 2010 and 2019.

Methods:

Descriptive ecological study with cases and deaths due to meningitis in Brazil (2010-2019) in the National Notifiable Diseases Information System (Sistema de Informações de Agravos de Notificação – SINAN). The following analyses were performed: (I) frequency analyses of cases and deaths, prevalence rates, mortality, lethality, Fisher's exact test, and chi-square test; (II) Prais-Winstein regression; and (III) Global, Local Moran's index, and Kernel density.

Results:

182,126 cases of meningitis were reported in Brazil, of which 16,866 (9.26%) resulted in death, with prevalence rates of 9.03/100,000 inhabitants, mortality of 0.84/100,000 inhabitants, and lethality of 9.26%. There was a noted trend of decreasing prevalence rates (−9.5%, 95% confidence interval — 95%CI −13.92; −4.96, p<0.01) and mortality (−11.74%, 95%CI −13.92; −9.48, p<0.01), while lethality remained stable (−2.08%, 95%CI −4.9; 0.8; p<0.1941). The majority of cases were viral meningitis (45.7%), among 1-9 years old (32.2%), while the highest proportion of deaths was due to bacterial meningitis (68%), among 40-59 years old (26.3%). In the Moran and Kernel maps of prevalence and mortality rates, municipalities in the South, Southeast, and the capital of Pernambuco in the Northeast stood out with high rates; as for lethality, the North, Northeast, and Southeast coastal areas were highlighted.

Conclusion:

A decrease in meningitis cases and deaths was found in this study; however, the lethality rate was higher in areas with lower prevalence, emphasizing the need to enhance actions for identifying, monitoring, and providing health care for cases, as well as expanding vaccination coverage.

Keywords:
Meningitis; Vaccine-preventable diseases; Public health; Epidemiologic factors; Time series studies; Spatial analysis

INTRODUÇÃO

A meningite é uma doença caracterizada pela inflamação das meninges e do espaço subaracnóideo, que são estruturas responsáveis pela proteção do sistema nervoso central, formadas por três camadas membranosas — dura-máter, aracnoide e pia-máter. Estas possuem entre elas o líquido cefalorraquidiano (LCR), o líquor, um fluido biológico responsável por amortecer o sistema nervoso11 Gomes LS, Passos BVS, Azevedo PSS, Silva Júnior FTS, Sampaio LS, Matos LFL, et al. Aspectos epidemiológicos das meningites virais no estado do Piauí no período de 2007 a 2017. Rev Eletrônica Acervo Saúde 2019; 11(10): e433. https://doi.org/10.25248/reas.e433.2019
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33 Silva HCG, Mezzaroba N. Meningite no Brasil em 2015: o panorama da atualidade. ACM Arq Catarin Med 2018; 47(1): 34-46..

