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Lista de verificação para gerenciamento do despertar diário de pacientes críticos

RESUMO

Objetivo:

Validar o instrumento "Lista de Verificação (checklist) para o Gerenciamento do Despertar Diário de Pacientes Críticos".

Métodos:

Estudo descritivo com abordagem quantitativa para a validação de conteúdo utilizando o método Delphi, para a obtenção de consenso de especialistas que apreciaram o instrumento, por meio de escala tipo Likert. O índice de validade de cada item do instrumento foi calculado para sua validação, tendo como parâmetro mínimo consenso acima de 0,78.

Resultados:

Foram necessárias três rodadas Delphi, iniciada com 29 e finalizada com 15 especialistas, convidados pessoalmente e via correio eletrônico a participarem do estudo. O instrumento com 15 itens teve 13 deles validados com índice de validade de conteúdo > 0,78. O instrumento manteve seus atributos, sendo reformulados seis itens, sem necessidade de exclusão de algum deles. Os itens validados permitiram avaliar e decidir sobre as dimensões relacionadas ao nível de sedação e agitação, sinais vitais, parâmetros ventilatórios e dor. Pode-se dizer que o instrumento apresentou indicadores psicométricos de validade de conteúdo aceitáveis.

Conclusão:

O instrumento proposto no estudo apresentou validade de conteúdo na maioria de seus itens e mostra-se como estratégia prática no gerenciamento da interrupção diária da sedação de pacientes críticos.

Descritores:
Cuidados críticos; Sedação consciente; Protocolos; Inquéritos e questionários

ABSTRACT

Objective:

To validate the "Checklist for Managing Critical Patients' Daily Awakening" instrument.

Methods:

This was a descriptive study that used a quantitative approach for content validation using the Delphi method to obtain the consensus of experts who evaluated the instrument using a Likert scale. The validity index of each item of the instrument was calculated, with a minimum consensus parameter above 0.78.

Results:

Three Delphi rounds were required, starting with 29 experts and ending with 15 experts who were invited in person and via e-mail to participate in the study. Of the 15 items in the instrument, 13 had a content validity index > 0.78. The instrument maintained its attributes, and six items were reformulated without the need to exclude any of them. The validated items enabled the assessment of and decisions regarding the dimensions related to the level of sedation and agitation, vital signs, ventilatory parameters and pain. The instrument presented psychometric indicators with acceptable content validity.

Conclusion:

The instrument proposed in the study exhibited content validity for most of its items and emerges as a practical strategy for the management of the daily interruption of sedation of critical patients.

Keywords:
Critical care; Conscious sedation; Protocols; Surveys and questionnaires

INTRODUÇÃO

Observa-se certa disparidade entre a necessidade de sedação e a forma como ela é feita. Se for inadequada, pode resultar em dor, ansiedade, agitação, extubação traqueal não planejada e retirada de cateteres.(11 Sakata RK. Analgesia e sedação em unidade de terapia intensiva. Rev Bras Anestesiol. 2010;60(6):653-58.,22 Augustes R, Ho KM. Meta-analysis of randomised controlled trials on daily sedation interruption for crtitically ill adult patients. Anaesth Intensive Care. 2011;39(3):401-9.) Por outro lado, o uso da sedação de forma excessiva ou prolongada favorece, além da ventilação mecânica (VM) prolongada, delirium, pneumonia, coma, lesões por pressão e maior tempo de permanência na unidade de terapia intensiva (UTI).(11 Sakata RK. Analgesia e sedação em unidade de terapia intensiva. Rev Bras Anestesiol. 2010;60(6):653-58.

2 Augustes R, Ho KM. Meta-analysis of randomised controlled trials on daily sedation interruption for crtitically ill adult patients. Anaesth Intensive Care. 2011;39(3):401-9.

