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O argumento da “voz diferente” nas trajetórias profissionais das desembargadoras do TJPA

Resumo

Nosso objetivo é analisar a relação entre gênero e atuação jurisdicional no Tribunal de Justiça do Pará (TJPA), composto, majoritariamente, por desembargadoras, em termos de efetivação de direitos humanos de mulheres. Buscamos problematizar a hipótese de uma “voz diferente”, recorrente em pesquisas sobre mulheres na profissão jurídica: afinal, a maior presença de mulheres no Judiciário pode trazer uma perspectiva diferente? A metodologia utilizada é qualitativa, tendo como instrumento privilegiado de coleta de dados entrevistas semiestruturadas com as desembargadoras do órgão. Concluímos que a atuação jurisdicional das entrevistadas é influenciada por uma leitura androcêntrica do princípio da imparcialidade, que suprime quaisquer sinais de diferença, seja das próprias juízas, seja dos jurisdicionados. Esses resultados apontam para a necessidade de se repensar não apenas a cultura masculina imbricada na profissão jurídica, mas, principalmente, os fundamentos capazes de servir como sólida base teórica para assegurar a igualdade de gênero (e de outros marcadores de diferenças sociais) no Poder Judiciário.

Palavras-chave:
Democratização do sistema de justiça; Direitos humanos de mulheres; Argumento da diferença

Abstract

Our objective is to analyze the relationship between gender and jurisdictional action in the State of Pará Court of Justice, mainly composed of judges, regarding the effectiveness of women's human rights. We seek to problematize the hypothesis of a “different voice,” recurrent in research on women in the legal profession. After all, may the greater presence of women in the judiciary bring a different perspective? The methodology used is qualitative, having as a privileged instrument of data collection semi-structured interviews with the judges of the organ. We conclude that the jurisdictional performance of the interviewees is influenced by an androcentric reading of the principle of impartiality, which suppresses any signs of difference, whether from the judges themselves or from the people under their jurisdiction. These results point to the need to rethink not only the male culture imbricated in the legal profession, but also the foundations capable of serving as a solid theoretical basis to ensure gender equality (and other markers of social differences) in the judiciary system.

Keywords:
Democratization of the justice system; Women's rights; Difference argument

1 Introdução

O presente texto é resultado de nosso trabalho de pesquisa de mestrado, no qual buscamos analisar, a partir de dados sobre a composição de gênero dos Tribunais de Justiça estuais do Brasil, por que o Tribunal de Justiça do Estado do Pará é o único cuja composição de desembargadoras ultrapassa a de desembargadores; e se esse fato impacta na atuação jurisdicional do órgão, em termos de efetivação de direitos humanos de mulheres.

Embora exista considerável produção acadêmica sobre a presença de mulheres no Poder Judiciário, na América Latina a discussão ainda está ganhando força, em especial em relação aos impactos que a inserção de juízas pode oferecer para a magistratura e para o Direito. Por essas razões, o estudo do TJPA, além de contextualizar as pesquisas sobre feminização da profissão jurídica no cenário brasileiro a partir de dados sobre a composição de gênero nos Tribunais brasileiros, procura problematizar as possíveis contribuições da presença feminina em órgãos historicamente compostos por homens.

O perfil sociodemográfico da magistratura brasileira tem alterado muito pouco desde os anos 1990: a maioria dos juízes se declara branca, oriunda de estratos sociais médios e altos, casados, com filhos e, em média, têm 46 anos. A maioria também afirma ser católica e ter parentes próximos na mesma profissão. Apesar de algum acréscimo de mulheres e de pessoas não brancas nas duas últimas décadas, o perfil branco e masculino no topo da carreira permanece quase imutável (CNJ, 2018CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). Perfil Sociodemográfico dos Magistrados Brasileiros. Brasília, DF: Conselho Nacional de Justiça, 2018. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2011/02/5d6083ecf7b311a56eb12a6d9b79c625.pdf. Acesso em 28 fev. 2020.
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).

Uma exceção, ao menos quanto ao perfil de gênero, é o Tribunal de Justiça do Pará (TJPA). Em 2014, havia 64% de mulheres no topo da carreira. Além disso, o TJPA foi o primeiro tribunal brasileiro a nomear uma mulher para a sua presidência, ainda em 1979, período em que vários tribunais sequer tinham desembargadoras em sua composição. Nos últimos 10 anos, as desembargadoras exerceram a maioria dos mandatos de presidência do TJPA.

