Acessibilidade / Reportar erro

Anomalias dentárias na dentição decídua de pacientes com fissuras orais não sindrômicas

Resumo

Objetivos:

investigar a prevalência de anomalias dentárias na dentição decídua completa de crianças com FL/PNS.

Métodos:

este estudo incluiu 75 crianças com FL/PNS e 286 controles saudáveis. Em ambos os grupos as crianças tinham dentição decídua com idade variando de 4 a 6 anos. Exame clínico, radiografias panorâmicas e periapicais foram realizadas e anomalias dentárias de número e forma foram consideradas.

Resultados:

houve maior prevalência de anomalias dentárias no grupo caso, comparado ao grupo controle. Ao todo 42 anomalias dentárias foram identificadas, 25,33% no grupo caso e 8,04% no grupo controle (p<0,001). Houve maior frequência de anomalias dentárias na FL/PNS (47,36%), seguida da fissura labial não sindrômica (31,57%) e da fissura palatina não sindrômica (21,05%). A ocorrência de agenesia (p= 0,005) e geminação (p=0,029) foram maiores no grupo caso.

Conclusão:

a ocorrência de agenesia e geminação dentária foram mais frequentes no grupo caso e pode contribuir para a definição de subfenótipos de fissuras orais.

Palavras-chave:
Fissura labial; Fissura palatina; Anormalidades dentárias; Dentição primária; Agenesia dos dentes; Geminação dental

Abstract

Objectives:

to investigate the prevalence of dental anomalies in complete deciduous dentition of children with NSCL/P.

Methods:

this study included 75 children with NSCL/P and 286 healthy control. In both groups the children had deciduous dentition with ages varying from 4 to 6 years. Clinical examination, panoramic and periapical radiographies were performed and dental anomalies of number and shape were considered.

Results:

there was a higher prevalence of dental anomalies in the case group, compared to the control group. In all, 42 dental anomalies were identified, 25.33% in the case group and 8.04% in control group (p<0.001). Therewas a higher frequency of dental anomalies in NSCL/P (47.36%), followed by non-syndromic cleft lip (31.57%) and non-syndromic cleft palate (21.05%). The occurrence of agenesis (p= 0.005) and twinning (p = 0.029) were higher in the case group.

Conclusions:

the occurrence of agenesis and dental twinning was more frequent in the case group and may contribute to the definition of oral cleft subphenotype.

Key words:
Cleft lip; Cleft palate; Dental abnormalities; Primary dentition; Teeth agenesis; Dental twinning

Introdução

As fissuras orais são os defeitos congênitos orofaciais mais comuns, ocorrendo em 1 em 500-2.500 nascidos vivos no mundo.11 Dixon MJ, Marazita ML, Beaty TH, Murray JC. Cleft lip and palate: understanding genetic and environmental influences. Nat Rev Genet. 2011; 12 (3): 167-78. No Brasil, a prevalência varia de 0,36 a 1,54 por 1.000 nascidos vivos.22 Martelli-Junior H, Porto LV, Martelli DR, Bonan PR, Freitas AB, Della Coletta R. Prevalence of nonsyndromic oral clefts in a reference hospital in the state of Minas Gerais, Brazil, between 2000-2005. Braz Oral Res. 2007; 21(4):314-7.,33 Rodrigues K, Sena MF, Roncalli AG, Ferreira MA. Prevalence of orofacial clefts and social factors in Brazil. Braz Oral Res. 2009; 23 (1): 38-42. Cerca de 70% dos casos ocorrem como uma forma não sindrômica [fissura labial não sindrômica e/ou fissura palatina (FL/PNS)], e os 30% restantes estão associados a distúrbios mendelianos ou condições cromossômicas, teratogênicas e esporádicas.4 Com base nas características epidemiológicas e no tempo embriológico, as FL/PNS são tradicionalmente divididas em fissura labial (FLNS), fissura labial e fissura palatina (FL/PNS) e fissura palatina (FPNS).55 Machado RA, Freitas EM, Aquino SN, Martelli DRB, Swerts MSO, Reis SR, Persuhn DC, Moreira HS, Dias VO, Coletta RD, Martelli Júnior H. Clinical relevance of breast and gastric cancer-associated polymorphisms as potential susceptibility markers for oral clefts in the Brazilian population. BMC Med Genet. 2017; 4 (1): 1-6. A etiologia das FL/PNS é atribuída a uma interação de fatores genéticos e ambientais, mas as interações exatas são pouco conhecidas.11 Dixon MJ, Marazita ML, Beaty TH, Murray JC. Cleft lip and palate: understanding genetic and environmental influences. Nat Rev Genet. 2011; 12 (3): 167-78.