3 Flynn Makic MB. Daily sedation interruption: current state of the science. J Perianesth Nurs. 2014;29(6):501-3.

4 Minhas MA, Velasquez AG, Kaul A, Salinas PD, Celi LA. Effect of protocolized sedation on clinical outcomes in mechanically ventilated intensive care unit patients: a systematic review and meta-analysis of randomized controlled trials. Mayo Clin Proc. 2015;90(5):613-23.
-55 Chlan LL, Weinert CR, Skaar DJ, Tracy MF. Patient-controlled sedation: a novel approach to sedation management for mechanically ventilated patients. Chest. 2010;138(5):1045-53.)

O conceito de interrupção diária da sedação (IDS), ou "despertar diário", tem como finalidade avaliar a necessidade do sedativo e diminuir o acúmulo sistêmico do fármaco. Esta estratégia está incorporada em cerca de 30% das UTI e pode evitar as complicações causadas pela sedação excessiva, de forma individualizada.(11 Sakata RK. Analgesia e sedação em unidade de terapia intensiva. Rev Bras Anestesiol. 2010;60(6):653-58.)

A IDS é realizada principalmente nos pacientes sob VM, visando prevenir pneumonia associada à ventilação e seus efeitos nocivos. Estudos mostram que essa técnica ocorre basicamente por meio da interrupção da infusão do medicamento em um período de tempo, a cada dia, até tornar os pacientes mais alertas e viáveis a um desmame mais precoce da sedação e da VM.(22 Augustes R, Ho KM. Meta-analysis of randomised controlled trials on daily sedation interruption for crtitically ill adult patients. Anaesth Intensive Care. 2011;39(3):401-9.,33 Flynn Makic MB. Daily sedation interruption: current state of the science. J Perianesth Nurs. 2014;29(6):501-3.,66 Xiaojuan C. Daily Sedation Interruption in Critically III Patients on Mechanical Ventilation. Am J Nurs. 2015;115(5):21.,77 Burry L, Rose L, McCullagh IJ, Fergusson DA, Ferguson ND, Mehta S. Daily sedation interruption versus no daily sedation interruption for critically ill adult patients requiring invasive mechanical ventilation. Cochrane Database Syst Rev. 2014;(7):CD009176.)

Outros métodos estão também descritos, com papel relevante no gerenciamento da sedação, destacando-se, neste contexto, a "sedação intermitente", que permite administrações intercaladas do fármaco, com base nas respostas do paciente, e a "sedação guiada por metas", que titula a infusão de acordo com necessidades clínicas particulares. Salienta-se, contudo, que as Diretrizes de Prática Clínica, de 2013, relativas ao controle da dor, agitação e delirium, recomendam sedação leve, sempre que possível.(88 Benseñor FL, Cicarelli DD. Sedação e analgesia em terapia intensiva. Rev Bras Anestesiol. 2003;53(5):680-93.,99 Shehabi Y, Bellomo R, Reade MC, Bailey M, Bass F, Howe B, McArthur C, Murray L, Seppelt IM, Webb S, Weisbrodt L; Sedation Practice in Intensive Care Evaluation Study Investigators; Australian and New Zealand Intensive Care Society Clinical Trials Group. Early goal-directed sedation versus standard sedation in mechanically ventilated critically ill patients: a pilot study. Crit Care Med. 2013;41(8):1983-91.)

O surgimento da IDS se deu no ano de 2000, com a publicação de um estudo de grande impacto, que dividiu 150 pacientes em 2 grupos. No grupo em que a IDS foi a intervenção, a administração dos fármacos sedativos era interrompida uma vez ao dia e avaliava-se o despertar do paciente. Após seu retorno, objetivava-se um nível de sedação norteado pela Escala de Ramsay entre 2 - 3. O grupo controle recebia os cuidados tradicionais, sem despertar e sem alvo de nível de sedação. Essa breve interrupção mostrou benefícios como menor tempo de VM e de internação hospitalar, marcando o início de uma nova era na abordagem ao paciente sob intubação traqueal.(1010 Kress JP, Pohlman AS, O'Connor MF, Hall JB. Daily interruption of sedative infusions in critically ill patients undergoing mechanical ventilation. N Engl J Med. 2000;342(20):1471-7.)

