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Influência ambiental sobre a estrutura geotermal rasa

Resumos

O presente trabalho tem como finalidade principal quantificar as variações da temperatura, condutividade térmica e do fluxo térmico terrestre, às profundidades de 0,0m e 1,0m, durante um ciclo climático completo de um ano, mostrando, também, as fontes externas principais as quais são responsáveis por essas variações geotérmicas. Verificou-se que as fontes externas principais, que interagem diretamente com a estrutura geotermal rasa são o grau de cobertura vegetal superficial e os índices de precipitação pluviométrica e insolação locais. As variações geotérmicas registradas no presente trabalho são de suma importância para o melhor entendimento da estrutura geotermal rasa. Tais valores são importantes na elaboração de modelos reais acerca dos efeitos causados pelos processos de desmatamento ou de reflorestamento na Amazônia.

Geotermia; Geotermia Ambiental; Geotermia Rasa; Temperatura; Condutividade Térmica; Fluxo Geotermal Raso


The main objective of the present work is to quantify the variations of temperature, thermal conductivity and of terrestrial heat flow to the depths of 0.0m and 1.0m, during a complete one-year climatic cycle, and also showing the main external sources which are responsible for these geothermal variations. It was verified that the main external sources, which interact directly with the shallow geothermal structure, are the degree of superficial vegetation cover and the local rain indices and insolation. The registered geothermal variations in this study are of great importance for the best knowledge of the shallow geothermal structure. Such values are important in the elaboration of real models concerning the effects caused by the processes of deforestation or reforestation in the Amazon Region.

Geotherm; Environmental Geotherm; Shallow Geothermal; Temperature; Thermal Condutctivity; Shallow Geothermal Flow


Influência ambiental sobre a estrutura geotermal rasa

Rutenio Luiz Castro de AraujoI; Roberto Matias da SilvaII; João da Silva CarvalhoIII; Ierecê Barbosa MonteiroIV

IUniversidade Federal do Amazonas (UFAM), Av. Rodrigo Octávio Jordão Ramos, 3000, Aleixo - CEP: 69.077-000 Manaus, AM. Telefax: (92) 647-4025- E-mail: ruie@ufam.edu.br

IIFundação de Tecnologia do Estado do Acre (FUNTAC), Av. das Acácias; Lote 1 - Zona A - CEP: 69.917-100 Rio Branco, AC. Telefax: (68) 229-2322- E-mail: funtac@mdnet.com.br

IIIUniversidade Federal do Amazonas (UFAM), Av. Adolfo Ducke, 230, Conjunto Acariquara, Coroado - CEP: 69.085-270 Manaus, AM. Telefone: (92) 644-2038- E-mail: jscarvalho@ufam.edu.br

IVUniversidade do Estado do Amazonas (UEA), Av. Djalma Batista, 2470, Chapada - CEP: 69.050-010 Manaus, AM. Telefax: (92) 215-2074- E-mail: imonteiro@uea.edu.br

RESUMO

O presente trabalho tem como finalidade principal quantificar as variações da temperatura, condutividade térmica e do fluxo térmico terrestre, às profundidades de 0,0m e 1,0m, durante um ciclo climático completo de um ano, mostrando, também, as fontes externas principais as quais são responsáveis por essas variações geotérmicas. Verificou-se que as fontes externas principais, que interagem diretamente com a estrutura geotermal rasa são o grau de cobertura vegetal superficial e os índices de precipitação pluviométrica e insolação locais. As variações geotérmicas registradas no presente trabalho são de suma importância para o melhor entendimento da estrutura geotermal rasa. Tais valores são importantes na elaboração de modelos reais acerca dos efeitos causados pelos processos de desmatamento ou de reflorestamento na Amazônia.

Palavras-chave: Geotermia; Geotermia Ambiental; Geotermia Rasa; Temperatura; Condutividade Térmica; Fluxo Geotermal Raso.

ABSTRACT

The main objective of the present work is to quantify the variations of temperature, thermal conductivity and of terrestrial heat flow to the depths of 0.0m and 1.0m, during a complete one-year climatic cycle, and also showing the main external sources which are responsible for these geothermal variations. It was verified that the main external sources, which interact directly with the shallow geothermal structure, are the degree of superficial vegetation cover and the local rain indices and insolation. The registered geothermal variations in this study are of great importance for the best knowledge of the shallow geothermal structure. Such values are important in the elaboration of real models concerning the effects caused by the processes of deforestation or reforestation in the Amazon Region.

