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Viabilidade do Universal Life no Brasil sob a perspectiva da oferta e da demanda por seguros de vida* * Trabalho apresentado na XX USP International Conference in Accounting, São Paulo, SP, Brasil, julho de 2020.

RESUMO

O objetivo do artigo foi avaliar a viabilidade do Universal Life (UL) no Brasil sob duas perspectivas: do ponto de vista individual dos contratantes, considerando diferentes perfis de clientes e cenários de investimento; e sob a ótica empresarial, verificando se as seguradoras enxergam no UL vantagens de comercialização. Assim, apesar da indefinição da regulamentação dos contratos pela Superintendência de Seguros Privados (Susep), a contribuição deste artigo é avaliar o UL - produto tipicamente americano - no Brasil, utilizando metodologia integralmente atuarial, para segurados e seguradoras, em função de parâmetros locais. A relevância do artigo está no fornecimento de subsídios para indivíduos, empresas e autoridades avaliarem o produto e discutirem sua implementação, identificando, até mesmo, os perfis e cenários mais favoráveis ao seu desenvolvimento. Embora o UL seja uma modalidade de seguro individual muito difundida em diversos países e seu desenho explorar atrativos bem-definidos, o produto não havia sido explorado pela literatura nacional. A metodologia adotada no presente estudo usou modelagem inteiramente atuarial, taxa interna de retorno (TIR) e profit testing. O trabalho revela que o mercado brasileiro para o UL é viável, sobretudo em função das taxas de juros mais elevadas se comparadas aos países onde o produto já é amplamente disseminado. Sob a perspectiva da demanda, os resultados apontam que o segurado estaria em situação mais vantajosa adquirindo o UL do que comprando um seguro de vida no mercado privado e investindo o excedente em aplicações financeiras, devido à característica híbrida do contrato, que possibilita a utilização dos rendimentos financeiros como fatores de desconto na parcela securitária e nos encargos da operação, reduzindo os custos de oportunidade atrelados ao produto. No que tange às empresas, os resultados do profit testing sugerem haver estímulos para a oferta do UL, desde que a operação tenha viés de longo prazo. Alterando-se o padrão de mortalidade, tipo de apólice e perfil de investimento da companhia, todos os resultados apontam para direção similar.

Palavras-chave:
Universal Life ; seguros de vida; profit testing ; atuária; investimentos de longo prazo

ABSTRACT

The aim of this article was to evaluate the viability of Universal Life insurance (UL) in Brazil from two perspectives: from the individual viewpoint of policyholders, considering different client profiles and investment scenarios; and from the company viewpoint, verifying whether insurers see sales advantages in UL. Thus, despite the lack of definition of the regulations on these contracts by the Superintendence of Private Insurance (Susep), this article’s contribution lies in evaluating UL - a typically American product - in Brazil, using an entirely actuarial methodology, for policyholders and insurers, according to local parameters. The relevance of the article lies in strengthening the support for individuals, companies, and authorities to evaluate the product and discuss its implementation, even identifying the most favorable profiles and scenarios for its development. Although the UL is an individual modality that is widespread in several countries and its design exploits well-defined attractions, the product has not been explored in the national literature. The methodology adoted in this study used fully actuarial modeling, the internal rate of return (IRR), and profit testing. The study reveals that the Brazilian market for UL is viable, especially due to the higher interest rates compared to countries where the product is already widespread. From a demand perspective, the results indicate that the policyholder would be in a more advantageous position acquiring UL than buying life insurance in the private market and investing the surplus in financial assets, due to the hybrid characteristic of the contract, which enables the use of financial returns as discount factors in the insurance portion and operational charges, reducing the opportunity costs linked to the product. With regard to companies, the profit testing results suggest there are stimuli for the supply of UL, provided the operation has a long-term bias. Altering the mortality pattern, policy type, and the company’s investment profile, all the results point in a similar direction.

Keywords:
Universal Life; life insurance; profit testing; actuarial; long-term investments

1. INTRODUÇÃO

Os seguros de vida e os investimentos de longo prazo são duas opções cuja principal atratividade é a segurança financeira, tanto para o titular dos contratos como para os beneficiários relacionados. Com relação à primeira alternativa, os seguros garantem proteção financeira em caso de realização dos eventos cobertos, por meio de bases mutualísticas e do compartilhamento de riscos. No segundo caso, os indivíduos buscam adquirir produtos de investimentos financeiros como forma de alocar a poupança em aplicações que rendam juros ou outras formas de remuneração, visando gerar recursos monetários, superar o efeito da inflação ou aumentar o patrimônio para realização de projetos pessoais.

Apesar do atributo comum - a solidez financeira -, ambas as alternativas têm, entretanto, algumas limitações: os seguros estão restritos à chamada “indenização”, de modo que o recebimento financeiro máximo já é previamente conhecido pelos detentores de apólices e somente é acessado em caso de ocorrência do evento gerador, enquanto os investimentos, ao contrário, oferecem, em geral, maior liquidez e rentabilidade, mas não têm o viés de mitigação e transferência de ônus financeiro oriundo de riscos, típicos do mercado segurador.

Diante desse cenário, o Universal Life (UL) surgiu como um tipo de seguro que abrange essas duas características: proteção securitária e investimento financeiro, combinando o seguro de vida tradicional com acumulação de longo prazo. Além do compartilhamento de rendimentos e do resgate dos investimentos, a atratividade do produto está relacionada à flexibilidade de prêmios e de coberturas, dado que o saldo do fundo de investimentos pode ser acessado no momento da indenização (compondo, juntamente com o benefício por morte, parte do benefício recebido em caso de sinistro) e, a depender do montante acumulado, pode ainda isentar o segurado de determinadas parcelas do prêmio a ser vertido para a companhia.

O UL é muito difundido nos Estados Unidos da América (EUA). Segundo levantamento realizado em 2018 pela Life Insurance Marketing and Research Association (LIMRALife Insurance Marketing and Research Association. (2017). LIMRA forecasts positive growth in U.S. individual life insurance market for the next four years. https://www.limra.com/en/newsroom/industry-trends/2017/limra-forecasts-positive-growth-in-u.s.-individual-life-insurance-market-for-the-next-four-years/
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), o produto respondia, em média, por 37% dos prêmios arrecadados no país (Windsor, 2018Windsor, C. (2018). LIMRA: Strong indexed universal life sales drive U.S. individual life insurance premium growth in second quarter 2018. https://www.limra.com/en/newsroom/news-releases/2018/limra-strong-indexed-universal-life-sales-drive-u.s.-individual-life-insurance-premium-growth-in-second-quarter-2018/
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). O tamanho do mercado é expressivo, principalmente se comparado aos produtos tradicionais do ramo de vida individual: ainda em 2018, o seguro de vida inteira representava 36% dos prêmios anualizados, enquanto o seguro de vida temporário, 21%. Ainda de acordo com a LIMRA, estima-se que os seguros de vida movimentem, nos EUA, mais de US$ 14 bilhões ao ano.

Apesar do histórico de aproximadamente 40 anos de comercialização nos Estados Unidos da América, no Brasil, no entanto, a regulamentação do produto ainda não foi concluída. Em dezembro de 2016, foi divulgada a Resolução do Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) n. 344, aprovando a estruturação do modelo no país. Ainda assim, a Superintendência de Seguros Privados (Susep) não publicou a normatização do UL até a presente data. A discussão versa sobre a natureza dúbia do produto, cujo desenho entrepõe-se entre um plano securitário e um instrumento de investimento financeiro, gerando pendências relacionadas às questões tributárias e benefícios fiscais.