Isso gerou a elaboração de diversos protocolos para a IDS, com o objetivo de alcançar desfechos semelhantes em relação ao tempo de VM e de internação hospitalar. No geral, assim que o paciente é identificado como candidato à IDS, as infusões de sedação são descontinuadas, até que ele acorde e exiba sinais de responsividade ou intolerância ao despertar (agitação). Se houver intolerância clínica à interrupção da sedação, a infusão contínua pode ser reiniciada, normalmente na metade da dose anterior, devendo o paciente ser monitorado para a adequação da dose ideal.(1111 Berry E, Zecca H. Daily interruptions of sedation: a clinical approach to improve outcomes in critically ill patients. Crit Care Nurse. 2012;32(1):43-51.)

Porém, ainda que descrito o procedimento da IDS, é necessário que os profissionais de saúde atuantes em UTI, além da vigilância à beira do leito, tenham abordagem mais detalhada e prática sobre as etapas do despertar diário, para que o procedimento seja feito de forma segura e com o mínimo de danos.

Neste sentido, foi elaborado o instrumento Lista de Verificação (Checklist) para o Gerenciamento do Despertar Diário de Pacientes Críticos, baseado nas melhores evidências científicas sobre o tema, para oferecer aos profissionais da UTI suporte de avaliação e decisão clínica no despertar diário desses pacientes.

Para assegurar que este instrumento represente o conteúdo apropriado ao que se propõe avaliar e o universo de abrangência dos tópicos necessários ao gerenciamento da IDS, o presente estudo teve por objetivo validar o instrumento Lista de Verificação (Checklist) para o Gerenciamento do Despertar Diário de Pacientes Críticos.

MÉTODOS

Estudo descritivo, com abordagem quantitativa, realizado no período de março de 2016 a março de 2018, registrado na Plataforma Brasil, sob CAAE 62771416.7.0000.5285 e parecer de aprovação 1.869.349.

No processo de validação do instrumento Lista de Verificação (Checklist) para o Gerenciamento do Despertar Diário de Pacientes Críticos, utilizou-se o método Delphi para a obtenção do consenso, com participação de médicos e enfermeiros com curso de especialização ou residência em UTI ou alta complexidade.

A amostra intencional resultou em seleção por conveniência dos especialistas, conforme os seguintes critérios, que os separou em dois grupos para a validação: especialistas que tinham experiência clínica de assistência ao paciente crítico de, no mínimo, 2 anos; e especialistas que atuaram na área acadêmica como docentes/pesquisadores com conhecimento sobre as temáticas abordadas neste estudo, consubstanciadas por publicações de artigos, capítulos de livros e aulas ministradas. Os especialistas do Grupo 1 foram contatados por meio eletrônico ou por contato direto pela pesquisadora principal, e os do Grupo 2 por acesso ao respectivo currículo disponibilizado na Plataforma Lattes, no portal do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

O instrumento foi estruturado por questionário digital no Google Drive® e disponibilizado ao especialista via correio eletrônico, após seu aceite em participar do estudo. Ao final do questionário, existia um espaço em aberto para que ele dessa sua opinião/contribuição.

Após a leitura das respostas dos questionários sobre a lista de verificação e a computação dos dados, o instrumento foi organizado para a avaliação do consenso de especialistas, de acordo com o método Delphi, utilizando a pontuação de uma escala do tipo Likert de 7 pontos com a seguinte variação de 1 (discordo totalmente) a 7 (concordo totalmente).

Foi utilizado o programa Microsoft Excel 2010® para a tabulação dos dados e o cálculo do Índice de Validade de Conteúdo (IVC) de cada item do instrumento.

Para considerar o item como validado, estipularam-se as marcações nos itens 6 e 7 como validadas; os itens marcados como 3, 4 e 5, como indecisão; e os itens 1 e 2, como não validados.