Estudos propuseram que as anomalias dentárias poderiam servir como marcadores clínicos para a definição de subfenótipos de fissura, sugerindo um fundo genético comum entre essas condições.66 Letra A, Menezes R, Granjeiro JM, Vieira AR. Defining subphenotypes for oral clefts based on dental development. J Dent Res. 2007; 86 (10): 986-91. A favor dessa hipótese é que o desenvolvimento dentário, labial e palatino ocorre quase que concomitantemente e está relacionado anatomicamente.77 Paranaíba LMR, Coletta RD, Swerts MSO. Quintino RP, Barros LM, Martelli-Júnior H. Prevalence of dental anomalies in patients with nonsyndromic cleft lip and/or palate in a Brazilian population. Cleft Palate-Craniofac J. 2013; 50(4):400-5.,88 Schutte BC, Murray JC. The many faces and factors of orofacial clefts. Hum Mol Genet. 1999; 89 (10): 1853-9.

Quando comparadas com a população geral, anomalias dentárias, tais como agenesia dentária, dente supranumerário, microdontia, dente fundido, erupção ectópica, giroversão, taurodontismo e hipoplasia do esmalte, são consideravelmente mais prevalentes em indivíduos com FPNS.66 Letra A, Menezes R, Granjeiro JM, Vieira AR. Defining subphenotypes for oral clefts based on dental development. J Dent Res. 2007; 86 (10): 986-91.,77 Paranaíba LMR, Coletta RD, Swerts MSO. Quintino RP, Barros LM, Martelli-Júnior H. Prevalence of dental anomalies in patients with nonsyndromic cleft lip and/or palate in a Brazilian population. Cleft Palate-Craniofac J. 2013; 50(4):400-5.,99 Melo Filho MR, Dias VO, Martelli DRB, Paranaíba LMR, Swerts MSO, Barros LM. Tooth malposition in patients with cleft lip and/or palate in a Brazilian population. Dentistry. 3000. 2015; 3 (6): 1-6.,1010 Mangione F, Nguyen L, Foumou N, Bocquet E, Dursun E. Cleft palate with/without cleft lip in French children: radiographic evaluation of prevalence, location and coexistence of dental anomalies inside and outside cleft region. Clin Oral Investig. 2017; 22 (2): 689-95.,1111 Kuchler E, Motta L, Vieira A, Granjeiro J. Side of dental anomalies and taurodontism as potential clinical markers for cleft subphenotypes. Cleft Palate-Craniofac J. 2011; 48 (1):103-8. Curiosamente, poucos estudos têm investigado a frequência de anomalias dentárias na dentição primária de pacientes com FL/PNS.1212 Pegelow M, Alqadi N, Karsten A. The prevalence of various dental characteristics in the primary and mixed dentition in patients born with non-syndromic unilateral cleft lip with or without cleft palate. Eur. J. Orthod. 2012; 3(34):561-570.,1313 Sæle P, Østhus E2, Ådalen S, Nasir EF, Mustafa M. Pattern of clefts and dental anomalies in six-year-old children: a retrospective observational study in western Norway. Acta Odontol Scand. 2017; 75 (2): 100-5.