As oportunidades de penetração do UL no mercado nacional estão atreladas às limitações do seguro temporário (dado que, após o fim do período de cobertura, nenhum valor acumulado é disponibilizado para resgate), aos potenciais segurados que têm garantia somente com prêmio nivelado e, ainda, à possibilidade de planejamento de aposentadoria.

Portanto, tendo em vista o desenho singular do contrato e dada sua discussão pelos órgãos reguladores, o principal objetivo deste trabalho é avaliar, do ponto de vista individual, a vantagem comparativa da compra desse produto em relação ao acesso híbrido entre os produtos atuariais - seguros de vida - e financeiros, como títulos públicos federais e carteiras de ações. Posteriormente, a avaliação é estendida para as empresas seguradoras, a fim de averiguar a atratividade também sob a ótica empresarial e, assim, discutir a viabilidade da criação de um mercado nacional para o UL. A análise de viabilidade do UL no Brasil se justifica, uma vez que as rentabilidades financeiras de investimentos, neste país, são mais elevadas do que em países onde esse produto é amplamente difundido ou já foi instaurado, como é o caso dos EUA (Doll, 1999Doll, D. C. (1999). A brief history of universal life. Society of Actuaries.).

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

A criação do produto nos EUA ocorreu na década de 1970, quando os detentores de apólices e os potenciais segurados, preocupados com a inflação e os impostos crescentes da época, começaram a reavaliar seus ativos e investimentos - incluindo suas apólices de seguro de vida -, comprometendo a liquidez e a estabilidade das entidades seguradoras. Nesse cenário, visando apresentar ao mercado um desenho novo e flexível, o UL foi desenvolvido e divulgado como uma combinação entre os benefícios de um seguro de vida tradicional e os rendimentos providos por um fundo de acumulação (Doll, 1999Doll, D. C. (1999). A brief history of universal life. Society of Actuaries.).

Consequentemente à ampla penetração desse desenho na década de 1980 - devida às atrativas taxas de juros creditadas nas apólices -, alguns trabalhos foram desenvolvidos para atestar seu desempenho, principalmente sob o ponto de vista individual.

Chung e Skipper (1987Chung, Y., & Skipper, H. D. (1987). The effect of interest rates on surrender values of universal life policies. The Journal of Risk and Insurance, 54(2), 341-347.) analisaram a relação entre os juros correntes e os valores projetados para resgate de um contrato UL e concluíram que essa correlação só seria positiva ao serem considerados horizontes de longo prazo (períodos superiores a 10 anos). Porém, apesar de a taxa de juros ser uma premissa relevante, Carson (1996Carson, J. M. (1996). Determinants of universal life insurance cash values. The Journal of Risk and Insurance, 63(4), 673-681.) concluiu que essa poderia não ser o determinante primário na composição dos montantes auferidos pelo produto, sobretudo no curto prazo. Dessa forma, o autor buscou explorar os impactos de outras variáveis - como despesas, taxas de mortalidade e encargos derivados de resgate - na constituição dos fundos, e revelou que esses efeitos são significantes e negativamente relacionados com os valores acumulados no UL. Ao desconsiderar essas implicações, seria possível, portanto, extrair conclusões errôneas de mercado.

Dispêndios associados à mortalidade e às demais taxas envolvidas numa operação de seguros também foram elementos abordados por Mitchell et al. (1999Mitchell, O. S., Poterba, J. M., Warshawsky, M. J., & Brown, J. R. (1999). New evidence on the money’s worth of individual annuities. American Economic Review, 89(5), 1299-1318.). Os autores argumentam que, apesar de o valor presente esperado do pagamento de uma anuidade não equivaler aos prêmios referentes à aquisição da apólice - dados os carregamentos e encargos da empresa ofertante -, os segurados estariam dispostos a adquirir esse produto ao invés de investir em uma estratégia ótima de investimento que não abarcasse tal característica de proteção.

Isso posto, e considerando os dois aspectos intrínsecos ao UL - proteção e investimento -, Cherin e Hutchins (1987Cherin, A. C., & Hutchins, R. C. (1987). The rate of return on universal life insurance. The Journal of Risk and Insurance, 54(4), 691-711.), Corbett e Nelson (1992Corbett, R. B., & Nelson, J. M. (1992). A comparison of term insurance rates to protection-related charges in universal life insurance. The Journal of Risk and Insurance, 59(3), 470-475.) e D’Arcy e Lee (1987D’Arcy, S. P., & Lee, K. C. (1987). Universal/variable life insurance versus similar unbundled investment strategies. The Journal of Risk and Insurance, 54(3), 452-477.) buscaram comparar o desenho com outras aplicações no mercado capazes de abranger essas mesmas componentes. Dessa forma, sob as premissas inicialmente adotadas, Cherin e Hutchins (1987) chegam à conclusão de que um investidor estaria numa melhor situação financeira se optasse por adquirir um seguro a termo no mercado privado e investisse o restante do que seria pago no prêmio anual do UL no mercado financeiro do que comprando diretamente um produto que compreendesse essas duas características, dados os encargos e despesas inerentes à administração do contrato.

D’Arcy e Lee (1987D’Arcy, S. P., & Lee, K. C. (1987). Universal/variable life insurance versus similar unbundled investment strategies. The Journal of Risk and Insurance, 54(3), 452-477.) também discorrem acerca da comparação do UL com estratégias similares de alocação de recursos. Aqui, no entanto, os autores incorporam na análise os efeitos dos impostos que incidem sobre cada uma das estratégias alternativas, explorando as vantagens da tributação atrelada às diferentes aquisições. De acordo com o website do Internal Revenue Service (IRS), a autoridade fiscal norte-americana, os rendimentos do seguro de vida que uma pessoa recebe como beneficiário devido à morte do segurado não são incluídos na receita bruta, de modo que são isentos de tributação. Contudo, caso algum montante sobre o qual incidiram juros seja recebido pelo segurado em vida, deve ser informado à autoridade fiscal e tributado. Apesar dos encargos derivados de carregamento ou resgate, o resultado obtido por D’Arcy e Lee (1987) favorece, de certa forma, o UL: seus benefícios fiscais criam cenários em que o produto se mostra a melhor opção de compra no mercado, admitindo que a apólice esteja vigente por tempo suficiente (7 a 8 anos de duração) e desde que o máximo de capital permitido por lei tenha sido aportado em estratégias livres de impostos.

Isolando os termos de acumulação e rentabilidade do UL, Corbett e Nelson (1992Corbett, R. B., & Nelson, J. M. (1992). A comparison of term insurance rates to protection-related charges in universal life insurance. The Journal of Risk and Insurance, 59(3), 470-475.) comparam somente o custo do elemento de proteção do produto com os prêmios pagos por um seguro a termo renovável ofertado pela mesma seguradora. A hipótese inicial é de que, observadas grandes discrepâncias entre esses valores, a transparência premeditada pelo UL poderia não ser completa ou poderiam existir outras características do desenho que explicassem os altos custos a ele associados. Os resultados confirmam as divergências entre os prêmios destinados à cobertura do seguro de vida, mas os autores reforçam, entretanto, que é necessário cautela ao generalizar essa conclusão, uma vez que a amostra utilizada apresentou ampla variação dos custos observados e a precificação depende, essencialmente, do processo de subscrição da seguradora analisada.