Sua etiologia pode estar associada à presença de vírus, bactérias e outros agentes infecciosos, entretanto tal processo inflamatório também pode ser ocasionado por agentes não infecciosos, como medicamentos e outras doenças33 Silva HCG, Mezzaroba N. Meningite no Brasil em 2015: o panorama da atualidade. ACM Arq Catarin Med 2018; 47(1): 34-46.,44 Macedo Junior AM, Nicoletti GP, Santos ECG. Meningite: breve análise sobre o perfil epidemiológico no Brasil-BR, nos anos de 2018 e 2019. Int J Dev Res 2021; 11(1): 43751-6. https://doi.org/10.37118/ijdr.20705.01.2021
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O tipo mais prevalente de meningite na população é a viral, por ter maior número de agentes etiológicos quando comparada à bacteriana e estar relacionada com a vulnerabilidade socioeconômica da população55 Duque MAA, Silva TC, França ICC, Carvalho SMS, França ICC, Silva GS, et al. Aspectos epidemiológicos, clínicos e laboratoriais da meningite viral: uma revisão de literatura. Braz J Dev 2023, 9(1): 4086-96. https://doi.org/10.34117/bjdv9n1-283
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. A meningite bacteriana, por sua vez, é considerada a mais letal por sua gravidade, em comparação ao tipo viral55 Duque MAA, Silva TC, França ICC, Carvalho SMS, França ICC, Silva GS, et al. Aspectos epidemiológicos, clínicos e laboratoriais da meningite viral: uma revisão de literatura. Braz J Dev 2023, 9(1): 4086-96. https://doi.org/10.34117/bjdv9n1-283
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,66 Dias FCF, Rodrigues Junior CA, Cardoso CRL, Veloso FPFS, Rosa RTAS, Figueiredo BNS. Meningite: aspectos epidemiológicos da doença na região norte do Brasil. Revista de Patologia do Tocantins 2017; 4(2): 46-9. https://doi.org/10.20873/uft.2446-6492.2017v4n2p46
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A meningite é uma doença imunoprevenível, porém ainda é considerada um problema de saúde pública. Estima-se que anualmente, no mundo, ocorra 1,2 milhão de casos, 135 mil mortes por essa doença, e que sua letalidade possa chegar a 50% quando não há o tratamento oportuno77 GBD 2016 Meningitis Collaborators. Global, regional, and national burden of meningitis, 1990–2016: a systematic analysis for the Global Burden of Disease Study 2016. Lancet Neurol 2018, 17(2): 1061-82. https://doi.org/10.1016/S1474-4422(18)30387-9
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. No Brasil, os casos suspeitos ou confirmados de meningite são de notificação compulsória imediata e devem ser informados em até 24 horas às Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde88 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Boletim Epidemiológico 25 [Internet]. 2021 [cited on Jul 17, 2022]. Available at: https://www.gov.br/saude/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/boletins/boletins-epidemiologicos/edicoes/2021/boletim-epidemiologico-25_svs.pdf/view
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Os casos de meningite notificados no país apresentam disparidades regionais, apresentando maior concentração nas Regiões Sul, Sudeste e Nordeste. Esse padrão foi observado tanto em um estudo sobre os casos especificamente de meningite bacteriana quanto em outro, que buscou analisar todos os tipos da doença99 Silva AFT, Valente FS, Sousa LD, Cardoso PNM, Silva MA, Santos DR. Estudo epidemiológico sobre meningite bacteriana no Brasil no período entre 2009 a 2018. Rev Med 2021; 100(3): 220-8. https://doi.org/10.11606/issn.1679-9836.v100i3p220-228
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,1010 Moraes GFQ, Galdino MAO, Teixeira APC. Impacto da meningite entre os anos de 2010 e 2020 no Brasil: um estudo documental. Rev Ciênc Méd Biol 2022 21(3): 505-13. https://doi.org/10.9771/cmbio.v21i3.46627
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Diante disso, no ano de 2021, a Organização Mundial da Saúde (OMS) lançou um roteiro global que visa ao controle da meningite e à redução dos óbitos pela enfermidade até o ano de 2030. Essa ação objetiva eliminar epidemias de meningite bacteriana; reduzir os casos de meningite bacteriana imunopreveníveis; e ampliar a qualidade de vida dos indivíduos acometidos pela doença1111 World Health Organization. Defeating meningitis by 2030: a global road map [Internet]. Genebra: WHO, 2021 [cited on Jul 07, 2022]. Available at: https://www.who.int/initiatives/defeating-meningitis-by-2030
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.