Enquanto boa parte dos estudos sobre desigualdades nas carreiras jurídicas tem se dedicado a entender os obstáculos para que o Judiciário brasileiro possa ampliar os percentuais de mulheres e pessoas não brancas em sua composição, a investigação que dá apoio ao presente artigo buscou identificar, com base na perspectiva das próprias desembargadoras, dois principais aspectos: o primeiro, o que justifica a composição majoritariamente feminina do TJPA, diferindo do perfil de outros tribunais brasileiros, bem como a sua presença nos altos escalões da carreira? O segundo aspecto refere-se à hipótese de uma “voz diferente”: a maior presença de mulheres no Tribunal de Justiça do Pará resulta em uma perspectiva diferente no processo de tomada de decisão judicial, ao menos em casos diretamente relacionados a direitos de mulheres?

Para responder a tais questões, analisamos as percepções de desembargadoras e juízas do TJPA sobre os impactos da maior presença feminina no Tribunal. Como demonstraremos nos resultados, preliminar à consideração de uma hipótese de uma “voz diferente” em relação a mulheres e outros grupos minoritários, está a necessidade de se repensar as nuances e obstáculos de uma cultura masculina imbricada na profissão jurídica, que reprime o aparecimento de quaisquer marcadores de diferenças sociais no Poder Judiciário.

2. Uma “voz diferente” no judiciário?

As investigações sobre os efeitos da presença de mulheres na profissão jurídica têm sido recorrentes em diversos países1 1 A exemplo dos Estados Unidos, Reino Unido, Israel, Argentina, México, Canadá, Austrália, Nova Zelândia e Japão. , sobretudo em relação à carreira da magistratura. Para Kate Malleson (2007)MALLESON, Kate. La justificación de la igualdad de género en la magistratura: por qué la diferencia no funciona. Revista Jurídica de la Universidad de Palermo, año 8, núm. 1, Palermo, 2007., a popularidade desse tipo de estudo reside em dois principais aspectos: a) ele fornece um argumento sedutor em favor da participação de mulheres no Poder Judiciário; b) trata-se de argumento que contrabalanceia a supremacia dos atributos considerados masculinos e, ao mesmo tempo, valida as características femininas, até então marginalizadas e excluídas da esfera pública.

Em geral, são pesquisas que se propõem a responder a questões como: as mulheres são capazes de influenciar, qualitativamente, a profissão jurídica, resultando em um desempenho diferenciado de tarefas e de funções legais? Há uma “voz feminina” capaz de estabelecer um raciocínio e uma atuação diferenciada em relação aos homens, ainda que apenas em julgamentos relacionados diretamente às temáticas de gênero? (HUNTER, 2015HUNTER, Rosemary. More tan Just a Different Face? Judicial Diversity and Decision-Making. Current Legal Problems, p. 1-23, 2015.; GASTRON, 2009; BERCHOLC, 2015BERCHOLC, Jorge. Mujeres supremas. La cuestión de género en cortes supremas y tribunales constitucionales. Datos comparados sobre la perfomance de las juezas. Universidad de Nariño: Revista Científica CODEX, v. 1, n.1, p. 211–226, 2015.).