As abordagens anteriores estudam o comportamento do UL e sua viabilidade observando o contexto individual. No que tange à oferta, Hoyt (1994Hoyt, R. E. (1994). Modeling insurance cash flows for universal life policies. Journal of Actuarial Practice, 2, 197-220.) analisa o fluxo de caixa das seguradoras que ofertam o produto, introduzindo um modelo preditivo para a dinâmica financeira das firmas. Já Gatzert e Kling (2007Gatzert, N., & Kling, A. (2007). Analysis of participating life insurance contracts: A unification approach. Journal of Risk and Insurance, 74(3), 547-570.) investigam a componente de risco e os fatores que afetam as apólices de compartilhamento de rendimentos - como o UL -, abordando medidas como a variância e o expected shortfall nas situações em que a empresa seguradora não adota em sua operação estratégias de hedge consideradas perfeitas.

Ademais, dois trabalhos recentes tratam a questão dos custos e da precificação dos ramos de vida: Koijen e Yogo (2015Koijen, R. S. J., & Yogo, M. (2015). The cost of financial frictions for life insurers. American Economic Review, 105(1), 445-475.) analisam o markup em condições de imperfeições de mercado, enquanto Le Courtois e Shen (2018Le Courtois, O. A., & Shen, L. (2018). Profit testing of profit sharing life insurance policies in the presence of extreme risks. Social Science Research Network. https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=3184789
https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?...
) aplicam o teste de lucro estocástico em apólices com compartilhamento de rendimentos, com o intuito de examinar a influência de parâmetros e modelos financeiros sobre os indicadores do profit testing das empresas seguradoras.

No Brasil, parece não haver referências acadêmicas que explorem o tema. Apesar de haver estudos de viabilidade e competitividade no mercado norte-americano, cujas evidências empíricas constatam que seria mais vantajoso para os potenciais segurados comprar o seguro a termo renovável do que o UL, ou que o produto só seria mais atrativo em decorrência dos benefícios fiscais após um período de 7 a 8 anos de maturação, não se sabe ao certo, do ponto de vista individual, se essas conclusões obtidas pelos autores nas décadas de 1980 e 1990 são sustentadas e corroboradas para o caso brasileiro.

3. O MODELO

Dickson et al. (2013Dickson, D. C. M., Hardy, M. R., & Waters, H. R. (2013). Actuarial mathematics for life contingent risks. Cambridge University Press.) apresentam as características operacionais do UL e os cálculos envolvendo a movimentação financeira dos fundos. Em suma, trata-se de um produto que combina o que seria um seguro de vida inteira com uma variação do seguro por sobrevivência, apresentando três características fundamentais: transparência, flexibilidade e compartilhamento de rendimentos.

Desse modo, o desenho do UL divide-se em duas principais componentes: a parcela de proteção e a de investimento, sendo que a segunda pode ser acessada, a priori, de três maneiras distintas: (i) a partir do resgate total ou parcial feito pelo segurado; (ii) na indenização, compondo parte do benefício por morte a ser recebido pelos beneficiários em caso de sinistro; e (iii) revertendo rendimentos em saldos para pagamento dos prêmios. Destaca-se, aqui, a flexibilidade do produto, uma vez que os valores resultantes da porção de investimento podem ser transferidos para a própria componente do seguro, abatendo o montante dos prêmios destinados a cobrir a mortalidade. Isso pode tornar o custeio menor e/ou não contínuo. Além disso, o compartilhamento dos rendimentos é formalizado pelos resultados associados aos juros da operação, que, por sua vez, estão atrelados ao desempenho financeiro dos fundos de investimentos mantidos pela seguradora. Essa dinâmica é evidenciada para os contratantes em cada período, garantindo transparência do fluxo monetário.

Com relação à movimentação financeira das contas individuais, os prêmios pagos pelos segurados são depositados numa conta nocional (fictícia) que, além dessa componente, é ainda acrescida pelos rendimentos provenientes de aplicações financeiras. As deduções são referentes às despesas com mortalidade e aos encargos administrativos (EC), e o resultado dessa conta (account value - AV) é dinâmico no tempo, representando a responsabilidade da empresa perante o detentor da apólice.

Há duas modalidades distintas de contratos de UL: tipo A e tipo B. A diferença básica está na fórmula de cálculo da indenização a ser considerada quando da ocorrência do sinistro. Nos contratos tipo B, o additional death benefit (ADB), que representa o montante acordado para cobertura de morte equivalente ao benefício que seria pago no caso de um seguro renovável, é nivelado e pré-determinado, de forma que o AV tende a crescer com o tempo. Assim, espera-se que o benefício total pago por morte também acompanhe esse movimento, justamente por ser a soma de ADB e AV.

Já no contrato tipo A, o benefício segue uma lógica distinta: o benefício total é fixo, forçando um decréscimo do ADB à medida que os juros creditados na conta individual estimulam seu crescimento. Dada essa particularidade, outra característica específica dessa modalidade é a existência do denominado corridor factor requirement, que visa modular o valor da importância segurada (ADB) nos casos em que o desempenho do fundo promove grandes repasses às contas individuais, que, dessa forma, podem equiparar-se ao próprio valor total pago no sinistro - ou até mesmo superá-lo. Nessas situações, para não extinguir o ADB e, assim, manter a característica securitária do contrato, o corridor factor garante uma correção no valor da parcela de proteção, de forma a torná-la uma função de AV. Com isso, o valor do benefício total pode até mesmo exceder o originalmente acordado, tornando o contrato flexível não somente no aporte contributivo, mas também no montante resgatável.

De modo geral, o mecanismo do UL e a dinâmica da sua estrutura de funcionamento são apresentados pela Figura 1.

Figura 1
Movimentação financeira do seguro Universal Life (UL) ADB = additional death benefit

Os prêmios (P’) - aportes contributivos feitos pelo participante a cada instante de tempo - podem estar sujeitos a um valor mínimo, mas são, em geral, flexíveis. Esses valores são pagos à entidade seguradora e repassados às contas individuais (P). Os EC podem ser um percentual do AV, uma proporção dos prêmios ou ainda um termo fixo, e as taxas de juros creditadas nas contas nocionais (i) são resultado do desempenho de um portfólio de investimentos financeiros definido pela companhia (com rentabilidade i’), descontado o spread. Por fim, o custo do seguro (CoI) representa o prêmio único puro (PUP) para o seguro de vida a termo de um ano renovável, com montante segurado igual ao ADB.

Destaca-se, porém, que, embora AV represente a responsabilidade da entidade seguradora perante os segurados, esse valor não necessariamente se equipara ao recebido pelo contratante em caso de resgate ou de eventual sinistro. Isso porque, dados os custos inerentes à operação administrativa, incorre-se em uma taxa de resgate decrescente ao longo do tempo que permite à empresa reter parte do montante acumulado. Trata-se de mecanismo necessário para liquidar (ao menos parcialmente) os custos operacionais advindos do produto nos casos em que, devido ao pouco tempo de permanência do indivíduo no contrato, a diluição dos custos de aquisição em longas parcelas por meio do EC não é concretizada. Assim, após a aplicação da taxa, o novo valor da conta disponível para o indivíduo é o surrender/cash value (CV), que pode ser acessado com o resgate pelo segurado em vida ou ainda em caso de sinistro - compondo, juntamente com o ADB, o valor de indenização destinado aos beneficiários.