Atualmente, as vacinas configuram-se como uma das principais formas de prevenção à meningite. E, no Brasil, essas vacinas fazem parte do calendário nacional de imunização do Programa Nacional de Imunização (PNI), sendo ofertadas gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Entre as disponíveis estão: a pneumocócica 10-valente (PCV 10), meningocócica C (Conjugada), pneumocócica 23-valente (PPV 23), pentavalente e meningocócica ACWY (Conjugada)1212 Brasil. Ministério da Saúde. Calendário de vacinação [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2022 [cited on Jul 13, 2022]. Available at: https://www.gov.br/saude/pt-br/vacinacao/calendario
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. Estudos demonstram que a vacinação apresentou efeito positivo na redução dos casos e dos óbitos pela doença ao longo dos últimos anos1313 Neves RC, Böhm AW, Costa CS, Flores TR, Soares ALG, Wehrmeister FC. Cobertura da vacina meningocócica C nos estados e regiões do Brasil em 2012. Rev Bras Med Fam Comunidade 2016; 11(38): 1-10. https://doi.org/10.5712/rbmfc11(38)1122
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As manifestações clínicas da meningite são influenciadas pela idade, duração da doença e agente etiológico. Entre os principais sinais e sintomas estão: febre, hipotermia, diarreia, letargia, rigidez na nuca (irritação meníngea), dor lombar, fotofobia, dispneia, aparecimento de petéquias e exantemas maculopapulares1414 Teixeira AB, Cavalcante JCV, Moreno IC, Soares IA, Holanda FOA. Meningite bacteriana: uma atualização. Rev Bras Anal Clin 2018; 50(4): 327-329. https://doi.org/10.21877/2448-3877.201800725
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. A confirmação laboratorial pode ser realizada por meio de exames de reação em cadeia da polimerase (PCR), aglutinação pelo látex e cultura, sendo este último, considerado o padrão-ouro para o diagnóstico da meningite bacteriana88 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Boletim Epidemiológico 25 [Internet]. 2021 [cited on Jul 17, 2022]. Available at: https://www.gov.br/saude/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/boletins/boletins-epidemiologicos/edicoes/2021/boletim-epidemiologico-25_svs.pdf/view
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Diante desse contexto, justifica-se a realização desta pesquisa pela importância de conhecer a dinâmica epidemiológica das meningites no Brasil e contribuir para a compreensão espaçotemporal da doença e das suas características. Isso porque a utilização de dados geográficos, socioeconômicos e de saúde permite a caracterização de cenários epidemiológicos de interesse à saúde pública/coletiva1515 Oliveira DS, Chiaravalloti Neto F, Mota TS, Araujo DB, Sartori AMC. Spatial analysis of pneumococcal meningitis in São Paulo in the pre-and post-immunization era. Rev Saúde Pública 2019; 53: 59. https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2019053001183
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,1616 Cavalcante JR, Abreu AJL. COVID-19 no município do Rio de Janeiro: análise espacial da ocorrência dos primeiros casos e óbitos confirmados. Epidemiol Serv Saúde 2020; 29(3): e2020204. https://doi.org/10.5123/S1679-49742020000300007
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O presente estudo buscou responder ao seguinte questionamento: considerando-se que a meningite é um problema de saúde pública, qual é o cenário epidemiológico das meningites no Brasil nos últimos anos? Desse modo, objetivou-se analisar a dinâmica epidemiológica espaçotemporal das meningites no Brasil entre os anos de 2010 e 2019.

METÓDOS

Foi realizado um estudo descritivo e ecológico, de abordagem espaçotemporal, acerca dos casos e óbitos pelos diferentes tipos de meningites (bacteriana, viral e causadas por outros agentes), no Brasil, no período de 2010 a 2019, com base em dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan). O Sinan é um sistema de informação em saúde, criado em 1993 e que foi aprimorado ao longo dos anos. Nele são notificadas as doenças que fazem parte da Lista Nacional de Notificação Compulsória de Doenças1717 Rocha MS, Bartholomay P, Cavalcante MV, Medeiros FC, Codenotti SB, Pelissari DM, et al. Notifiable Diseases Information System (SINAN): main features of tuberculosis-relatid notification and data analysis. Epidemiol Serv Saude 2020; 29(1): e2019017. https://doi.org/10.5123/S1679-49742020000100009
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A coleta dos dados foi realizada no TabNet do Departamento de Informática do SUS (DataSUS), na aba "Epidemiológicas e Morbidade". Depois foi selecionada a opção "Doenças e Agravos de Notificação — 2007 em diante (SINAN)" e, posteriormente, "Meningite". Após essas etapas, deu-se início ao processo de tabulação dos dados1818 Brasil. Ministério da Saúde. Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DataSUS). TabNet [Internet] 2021 [cited on Jan 30, 2021]. Available at: https://datasus.saude.gov.br/informacoes-de-saude-tabnet/
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. Os dados referentes à população foram obtidos das estimativas populacionais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)1919 Brasil. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Panorama Brasil. IBGE Cidades [Internet]. 2022 [cited on Jul 07, 2022]. Available at: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/panorama
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Por se tratar de uma doença de notificação compulsória, os casos de meningite devem ser notificados de modo obrigatório, em até 24 horas, às Secretarias Municipais e Estaduais de Saúde, pelos profissionais de saúde ou responsáveis pelos serviços públicos e privados de saúde, que proporcionam assistência ao paciente. Qualquer cidadão também pode realizar a notificação do caso suspeito. A notificação é realizada por meio do documento "Ficha de Investigação de Meningite" e registrada no Sinan2020 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Articulação Estratégica de Vigilância em Saúde. Guia de vigilância em saúde [Internet]. 5a ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2022. Available at: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/guia_vigilancia_saude_5ed_rev_atual.pdf
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Por conseguinte, a área de estudo foi o Brasil, país localizado na América do Sul, que possui extensão territorial de 8.510.345,538 km2, com população estimada de 210.147.125 habitantes (hab.) para o ano de 2019. O país está dividido de forma administrativa em 5.570 municípios, 27 Unidades Federativas (UF) e cinco regiões geográficas (Norte, Nordeste, Sudeste, Sul e Centro-Oeste)1919 Brasil. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Panorama Brasil. IBGE Cidades [Internet]. 2022 [cited on Jul 07, 2022]. Available at: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/panorama
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Com o intuito de caracterizar o cenário epidemiológico geral das meningites no Brasil, foram calculadas as frequências absolutas e relativas das variáveis selecionadas para o estudo: sexo, faixa etária, raça/cor, critério de confirmação, etiologia, tipo de meningite (agrupada pelos autores com base na etiologia), evolução do caso, gestante, ano de início dos sintomas, região geográfica de residência, UF de residência e município de residência1818 Brasil. Ministério da Saúde. Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DataSUS). TabNet [Internet] 2021 [cited on Jan 30, 2021]. Available at: https://datasus.saude.gov.br/informacoes-de-saude-tabnet/
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(as categorias dessas variáveis constam no arquivo suplementar), bem como a taxa de prevalência (por 100 mil hab.), o coeficiente de mortalidade (por 100 mil hab.) e letalidade (por 100%).