Keywords: Geotherm; Environmental Geotherm; Shallow Geothermal; Temperature; Thermal Condutctivity; Shallow Geothermal Flow.

INTRODUÇÃO

Segundo Araujo (1999), geotermia rasa é a ciência que estuda a estrutura termal das camadas do solo e subsolo que são afetadas significativamente pelos efeitos do fluxo de radiação solar incidente na superfície sólida da Terra.

Atualmente, é intensamente difundido que a atividade de desmatamento na Amazônia provoca diversos distúrbios ambientais, tanto a nível local, como regional e global. Um desses principais distúrbios, sem dúvida, concerne às ampliações significativas das magnitudes das variações das temperaturas em superfície e em subsuperficie na região. No entanto, poucos são os trabalhos de pesquisa desenvolvidos localmente, sobretudo os relacionados com a geotermia rasa, que possibilite auxiliar na elaboração de um modelo global que seja plenamente aceito pela comunidade científica.

É registrado, com relativa freqüência na literatura clássica, que as perturbações térmicas, provocadas pela incidência do fluxo de radiação solar incidente na superfície terrestre, propagam-se em direção às camadas subsuperficiais sendo, no entanto, mensuravelmente atenuada com o incremento da profundidade (Astier, 1975; Beck, 1965; Bowen, 1966; Carslaw & Jaeger, 1959). Tais autores ressaltam, inclusive, que a atenuação dessa perturbação térmica é tão intensa que acarreta que a variação termal diurna é eliminada a 1,0m de profundidade, enquanto que a variação térmica sazonal atinge profundidades da ordem de 25,0 a 30,0m. No entanto, podemos ressaltar que nenhuma dessas pesquisas foi realizada em áreas características de zonas tropicais úmidas. Na região Amazônica, diversos outros trabalhos científicos registraram perturbações geotérmicas tanto diurnas quanto sazonais à profundidades superiores às citadas pelos autores acima aludidos (Araujo, 1999; Araujo, 1987; Araujo & Silva, 1982; Araujo et al., 1984; Palha et al., 1998; Serra, 2002; Serra et al., 1997).

O conhecimento da variação do fluxo geotermal, induzido pela radiação solar, nas camadas mais superficiais é de suma importância para as Geociências, pois essas profundidades constituem-se palco principal de inúmeros processos geoquímicos, principalmente intemperismo e lateritização, como também, processos geofísicos, tais como mudanças nos valores da condutividade térmica e da difusividade térmica do material existente na zona de aeração. A importância da definição de que as variações diurnas da temperatura subsuperficial podem ou não ser consideradas desprezíveis à profundidade de 1,0m se estende, na verdade, além das fronteiras de atuação das Geociências, pois abrangem profundidades de real interesse para as ciências biológicas, ambientais, florestais, agronômicas etc. Tais profundidades constituem-se, ainda, em cenário fundamental para a biosfera, portanto, abrange, também, as ciências sociais.

Para se ter um melhor entendimento sobre o regime geotermal raso, suas magnitudes, variações, efeitos e, principalmente, o comportamento da temperatura, torna-se necessário a realização de estudos que considerem as possíveis fontes externas e internas que influenciam diretamente os parâmetros envolvidos, principalmente no que concerne às constantes variações da temperatura e da condutividade térmica, conseqüentemente, do fluxo geotérmico.

Na Amazônia, a influência dessas fontes sobre o regime geotermal raso, principalmente o fluxo de radiação solar incidente e o regime pluviométrico sazonal, proporcionam uma considerável amplitude na variação da temperatura e da condutividade térmica nas camadas rasas, as quais, embora decaiam com a profundidade, são mensuráveis até profundidades da ordem de 250m (Serra, 2002). Um outro fator importante para o entendimento dos impactos ambientais antropogênicos na Amazônia são os efeitos do desmatamento nos regimes térmicos dos solos e na interação destes com a baixa atmosfera (Araujo, 1999).