Ressalta-se que a estrutura geral dos fluxos financeiros do produto apresentado pela Figura 1 representa o funcionamento do mercado norte-americano. No modelo brasileiro, proposto pela Resolução CNSP n. 344/2016CNSP Resolution n. 344/2016. (2016). Discusses the rules and criteria for structuring, selling, and operationalizing Universal Life Insurance. https://www.in.gov.br/materia/-/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/24798719/do1-2016-12-27-resolucao-cnsp-n-344-de-26-de-dezembro-de-2016-24798675
https://www.in.gov.br/materia/-/asset_pu...
, não há previsão de corridor factor, assim como não há diferenciação formal de AV e CV, sendo ambas contempladas pela provisão matemática de benefícios a conceder (PMBaC). No caso brasileiro, o valor acumulado na PMBaC pode ser resgatado, sendo descontados eventuais carregamentos postecipados, se houver previsão no produto, e tributos. Ademais, no caso de indenização por morte, poderá incidir tributação (não definida), diferentemente dos Estado Unidos da América. Contudo, ressalta-se a escolha metodológica pelo desenho do modelo dos Estados Unidos da América, adaptando-o a parâmetros financeiros e biométricos idiossincráticos do Brasil, porque se trata de um mercado maduro, cujo funcionamento, além de conhecido, possibilita comparação com resultados da literatura.

O desenvolvimento financeiro do AV (PMBaC brasileira) é fundamental para o entendimento da relação entre o segurado e a empresa seguradora a cada instante de tempo e é evidenciado mais detalhadamente na equação 1:

A V t = ( A V t - 1 + P t - E C t - C o I t ) × ( 1 + i t ) (1)

para todo t ≥ 0, aqui, de periodicidade anual.

4. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

4.1 Aspectos Atuariais

No que concerne à parcela de proteção do produto, sob o enfoque atuarial, a precificação de produtos securitários consiste em uma avaliação de fluxos financeiros aleatórios. No caso específico dos seguros pagáveis por morte, para que o prêmio seja minimamente suficiente para cobrir esses possíveis eventos de risco, seu cálculo deve respeitar a equação 2:

A x = t = 0 v t + 1 × t | q x (2)

em que vt+1 é o fator de desconto financeiro a valor presente por t+1 anos e t| qx é a probabilidade de o indivíduo de idade x morrer entre as idades x+t e x+t+1. Ax representa, assim, o PUP a ser pago por um indivíduo com idade x por um seguro de vida inteira com indenização post-mortem.

Outra modalidade de seguro pagável por morte é o seguro de vida temporário (Ax:n|-). Ao contrário do caso anterior, nesta condição, o pagamento do sinistro somente é devido se a morte ocorrer dentro de um período específico e pré-determinado n.

Para obter-se o prêmio atuarialmente justo, multiplica-se Ax pelo montante indenizável estipulado na apólice. Outra adequação comum para as práticas de mercado é transformar esse dispêndio de parcela única em prêmios nivelados anuais, possibilitando aos segurados pagamentos suavizados em quantias periódicas de valor constante, conforme a equação 3:

P ¨ = A x a ¨ x = t = 0 v t + 1 × t | q x t = 0 v t × t p x (3)

em que os subscritos dos termos A e a¨ dependem substancialmente do tipo de seguro contratado (inteiro, temporário ou diferido), bem como da modalidade e extensão de seus pagamentos.

4.2 Aspectos Financeiros

Além da parcela securitária, outra componente característica dos contratos UL é a acumulação de longo prazo. Diferentemente da avaliação atuarial, nesse caso, os ganhos podem ser acessados independentemente do evento gerador morte, e as taxas de juros remuneram o montante alocado ao longo do tempo em proporções que dependem de cada tipo de aplicação.

Observando os diferentes perfis de risco, duas principais modalidades de investimento foram consideradas: renda fixa e renda variável. No primeiro caso, a proxy adotada para as rentabilidades será a remuneração dos títulos de dívida pública Notas do Tesouro Nacional de série B (NTN-B), que apresentam taxa de rendimento real média de 4% ao ano (a.a.) - uma aproximação para os títulos públicos com vencimentos a partir de 2024 até 2050 (http://www.tesouro.fazenda.gov.br) -, indexada ao Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Já para a carteira de renda variável, foram analisados os retornos provenientes do mercado de ações como estimativa da rentabilidade atrelada ao Índice Bovespa (Ibovespa), que retrata o desempenho médio de cotações por meio de uma carteira teórica e representativa das ações mais negociadas na B3 S.A. - Brasil, Bolsa, Balcão (B3).

Dado que o Ibovespa expressa uma rentabilidade nominal, é preciso utilizar também, em cada período, a rentabilidade nominal esperada das operações de renda fixa, considerando a taxa de juros real de 4% a.a. Isso possibilita que ambos os retornos possam ser comparados e submetidos a uma análise de sensibilidade, considerando o perfil de risco de cada investidor.

4.2.1 Estimativas de inflação e do Ibovespa

Para a inflação dos próximos períodos, será adotada a meta definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), que utiliza o IPCA no cômputo desse indicador. Para 2020, foi divulgado um índice acumulado de 4%, com um intervalo de tolerância previsto de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos. Essa taxa de 4% a.a. é ainda acompanhada pelo Relatório Focus, que apresenta as expetativas do mercado para alguns índices econômicos, sendo semanalmente publicado pelo Banco Central do Brasil (BC).

Em contrapartida, em relação ao mercado financeiro, o retorno do Ibovespa será estimado a partir da evolução histórica de suas rentabilidades, considerando os valores de fechamento da B3 entre janeiro de 2000 e dezembro de 2018, em que o retorno médio observado para o índice das ações foi 12,3% a.a. O desvio-padrão considerado, nesse caso, será de 8 pontos percentuais para mais ou para menos.

Dadas essas estimativas pontuais, bem como seus desvios correspondentes, é possível construir alguns cenários que incorporem esses valores e que representem, no final, o retorno esperado atrelado às diferentes combinações de rentabilidade do mercado de renda fixa (NTN-B e inflação) e de variável (Ibovespa).

Partindo do cenário-base (8,16% a.a. de retorno na renda fixa e 12% a.a. nas operações de renda variável, ambas nominais), são previstos, então, aumentos dos rendimentos da carteira conforme ocorram deslocamentos positivos de cada um dos retornos individuais das aplicações, ocorrendo o oposto quando da queda dos juros associados a ambos os investimentos. Nota-se que, apesar da impossibilidade de retornos negativos (pela construção feita; afinal, não é esperado que haja deflação na economia brasileira) advindos das operações de renda fixa, tal cenário é passível de ocorrência nos investimentos de renda variável, sugerindo que os ativos garantidores alocados nessa modalidade possam estar sujeitos à desvalorização.

4.3 O Produto

Reunindo as características atuariais e de investimento apresentadas, o UL se desenvolve em uma conta nocional (o AV) para cada segurado ao longo do tempo, como trazido pela equação 1. Dada a distinção dos dois tipos de apólice (A e B), o cálculo dos termos referentes à movimentação do AVt será particionado entre essas duas categorias.

No que tange aos benefícios fiscais decorrentes de ganhos financeiros obtidos com o produto, uma vez que a Susep não normatizou o UL até o momento em que esse texto era redigido, esses aspectos serão desconsiderados nas avaliações das contas individuais. No entanto, é importante ressaltar que essa especificidade, assim que definida pelo regulador nacional, pode influenciar não apenas os modelos adotados e os resultados, mas também os incentivos que os agentes econômicos teriam para comercializar o UL.

4.3.1 Apólice tipo B

Nesse tipo de apólice, o valor total pago em caso de sinistro aumenta a cada período de análise dado ADB fixo e AV suposto crescente no tempo. Para calcular a dinâmica das contas individuais, quatro variáveis serão consideradas: o CoI, os prêmios, os encargos administrativos e a taxa de juros dos ativos na conta de investimentos.