Para o cálculo da taxa de prevalência e do coeficiente de mortalidade, usou-se como denominador a projeção populacional do respectivo ano, enquanto as taxas totais foram calculadas usando o somatório das projeções populacionais dos dez anos analisados como denominador.

Também foi empregado o teste de exato de Fisher e o teste de qui-quadrado para verificar se existem diferenças entre as médias de casos e óbitos, com nível de significância de 5% (p<0,05), por meio dos softwares Microsoft Office Excel 2016® e R versão 4.2.0.

Para a análise da evolução temporal, utilizou-se o método de regressão linear generalizada de Prais-Winsten, no qual as taxas de prevalência, mortalidade e letalidade das meningites foram consideradas como variáveis dependentes (Y) e os anos estudados a variável independente (X), com intervalo de confiança de 95%. Com esse método, é possível inferir se a tendência temporal é crescente (positiva), decrescente (negativa) ou estacionária (quando não há diferença significativa entre o valor obtido e zero). Para esta etapa foi utilizado o software R versão 4.2.0, com o pacote prais2121 Antunes JLF, Cardoso MRA. Uso da análise de séries temporais em estudos epidemiológicos. Epidemiol Serv Saúde 2015; 24(3): 565-76. https://doi.org/10.5123/S1679-49742015000300024
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,2222 Cunha AP, Cruz MM, Torres RMC. Tendência da mortalidade por aids segundo características sociodemográficas no Rio Grande do Sul e em Porto Alegre: 2000-2011. Epidemiol Serv Saúde 2016; 25(3): 477-86. https://doi.org/10.5123/S1679-49742016000300004
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Por conseguinte, na análise espacial foram calculados os índices de Moran global e local e a densidade de Kernel. O índice de Moran global objetivou verificar a existência de autocorrelação espacial na distribuição das taxas de prevalência, mortalidade e letalidade das meningites. Esse método baseia-se na hipótese nula (H0), que indica a não influência do espaço na distribuição da doença, evento ou agravo. Além disso, os valores obtidos nesse tipo de análise variam entre −1 e 1, e quanto mais próximo de 1 mais forte é a presença de autocorrelação espacial, enquanto valores próximos de zero mostram que a H0 é verdadeira2323 Nahas AK. Padrões espaço-temporais da taxa de mortalidade fetal no estado de São Paulo, Brasil, 2005-2016 [tese de doutorado]. São Paulo: Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP); 2018.,2424 Silva LR, Arruda LES, Silva AC, Teixeira CMB, Lira G, Ferreira RJ, et al. Negligência e desafios na saúde coletiva: Análise epidemiológica dos casos de doença de Chagas aguda no Brasil, no período de 2009 a 2018. Braz J Dev 2020; 6(8): 61734-52. https://doi.org/10.34117/bjdv6n8-555
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. Utilizou-se o teste de permutação aleatória com 9.999 permutações e intervalo de confiança de 95% para a validação dos achados2424 Silva LR, Arruda LES, Silva AC, Teixeira CMB, Lira G, Ferreira RJ, et al. Negligência e desafios na saúde coletiva: Análise epidemiológica dos casos de doença de Chagas aguda no Brasil, no período de 2009 a 2018. Braz J Dev 2020; 6(8): 61734-52. https://doi.org/10.34117/bjdv6n8-555
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Já o índice de Moran local permite a visualização de aglomerados de municípios com padrões de comportamento semelhante, segundo o critério de significância estatística2424 Silva LR, Arruda LES, Silva AC, Teixeira CMB, Lira G, Ferreira RJ, et al. Negligência e desafios na saúde coletiva: Análise epidemiológica dos casos de doença de Chagas aguda no Brasil, no período de 2009 a 2018. Braz J Dev 2020; 6(8): 61734-52. https://doi.org/10.34117/bjdv6n8-555
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. E a ferramenta da densidade de Kernel foi calculada para a identificação de áreas de concentração das taxas no espaço geográfico. Esse método utiliza a análise estatística por meio da interpolação de dados pontuais por unidade de área para estimar as curvas de densidade e convertê-las em dados em uma superfície contínua2525 Silverman BW. Density estimation for statistics and data analysis. Londres: Chapman and Hall; 1986..