Assim, o objetivo do presente estudo foi investigar a prevalência de anomalias dentárias na dentição primária completa em um grupo de crianças brasileiras com FL/PNS.

Métodos

Este estudo transversal, observacional, de caso-controle incluiu 75 crianças com FL/PNS (grupo de casos) e 286 no grupo de controle saudável. Todos os casos foram recrutados no Centro de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais de Minas Gerais, Brasil, e o controle foi obtido aleatoriamente na Clínica Odontopediatrica da Universidade. Os pacientes foram recrutados durante 2016 e até 2017 e, em ambos os grupos, as crianças tinham completado a dentição primária com idade variando de 4 a 6 anos. Todos os pacientes com FL/PNS foram cuidadosamente avaliados por especialistas do Centro de Reabilitação. Em ambos os grupos de estudo, os sujeitos foram selecionados por conveniência de todos os pacientes atendidos no Centro, entre 2016 e 2017. O grupo controle foi composto por indivíduos saudáveis, sem doenças físicas, psiquiátricos, defeitos congênitos ou com histórico familiar de fissuras orofaciais. Todos os sujeitos eram de Minas Gerais, Brasil, onde há uma população miscigenada de europeus (principalmente de Portugal e Itália) e africanos, com uma pequena porcentagem de índios brasileiros nativos.1414 Aquino SN, Messetti AC, Bagordakis E, Martelli Júnior H, Swerts MSO, Graner E, Coletta RD. Polymorphisms in FGF12, VCL, CX43 and VAX1 in Brazilian patients with nonsyndromic cleft lip with or without cleft palate. BMC Med Genet. 2013; 2 (14): 53-7. Todos os pacientes apresentavam etnias e cultura social similares e foram atendidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS) brasileiro.

As fissuras orais foram categorizadas em três grupos, tendo como referência o forame incisivo: Fissuras Lábiais (FLNS): inclui fissuras pré-forame completas ou incompletas, sejam unilaterais ou bilaterais; Fissuras Lábio-Palatino (FL/PNS): inclui fissurastransforame unilaterais ou bilaterais; Fissuras Palatinas (FPNS): inclui todas as fissuras pós-forame, completas ou incompletas.1515 Spina V, Psillakis JM, Lapa FS, Ferreira MC. Classification of cleft lip and cleft palate. Suggested changes. Rev Hosp Clin Fac Med São Paulo. 1972; 27 (1): 5-6.

Para ambos os grupos, foram realizados exame clínico e radiografias panorâmica e periapicais. Apenas anomalias dentárias de forma dentária (fusão, geminação, taurodontia, densinvaginatus, densevaginatus, dilaceração, microdontia, macrodontia, terceira raiz e dente conidial) e número (agenesia e dentes supranumerários) consideradas nesse estudo, e apenas aquelas fora da área de fissuras de fissuras foram incluídas. A classificação das anomalias dentárias foi realizada conforme descrito anteriormente. A fim de eliminar diferenças entre os examinadores, as anomalias dentárias foram classificadas por um único examinador (ABFT).

As informações coletadas foram armazenadas em um banco de dados e analisadas através do programa estatístico SPSS® versão 19.0 (Statistical Package for Social Sciences for Windows, Inc., EUA). As comparações foram avaliadas por meio da tabulação cruzada do teste do qui-quadrado, e a significância estatística foi fixada em p<0,05. Os odds ratios (OR) foram estimados com um intervalo de confiança de 95%.

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade (#1.612.095). O consentimento livre e esclarecido por escrito foi obtido dos pais ou responsáveis e/ou dos participantes.

Resultados

Dos 361 sujeitos incluídos neste estudo, 180 eram homens e 181 eram mulheres. No grupo dos casos (n=75), 43 eram homens e 32 mulheres, enquanto no grupo controle (n=286), 137 eram homens e 149 eram mulheres. Dos 75 pacientes com fissuras orais, a maioria (n=38; 50,66%) foi acometida por FL/PNS, seguida por FPNS (n=20; 26,66%) e FLNS (n=17; 22,66%). Houve uma proporção maior de casos (9,33%) com história familiar de FL/PNS em comparação com o controle (1,39%) (p=0,002).