A hipótese de uma voz diferente2 2 A existência de uma voz diferente também é defendida por teóricos críticos raciais. De acordo com Johnson e Rohwer (2004), “a teoria crítica da raça defendeu o conceito de ‘voice of color’, que afirma que as minorias falam com uma voz distinta ou, de certa forma, observam o mundo de maneira diferente dos brancos.” (2004, p. 11). Para os autores, a importância de uma voice of color, no Judiciário, reside na possibilidade de juízes, pertencentes a grupos minoritários abordarem o Direito a partir de uma perspectiva diferente, mudando os rumos de discussões, desafiando os estereótipos, limitando comentários inapropriados, e inserindo importantes informações até então desconsideradas e excluídas. ancora-se em perspectivas do chamado feminismo da diferença, dentre as quais se destaca o trabalho de Carol Gilligan (1993)GILLIGAN, Carol. In a different voice: Psychological Theory and Women's Development. Harvard University Press, 1993., In a Different Voice: Psycological Theory and Women’s Development. Nele, Gilligan (1993)GILLIGAN, Carol. In a different voice: Psychological Theory and Women's Development. Harvard University Press, 1993. analisa o desenvolvimento psicológico moral de meninos e meninas, por meio da apresentação de dilemas morais, bem como a percepção sobre a moralidade de homens e de mulheres. A autora afirma que, nas teorias psicológicas acerca do desenvolvimento moral humano, a experiência masculina constitui o parâmetro de experiência humana, o que culminou na exclusão das vozes de mulheres. Partindo do pressuposto de silenciamento e inferiorização a que são submetidas as vozes femininas, Gilligan (1993)GILLIGAN, Carol. In a different voice: Psychological Theory and Women's Development. Harvard University Press, 1993. realizou três estudos sobre concepções de self, moralidade, experiências de conflito e de escolha. Uma das conclusões é a de que o desenvolvimento psicológico moral de meninas é diferente de meninos, o que leva à consolidação de moralidades distintas entre homens e mulheres. Para a autora, o desenvolvimento de tais percepções diferenciadas de moralidade seria um produto dos processos de socialização a que homens e mulheres são submetidos, e não algo que remete à essência dos gêneros.

De acordo com a autora, as mulheres abordam problemas morais com base em uma “ética de cuidado”, fundamentada em valores como o cuidado, a conexão e o contexto/particularidade. Isto é, as mulheres raciocinam, moralmente, a partir de uma abordagem voltada à responsabilidade nas relações. Por outro lado, o raciocínio moral de homens se baseia em direitos individuais e abstratos, em detrimento de relações concretas – ou seja, em uma “ética de justiça” (GILLIGAN, 1993GILLIGAN, Carol. In a different voice: Psychological Theory and Women's Development. Harvard University Press, 1993.).

Neste cenário, as principais hipóteses de modificações que as mulheres podem promover no exercício da atividade jurisdicional são: a transformação do sistema judicial em instituições menos competitivas e mais cooperativas (GASTRON, 2009); a substituição de uma “ética de justiça”, abstrata e imparcial, por uma “ética de cuidado”, centrada nas noções de cooperação e de resolução alternativa de disputas (COONEY, 1993COONEY, Sean. Gender and Judicial Seletion: should there be more women on the courts. Melbourne University Law Review, v. 19, p. 20-44, jun., 1993.); a mudança de ênfase sobre direitos individuais por noções de inclusão, coletividade e responsabilidade social (COONEY, 1993COONEY, Sean. Gender and Judicial Seletion: should there be more women on the courts. Melbourne University Law Review, v. 19, p. 20-44, jun., 1993.); e a maior empatia e sensibilidade, ao menos em casos envolvendo direitos humanos das mulheres (WILSON, 1992).

Entre as teóricas que apostam na existência de uma voz diferente e na possibilidade de mudanças na perspectiva androcêntrica e formalista do Direito, destaca-se Carrie Menkel Meadow (2013). Para a autora, a partir de uma performance profissional diferente dos homens, as mulheres podem modificar a lógica de competitividade e agressividade, presentes em litígios, cujos desfechos resultam em perdas e ganhos3 3 Nesse sentido, “as mulheres podem procurar soluções para problemas morais sem escolher respostas abstratas certas ou erradas, e tentarão manter o relacionamento das partes em dilemas morais constantes” (MENKEL-MEADOW, 2013, p. 86). . Outra possibilidade é a criação de estruturas diferentes de trabalho, a exemplo do que já ocorre, nos Estados Unidos, com a criação de escritórios de advocacia feminista, nos quais as mulheres estabeleceram relações mais horizontalizadas e estruturas de trabalho menos hierárquicas.

Bertha Wilson (1992), juíza aposentada da Suprema Corte do Canadá, também defende o potencial transformador que a maior presença de mulheres pode trazer ao Judiciário. A magistrada acredita que existem áreas do Direito mais (ou menos) suscetíveis à aplicação de uma perspectiva feminina e, a partir da identificação desses espaços viáveis de discussão e de transformação, alguns dos efeitos esperados são: o potencial simbólico-educativo da presença de mulheres; a desconstrução de determinados estereótipos de gênero da magistratura; o aumento da confiança pública de que a diversificação do Judiciário trará ao inserir mais mulheres; e a diminuição de discriminações de gênero nas instituições judiciárias.