Foram considerados os seguintes critérios para a taxa de concordância aceitável entre os especialistas: no caso de cinco ou menos, todos deveriam concordar; no caso de seis ou mais, a concordância deveria apresentar taxa maior que 0,78.(1212 Alexandre NM, Coluci MZ. Validade de conteúdo nos processos de construção e adaptação de instrumentos de medidas. Ciênc Saúde Coletiva. 2011;16(7):3061-8.,1313 Polit DF, Beck CT. The content validity index: are you sure you know what's being reported? Critique and recommendations. Res Nurs Health. 2006;29(5):489-97.) Este cálculo, que é o do IVC, refere-se à "proporção ou porcentagem de juízes que estão em concordância sobre determinados aspectos do instrumento e de seus itens",(1212 Alexandre NM, Coluci MZ. Validade de conteúdo nos processos de construção e adaptação de instrumentos de medidas. Ciênc Saúde Coletiva. 2011;16(7):3061-8.) sendo preconizado IVC de, no mínimo, 0,78 a partir de seis a dez especialistas.(1212 Alexandre NM, Coluci MZ. Validade de conteúdo nos processos de construção e adaptação de instrumentos de medidas. Ciênc Saúde Coletiva. 2011;16(7):3061-8.

13 Polit DF, Beck CT. The content validity index: are you sure you know what's being reported? Critique and recommendations. Res Nurs Health. 2006;29(5):489-97.
-1414 Lynn MR. Determination and quantification of content validity. Nurs Res. 1986;35(6):382-5.)

RESULTADOS

Foram convidados a participar da pesquisa 42 enfermeiros e 12 médicos para serem especialistas. Dentre estes, 29 participantes retornaram o instrumento respondido. Participaram das três rodadas consideradas para a obtenção do consenso tanto os profissionais atuantes da UTI em que o instrumento foi elaborado e utilizado, quanto os profissionais convidados via Plataforma Lattes.

Os resultados apresentados correspondem às três rodadas para o consenso dos especialistas. Na primeira rodada, houve concordância elevada na avaliação individual realizada pelos 29 especialistas, no que se refere à avaliação dos itens do instrumento, ou seja, entre os 15 itens relacionados, 8 alcançaram a concordância e não precisaram de reformulação.

Dentre eles, dois tiveram IVC de 0,96 e os outros seis entre 0,93 - 0,79. Os itens 2 e 3 foram os que obtiveram maior concordância, tendo apenas uma não concordância. O item 2 referia-se a "Citar a sedação (fármaco) utilizada" e o item 3, a "Checar se há analgésico prescrito".

Diante disso, os demais itens foram reformulados, conforme as sugestões, e os especialistas foram novamente convidados, via correio eletrônico, para uma segunda rodada. Após ressaltar a importância e a relevância dos itens não validados em se manterem no checklist, com o apoio de referências bibliográficas, elevada concordância foi observada na segunda rodada, com a participação de 19 especialistas que, assim, puderam validar mais três itens com IVC, que variaram de 0,89 a 0,100, sendo estes o item 5, "Checar se há antipsicótico prescrito" (IVC = 0,95); item 9, "Na 12ª hora após a interrupção, avaliar a necessidade de retorno da sedação ou se clinicamente indicada" (IVC = 0,89); e o item 15, "Em caso de falha nos 4 passos anteriores: retornar com a sedação na dose descrita no item 2" (IVC = 0,100). Com base no IVC dos três itens validados, observa-se que embasar cada item em literatura de forma explicativa auxiliou na tomada de decisão do especialista, contribuindo para a validação dos itens. O item 15, por exemplo, chegou até 100% de validação, com concordância de todos.

Os itens não validados foram outra vez considerados para reformulação, e os especialistas foram novamente convidados, via correio eletrônico, para uma terceira rodada.

Nessa rodada, com o retorno de 15 especialistas, dois itens foram validados, com IVC 0,80 e 0,100, mantendo-se, todavia, dois itens com IVC de 0,46 e 0,66, respectivamente.

Na segunda rodada, entre os 29 especialistas que aceitaram participar do estudo, 19 retornaram com o instrumento avaliado. Ao final, 15 especialistas retornaram as respostas na terceira rodada.