Trinta e nove (10,80%) pacientes de ambos os grupos apresentaram anomalias dentárias, sendo que 16 pacientes (21,33%) pertenciam ao grupo caso, e 23 (8,04%) ao grupo controle. A Tabela 1 apresenta os tipos de anomalias dentárias distribuídas em ambos os grupos. Ao todo, foram identificadas 42 anomalias dentárias, sendo 25,33% (n=19) no grupo caso e 8,04% (n=23) no grupo controle (p<0,001). A anomalia mais comum foi a supranumerária (n=14) em ambos os grupos de estudo (p=0,160), seguida de agenesia e fusão dentária, ambas com 6 ocorrências. A agenesia dentária (p=0,005) e a geminação (p=0,029) foram mais comuns no grupo de casos, em comparação ao controle.

Tabela 1
Distribuição das anomalias dentárias no caso (fissuras orais não sindrômicas) e grupos de controle.

Com relação à distribuição das anomalias dentárias e tipo de fissura oral, observou-se que houve maior prevalência entre os pacientes com FL/PNS (n=9; 47,36%), seguidos por FLNS (n=6; 31,75%) e FPNS (n=4; 21,05%). Dos 4 casos de agenesia dentária, 3 ocorreram em FL/PNS e 1 em FPNS, enquanto, dos 3 casos de geminação, 2 ocorreram em FL/PNS e 1 FLNS.

Quanto às 42 anomalias dentárias identificadas, 57,14% (n=24) ocorreram na arcada superior e 42,85% (n=18) na arcada mandibular. A maioria das anomalias dentárias envolveu o incisivo lateral (n=15; 35,71%) e o incisivo central (n=14; 33,33%). Quanto à lateralidade das fissuras, 25 (59,52%) ocorreram no lado direito e 17 (40,47%) no lado esquerdo (Tabelas 2 e 3).

Tabela 2
Distribuição das anomalias dentárias na maxilla do caso (fissuras orais não sindrômicas) e grupos de controle.
Tabela 3
Distribuição das anomalias dentárias na mandibula do caso (fissuras orais não sindrômicas) e grupos de controle.

Discussão

Neste estudo caso-controle, investigamos a prevalência de anomalias dentárias na dentição primária completa de pacientes com FL/PNS. Nossos resultados mostraram que a prevalência foi maior no grupo de casos, em comparação com o grupo controle. Dentre as anomalias dentárias, os dentes supranumerários foram os mais frequentemente observados em ambos os grupos de estudo (14 casos). No grupo FL/PNS, todos os dentes supranumerários ocorreram na maxila (n=5), enquanto no grupo controle a distribuição foi semelhante entre maxila e mandíbula (n=9). No entanto, essa anomalia dentária não apresentou diferenças na frequência entre os grupos.

Em uma análise retrospectiva de 207 radiografias panorâmicas de pacientes brasileiros com FL/PNS de 12 a 45 anos de idade, constatou-se que a frequência de dentes supranumerários era maior em pacientes com FL/PNS bilateralmente completas.16 Em outro estudo que avaliou as anomalias dentárias das FL/PNS, não foi encontrado um aumento significativo de dentes supranumerários em relação à população geral.77 Paranaíba LMR, Coletta RD, Swerts MSO. Quintino RP, Barros LM, Martelli-Júnior H. Prevalence of dental anomalies in patients with nonsyndromic cleft lip and/or palate in a Brazilian population. Cleft Palate-Craniofac J. 2013; 50(4):400-5.