A crítica ao argumento de que as mulheres, por possuírem uma perspectiva distinta em relação aos homens, podem agir diferente na carreira ou mesmo modificar o modelo predominante de atuação jurisdicional, é bastante ampla. Para Deborah Rhode (2003)RHODE, Deborah. Gender and the Profession: An American Perspective. In: SCHULTZ, Ulrike; SHAW, Gisela (Ed). Women in the World's Legal Professions. Oxford: Hart Publishing, 2003., por exemplo, a divisão do mundo, apenas com base em gênero, ignora outros marcadores de diferença social e circunstâncias que impactam nas perspectivas dos indivíduos, razão pela qual é preciso atentar para, durante a reivindicação de uma voz feminina, não recair na homogeneização da diversidade de experiências, mesmo entre as mulheres. Dependendo da cultura, classe social, raça, etnia, idade etc., os vieses e valores entre as mulheres variam muito, não sendo possível pensar em uma voz diferente como parâmetro das experiências de mulheres de forma universalizante e essencialista.

Além disso, a autora pontua que essa forma de divisão dualista, entre uma abordagem fundada em princípios abstratos e direitos individuais, e outra baseada em uma ética do cuidado, acaba por reforçar estereótipos de gênero, socialmente, já sedimentados - resultado contrário aos objetivos de qualquer proposta feminista de reforma legal e da profissão jurídica. Por tal motivo, Rhode (2003)RHODE, Deborah. Gender and the Profession: An American Perspective. In: SCHULTZ, Ulrike; SHAW, Gisela (Ed). Women in the World's Legal Professions. Oxford: Hart Publishing, 2003. entende necessário o afastamento de discursos que se valham de uma natureza essencial da mulher (cuidado, maternal, histeria, emotividade etc.).

Kate Malleson (2007)MALLESON, Kate. La justificación de la igualdad de género en la magistratura: por qué la diferencia no funciona. Revista Jurídica de la Universidad de Palermo, año 8, núm. 1, Palermo, 2007. também registra críticas ao argumento oriundo dos feminismos da diferença, quando aplicado enquanto substrato teórico em debates sobre igualdade de gênero – fato que tem sido recorrente, a ponto de relegar outros discursos teoricamente mais sólidos (a exemplo da legitimidade e da equidade) à posição de fundamentos complementares. Para a autora, é necessário ter precaução ao utilizar a diferença entre gêneros enquanto estratégia discursiva para sustentar a demanda de paridade numérica e funcional no Judiciário, por se tratar de um discurso teórico e empiricamente frágil, que acarreta problemas relacionados a essencialismos e ao reforço de papeis sociais entre homens e mulheres.

Em seu ensaio La justificación de la igualdad de género en la magistratura: por qué la diferencia no funciona (2007), Malleson faz uma revisão bibliográfica de estudos voltados, sobretudo, à análise de decisões judiciais. Conclui não haver diferenças significativas de julgamento entre homens e mulheres e, mesmo nos casos em que foram encontradas diferenças, a exemplo dos litígios envolvendo discriminação sexual4 4 A autora cita a pesquisa: CROWE, Nancy. The effects of Judges’ Sex and Race on Judicial Decision Making on the U.S. Courts of Appeals. PhD dissertation, The University of Chicago, Department of Political Science, 1999. , nem sempre elas correspondem aos estereótipos de gênero esperados5 5 Malleson (2007) cita como exemplos de pesquisas em que os resultados apresentaram uma tendência, de juízas, à imposição de maiores penas de prisão às mulheres: STEFFENSMEIER, Darrel; HEBERT, Chris. Women and Men PolicyMakers: Does the judge’s Gender Affect the Sentencing of Criminal Defendants? Social Forces 77, 1999; GRUHL, John; SPOHN, Cassia; WELCH, Susana. Women as Policymakers: The Case of Trial Judges. American Journal of Political Science, 1981. . Embora não descarte a possibilidade de uma atuação de gênero diferenciada entre homens e mulheres6 6 Nesse sentido, Malleson (2007) pontua que há importantes investigações qualitativas que não se baseiam tão somente no conteúdo das sentenças, a exemplo de pesquisas que analisam as percepções de juízas sobre a natureza da diferença de gênero em decisões judiciais e seu papel na magistratura. , as contradições encontradas em tais estudos demonstraram a fragilidade teórica e empírica deste argumento, dando lugar à incerteza sobre a existência, o alcance e o futuro das diferenças de gênero no Judiciário.