Com relação à proteção securitária da equação 1, tem-se que:

C o I t = A x + t : 1 | - × A D B t (4)

em que CoIt reflete o PUP que seria pago pelo indivíduo no mercado privado por um seguro de vida temporário de um ano de vigência, passível de renovação.

Dada essa primeira componente, os prêmios a serem vertidos pelo segurado (Pt ) abarcam o CoIt (o prêmio atuarialmente justo) e outras duas parcelas incrementais: (i) a margem adicional de carregamento para liquidar os custos administrativos da operação; e (ii) o volume destinado à carteira de investimentos.

Os encargos administrativos operacionais adotados (ECt ) da equação 1 foram fixados em 1% sobre o valor dos prêmios arrecadados mais um adicional monetário. Trata-se de montante destinado a cobrir despesas operacionais diversas da gestão dos produtos securitários.

Por fim, em relação aos juros creditados no AV da equação 1, it , a taxa estimada está atrelada à composição da carteira de investimentos adotada pela companhia seguradora. A relação entre o perfil de risco do gestor dos fundos e o percentual alocado em cada classe de investimento - condizente com os limites legais, segundo os quais pelo menos 51% dos ativos garantidores deverão ser investidos na modalidade de renda fixa, como definido pela Resolução CMN n. 4.444/2015CMN Resolution n. 4,444/2015. (2015). Discusses the rules that govern the application of the resources from technical reserves, provisions, and the funds of insurance companies, capitalization companies, complementary open pension entities, and local reinsurers, regarding applications of resources required in the country to guarantee the obligations of the admitted reinsurer and regarding the portfolio of Individual Planned Retirement Funds (Fapi). https://www.bcb.gov.br/htms/normativ/Resolucao4444.pdf?r=1
https://www.bcb.gov.br/htms/normativ/Res...
- adotada neste estudo será a seguinte: caso a companhia adote uma postura conservadora, 80% dos ativos são investidos em renda fixa. Caso se decida pelo perfil moderado, então 60% dos recursos geridos são alocados nos títulos públicos federais.

Depois de determinada a alocação inicial dos recursos - fator discricionário e passível de simulações -, a remuneração associada a cada classe de ativos é calculada conforme exposto na seção 4.1, seguindo os ditames do Art. 39 da Resolução CNSP n. 344/2016CNSP Resolution n. 344/2016. (2016). Discusses the rules and criteria for structuring, selling, and operationalizing Universal Life Insurance. https://www.in.gov.br/materia/-/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/24798719/do1-2016-12-27-resolucao-cnsp-n-344-de-26-de-dezembro-de-2016-24798675
https://www.in.gov.br/materia/-/asset_pu...
. No Brasil, a rentabilidade do saldo da PMBaC é ligada ao desempenho dos Fundos de Investimentos Especialmente Constituídos (FIE), cujos limites legais são dados pela Resolução CMN n. 4.444/2015CMN Resolution n. 4,444/2015. (2015). Discusses the rules that govern the application of the resources from technical reserves, provisions, and the funds of insurance companies, capitalization companies, complementary open pension entities, and local reinsurers, regarding applications of resources required in the country to guarantee the obligations of the admitted reinsurer and regarding the portfolio of Individual Planned Retirement Funds (Fapi). https://www.bcb.gov.br/htms/normativ/Resolucao4444.pdf?r=1
https://www.bcb.gov.br/htms/normativ/Res...
. Assume-se que a seguradora cobra um spread pela decisão de diversificação de investimentos, visando maximizar o retorno auferido pelo FIE, de modo que os juros creditados nas contas individuais sejam as taxas de retornos resultantes das aplicações menos o spread.

4.3.2 Apólice tipo A

Nesse tipo de apólice, diferentemente do caso anterior, em que o total indenizado refletia o movimento do AV (uma vez que o ADB era constante e pré-determinado), o valor devido em caso de sinistro - também referido como face amount (FA), isto é, o somatório das parcelas securitária e de acumulação financeira pagas em caso de morte do segurado - é fixo, de forma que o ADBt tende a diminuir ao longo do tempo devido ao crescimento do valor da conta individual AVt A relação entre esses valores é evidenciada na equação 9.

A forma de cálculo de ECt , it e Pt é análoga à apólice tipo B. Contudo, os valores de CoIt e ADBt são estimados de outra maneira, devido à inclusão do corridor factor adjustment γt (conforme indicado na equação 10). Como explicitado na seção 3, esse fator garante a preservação da característica securitária do UL nos casos em que os ganhos auferidos com os juros da carteira promovem o crescimento acelerado das contas individuais, que, assim, passam a representar grande parcela (ou a integralidade) do benefício total.

Assumindo a mesma taxa de juros it e considerando que o sobrescrito c indica a aplicação do fator de ajuste e f denota que a incidência desse fator não é admitida, tem-se que:

C o I t = max C o I t f , C o I t c (5)

A D B t = max A D B t f , A D B t c (6)

em que

C o I t f = A x + t : 1 | - × A D B t f = A x + t : 1 | - × [ F A - A V t - 1 + P t - E C t × 1 + i t ] 1 - A x + t : 1 | - × ( 1 + i t ) (7)

C o I t c = A x + t : 1 | - × A D B t c = A x + t : 1 | - × 1 + i t × γ t - 1 × A V t - 1 + P t - E C t 1 + A x + t : 1 | - × ( 1 + i t ) × γ t - 1 (8)

Ademais:

A D B t f = F A - A V t (9)

A D B t c = γ t - 1 × A V t (10)

A partir do desenvolvimento desses modelos e da consequente atribuição de valores a AVt , a avaliação da viabilidade comercial do produto, tanto do ponto de vista empresarial como individual, poderá ser efetivada a partir das métricas que serão abordadas na próxima seção.

4.4 Métricas de Avaliação e Viabilidade

4.4.1 Demanda

Do ponto de vista individual, a métrica adotada para verificar a vantagem comparativa do UL ante a outras opções combinadas de seguros e investimentos será a TIR, também abordada por Cherin e Hutchins (1987Cherin, A. C., & Hutchins, R. C. (1987). The rate of return on universal life insurance. The Journal of Risk and Insurance, 54(4), 691-711.).

Dado que os contratantes têm a opção de alocar no mercado privado o prêmio que seria despendido no produto híbrido, trata-se de um indicador que permite, em última instância, avaliar, sob o ponto de vista da demanda, se o indivíduo estaria numa melhor situação adquirindo o UL ou comprando um seguro de vida temporário renovável no mercado e aplicando o excedente em portfólios ou fundos de investimento que oferecessem benefícios e riscos similares ao UL. Isso é possível por meio da comparação direta do retorno atrelado a essas duas alternativas, sendo a TIR obtida por meio da equação 11:

VPL= t=0TFCt(1+TIR)t=0, em que FCt=-(Pt-PCt), se tT e FCt=CVt, se t=T, (11)

com PCt representando o prêmio comercial de um seguro de vida temporário disponível no mercado. Para estimá-lo, utilizou-se a equação 12 para incorporar ao prêmio atuarialmente justo (CoI) o somatório dos carregamentos e encargos da operação (k).

P C t = C o I t ( 1 - k ) (12)

No caso específico do UL, em conformidade com o trabalho de Cherin e Hutchins (1987Cherin, A. C., & Hutchins, R. C. (1987). The rate of return on universal life insurance. The Journal of Risk and Insurance, 54(4), 691-711.), as entradas consideradas serão os prêmios pagos a cada instante de tempo pelo segurado menos o prêmio comercial médio praticado pelo mercado privado por um seguro de vida temporário de um ano. Isso cria um cenário de investimento fictício para o indivíduo, que recebe, após o tempo de permanência com o contrato, um retorno de montante igual ao cash value. Nesse particular caso, a TIR representa, portanto, o custo de oportunidade atrelado à permanência do contratante no UL.