Pelo acima exposto, torna-se de efetiva importância científica a determinação da magnitude das variações geotérmicas diurnas e sazonais causadas pela perturbação térmica derivada da incidência do fluxo de radiação solar na superfície terrestre.

MATERIAIS E MÉTODOS

Os trabalhos de pesquisa foram desenvolvidos na região de Manaus, mais precisamente no mini-campus da Universidade Federal do Amazonas e na AM- 240, km 68, próximo a vila de Balbina, figura 1. Em ambas as regiões foram feitas pesquisas em dois locais distintos, porém contíguos, sendo um sem cobertura vegetal (s/c - vegetação composta por gramas e arbustos) e outro com cobertura vegetal (c/c - vegetação composta por árvores de médio e grande porte). Para a região do mini-campus da Universidade Federal do Amazonas, as pesquisas foram realizadas durante um ciclo climático completo, referente ao ano de 2000. As medidas de temperatura foram realizadas nos horários das 08h, 14h e 17h. Na região da AM-240, km 68, foi realizado um monitoramento geotérmico de 29 horas consecutivas, em intervalos de 1h, no período das 7:00h do dia 15 às 12:00h do dia 16 de maio de 2003. As medidas de temperatura foram feitas em superfície e a 1,0m de profundidade.


As medidas de temperatura superficial, em ambas as regiões e locais, foram realizadas com o emprego de um termômetro digital de termopar. A precisão dessas medidas foi de ±0,01ºC. As medidas de temperatura a 0,5 e 1,0m de profundidade foram realizadas utilizando-se um termômetro de termistor. A leitura da resistência elétrica do termistor foi obtida com o auxílio de uma ponte resistiva, tipo Wheatstone, com precisão de ±2,0W e resolução de ±0,5W. Os termistores foram previamente calibrados, usando-se um termômetro padrão de platina, com precisão de ±0,005ºC, da seguinte maneira: ambos os termômetros foram imersos em um banho térmico de precisão de ±0,01ºC, com temperatura regulável, e as resistências elétricas do termistor, às diferentes temperaturas, foram medidas usando-se a mesma ponte resistiva supra mencionada. Dessa forma, foi possível a elaboração de uma curva de calibração que permitiu a conversão dos valores medidos da resistência elétrica do termistor em valores precisos de temperatura. As variações da temperatura foram registradas com precisão de ±0,01ºC.

As medidas de condutividade térmica foram realizadas via método transiente de calor, utilizando-se para isso o aparato tipo agulha. Este aparato é idêntico aos já descritos por Von Herzen & Maxwell (1959), Smith (1973) e Araujo (1999).

Para se efetuar as medidas de condutividade térmica, a agulha é inserida na amostra a ser analisada e após ter sido atingido o equilíbrio térmico do sistema (amostra-agulha) é ligado a fonte de corrente contínua. Isto provoca o aquecimento da sonda cuja temperatura, registrada pelo termistor, varia com o tempo, segundo a relação de Carslaw & Jaeger (1959).

Onde: Ts - Temperatura da sonda; t - Tempo; Qs - Fluxo de calor, por unidade de comprimento, produzido dentro da agulha pelo fio aquecedor; l - Condutividade térmica da amostra analisada; C - Constante.

O gráfico dos valores registrados de Ts em função de ln(t) resulta em uma relação linear cujo coeficiente angular é dado por:

Desta forma, desde que o valor de Qs seja conhecido, a condutividade térmica da amostra analisada pode ser determinada pela equação (2).

O sistema do aparato tipo agulha utilizado no trabalho tem as seguintes características:

R = 361W; Vcc = 15V; L = 6,3cm.

Sendo que R - resistência do fio aquecedor; Vcc - diferença de potencial aplicada entre os terminais do fio aquecedor e L - comprimento da agulha.

Em função dos parâmetros indicados, temos então que o valor de Qs para o trabalho em epígrafe é de: Qs = 9,89W/m.

Todos os resultados das condutividades térmicas medidas foram obtidos com erro inferior a 3%.

Os dados meteorológicos, precipitação pluviométrica, insolação e evaporação, foram obtidos junto ao 1º Distrito de Meteorologia do Instituto Nacional de Meteorologia-INMET, na estação meteorológica localizada no Pólo Industrial de Manaus.