Entre os 15 itens propostos, 13 foram validados e dois não conseguiram obter o IVC mínimo para sua validação. Apresenta-se a redação final do instrumento na tabela 1, com os respectivos IVC.

Tabela 1
Redação final dos itens após três rodadas de avaliação

DISCUSSÃO

Como participantes da pesquisa, foram convidados os médicos e enfermeiros que atuavam na UTI em que o instrumento foi elaborado e utilizado, considerando sua experiência na prática cotidiana da unidade como fundamental para a adequação e validação do checklist. Contudo, a despeito de utilizarem o instrumento em apreço em sua prática profissional, o número de especialistas que colaboraram com o estudo foi em menor quantidade, se comparado aos convidados via Plataforma Lattes.

Obter especialistas que fossem participantes da pesquisa apresentou algumas dificuldades, mesmo com a localização de profissionais que contemplassem os critérios de inclusão estabelecidos. Isso porque a maioria deles não retornavam o e-mail para a confirmação da participação na pesquisa, havendo também demora na devolução do material a eles enviado. Situações como essa já foram apontadas por outros autores, qualificando uma das dificuldades em estudos de validação.(1212 Alexandre NM, Coluci MZ. Validade de conteúdo nos processos de construção e adaptação de instrumentos de medidas. Ciênc Saúde Coletiva. 2011;16(7):3061-8.,1515 Bellucci Júnior JA, Matsuda LM. Construção e validação de instrumento para avaliação do Acolhimento com Classificação de Risco. Rev Bras Enferm. 2012;65(5):751-7.)

Os itens validados alcançaram IVC variados entre 0,79 e 0,100, tendo alguns obtido o consenso máximo. Porém, isso aconteceu após serem baseados, individualmente, em literatura e de forma explicativa.

Nos estudos de validação encontrados na literatura, no que se refere ao número de especialistas, bem como à concordância, três estudos trabalharam com menos de seis especialistas.(1616 Pedreira RB, Rocha SV, Santos CA, Vasconcelos LR, Reis MC. Validade de conteúdo do Instrumento de Avaliação da Saúde do Idoso. Einstein. 2016;14(2):158-77.

17 Zanin LE, Melo DH, Carneiro MS, Gomes JM, Pinto VP, Silva LW, et al. Proposta e validação de um protocolo de triagem para identificar as manifestações fonoaudiológicas na hanseníase. Rev Bras Promoç Saúde. 2016;29(4):564-73.
-1818 Graziani AF, Fukushiro AP, Genaro KF. Proposta e validação do conteúdo de um protocolo de avaliação miofuncional orofacial para indivíduos com fissura labiopalatina. CoDAS. 2015;27(2):193-200.) Contudo, todos os respectivos estudos utilizaram a validade de conteúdo e conseguiram obter a concordância e, assim, validar seus instrumentos.

Outro ponto que se pode observar diz respeito aos números de itens encontrados nos instrumentos dos estudos. O número mais discrepante foi encontrado no estudo em que foram avaliados 157 itens do instrumento adotado. O modelo inicial constava de 207 itens e, após observação comum feita pelo corpo de avaliadores do instrumento, fez referência à sua extensão, o que resultou na exclusão de 50 questões consideradas irrelevantes ou não representativas.(1616 Pedreira RB, Rocha SV, Santos CA, Vasconcelos LR, Reis MC. Validade de conteúdo do Instrumento de Avaliação da Saúde do Idoso. Einstein. 2016;14(2):158-77.)

Faz-se importante que o instrumento elaborado facilite a prática clínica, mas, para isso, é preciso levar em consideração o grupo populacional ao qual o instrumento será aplicado ou utilizado. Supõe-se, assim, que um instrumento reduzido pode ser de mais fácil aplicação, otimizando seu uso, bem como para a efetividade direcionada ao grupo populacional em questão e, assim, alcançar os resultados desejados com sua aplicação.(1616 Pedreira RB, Rocha SV, Santos CA, Vasconcelos LR, Reis MC. Validade de conteúdo do Instrumento de Avaliação da Saúde do Idoso. Einstein. 2016;14(2):158-77.)