4.4.2 Oferta

Apesar de a TIR revelar o potencial de penetração do UL no mercado, sua análise está restrita à perspectiva individual. Assim, faz-se necessário avaliar a viabilidade do produto também sob a ótica empresarial, de forma a verificar se as entidades seguradoras têm potencial para enxergar no UL uma oportunidade de comercialização.

A métrica de avaliação adotada, nesse caso, será o profit testing, também utilizada por Dickson et al. (2013Dickson, D. C. M., Hardy, M. R., & Waters, H. R. (2013). Actuarial mathematics for life contingent risks. Cambridge University Press.). O método consiste em avaliar o resultado da empresa seguradora a cada período de tempo e verificar o instante em que ocorre o chamado payback da operação (momento em que os retornos do produto já são suficientes para liquidar os aportes iniciais de realização do projeto). A execução é desenvolvida em duas etapas. Primeiro, calcula-se o vetor de lucros da empresa Prt , como apresentado pela equação 13:

P r t = A V t - 1 + P t - E t + I t - E D B t - E S B t - E A V t (13)

em que AVt-1 representa o valor da conta individual no instante t-1, Pt é o prêmio pago pelo indivíduo em t, Et são os encargos administrativos globais da seguradora, não sendo necessariamente equivalentes a ECt da equação 1 (ou seja, parte dos lucros auferidos pela seguradora já́ está contabilizada e incorporada nas despesas individuais, juntamente com os demais custos atrelados às apólices), e It denota a taxa que representa o rendimento total obtido pela empresa na sua carteira de investimentos. EDBt , ESBt e EAVt retratam, respectivamente, os três cenários passíveis de movimentação do AVt a cada período de tempo t: (i) morte do segurado; (ii) resgate do cash value; e (iii) continuidade da conta. No primeiro caso, o valor esperado dos benefícios pagos por morte no final do t-ésimo ano (EDBt ) é o produto da probabilidade de morte do indivíduo entre t-1 e t pelo valor total pago em caso de sinistro (AVt + ADBt ), somado a um acréscimo devido à despesa adicional incorrida na morte do segurado. Na segunda situação, o custo esperado dos benefícios resgatados em t (ESBt ) é o valor do surrender value em t acrescido de um valor incremental e também referente aos custos transacionais, ponderados pela probabilidade de resgate em t. No último cenário, por fim, o valor esperado no final do t-ésimo ano para as contas que continuarem vigentes (EAVt ) é o produto de AVt pela probabilidade de permanência do indivíduo com o produto.

Dada a criação do vetor de lucros por meio da equação 13, a segunda etapa de desenvolvimento do profit testing consiste em multiplicar os valores desse vetor em t pela probabilidade de vigência da apólice no início de cada período:

π t = P r t × p x + t - 2 00 × 1 - p x + t - 1 0 d - q x + t - 1 0 w + p x + t - 1 0 d × q x + t - 1 0 w (14)

em que px+t-200 é a probabilidade de a apólice estar vigente até o instante t-1, px+t-10d é a probabilidade de o indivíduo não morrer entre t-1 e t e qx+t-10w refere-se à probabilidade de resgate entre t-1 e t. Posteriormente, para encontrar o valor presente líquido do lucro (NPVt ), aplica-se um desconto de jt em πt e soma-se o valor encontrado com NPVt-1:

N P V t = π t × 1 + j t - t + N P V t - 1 (15)

Assim, tem-se a natureza estocástica de NPVt representando o resultado das operações a cada período de análise e, no instante em que há inversão de sinal e os valores passam a ser maiores do que 0, observa-se o payback do produto UL.

5. RESULTADOS

5.1 Hipóteses e Premissas

Dadas a estrutura do modelo e a metodologia descrita nas seções 3 e 4, as premissas adotadas para a operacionalização dos cálculos são apresentadas na Tabela 1.

Tabela 1
Premissas para o cálculo das contas individuais e métricas de avaliação do Universal Life (UL)

Sob a ótica do segurado, o prêmio inicial encontra-se em bases anuais e foi considerado constante para todos os anos em que houve desembolso (100% de densidade contributiva). Juntamente com as hipóteses do ADBt , do percentual da mortalidade padrão, do ECt e da rotatividade, essas premissas estão relacionadas com o indivíduo representativo e são utilizadas para viabilizar o desenvolvimento da conta individual AVt , em conformidade com a equação 1.

Já as premissas atreladas ao contexto da empresa seguradora referem-se, em geral, aos encargos incorridos pela entidade na sua própria operação. As despesas iniciais e administrativas estão vinculadas às possíveis movimentações das contas individuais e foram contabilizadas a partir dos modelos de custeio híbrido (percentual dos prêmios e adicional monetário) e de montante fixo. Para materializar o desenvolvimento das contas do profit testing, assumiu-se um spread de 2% sobre os rendimentos obtidos nas aplicações financeiras e uma taxa de desconto de 2% para avaliação dos resultados anuais, refletindo a expectativa de crescimento do produto interno bruto (PIB) brasileiro. A escolha dessa taxa de desconto baseou-se nos resultados de edições do Relatório Focus do BC de meados de outubro de 2019, quando o trabalho foi concebido. Por ao menos cinco semanas foi mantida a expectativa de crescimento nesse patamar.

Para fins de exercício empírico, adotou-se a mesma tábua de rotatividade utilizada por Dickson et al. (2013Dickson, D. C. M., Hardy, M. R., & Waters, H. R. (2013). Actuarial mathematics for life contingent risks. Cambridge University Press., pp. 449-457) para incorporar a situação em que o acesso dos contratantes ao surrender value não é oriundo de sinistro, mas por meio do resgate em vida. Os valores provenientes dessa tábua representam, portanto, o percentual esperado de apólices resgatadas ao fim de cada ano adicional de duração do contrato e são utilizados para compor o ESBt , cujo efeito pode ser diretamente observado no vetor de lucros da companhia seguradora. Seguindo os mesmos critérios dos autores, foram utilizadas, ainda, as taxas de penalidade por resgate antecipado e o corridor factor adjustment.

Com relação ao fator k - refletindo o repasse das despesas da própria gestão operacional para os prêmios comerciais, segundo a equação 12 -, foram adotados três valores distintos em função da faixa etária do indivíduo: 0,5, 0,4 e 0,3 para as idades de 20, 40 e 60 anos, respectivamente. A escolha de níveis decrescentes em função da idade é uma maneira de preservar o formato da curva original de prêmios atuarialmente justos, que cresce naturalmente em função da maior probabilidade de morte. Caso fosse aplicado um fator constante para todas as idades, criar-se-ia uma distorção exponencial na diluição dos custos por idade: a massa mais jovem arcaria com custos operacionais menores, pois os prêmios atuarialmente justos para esse grupo são naturalmente mais baixos, e os custos maiores ficariam a cargo da massa de segurados mais idosa, que, de partida, tem valores muito altos de prêmios associados e, por isso, estaria menos propensa a arcar com dispêndios ainda mais elevados.

Enquanto os critérios específicos são definidos e fixados nas análises dos resultados, os critérios gerais da Tabela 1 representam os fatores utilizados na avaliação da sensibilidade dos resultados em relação às características do detentor da apólice e do contexto de mercado no qual a empresa está inserida. Isso permite, em última instância, identificar os cenários nos quais o UL se mostra mais atrativo para os potenciais participantes desse mercado.