A figura 2 mostra os resultados obtidos dos parâmetros precipitação pluviométrica e insolação, na região de Manaus, relativos a todo o ano de 2000.


Em base na figura 2, para fins de análises, principalmente no que concerne a influência das fontes externas sobre o regime geotermal raso, consideramos o mês de abril/2000 como sendo o mês representativo do período de maior precipitação pluviométrica, enquanto que o mês de outubro/2000 foi escolhido como sendo representativo do período de menor precipitação pluviométrica.

Fonte das influências externas sobre o regime geotermal raso

Para se ter um melhor entendimento acerca da estrutura geotermal rasa é de fundamental importância a execução de estudos atinentes à influência das fontes externas, principalmente no que concerne ao nível de cobertura vegetal, precipitação pluviométrica e insolação em uma determinada região.

Na figura 3 observa-se uma boa relação entre as configurações das curvas representativas dos valores da temperatura (para os locais s/c e c/c), com relação à curva referente à insolação. No mês de abril a somatória mensal da insolação teve o valor de 50,9h. A boa relação das variações dos parâmetros temperatura superficial e insolação caracteriza a insolação como uma eficiente e fundamental fonte externa a qual influencia, preponderantemente, os valores da temperatura às profundidades palco dos estudos da geotermia rasa. A figura 3 mostra, também, os valores mais altos da temperatura superficial registrados no local sem cobertura vegetal, em relação aos valores obtidos deste parâmetro, correspondentes ao local com cobertura vegetal. Neste mês de abril o valor médio mensal da temperatura superficial no local s/c foi de 31,13ºC, enquanto que no local c/c registrou-se o valor médio de 25,61ºC. Existe, então, uma diferença, entre as duas médias citadas, de 5,52ºC. Face ao fato de que os dois locais estarem contíguos e apresentarem litologias iguais (97% de areia), podemos concluir que a elevada variação nos valores médios mensais da temperatura superficial deve-se, também, à diferença do grau de influência da cobertura vegetal. Assim sendo, mensurando tal influência torna-se possível determinar a importância crucial da cobertura vegetal superficial sobre a estrutura geotermal rasa.


O comportamento dos dados contidos na figura 4 permite a realização de uma análise similar à observada na figura 3, ou seja, os valores da temperatura superficial correspondentes ao local sem cobertura vegetal são mais altos, em relação aos valores da temperatura superficial registrados no local com cobertura vegetal. Como o valor mensal da insolação atinente ao mês de outubro é mensuravelmente maior do que o valor registrado no mês de abril (205,2h e 50,9h, respectivamente), as magnitudes dos valores da temperatura superficial medidos no mês de outubro são superiores aos valores obtidos no mês de abril. Para o mês de outubro, a temperatura média mensal no local s/c foi de 32,68ºC, enquanto que no local c/c foi de 28,81ºC. Registrando-se uma variação dos valores médios mensais de temperatura superficial, da ordem de 3,87ºC. Também, de maneira similar à figura 3, verifica-se a existência de uma boa relação entre as variações térmicas registradas e os valores da insolação.


Para efeito de comprobação da influência do fluxo de radiação solar que incide na superfície terrestre, como um agente externo atuante sobre o regime geotermal raso, apresentamos as figuras 5 e 6. A figura 5 apresenta os valores da temperatura média mensal e da insolação para o ano de 2000, às 14:00h, em superfície, nos locais sem e com cobertura vegetal, enquanto que a figura 6 apresenta os mesmos parâmetros da figura 5, sendo que para 1,0m de profundidade.



A fim de ratificarmos que existe influência direta das fontes externas sobre a estrutura geotermal rasa, apresentamos as figuras de 7 a 12, onde se evidencia a importância que exerce a precipitação pluviométrica sobre o comportamento da temperatura em superfície e em subsuperfície. Para tanto, usaremos na presente análise os meses representativos de cada período. A precipitação pluviométrica total no mês de abril foi de 535,4mm, enquanto que para o mês de outubro foi de 47,2mm. Também utilizaremos, para análise, o ciclo climático completo, referente ao ano de 2000.