Ora, se a diferença de gênero é o único substrato teórico para a defesa da igualdade de gênero, o que acontece se/quando existirem evidências de que não há diferenças significativas? E, caso existam essas diferenças, o que ocorre quando constatado que elas não interferem no Poder Judiciário?

O argumento da atuação diferente entre homens e mulheres é também problemático do ponto de vista estratégico. De acordo com Malleson (2007)MALLESON, Kate. La justificación de la igualdad de género en la magistratura: por qué la diferencia no funciona. Revista Jurídica de la Universidad de Palermo, año 8, núm. 1, Palermo, 2007., na prática, a defesa de uma forma particular de exercício do Direito criará novas categorias de “trabalhos para mulheres”, em uma espécie de “guetização” (MALLESON, 2007MALLESON, Kate. La justificación de la igualdad de género en la magistratura: por qué la diferencia no funciona. Revista Jurídica de la Universidad de Palermo, año 8, núm. 1, Palermo, 2007., p. 45), que reforçará a divisão de áreas de trabalho masculinas e femininas, reduzindo as possibilidades de carreira e de igualdade funcional na magistratura. Além disso, a autora se mostra cética em relação à possibilidade de ressignificação e valorização, na esfera jurídica, de características “femininas”, uma vez que essas mesmas características têm sido, sistematicamente, desqualificadas em nossa sociedade. Entende, assim, que, longe de haver reconhecimento e valorização, tais atributos serão novamente desqualificados, socavando assim a justificativa para o equilíbrio de gêneros no Judiciário.

Assumindo uma posição diversa, Rosemary Hunter (2015)HUNTER, Rosemary. More tan Just a Different Face? Judicial Diversity and Decision-Making. Current Legal Problems, p. 1-23, 2015., com apoio em estudos que tanto confirmam quanto refutam a existência de uma voz diferente, argumenta em favor da possibilidade de uma composição judicial diversificada impactar, substantivamente, a deliberação judicial, mas apenas quando as diferenças se articularem com outros elementos: oportunidade e comprometimento pessoal.

O comprometimento pessoal significa a presença de juízas feministas, conscientes e envolvidas em julgamentos com perspectiva de gênero, que consideram as experiências de mulheres e as discriminações a que estão submetidas. Julgamentos feministas não são sinônimos de decisões em favor das mulheres; são julgamentos informados por teorias feministas e pela compreensão das experiências de gênero -- associadas a outros marcadores de diferença social -- e suas implicações. A adoção de julgamentos feministas nada mais é do que “prestar atenção às vozes e experiências excluídas ou marginalizadas e interpretar os fatos do caso dessa perspectiva; estar atento às experiências intersetoriais de gênero e raça/etnia, religião, sexualidade, idade e deficiência” (HUNTER, 2015HUNTER, Rosemary. More tan Just a Different Face? Judicial Diversity and Decision-Making. Current Legal Problems, p. 1-23, 2015., p. 13).

Contudo, o posicionamento feminista e a adoção de uma perspectiva de gênero, nas deliberações judiciais, não são suficientes para assegurar uma atuação diferenciada. Existem limites relativos à oportunidade desse tipo de atuação: em primeiro lugar, nem sempre há margem para qualquer forma de atuação judicial feminista e de julgamentos com perspectiva de gênero no Tribunal ou no âmbito da jurisdição em que a juíza atua7 7 Hunter (2015) oferece o exemplo de uma das magistradas que entrevistou: “Uma magistrada afirmou que estava limitada pela qualidade das provas apresentadas ao tribunal, e que, às vezes, era frustrante o fato de que, em casos de violência doméstica, a polícia não trazer todas as provas necessárias para a proteção das pessoas.” (HUNTER, 2015, p. 15). Outro exemplo mencionado pela autora foi o de um magistrado que afirmou que, no Tribunal onde trabalha, a tomada de decisões é altamente vinculada aos precedentes, o que diminui o espaço para uma atuação voltada a quaisquer perspectivas que não reflitam os posicionamentos tradicionais. ; em segundo, a maioria dos casos não levanta tais questões8 8 Esse ponto se tornou evidente para Hunter (2015) quando ela realizou um estudo sistemático de todos os julgamentos da juíza australiana Marcia Neave, durante os três primeiros anos de sua indicação, para a Corte de Apelação Estadual. Marcia Neave era conhecida por seu histórico de comprometimento com a causa feminista, tanto na advocacia quanto na academia. Dos 204 casos sobre os quais se debruçou, durante os primeiros três anos, no Tribunal, Hunter (2015) só encontrou questões feministas, ou relacionadas ao gênero, em 66 deles, o equivalente a 32%. A expressiva maioria dos casos era de natureza penal. .