Recentemente, em um estudo longitudinal, Suzuki et al.1717 Suzuki A, Nakano M, Yoshizaki K, Yasunaga A, Haruyama N, Takahashi I. A Longitudinal Study of the Presence of Dental Anomalies in the Primary and Permanent Dentitions of Cleft Lip and/or Palate Patients. Cleft Palate-Craniofac J.2016;54(3):309-20. verificaram que a prevalência de agenesia foi de 16,2% para a dentição primária e 52,7% para a dentição permanente nos indivíduos com FL/PNS. Em um estudo anterior, foi verificada a ocorrência de agenesia dentária em 22,3% na dentadura permanente de indivíduos com fissuras orais.7 Esse número está de acordo com vários estudos que encontraram percentuais de agenesia dentária em torno de 24% fora da área de fissuras,6,16,18,19 confirmando que a agenesia dentária é quase cinco vezes mais comum em indivíduos com fissuras do que na população geral (4,83%).20 Em outro estudo, envolvendo 60 crianças entre 5 e 13 anos com FL/PNS, a ocorrência de agenesia dentária foi de 63,3%.2121 Tan ELY, Kuek MC, Wong HC, Ong SAK, Yow M. Secondary Dentition Characteristics in Children With Nonsyndromic Unilateral Cleft Lip and Palate: A Retrospective Study. Cleft Palate-Craniofac J. 2018; 55 (4): 582-9.

A distribuição da agenesia dentária foi significativamente maior no grupo de casos e entre os pacientes com FL/PNS. A maioria dos estudos mostrou que o FL/PNS tem a maior prevalência de agenesia.1717 Suzuki A, Nakano M, Yoshizaki K, Yasunaga A, Haruyama N, Takahashi I. A Longitudinal Study of the Presence of Dental Anomalies in the Primary and Permanent Dentitions of Cleft Lip and/or Palate Patients. Cleft Palate-Craniofac J.2016;54(3):309-20.,2222 Tsai TP, Huang CS, Huang CC, See LC. Distribution patterns of primary and permanent dentition in children with unilateral complete cleft lip and palate. Cleft Palate-Craniofac J. 1998; 35 (2): 154-60. Em nosso estudo, no grupo de casos, os dentes envolvidos pela agenesia foram principalmente os incisivos laterais e o segundo molar. Em geral, estudos anteriores relataram que as anomalias, como a agenesia dentária, nesses dentes são o achado mais comum em crianças com FL/PNS.66 Letra A, Menezes R, Granjeiro JM, Vieira AR. Defining subphenotypes for oral clefts based on dental development. J Dent Res. 2007; 86 (10): 986-91.,1515 Spina V, Psillakis JM, Lapa FS, Ferreira MC. Classification of cleft lip and cleft palate. Suggested changes. Rev Hosp Clin Fac Med São Paulo. 1972; 27 (1): 5-6.,1717 Suzuki A, Nakano M, Yoshizaki K, Yasunaga A, Haruyama N, Takahashi I. A Longitudinal Study of the Presence of Dental Anomalies in the Primary and Permanent Dentitions of Cleft Lip and/or Palate Patients. Cleft Palate-Craniofac J.2016;54(3):309-20.,2222 Tsai TP, Huang CS, Huang CC, See LC. Distribution patterns of primary and permanent dentition in children with unilateral complete cleft lip and palate. Cleft Palate-Craniofac J. 1998; 35 (2): 154-60.