A figura 7 apresenta os valores diários da temperatura superficial e da precipitação pluviométrica referentes ao mês de abril, no horário das 17:00h, para os locais s/c e c/c. A figura 8 apresenta os resultados dos mesmos parâmetros e horários registrados na figura 7, para o mês de outubro. A figura 9 mostra os valores diários da temperatura a 1,0m de profundidade e os de precipitação pluviométrica atinentes ao mês de abril, no horário das 17h, para os locais s/c e c/c; enquanto que a figura 10 mostra os valores medidos dos mesmos parâmetros e horário assinalados na figura 9 relativos ao mês de outubro. A figura 11 mostra os valores médios mensais da temperatura superficial às 17:00h e da precipitação pluviométrica, nos locais sem e com cobertura vegetal, enquanto que a figura 12 mostra os mesmos parâmetros da figura 11 obtidos a 1,0m de profundidade.

A análise das figuras de 3 a 12 mostra que as variações diárias das temperaturas referentes aos dois meses analisados em detalhe são compatíveis com as variações observadas ao longo de todo o período de um ano, independente das profundidades e locais estudados. Isto comprova que as variações geotermais rasas aqui registradas não são características de um horário especial, mas válidas para um ciclo climático completo. Esta característica é explicada face ao fato de serem as mesmas fontes as causadoras das variações geotermais registradas. Portanto, dependendo das mudanças das fontes externas haverá variações com magnitudes diferenciadas no regime geotermal raso.











Variação temporal da condutividade térmica

No presente trabalho, as medidas de condutividade térmica foram todas realizadas utilizando-se o método transiente de calor, via aparato tipo agulha. Tal procedimento foi similar aos adotados por Araujo (1999) e Araujo et al. (1995).

As amostras foram coletadas no mesmo local onde foi realizado o monitoramento geotermal raso, no campus da Universidade Federal do Amazonas (ver figura 1). A amostragem ocorreu durante o período dos meses de janeiro a dezembro, do ano de 2000, sempre no último dia útil de cada mês. Todas as amostras apresentaram cerca de 97% de areia. A profundidade de amostragem foi de 1,0m, efetuada com o uso de um trado manual.

A fim de minimizar o processo de perda de umidade das amostras em apreço, logo após as mesmas serem obtidas eram transportadas para o laboratório apropriado e realizadas as medidas de condutividade térmica. O intervalo de tempo entre a coleta da amostra e a realização das medidas de condutividade térmica foi inferior a vinte minutos. Com a finalidade de minimizar o erro de medida, foram efetuadas quatro medidas, sucessivas, de condutividade térmica em cada amostra. O valor citado no presente trabalho representa a média aritmética dessas quatro medidas. O erro registrado foi menor que 3%.

A medida da porcentagem de água contida nas amostras, também obedecem aos procedimentos adotados por Araujo (1999) e Araujo et al. (1995). Logo após a quarta medida de condutividade térmica, a amostra era pesada em balança digital, com precisão de ±0,01g e, a seguir, inserida a uma estufa a uma temperatura de 100ºC. A amostra ali permanecia por um período de 24h. Após a sua retirada e esfriamento em recipiente hermeticamente fechado, a amostra era novamente pesada e, então, das diferenças de massas, obteve-se a porcentagem de água contida na mesma.

A figura 13 mostra os valores da condutividade térmica e da quantidade de água existente das amostras analisadas. Nota-se nitidamente nesta figura, que quanto maior o percentual de água contido na amostra, maior o valor de sua condutividade térmica. Portanto, as variações observadas dos valores de condutividade térmica proporcionam uma ótima relação direta com a quantidade de água existente nas amostras. Os resultados mostrados na figura 13 são perfeitamente explicados face ao fato de que, quanto maior a porcentagem de água contida na amostra, maior será o valor da condutividade térmica, uma vez que a água apresenta um valor de condutividade térmica mais de vinte vezes superior ao valor deste parâmetro físico referente ao ar (Holman, 1983), conseqüentemente, a substituição de um destes fluidos pelo outro altera, significativamente, o valor resultante da condutividade térmica da amostra em análise.