O presente estudo não necessitou de aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), pois foi realizado exclusivamente com dados secundários de domínio público e, segundo a Resolução n° 510/16 do Conselho Nacional de Saúde (CNS), pesquisas desse tipo não precisam ser submetidas ao CEP2626 Brasil. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Resolução n° 510, de 7 de abril de 2016 [Internet]. 2016 [cited on Oct 20, 2021]. Available at: https://conselho.saude.gov.br/resolucoes/2016/Reso510.pdf
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RESULTADOS

Entre os anos de 2010 e 2019, foram notificados 182.126 casos de meningites no Brasil, dos quais 16.866 (9,26%) evoluíram para o óbito pela causa, com taxa de prevalência média de 9,03 casos por 100 mil hab., coeficiente de mortalidade médio de 0,84 óbitos/100 mil hab. e taxa de letalidade média de 9,26%.

Quanto à caracterização epidemiológica dos casos, observou-se que a maioria ocorreu em indivíduos do sexo masculino (59,12%); na faixa etária de um a nove anos (32,18%); na raça/cor branca (45,17%); sendo a maior parcela de etiologia viral (45,69%), com confirmação por meio do exame quimiocitológico (60,99%), e 79,37% dos casos evoluíram para a cura (Tabela 1).

Tabela 1
Caracterização epidemiológica dos casos e dos óbitos por meningites no Brasil, entre os anos de 2010 e 2019.

Com relação aos óbitos (n=16.866), a maioria ocorreu em indivíduos do sexo masculino (58,73%); na faixa etária de 40 a 59 anos (26,34%); na raça/cor branca (39,16%); a principal causa desses óbitos tinha como etiologia a meningite do tipo bacteriana (22,15%); e o meio de confirmação mais utilizado foi o de cultura (29,15%) (Tabela 1).

Na análise de tendência temporal, observou-se um decrescimento da variação percentual anual da taxa de prevalência de −9,5% (IC95% −13,92; −4,96, p<0,01) no período, assim como a taxa de mortalidade, que também apresentou decréscimo de −11,74% (IC95% −13,92; −9,48, p<01,01). Já a taxa de letalidade demonstrou tendência estacionária, mas com decréscimo de −2,08% (IC95% −4,9; 0,8; p<0,1941) no período estudado (Figura 1).

Figura 1
Série temporal* das taxas de prevalência, mortalidade e letalidade das meningites no Brasil, entre os anos de 2010 e 2019.

Ademais, ao observar a estratificação por tipo de meningite (Tabela 2), notou-se tendência estacionária da prevalência da meningite viral e tendência decrescente das meningites bacterianas e outros agentes etiológicos. Para a mortalidade, também foi constatada uma tendência estacionária para a meningite viral e uma decrescente para as meningites bacterianas e outros tipos. No tocante à letalidade, todos os tipos de meningites apresentaram tendência estacionária.