A geminação é definida como o desenvolvimento incompleto de dois dentes a partir de um órgão de esmalte. A geminação dentária foi outra anomalia dentária predominante no grupo com FL/PNS (p=0,029). Aizenbud et al.2323 Aizenbud D, Coval M, Hazan-Molina H, Harari D. Isolated soft tissue cleft lip: epidemiology and associated dental anomalies. Oral Dis. 2011; 17 (2): 221-31. em um estudo, incluindo 657 pacientes com fissura labial, onde 19 eram crianças de 9 a 13 anos tratadas durante os últimos 10 anos, observaram a maior ocorrência de gema dentária em comparação com a população em geral. Nossos resultados são consistentes com esse estudo, mostrando a maior ocorrência de geminação entre as FL/PNS. Observou-se também maior ocorrência de geminação dentária entre os incisivos laterais, semelhante à encontrada na dentição permanente.2424 Al Jamal GA, Hazza'a AM, Rawashdeh MA. Prevalence of dental anomalies in a population of cleft lip and palate patients. Cleft Palate-Craniofac J. 2010; 47 (4): 413-20. Todas as outras anomalias dentárias, fusão (p=0,445), microdontia (p=0,147), cúspides de garra (p=0,590) e terceira raiz (p=0,147) não apresentaram diferenças entre os grupos controle e caso.

Em nosso estudo, houve maior proporção de casos (9,33%) com história familiar de FL/PNS em relação ao grupo controle (1,39%) (p=0,002). Em um estudo anterior realizado pelo nosso grupo, foi encontrado um histórico familiar positivo de FL/PNS em 35,13% dos casos.2525 Martelli DR, Bonan PR, Soares MC, Paranaíba LR, Martelli-Júnior H. Analysis of familial incidence of non-syndromic cleft lip and palate in a Brazilian population. Med Oral Patol Oral Cir Bucal. 2010; 15 (6): 898-901.

Um estudo que investigou 4.557 crianças afetadas nascidas na República Tcheca da Eslováquia durante um período de 29 anos, registrou um histórico familiar positivo em 18% dos casos.26 Em outro estudo, composto por 153 indivíduos com FL/PNS na Tailândia, registrou um histórico familiar positivo em 17,7% dos casos.2727 Jaruratanasirikul S, Chichareon V, Pattanapreechawong N, Sangsupavanich P. Cleft lip and/or palate: 10 years experience at a pediatric cleft center in Southern Thailand. Cleft Palate-Craniofac J. 2008; 45 (6): 597-602.

A ocorrência de anomalias dentárias não mostrou diferenças significativas entre a maxila e a mandíbula. Embora a ocorrência de anomalias dentárias possa ser explicada como consequência da cirurgia plástica para reparo das fissuras orais, que pode afetar o desenvolvimento do osso maxilar, resultando em menor espaço na arcada superior para a erupção normal dos dentes, é interessante mencionar que a maior incidência de anomalia dentária ocorreu na mandíbula.6,28 Fissuras orais mostram evidência de lateralidade direcional, com fissuras do lado esquerdo ocorrendo cerca do dobro das fissuras do lado direito.29 Tal assimetria é comum em outros aspectos do desenvolvimento embrionário, incluindo resultados médicos e acadêmicos.30 Embora com uma população limitada, nosso estudo mostrou aumento da ocorrência de FLPNS/P no lado direito.

Em conclusão, nossos resultados sugerem que há maior prevalência de anormalidades dentárias na dentição primária completa dos indivíduos com fissuras orais, em comparação com a população em geral. A ocorrência de agenesia e geminação dentária foram significativas no grupo com FL/PNS e podem contribuir para a definição de subfenótipos de fissuras orais. Entretanto, estudos maiores são necessários para validar nossos achados. Uma limitação desse estudo foi o tamanho da amostra populacional utilizada.

Agradecimentos

Agradecemos a Fundação de Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG) e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pelo apoio financeiro.