5.2 Resultados - Perspectiva Individual

5.2.1 Cenário-base

Atribuindo as premissas apresentadas na Tabela 1 à equação 11, obtêm-se os resultados associados à métrica de avaliação individual apresentada no trabalho. Adotando-se, inicialmente, a tábua de mortalidade AT-2000 e considerando indivíduo representativo um segurado homem, contratante da apólice tipo B aos 40 anos que permanece com o produto por 10 anos, auferindo os rendimentos esperados de cada aplicação e tendo alocado 80% dos ativos em renda fixa - cenário-base - a TIR nominal obtida com o UL é de 9,10% a.a.

5.2.2 Análise de sensibilidade - Simulação de novos cenários

Para além do cenário-base, os valores da TIR para as diversas combinações de perfis segurados, retornos de mercado e características de contrato para uma apólice tipo B - conforme os critérios gerais da Tabela 1 - são expostos na Tabela 2.

Tabela 2
Taxa interna de retorno (TIR) para o Universal Life (UL) tipo B para diferentes sexos (S), idades de contratação (Id) e duração da apólice (D), considerando 80% dos ativos aplicados em renda fixa

Verifica-se, na Tabela 2, que os valores mais altos do indicador se concentram, majoritariamente, nas situações em que os retornos financeiros oriundos dos fundos gerenciados pela empresa são substancialmente elevados. Nesses cenários, a TIR do contrato supera, em geral, a taxa de retorno que seria obtida caso o indivíduo contratasse um seguro de vida a termo no mercado privado e investisse - diretamente e sem a intermediação de um agente ou empresa - na mesma carteira de investimentos adotada pela seguradora (no cenário-base, por exemplo, a taxa de retorno obtida pelo indivíduo no mercado privado seria de 8,93% a.a.). Tal vantagem ocorre porque os juros creditados nas contas do detentor da apólice se comportam como fatores de desconto nos valores e carregamentos que seriam pagos no seguro individual.

Além disso, variando o percentual alocado em cada um dos tipos de investimento, nota-se que a atribuição de uma proporção maior do fundo aos títulos de renda fixa garante, em geral, maior estabilidade dos resultados - situação associada à alta variância de retornos históricos observada nas ações negociadas na B3.

No que tange às características individuais, as variações da TIR em função do sexo do participante e sua respectiva idade de entrada estão fortemente relacionadas com o aproveitamento dos efeitos de desconto advindos dos juros creditados nas contas nocionais. Tal efeito é ainda mais evidente quando os prêmios comerciais praticados em mercado são maiores. Observa-se, assim, que as mulheres têm, ordinariamente, valores de TIR mais baixos do que os homens, dadas sua expectativa de sobrevida mais elevada e, consequentemente, menor prêmio de seguro a ser desembolsado no mercado privado.

Seguindo o mesmo critério e isolando os demais fatores, um aumento na idade de entrada aumenta monotonicamente o resultado da operação: indivíduos de 60 anos, cujos prêmios no mercado são substancialmente elevados, conseguem abater grande parte dos custos securitários com os rendimentos advindos dos próprios fundos de investimento, ao passo que, para os jovens (idade de entrada de 20 anos), esse efeito não é expressivo. Ademais, destaca-se aqui uma importante característica do UL: a possibilidade de manter o mesmo valor de importância segurada (ADBt ) a partir de prêmios constantes e nivelados. Como exemplo, nota-se que, no caso de segurados de 60 anos, há momentos em que o prêmio do UL (R$ 2.250) não seria suficiente para, sozinho, arcar com o custo crescente que seria pago no mercado privado, visando manter o capital segurado fixo de R$ 100.000,00. Pelo desenho híbrido do produto, entretanto, é possível continuar com essa mesma indenização pagando uma quantia constante, devido aos juros históricos acumulados nas contas individuais.

Por fim, em relação à duração das apólices, encontra-se um nível ótimo de TIR em 8 anos de vigência do contrato, similar aos resultados de D’Arcy e Lee (1987D’Arcy, S. P., & Lee, K. C. (1987). Universal/variable life insurance versus similar unbundled investment strategies. The Journal of Risk and Insurance, 54(3), 452-477.). Trata-se de um período em que são equilibrados os efeitos das penalidades por resgate antecipado, crescimento dos custos da parcela securitária e acumulação de juros provenientes das aplicações.

Os valores da TIR associados à aplicação de 60% dos ativos em renda fixa não foram mostrados devido à restrição de espaço, bem como devido à similaridade com os resultados obtidos a partir da utilização de um percentual de 80%. Ademais, foram realizadas outras simulações para além das expostas nas tabelas 2 e 3. Caso o leitor tenha interesse, os demais resultados podem ser fornecidos pelos autores mediante solicitação.

A Figura 2 apresenta os efeitos marginais atrelados à variação de cada uma das características apresentadas nos critérios gerais da Tabela 1. A partir do cenário-base abordado na seção anterior, pode-se obter uma TIR para cada nova situação ao se alterar, individualmente, cada uma das variáveis descritas. Nessa segunda análise, além da mudança do padrão de mortalidade (tábua BR-EMS2015-mt, refletindo a experiência brasileira), foram consideradas novas idades de contratação, duração da apólice e rentabilidade dos investimentos em renda variável - incorporando, até mesmo, a possibilidade de desvalorização do capital investido. Apesar de a tábua AT-2000 ser utilizada para coberturas de sobrevivência e a BR-EMS-mt ser adotada para coberturas por morte, os resultados são comparativamente menos sensíveis a essa variável, de maneira que a escolha da tábua AT-2000 (conservadora, nesse caso) não acarreta distorções nos resultados. A partir do cenário-base, as variáveis mais sensíveis na composição do resultado são o retorno da renda variável, o retorno da renda fixa, o percentual alocado em renda fixa, a idade inicial de contratação e a duração da apólice.

Todas as simulações feitas para o contrato do tipo B foram replicadas para um contrato do tipo A. Porém, os resultados da TIR para esse caso, apesar de serem inferiores - em função do menor custo da parcela referente ao pecúlio por morte que seria paga no mercado privado (influenciada pelo crescimento das contas individuais e do benefício fixo total) -, ainda continuam muito similares aos outputs da apólice adotada no cenário-base.

Figura 2
Efeitos marginais das variáveis atreladas à composição dataxa interna de retorno (TIR) .

5.3 Resultados - Perspectiva Empresarial

5.3.1 Cenário-base

Considerando o mesmo cenário-base descrito na subseção anterior, o resultado da operação, sob a ótica da companhia, sugere possibilidade de comercialização do produto: o lucro esperado para a empresa, com uma apólice subscrita e após 10 anos de contrato com o indivíduo representativo, é de, aproximadamente, R$ 701. O payback do negócio é verificado depois dos 9 anos iniciais de vigência, sugerindo que o interesse das seguradoras é maior para contratos de longo prazo de duração.

5.3.2 Análise de sensibilidade - Simulação de novos cenários

Nesta seção são apresentados os resultados monetários da empresa seguradora ofertante do UL pelos mesmos perfis adotados na avaliação da TIR. Os valores estimados para o vetor de lucros do profit testing são trazidos pela Tabela 3.