Tabela 2
Evolução temporal das taxas de prevalência, mortalidade e letalidade dos tipos de meningite no Brasil, entre os anos de 2010 e 2019.

Com relação à análise da prevalência das meningites, segundo a região geográfica, observou-se que a Região Sul obteve taxa de 12,48/100 mil hab., seguida pelas Regiões Sudeste (11,65/100 mil hab.), Nordeste (5,59/100 mil hab.), Centro-Oeste (5,54/100 mil hab.) e Norte (4,54/100 mil hab.).

Para o coeficiente de mortalidade, sobressaiu-se a Região Sudeste (1,08/100 mil hab.), seguida das Regiões Sul (0,89/100 mil hab.), Centro-Oeste (0,67/100 mil hab.), Norte (0,65/100 mil hab.) e Nordeste (0,54/100 mil hab.). Para a letalidade, destacou-se a Região Norte, com taxa de letalidade de 14,21%, seguida pelas Regiões Centro-Oeste (12,08%), Nordeste (9,73%), Sudeste (9,25%) e Sul (7,15%).

A presença de autocorrelação espacial na distribuição da taxa de prevalência das meningites foi confirmada pelo índice de Moran Global (I=0,54; p-valor=0; z-score= 13,80). No Moran local, destacaram-se municípios das UF de São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Pernambuco, com clusters de municípios com altas taxas e vizinhança alta (Figura 2A).

Figura 2
Mapas do índice de Moran das taxas de prevalência (A), mortalidade (B) e letalidade (C) das meningites no Brasil, 2010 e 2019.

Com relação ao coeficiente de mortalidade, identificou-se autocorrelação espacial fraca (I= 0,03; p-valor=0,34; z-score=0,93) e, conforme o mapa do Moran local, notou-se semelhança com o mapa da taxa de prevalência, sobressaindo-se os municípios dos estados de São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, Paraná e Santa Catarina (Figura 2B).

No mapa da letalidade, também foi confirmada a presença de autocorrelação espacial frágil (I=0,03; p-valor=0; z-score=23,57), no entanto observou-se uma mudança nas áreas de destaque do mapa. Algumas áreas que não se destacaram nos mapas descritos anteriormente sobressaíram-se no mapa de letalidade, como os municípios dos estados do Amazonas, Pará, Maranhão, Bahia, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Espírito Santo (Figura 2C).

A análise da densidade de Kernel da taxa de prevalência revelou que alguns municípios dos estados de São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul são áreas de alta e média densidade (Figura 3A). Essas áreas também foram comuns ao mapa do coeficiente de mortalidade com áreas de alta e média concentração de óbitos, além dos estados de Pernambuco, Minas Gerais e Rio de Janeiro (Figura 3B). Para a letalidade, sobressaíram-se as áreas de maior densidade nos estados de Minas Gerais e da Paraíba, enquanto os municípios das UF de São Paulo, Minas Gerais, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Maranhão e alguns municípios do litoral nordestino se destacaram como áreas de média concentração (Figura 3C).

Figura 3
Mapas da densidade de Kernel das taxas de prevalência (A), mortalidade (B) e letalidade (C) das meningites no Brasil, 2010 e 2019.

DISCUSSÃO

Com base nas análises realizadas no presente estudo, observou-se que há uma tendência de decrescimento das taxas de prevalência e da mortalidade pelas meningites no Brasil, porém a letalidade ainda se mantém estacionária, o que pode ser considerado um desafio para as autoridades sanitárias. Ademais, houve maior prevalência de casos por meningite do tipo viral, entretanto ocorreu maior mortalidade pela meningite do tipo bacteriana. Além disso, encontrou-se maior concentração dos casos nas UF das Regiões Sul e Sudeste.