A figura 14 mostra, claramente, que existe uma eficiente relação direta entre a quantidade de água presente nas amostras e a precipitação pluviométrica local. Por outro lado, existe também uma eficiente relação inversa entre a quantidade de água e a evaporação local, o que fica evidenciado, através da análise da figura 15.



Nota-se, também, ao analisar os dados contidos na figura 14, que os valores da condutividade térmica, referentes ao período de maior precipitação pluviométrica são mais altos em relação ao período de menor precipitação pluviométrica. Na figura 14 percebe-se que as variações do índice de precipitação pluviométrica são responsáveis pelas flutuações na quantidade de água presente nos materiais encontrados à profundidade amostrada. O valor da condutividade térmica da amostra analisada para o mês de abril, que é o mês representativo do período de maior precipitação pluviométrica na região é de 2,72W/mºC, enquanto que o valor deste parâmetro, para a amostra analisada no mês de outubro, que é o mês representativo do período de menor precipitação pluviométrica é de 2,31W/mºC, registrando, assim, uma variação de condutividade térmica de 0,41W/mºC, entre os períodos climáticos da região. Por conseguinte, fica nitidamente caracterizado que a precipitação pluviométrica e a evaporação local constituem-se em fontes externas que provocam variações mensuráveis nos valores de condutividade térmica dos materiais situados na zona de aeração do local estudado.

Pelo acima descrito, podemos concluir que às profundidades onde há flutuação do nível freático há, ao longo de um ciclo climático, mudanças mensuráveis dos valores de condutividade térmica dos materiais ali existentes. Portanto, o valor de condutividade térmica dos materiais situados na zona de aeração é nitidamente influenciado por fontes externas, tais como precipitação pluviométrica, insolação e evaporação. Conseqüentemente, o cálculo do fluxo geotermal raso pode conter erros superiores a 30%, caso o valor de condutividade térmica não seja obtido diretamente de medida em amostra local. Os valores de condutividade térmica registrados na literatura, concernentes a zona de aeração, podem, portanto, não estarem representando o valor verdadeiro do período no qual se determinou o gradiente geotérmico raso. Para tanto, basta que as duas medidas citadas tenham sido efetuadas em estações climáticas diferentes, para que o cálculo do fluxo geotermal raso contenha erro. Ratificamos, portanto, a sugestão de que, o uso do valor da condutividade térmica, para o cálculo do fluxo geotermal raso, tem que ser oriundo de medidas diretas e não de valores referenciais publicados.

Variação do Fluxo Geotermal Raso a 1,0m de Profundidade

Os quadros 1 e 2 apresentam os valores do fluxo geotermal raso a 1,0m de profundidade, nos locais sem e com cobertura vegetal, respectivamente.



Nos quadros 1 e 2 estão registrados os valores representativos para cada mês do ano de 2000, às 14h, da condutividade térmica, do conteúdo de água de cada amostra analisada, da variação de temperatura, do gradiente de temperatura e do fluxo geotermal entre a superfície e 1,0m de profundidade.

A figura 16 apresenta os resultados dos valores do fluxo geotermal raso, à profundidade de 1,0m, para os locais sem e com cobertura vegetal.


Os valores, mínimo e máximo do fluxo geotermal a 1,0m de profundidade, para o ano de 2000, às 14h, no local sem cobertura vegetal, foram de 8,75 e de 26,24W/m2, respectivamente. Segundo Souza et al. (1989) o fluxo de radiação solar incidente na superfície terrestre, na região amazônica, é de cerca 180W/m2, conseqüentemente, esses valores, em termos absolutos, representam cerca de 4,86 a 14,58% deste total. A variação entre os valores mínimo e máximo do fluxo geotermal para o local sem cobertura vegetal foi de 17,49W/m2, o que representa 9,72% do fluxo de radiação solar incidente na superfície terrestre. Já para o local com cobertura vegetal, os valores deste mesmo parâmetro físico foram de 2,68 e de 11,49W/m2, respectivamente, o que pode-se concluir que esses valores representam, em termos absolutos, 1,49 a 6,38% do valor da radiação solar incidente na superfície terrestre da região estudada. A variação do fluxo geotermal, entre os valores mínimo e máximo para o local com cobertura vegetal foi de 8,81W/m2, o que representa, em termos absolutos 4,89%, do total do fluxo de radiação solar incidente na superfície terrestre local.