References

  • 1
    Dixon MJ, Marazita ML, Beaty TH, Murray JC. Cleft lip and palate: understanding genetic and environmental influences. Nat Rev Genet. 2011; 12 (3): 167-78.
  • 2
    Martelli-Junior H, Porto LV, Martelli DR, Bonan PR, Freitas AB, Della Coletta R. Prevalence of nonsyndromic oral clefts in a reference hospital in the state of Minas Gerais, Brazil, between 2000-2005. Braz Oral Res. 2007; 21(4):314-7.
  • 3
    Rodrigues K, Sena MF, Roncalli AG, Ferreira MA. Prevalence of orofacial clefts and social factors in Brazil. Braz Oral Res. 2009; 23 (1): 38-42.
  • 4
    Meng L, Bian Z, Torensma R, Von denHoff JW. Biological mechanisms in palatogenesis and cleft palate. J Dent Res. 2009;88(1):22-33.
  • 5
    Machado RA, Freitas EM, Aquino SN, Martelli DRB, Swerts MSO, Reis SR, Persuhn DC, Moreira HS, Dias VO, Coletta RD, Martelli Júnior H. Clinical relevance of breast and gastric cancer-associated polymorphisms as potential susceptibility markers for oral clefts in the Brazilian population. BMC Med Genet. 2017; 4 (1): 1-6.
  • 6
    Letra A, Menezes R, Granjeiro JM, Vieira AR. Defining subphenotypes for oral clefts based on dental development. J Dent Res. 2007; 86 (10): 986-91.
  • 7
    Paranaíba LMR, Coletta RD, Swerts MSO. Quintino RP, Barros LM, Martelli-Júnior H. Prevalence of dental anomalies in patients with nonsyndromic cleft lip and/or palate in a Brazilian population. Cleft Palate-Craniofac J. 2013; 50(4):400-5.
  • 8
    Schutte BC, Murray JC. The many faces and factors of orofacial clefts. Hum Mol Genet. 1999; 89 (10): 1853-9.
  • 9
    Melo Filho MR, Dias VO, Martelli DRB, Paranaíba LMR, Swerts MSO, Barros LM. Tooth malposition in patients with cleft lip and/or palate in a Brazilian population. Dentistry. 3000. 2015; 3 (6): 1-6.
  • 10
    Mangione F, Nguyen L, Foumou N, Bocquet E, Dursun E. Cleft palate with/without cleft lip in French children: radiographic evaluation of prevalence, location and coexistence of dental anomalies inside and outside cleft region. Clin Oral Investig. 2017; 22 (2): 689-95.
  • 11
    Kuchler E, Motta L, Vieira A, Granjeiro J. Side of dental anomalies and taurodontism as potential clinical markers for cleft subphenotypes. Cleft Palate-Craniofac J. 2011; 48 (1):103-8.
  • 12
    Pegelow M, Alqadi N, Karsten A. The prevalence of various dental characteristics in the primary and mixed dentition in patients born with non-syndromic unilateral cleft lip with or without cleft palate. Eur. J. Orthod. 2012; 3(34):561-570.
  • 13
    Sæle P, Østhus E2, Ådalen S, Nasir EF, Mustafa M. Pattern of clefts and dental anomalies in six-year-old children: a retrospective observational study in western Norway. Acta Odontol Scand. 2017; 75 (2): 100-5.
  • 14
    Aquino SN, Messetti AC, Bagordakis E, Martelli Júnior H, Swerts MSO, Graner E, Coletta RD. Polymorphisms in FGF12, VCL, CX43 and VAX1 in Brazilian patients with nonsyndromic cleft lip with or without cleft palate. BMC Med Genet. 2013; 2 (14): 53-7.
  • 15
    Spina V, Psillakis JM, Lapa FS, Ferreira MC. Classification of cleft lip and cleft palate. Suggested changes. Rev Hosp Clin Fac Med São Paulo. 1972; 27 (1): 5-6.
  • 16
    Sá J, Mariano LC, Canguçu D, Coutinho TSL, Hoshi R, Medrado AP Martelli-Junior H, Coletta RD, Reis SRA. Dental Anomalies in a Brazilian Cleft Population. Cleft Palate-Craniofac J. 2016; 53 (6): 714-9.
  • 17