Assim como revelado pela literatura científica, o estudo também encontrou maior concentração de casos de meningites no público infantil, o que pode estar relacionado às questões de desenvolvimento do sistema imunológico, incompletude do esquema vacinal e a aglomeração das crianças em instituições de ensino, o que facilita a propagação do(s) agente(s) infeccioso(s)33 Silva HCG, Mezzaroba N. Meningite no Brasil em 2015: o panorama da atualidade. ACM Arq Catarin Med 2018; 47(1): 34-46.,66 Dias FCF, Rodrigues Junior CA, Cardoso CRL, Veloso FPFS, Rosa RTAS, Figueiredo BNS. Meningite: aspectos epidemiológicos da doença na região norte do Brasil. Revista de Patologia do Tocantins 2017; 4(2): 46-9. https://doi.org/10.20873/uft.2446-6492.2017v4n2p46
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Com relação ao critério de raça/cor da pele, a literatura demonstra que a maioria dos casos é na população branca, como evidenciado neste estudo. No entanto, salienta-se que tal achado pode apresentar divergências em outras pesquisas, pois é influenciado pelas características populacionais de determinada localidade, da miscigenação da população brasileira e questões relacionadas à notificação, considerando-se que um quantitativo superior a 20% dos casos e 16% dos óbitos teve esse campo ignorado durante o preenchimento da notificação no Sinan88 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Boletim Epidemiológico 25 [Internet]. 2021 [cited on Jul 17, 2022]. Available at: https://www.gov.br/saude/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/boletins/boletins-epidemiologicos/edicoes/2021/boletim-epidemiologico-25_svs.pdf/view
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Nesta atual pesquisa, também foi constatado que a maioria dos casos de meningites recorrentes na população é do tipo viral, possivelmente em razão da facilidade de propagação do vírus no ambiente. Segundo a literatura, o tipo viral possui maior frequência e quadro clínico mais leve, no entanto a meningite bacteriana é uma afecção de elevada importância por causa da sua alta morbidade e mortalidade quando comparada às meningites virais, e aparece substancialmente no público infantil das áreas de maior vulnerabilidade econômico e social22 van de Beek D, Brouwer M, Hasbun R, Koedel U, Whitney CG, Wijdicks E. Community-acquired bacterial meningitis. Nat Rev Dis Primers 2016; 2: 16074. https://doi.org/10.1038/nrdp.2016.74
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,33 Silva HCG, Mezzaroba N. Meningite no Brasil em 2015: o panorama da atualidade. ACM Arq Catarin Med 2018; 47(1): 34-46.,2323 Nahas AK. Padrões espaço-temporais da taxa de mortalidade fetal no estado de São Paulo, Brasil, 2005-2016 [tese de doutorado]. São Paulo: Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP); 2018.,2828 Aguiar TS, Fonseca MC, Santos MC, Nicoletti GP, Alcoforado DSG, Santos SCD, et al. Perfil epidemiológico da meningite no Brasil, com base nos dados provenientes do DataSUS nos anos de 2020 e 2021. Res Soc Dev 2022; 11(3): e50811327016. http://dx.doi.org/10.33448/rsd-v11i3.27016
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O desenvolvimento e o aprimoramento de técnicas diagnósticas e a capacitação de profissionais de saúde para a detecção oportuna dos casos de meningite na população são estratégias fundamentais para que o tratamento dos indivíduos seja iniciado em tempo oportuno, aumente as chances de cura sem sequelas e diminua os óbitos pela doença2727 Matos AC, Fecury AA, Oliveira E, Dendasck CV, Dias CAGM. Número de casos confirmados de meningite no Brasil no período de 2011 a 2015. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento 2020; 5(1): 121-30. https://doi.org/10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/saude/meningite-no-brasil
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,2929 Teixeira DC, Diniz LMO, Guimarães NS, Moreira HMAS, Teixeira CC, Romanelli RMC. Fatores de risco associados aos desfechos da meningite bacteriana pediátrica: uma revisão sistemática. J Pediatr (Rio J) 2020; 96(2): 159-67. https://doi.org/10.1016/j.jped.2019.07.003
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De acordo com o boletim epidemiológico do Ministério da Saúde88 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Boletim Epidemiológico 25 [Internet]. 2021 [cited on Jul 17, 2022]. Available at: https://www.gov.br/saude/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/boletins/boletins-epidemiologicos/edicoes/2021/boletim-epidemiologico-25_svs.pdf/view
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sobre a situação da meningite pneumocócica no Brasil, após a introdução da vacinação PCV-10, a partir do ano de 2010, houve decrescimento da incidência dos casos de meningite pneumocócica no país, de 2,5 casos/100 mil hab., no ano de 2007, para 1 caso/100 mil hab., em 2015, mantendo-se estável nos anos seguintes. Isso enfatiza que a vacinação da população é a principal estratégia para a redução/controle dos casos de meningite no território brasileiro.