O valor médio do fluxo geotermal no local sem cobertura vegetal foi de 16,08 ±4,76W/m2 e, no local com cobertura vegetal, foi de 7,54 ±3,21W/m2, registrando, assim, uma variação em torno de 8,54W/m2, o que representa, em termos absolutos, 4,7% do fluxo de radiação solar incidente.

Os valores do fluxo geotermal raso obtidos são extremamente elevados, se comparados com o valor médio do fluxo geotermal profundo, que segundo Araujo (1999), para um local próximo ao estudado no presente trabalho, é de 44,91 × 10-3W/m2. Desta forma, as variações do fluxo geotermal a 1,0m de profundidade não podem ser desprezíveis, e nem tão pouco serem explicadas como mudanças normais exclusivamente do fluxo de calor proveniente do interior da Terra. Tais variações são decorrentes do fato de que uma das influências mais proeminentes sobre o fluxo geotermal raso é o fluxo de radiação solar incidente na superfície terrestre local, devido a elevada quantidade de energia atuante (Araujo, 1999; Araujo, 1987). Conforme Smith (1973), o fluxo de radiação solar incidente na superfície terrestre é em torno de 104 vezes maior que a quantidade de energia do fluxo geotermal profundo.

Na figura 16 verifica-se que o fluxo de calor a 1,0m de profundidade, apresenta dois períodos bem característicos, períodos esses que são melhores observados para o local com cobertura vegetal. Verifica-se que no intervalo entre os meses de janeiro a junho, registra-se um período com menor fluxo de calor, enquanto que no intervalo entre os meses de julho a dezembro, um período com maior fluxo de calor. Já para o local sem cobertura vegetal, os valores de fluxo de calor são sensivelmente superiores aos do local com cobertura vegetal, isto ocorre em função dos valores do gradiente de temperatura serem superiores aos encontrados no local com cobertura vegetal.

CONCLUSÕES

Os quadros 3 e 4 apresentam os valores médios mensais das temperaturas superficial e a 1,0m de profundidade, nos locais sem e com cobertura vegetal, respectivamente, nos horários das 14h e 17h. No período estudado, o valor médio anual local da precipitação pluviométrica foi de 216,63 ± 150,69mm, o da evaporação foi de 59,25 ± 14,80mm e o da insolação foi de 148,23 ± 60,71h.



Há superioridade dos valores diurnos e das médias mensais da temperatura, tanto em superfície como a 1,0m de profundidade, do local sem cobertura vegetal em relação a outro local com cobertura vegetal.

Em ambos os períodos e locais estudados ocorrem variações mensuráveis nos valores da temperatura, tanto em superfície como a 1,0m de profundidade.

São mensuráveis as variações diurnas da temperatura a 1,0m de profundidade, as quais são sensivelmente dependentes das mudanças térmicas superficiais. Tal comportamento é extensivo a todo o ciclo de um ano e seus valores não podem ser considerados como negligenciáveis.

Para a região da estrada AM-240, km 68, durante o monitoramento realizado com período de 29 horas, a temperatura média superficial, no local com cobertura vegetal foi de 27,23 ± 2,56ºC e de 30,56 ± 5,06ºC para o local sem cobertura vegetal; obteve-se assim, uma variação na temperatura de 3,33ºC. A 1,0m de profundidade, a temperatura média foi de 27,55 ± 1,28ºC para o local com cobertura vegetal e de 29,36 ± 1,71ºC para o local sem cobertura vegetal, o que resulta em uma variação na temperatura média para o período de 1,81ºC.

Há um boa relação entre as variações dos parâmetros temperatura, tanto superficial quanto à 1,0m de profundidade, com as mudanças nos índices de precipitação pluviométrica, insolação e evaporação.

Na área estudada, em um ciclo de duração de um ano, os valores da condutividade térmica, referentes ao material amostrado na zona de aeração, apresentaram variações que oscilam de 2,27W/mºC a 2,71W/mºC, com valor médio de 2,49 ±0,16 W/mºC.

Existe uma relação direta entre os parâmetros condutividade térmica e conteúdo de água presente na amostra analisada. A condutividade térmica do material presente na zona de aeração é influenciada por fatores externos e mutáveis, sendo de fundamental importância os parâmetros precipitação pluviométrica e evaporação local.