Sobre os itens discutidos na validação do checklist e sem obtenção do consenso, enfatiza-se que não foi encontrado na literatura um horário ideal para se interromper a sedação de um paciente crítico na intenção de provocar seu despertar. Apenas questões acerca do ciclo de sono e vigília fisiológica do paciente e da duração do efeito de cada fármaco em questão foram abordadas, como preconiza a Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB).(1919 Bresolin NL, Fernandes VR. Sedação, analgesia e bloqueio neuromuscular [Internet]. São Paulo: Sociedade Brasileira de Pediatria; s.d. 24 p. [ciado 2019 June 2]. Disponível em: https://www.sbp.com.br/fileadmin/user_upload/2015/02/sedacao-e-analgesia-em-vent-mec.pdf
https://www.sbp.com.br/fileadmin/user_up...
)

Levando em consideração que cada paciente é único e, de acordo com seu quadro clínico, é utilizado um tipo de sedação, com determinada dose de infusão contínua, por um período de tempo, esses fatores podem influenciar na decisão do horário de interrupção do sedativo a fim de provocar seu despertar. Além disso, fatores gerenciais de cada serviço, horário de troca de plantão e outras diversas rotinas existentes em UTI podem influenciar diretamente na decisão de escolha do melhor horário para interrupção da sedação. Esse fato foi, inclusive, citado por um dos especialistas referente à avaliação qualitativa, logo na primeira rodada.

Com base nestes motivos, após serem sugeridos dois horários para interrupção da sedação (6h e 8h, respectivamente), porém sem atingir a concordância, decidiu-se manter a última opção sugerida, de a hora para a interrupção da sedação ficar a cargo de cada serviço, sugerindo-se a discussão entre as equipes médica e de enfermagem. Assim, no instrumento final, no item 6, foi disponibilizado um campo para preenchimento referente à interrupção da sedação, conforme a hora escolhida, de forma a protocolar o horário.

Houve também dificuldade para alcançar a concordância quanto ao item referente ao tempo de avaliação após a sexta hora. Foi sugerida a reavaliação do nível de sedação, conforme a escala utilizada no instrumento em apreço, a saber, a Escala de Sedação-Agitação (SAS), com base nas seguintes propostas: após a sexta hora, se necessário, a cada 2 horas e, se necessário, e por último, a cada 1 hora. Porém, nenhuma das três propostas atingiu o consenso mínimo para a validação, visto que a última opção obteve o IVC de menor valor (0,46), enquanto as duas primeiras tiveram valores de maiores concordâncias.

Um estudo sobre protocolos de sedação versus interrupção diária de sedação revisou, de forma sistemática, os estudos que compararam um protocolo com alvo de sedação leve com a IDS.(2020 Nassar Junior AP, Park M. Protocolos de sedação versus interrupção diária de sedação: uma revisão sistemática e metanálise. Rev Bras Ter Intensiva. 2016;28(4):444-51.) Em um deles, o SAS era reavaliado em 1 - 2 horas no protocolo de sedação, e, na IDS, a infusão de sedativos e opioides era mantida de forma idêntica à do protocolo, mas os sedativos e analgésicos eram desligados às 9h.(2121 Mehta S, Burry L, Martinez-Motta JC, Stewart TE, Hallett D, McDonald E, Clarke F, Macdonald R, Granton J, Matte A, Wong C, Suri A, Cook DJ; Canadian Critical Care Trials Group. A randomized trial of daily awakening in critically ill patients managed with a sedation protocol: a pilot trial. Crit Care Med. 2008;36(7):2092-9.) Já em outro estudo, que utilizava a escala Ramsay, diariamente, a sedação era interrompida e se avaliava o despertar; para manter Ramsay 3 - 4, o paciente era avaliado a cada 2 - 3 horas.(2222 Strom T, Martinussen T, Toft P. A protocol of no sedation for critically ill patients receiving mechanical ventilation: a randomised trial. Lancet. 2010;375(9713):475-80.)