A análise espacial evidenciou a concentração de casos e óbitos em estados das Regiões Sul (Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul), Sudeste (São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Espírito Santo) e Centro-Oeste (Mato Grosso do Sul), possivelmente em consequência do desenvolvimento dessas regiões no aprimoramento das técnicas de vigilância em saúde para a identificação oportuna dos casos e/ou a presença de maior densidade populacional, principalmente na Região Sudeste. Isso contribui para que os agentes infecciosos se propaguem entre a população33 Silva HCG, Mezzaroba N. Meningite no Brasil em 2015: o panorama da atualidade. ACM Arq Catarin Med 2018; 47(1): 34-46.,2727 Matos AC, Fecury AA, Oliveira E, Dendasck CV, Dias CAGM. Número de casos confirmados de meningite no Brasil no período de 2011 a 2015. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento 2020; 5(1): 121-30. https://doi.org/10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/saude/meningite-no-brasil
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,3030 Rodrigues EMB, Milagres BS. Meningite: perfil epidemiológico da doença no brasil nos anos de 2007 a 2013 [Trabalho de conclusão de curso]. Brasília: Faculdade de ciências da educação e saúde do Centro Universitário de Brasília (UniCEUB); 2015..

Destaca-se a diferença entre o mapa da letalidade, os mapas da prevalência e mortalidade. Nota-se que as áreas que tiveram taxas de prevalência ou de mortalidade menores se destacaram por possuírem taxas de letalidade mais elevadas, como os estados das Regiões Norte e Nordeste. Tal achado pode estar relacionado com as dificuldades do sistema de saúde para identificar de forma oportuna os casos, a fim de evitar o desfecho negativo do óbito; a baixa cobertura vacinal, desigualdades socioeconômicas e regionais, visto que essas regiões são marcadas por histórica desigualdade socioeconômica e iniquidades em saúde1313 Neves RC, Böhm AW, Costa CS, Flores TR, Soares ALG, Wehrmeister FC. Cobertura da vacina meningocócica C nos estados e regiões do Brasil em 2012. Rev Bras Med Fam Comunidade 2016; 11(38): 1-10. https://doi.org/10.5712/rbmfc11(38)1122
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,3131 Barata RB, Pereira SM. Desigualdades sociais e cobertura vacinal na cidade de Salvador, Bahia. Rev Bras Epidemiol 2013; 16(2): 266-77. https://doi.org/10.1590/S1415-790X2013000200004
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Com relação às limitações do estudo, destaca-se a possibilidade da reprodução de vieses presentes na notificação e atualização dos casos e óbitos no Sinan, o que pode não refletir com fidedignidade o cenário epidemiológico das meningites no Brasil. Outra limitação é o percentual de notificações com campos não preenchidos ou ignorados, o que dificulta a compreensão da real situação das meningites no país.

Com o intuito de diminuir tais limitações, foram analisadas inconsistências e incompletudes no banco de dados com rigor metodológico nos procedimentos estatísticos usados, bem como apoio na literatura científica disponível acerca do tema, a fim de embasar a interpretação dos achados.

Em suma, notou-se tendência de decrescimento da prevalência e da mortalidade pela doença, mas com uma letalidade que ainda precisa ser observada com atenção, considerando-se que regiões que apresentaram menores taxas de prevalência possuíam maior letalidade, simultaneamente. Essa preocupação se dá pelo fato de a letalidade indicar o percentual de indivíduos que adoecem e evoluem para óbito por causa da meningite.

Sendo assim, torna-se imprescindível uma investigação mais aprimorada sobre a doença, o fortalecimento dos serviços e ações de saúde pública no país para identificar os casos de meningites de forma oportuna, de modo a evitar o óbito pela doença e ampliar a cobertura vacinal da população contra as doenças imunopreveníveis. Por fim, propõe-se a realização de outros estudos relacionados à temática da epidemiologia das meningites no Brasil, com análises do impacto da vacinação nos cenários dos casos e óbitos por meningites e/ou a comparação da dinâmica epidemiológica dos diferentes tipos de meningites.

  • FONTE DE FINANCIAMENTO: nenhuma.

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Disponibilidade de dados

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Jun 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    21 Ago 2023
  • Revisado
    09 Fev 2024
  • Aceito
    09 Fev 2024
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