    Suzuki A, Nakano M, Yoshizaki K, Yasunaga A, Haruyama N, Takahashi I. A Longitudinal Study of the Presence of Dental Anomalies in the Primary and Permanent Dentitions of Cleft Lip and/or Palate Patients. Cleft Palate-Craniofac J.2016;54(3):309-20.
  • 18
    Silva AP, Costa B, de Carvalho Carrara CF. Dental anomalies of number in the permanent dentition of patients with bilateral cleft lip: radiographic study. Cleft Palate-Craniofac J. 2008; 45 (5): 473-6.
  • 19
    Menezes R, Vieira AR. Dental anomalies as part of the cleft spectrum. Cleft Palate Craniofac J. 2008; 45(4): 414-419.
  • 20
    Polder BJ, Van't Hof V MA, Van der Linden FPGM, Kuijpers-Jagtma AM. A meta-analysis of the prevalence of dental agenesis of permanent teeth. Community Dent Oral Epidemiol. 2004; 32 (3): 217-26.
  • 21
    Tan ELY, Kuek MC, Wong HC, Ong SAK, Yow M. Secondary Dentition Characteristics in Children With Nonsyndromic Unilateral Cleft Lip and Palate: A Retrospective Study. Cleft Palate-Craniofac J. 2018; 55 (4): 582-9.
  • 22
    Tsai TP, Huang CS, Huang CC, See LC. Distribution patterns of primary and permanent dentition in children with unilateral complete cleft lip and palate. Cleft Palate-Craniofac J. 1998; 35 (2): 154-60.
  • 23
    Aizenbud D, Coval M, Hazan-Molina H, Harari D. Isolated soft tissue cleft lip: epidemiology and associated dental anomalies. Oral Dis. 2011; 17 (2): 221-31.
  • 24
    Al Jamal GA, Hazza'a AM, Rawashdeh MA. Prevalence of dental anomalies in a population of cleft lip and palate patients. Cleft Palate-Craniofac J. 2010; 47 (4): 413-20.
  • 25
    Martelli DR, Bonan PR, Soares MC, Paranaíba LR, Martelli-Júnior H. Analysis of familial incidence of non-syndromic cleft lip and palate in a Brazilian population. Med Oral Patol Oral Cir Bucal. 2010; 15 (6): 898-901.
  • 26
    Peterka M, Peterkova R, Halaskova M, Tvrdek M, Fara M, Likovsky Z. Sex differences in the incidence of cleft and question of primary prevention in families with genetic risk. Acta Chir Plast. 1996; 38 (2): 57-60.
  • 27
    Jaruratanasirikul S, Chichareon V, Pattanapreechawong N, Sangsupavanich P. Cleft lip and/or palate: 10 years experience at a pediatric cleft center in Southern Thailand. Cleft Palate-Craniofac J. 2008; 45 (6): 597-602.
  • 28
    Genisca AE, Frias JL, Broussard CS, Honein MA, Lammer EJ, Moore CA, Rasmussen SA. Orofacial clefts in the national birth defects prevention study. Am J Med Genet. 2009;149(6):1149-58.
  • 29
    Melo Filho MR, Santos LAN, Martelli DRB, Silveira MF, Silva ME, Barros LM, Coletta RD, Martelli-Júnior H. Taurodontism in patients with nonsyndromic cleft lip and palate in a Brazilian population: a case control evaluation with panoramic radiographs. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol. 2015; 120 (6): 744-50.
  • 30
    Gallagher ER, Siebold B, Collett BR, Cox TC, Aziz V, Cunningham ML. Associations between laterality of orofacial clefts and medical and academic outcomes. Am J Med Genet. 2017; 3 (2): 1-10.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Maio 2020
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2020

Histórico

  • Recebido
    30 Jan 2019
  • Revisado
    14 Jul 2019
  • Aceito
    23 Dez 2019
Instituto de Medicina Integral Prof. Fernando Figueira Rua dos Coelhos, 300. Boa Vista, 50070-550 Recife PE Brasil, Tel./Fax: +55 81 2122-4141 - Recife - PR - Brazil
E-mail: revista@imip.org.br