Em trabalhos de Geotermia Rasa não é aconselhável o uso de resultados de condutividade térmica publicado em literatura.

Na região estudada, no local com cobertura vegetal, durante um ciclo climático de um ano, o fluxo geotermal raso, à 1,0m de profundidade, variou de 2,68W/m2 a 11,49W/m2, com valor médio de 7,54 ± 3,21W/m2, o que corresponde a cerca de 1,49% a 6,38% do fluxo de radiação solar incidente na superfície terrestre local. No local sem cobertura vegetal, este parâmetro variou de 8,75W/m2 a 26,24W/m2, com valor médio de 16,08 ± 4,76W/m2, o que corresponde a cerca de 4,48% a 14,58% do fluxo de radiação solar incidente na superfície terrestre local. Essas mudanças não podem, em hipótese alguma plausível, serem associadas a qualquer mudança do fluxo geotérmico profundo.

AGRADECIMENTOS

Externamos nossos sinceros agradecimentos à Universidade Federal do Amazonas, à Universidade do Estado do Amazonas e à Fundação de Tecnologia do Estado do Acre por permitirem aos autores dedicação à pesquisa.

Ao Instituto Nacional de Meteorologia, 1º Distrito de Meteorologia, pelo fornecimento dos dados de precipitação pluviométrica e insolação.

À Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado do Amazonas pelo fomento a esta pesquisa.

A todos que de maneira direta ou indireta contribuíram para a realização deste trabalho.

Recebido em 12 fevereiro, 2004 / Aceito em 03 agosto, 2004

Received February 12, 2004 / Accepted August 03, 2004

NOTAS SOBRE OS AUTORES

Rutenio Luiz Castro de Araújo. Graduado em Física pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, em 1973. Mestre em Geofísica pela Universidade de São Paulo, em 1978 e Doutor em Geofísica pela Universidade Federal do Pará, em 1987. Atualmente é Professor Titular da Universidade Federal do Amazonas, onde exerce a função de docente e de pesquisador desde o ano de 1980, tendo exercido várias funções administrativas, como Chefe de Departamento Acadêmico e Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação. Atua na área de Geofísica Aplicada, principalmente em Geofísica Ambiental, com ênfase na região Amazônica.

Roberto Matias da Silva. Em 1983, bacharelou-se em Geologia pela Universidade Federal do Amazonas. Em 2003, concluiu Mestrado em Geofísica, especialidade Geotermia Ambiental, pela mesma instituição. De 1983 a 1991, atuou como Geólogo, na Mineração Oriente Novo, em Rondônia, exploração de cassiterita, onde foi Gerente de mina. Desde 1991 atua como pesquisador da Fundação de Tecnologia do Estado do Acre (FUNTAC), onde foi Diretor Técnico e de Produção, no período de 10/01/1992 a 31/12/1994, e Presidente, no período de 02/02/1995 a 15/04/1998. Atualmente exerce a função de pesquisador II.

João da Silva Carvalho. Graduado em Geologia pela Universidade Federal do Amazonas e Mestre em Geofísica pela Universidade Federal do Pará. Está, desde 1982, vinculado à Universidade Federal do Amazonas, onde exerce atividades de ensino, pesquisa e extensão. Desenvolve atividades na área de Geofísica Aplicada e cartografia geológica.

Ierecê Barbosa Monteiro. Licenciada em Pedagogia pela Universidade Federal do Pará (UFPA). Bacharel em Comunicação Social (Jornalismo e Relações Públicas) pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM). Mestre em Educação (UFAM) e Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Exerceu vários cargos administrativos, tais como: Coordenadora do Curso de Comunicação Social (UFAM) Chefe de Departamento (UFAM), Assessora de Comunicação Social (UFAM) e Pró-Reitora de Ensino de Graduação (UFAM). Atualmente é professora da Universidade do Estado do Amazonas (UEA). Tem como áreas de atuação profissional a educação, a comunicação e estudos ambientais.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Mar 2007
  • Data do Fascículo
    Abr 2004

Histórico

  • Aceito
    03 Ago 2004
  • Recebido
    12 Fev 2004
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