Podemos perceber, portanto, que protocolos de sedação e interrupções diária de sedação utilizam de diversas estratégias, mas parecem ser equivalentes como estratégias que almejem níveis mais leves de sedação.

Objetivando a usabilidade do checklist e, assim, facilitar a avaliação do profissional quanto ao nível de sedação/agitação do paciente, foi sugerido que, no item 8, fosse considerado proceder à avaliação do nível de sedação e agitação pela SAS, após a 6ª hora, no mesmo horário de aferição dos sinais vitais, no intuito também de diminuir possíveis resistências em reavaliar o paciente.

O estudo utilizou como método a avaliação de conteúdo. A despeito da não obtenção de consenso em dois itens, novas rodadas com os especialistas não foram feitas, porque outras modificações no instrumento não seriam mais possíveis no momento, sob o risco de descaracterizá-lo.

Supõe-se que o fato de os dois itens não terem sido validados pode estar associado à diminuição do número dos especialistas ao logo das rodadas. Todavia, ainda assim, acredita-se que isso não prejudicará o uso do instrumento. A proposta de aplicação do instrumento na prática cotidiana pode contribuir para sua validação clínica, trazendo respostas e auxiliando na avaliação desses itens.

Com base nos resultados obtidos, pode-se dizer que o instrumento apresentou indicadores psicométricos de validade de conteúdo aceitáveis, denotando que pode ser utilizado em pacientes internados em UTI. O instrumento, por ser válido e de fácil aplicação, pode permitir melhor identificação dos agravos e o uso de estratégias adequadas para a tomada de decisão, no que diz respeito ao gerenciamento do despertar diário de pacientes críticos. O referido instrumento, constituído por 15 itens, manteve seus atributos, com a reformulação de seis itens (Tabela 2) e nenhuma exclusão (Tabela 3).

Tabela 2
Comparação dos itens que foram modificados após as três rodadas
Tabela 3
Lista de Verificação (Checklist) para o Gerenciamento do Despertar Diário de Pacientes Críticos

Apresenta-se na tabela 4 os itens validados no modelo final da lista de verificação, seguidos de suas respectivas competências sugeridas no âmbito da equipe multidisciplinar. Apesar da viabilidade de sua utilização, apontada por sua validação de conteúdo após avaliação pelos especialistas, considera-se necessário que novos estudos sejam realizados, a fim de investigar a efetividade do material e a apreensão do conhecimento, a partir de sua utilização. Além disso, a validação de conteúdo dos itens não contemplados na terceira etapa no presente estudo e sua validação clínica por especialistas podem oferecer evidências mais sólidas para a adequação desses itens à sua aplicação na prática clínica cotidiana.

Tabela 4
Roteiro de utilização do instrumento Lista de Verificação (Checklist) para o Gerenciamento do Despertar Diário de Pacientes Críticos

Como limitações desta pesquisa, mencionam-se o número reduzido de aceites para participação da pesquisa e, posteriormente, como dificuldade, o retorno do instrumento respondido. Acredita-se que isto não interferiu significativamente no resultado da pesquisa. Entretanto, sugere-se considerar tais aspectos em outras pesquisas que forem utilizar tal metodologia. Espera-se que novos estudos sejam gerados, de forma a colaborar com o cuidado baseado em evidências científicas, impactando de forma positiva na prática clínica e, por conseguinte, aumentando a qualidade da assistência prestada aos pacientes críticos internados em UTI, com melhoria de desfechos e aumento da sua segurança.

CONCLUSÃO

O instrumento foi considerado válido para o gerenciamento do despertar diário, além de ser adequado para ser utilizado por profissionais que atuam em unidade de terapia intensiva. Possibilita sua aplicabilidade no contexto dos cuidados a esta clientela, mesmo sem a validação de dois itens, por considerá-los não prejudiciais à sua aplicabilidade.

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Editado por

Editor responsável: Felipe Dal-Pizzol

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Out 2019
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2019

Histórico

  • Recebido
    15 Jul 2018
  • Aceito
    09 Mar 2019
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