Tabela 3
Profit testing (em R$) para o Universal Life (UL) tipo B para diferentes sexos (S), idades de contratação (Id) e duração da apólice (D), considerando 80% dos ativos em renda fixa

Nota-se que, apesar da relação diretamente proporcional do lucro com os rendimentos auferidos na aplicação dos recursos financeiros, as rentabilidades exercem menos influência nos resultados se comparadas à idade de entrada do segurado e ao tempo de duração da apólice. Isso decorre do fato de que: (i) devido às taxas de mortalidade crescentes ao longo do tempo, e fixado o valor inicial de prêmio pago, quanto mais tardia for a aquisição do UL pelo indivíduo, maiores serão as provisões que a empresa deverá constituir para liquidar possíveis sinistros (EDBt ); e (ii) como característica do mercado segurador, incorre-se em elevados custos de angariação no primeiro período do contrato, sendo necessário um horizonte maior de tempo para que a entidade comece a reverter as despesas iniciais. Além disso, o acúmulo de recursos provenientes das contas individuais por um período maior permite à empresa maiores lucros em função do spread retido nas aplicações.

Os melhores cenários de lucro estão, portanto, atrelados às apólices de vigência mais extensa (entre 10 e 20 anos) e idades de entrada mais baixas de seus respectivos detentores (aproximadamente 20 e 40 anos). Mulheres promovem resultados levemente superiores em função de sua maior expectativa de sobrevida.

Ao analisar-se o desempenho das apólices tipo A sob a perspectiva das firmas, atesta-se que é mais vantajoso para a seguradora comercializar apólices do tipo B, uma vez que, em decorrência da dinâmica particular desse contrato, o custo de uma apólice de seguro de vida (CoI) dessa modalidade é geralmente menor, promovendo, assim, valores maiores disponíveis para resgate comparativamente à apólice tipo B. Além disso, como o fator de ajustamento garante uma relação entre ADB e AV nos casos em que o bom desempenho dos fundos promove um crescimento expressivo das contas nocionais, o valor do benefício total devido em caso de sinistro é acrescido nessas circunstâncias, incrementando o valor das provisões.

Combinando os resultados das Tabelas 2 e 3, é possível determinar as variáveis mais sensíveis aos resultados e, consequentemente, as condições mais vantajosas para a comercialização do UL no Brasil: (i) retornos altos dos investimentos em renda fixa e renda variável (iguais ou acima do esperado) - fator dominante na perspectiva individual -; e (ii) apólices de duração mais longa (entre 10 e 20 anos de contrato) - fator dominante sob a ótica da firma. Conclui-se, portanto, que o melhor cenário é materializado quando se observam elevados retornos financeiros e que, em linhas gerais, o potencial contratante desse produto é um indivíduo tipicamente mais idoso, com perspectivas de permanência de longo prazo no UL.

5.4 E se as Taxas de Juros Caírem?

Dada a relevância das taxas de juros sobre os valores da TIR, é importante explorar os efeitos marginais dessa variável na análise de viabilidade do UL - especialmente se considerada a tendência atual de queda dos retornos observados. A Figura 3 traz um comparativo da sensibilidade da TIR do UL com os retornos auferidos no mercado privado (supondo o mesmo portfólio de investimentos da seguradora), a partir de variações na remuneração dos títulos públicos federais e considerando as demais premissas do cenário-base.

Conforme abordado na seção 5.2, se os retornos de renda fixa reproduzirem ou superarem os níveis esperados, os juros creditados nas contas individuais reduzem os dispêndios com a parcela securitária e com os encargos administrativos a ela associados, tornando o UL mais atrativo em relação ao mercado privado - sobretudo para perfis segurados que tenham alto prêmio associado. Movendo-se para o lado esquerdo do gráfico, no entanto, esse efeito torna-se cada vez menor: no caso limite de taxas de retorno extremamente baixas, não é possível auferir nenhum tipo de rendimento que promova a dedução das parcelas securitária e operacional do contrato, tornando diminuta - senão inexistente - a vantagem híbrida do produto. Nesse caso, o mecanismo do UL se aproxima cada vez mais da dinâmica realizada no mercado privado (compra de seguro e investimento de excedente), porém, com a intermediação de uma empresa, que, nesse caso, precisa ser remunerada. Consequentemente à incidência dos encargos administrativos e ao spread retido pela seguradora, os resultados individuais do UL são, nesse caso, inferiores aos apresentados pelo mercado privado.

Figura 3
Efeitos marginais da taxa de juros na taxa interna de retorno (TIR) e comparação com o mercado privado

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O principal objetivo deste estudo era avaliar - sob o ponto de vista individual - a viabilidade do UL no Brasil. Foram realizadas simulações variando as características do contratante e o cenário macroeconômico do país, a fim de identificar tanto a sensibilidade dessas variáveis frente ao resultado financeiro do produto (TIR) como os perfis mais propensos à sua contratação. Posteriormente, foram utilizadas métricas de avaliação empresariais para verificar a possibilidade de oferta do UL e, assim, analisar os efeitos da criação de um mercado nacional para o produto, tendo em vista a indefinição da Susep acerca de sua regulamentação.

Os resultados revelaram que, considerando o cenário-base, a TIR nominal de 9,1% a.a. é mais alta se comparada ao retorno advindo da aquisição apartada dos mesmos benefícios ofertados pelo UL no mercado privado. Isso é observado, em geral, nos casos de alta nos retornos financeiros obtidos e decorre de duas características exclusivas do produto: (i) seu aspecto híbrido, que possibilita a utilização dos rendimentos acumulados como fator de desconto na parcela securitária e nos encargos que seriam despendidos no mercado privado; e (ii) a possibilidade de manutenção da mesma cobertura segurada por meio do pagamento de valores nivelados de prêmio (flexibilidade contributiva). Ambos os efeitos se mostram mais relevantes quando o custo de oportunidade do UL é baixo frente aos custos de aquisição do mercado, especialmente no caso em que os indivíduos têm idades mais avançadas de contratação (60 anos). Apesar de não corroborar as conclusões obtidas por Cherin e Hutchins (1987Cherin, A. C., & Hutchins, R. C. (1987). The rate of return on universal life insurance. The Journal of Risk and Insurance, 54(4), 691-711.), no entanto, essas conclusões se justificam pelas taxas de juros no Brasil serem historicamente mais altas frente às americanas.

Do ponto de vista da seguradora, a variável mais sensível nos resultados do profit testing é a duração do contrato: dados o spread retido nos investimentos e a incidência de altos custos iniciais de operação, quanto mais longa a permanência do segurado na carteira, mais lucro a seguradora obtém. Tal fato contrasta com o ponto ótimo de TIR individual, que se encontra após 8 anos de extensão de contrato - momento de equilíbrio entre a acumulação financeira e o custo crescente da parcela de proteção.

Portanto, tendo em vista os resultados da TIR e do profit testing apresentados, têm-se argumentos que justificam a comercialização do UL no Brasil, principalmente considerando-se o público com idades mais altas de contratação, os cenários de alta nas taxas de juros nacionais e políticas de estímulos às apólices de longo prazo.

Dadas a inexistência de uma literatura nacional sobre o tema e a não conclusão da regulamentação do produto por parte da Susep, foram encontradas poucas evidências que pudessem retratar adequadamente as questões tributárias envolvidas na decisão de planejamento financeiro individual. Da mesma maneira, não foram contemplados os prêmios comerciais praticados em mercado, sendo essas as principais limitações deste estudo. Além desses aspectos, trabalhos futuros poderiam incorporar, ainda, a existência de taxas mínimas garantidas e a possibilidade de escolha individual da carteira de investimentos (Variable UL).

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Editado por

Editor-Chefe:

Fábio Frezatti

Editor Associado:

Luís Eduardo Afonso

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Abr 2022
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2022

Histórico

  • Recebido
    18 Dez 2020
  • Revisado
    01 Maio 2021
  • Aceito
    01 Nov 2021
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