Considerando a escassez de oportunidades, Hunter (2015)HUNTER, Rosemary. More tan Just a Different Face? Judicial Diversity and Decision-Making. Current Legal Problems, p. 1-23, 2015. notou que os estudos norte-americanos em Ciência Política encontraram diferenças de gênero apenas nos julgamentos de casos envolvendo women’s issues, como discriminação sexual e manutenção de pensão em divórcios, que são uma minoria das decisões judiciais. Por essa razão, para a autora, parece plausível que os estudos quantitativos norte-americanos, em geral, não encontrem diferenças de gênero na maior parte dos julgamentos, em apenas alguns casos específicos9 9 Famosas decisões feministas de juízas (como Bertha Wilson, na Suprema Corte do Canadá e Ruth Bader Ginsburg na Suprema Corte dos EUA) ocorreram em casos envolvendo women’s issues, como violência contra a mulher, direitos sexuais e reprodutivos, e a valorização do trabalho das mulheres, incluindo o trabalho de cuidados não remunerados. .

Um sistema judicial mais diversificado pode trazer decisões judiciais diferenciadas, mas não necessariamente o fará. Se é um desejo que um Judiciário diversificado signifique um processo de deliberação mais justo para a sociedade, as oportunidades devem ser aproveitadas sempre que surgirem. Isso exigirá uma mudança em relação ao apoio e incentivo da diversidade substantiva judicial, além da “nomeação de juízes e juízas que tenham o compromisso e a coragem de fazer a diferença” (HUNTER, 2015HUNTER, Rosemary. More tan Just a Different Face? Judicial Diversity and Decision-Making. Current Legal Problems, p. 1-23, 2015., p. 23).

A resposta ao questionamento sobre se as juízas julgam diferente (e em favor dos direitos de mulheres), não parece poder ser negada completamente, tampouco superestimada (GASTRON, 2009).

3. Metodologia

O presente artigo apresenta dados e análises produzidos no âmbito da investigação de mestrado “Mulheres na magistratura paraense: uma análise das percepções das desembargadoras do Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJPA) sobre trajetória profissional e atuação jurisdicional voltada à efetivação dos direitos humanos das mulheres”, e do projeto de pesquisa “Políticas e estratégias institucionais do Poder Judiciário de melhoria das condições de acesso à justiça das mulheres em situação de violência: um estudo junto às coordenadorias estaduais das mulheres dos tribunais estaduais de justiça no Brasil”, realizado com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).

A pesquisa realizada é de natureza qualitativa e usou como instrumentos de coleta de dados entrevistas semiestruturadas, análise documental e diário de campo. No total, foram realizadas onze entrevistas: oito desembargadoras atuantes, uma desembargadora aposentada e duas juízas auxiliares convocadas à época da pesquisa. As entrevistas foram realizadas no TJPA, conforme a disponibilidade de cada desembargadora, e duraram, em média, 30 a 40 minutos.

Para definição das profissionais entrevistadas, fizemos contato direto com todas as desembargadoras e juízas auxiliares que estavam presentes, no prédio do TJPA, durante os períodos de visita, convidando-as para participar da pesquisa. Ao total, foram três visitas: de 05/12/15 a 12/12/15, de 24/10/16 a 28/10/16 e de 05/04/17 a 12/04/17. Durante tais períodos, além das entrevistas, fizemos uso de diário de campo para registro de informações e de conversas informais com profissionais do TJPA, além de reunirmos documentos junto ao Museu do Tribunal, especialmente cópias de livros e biografias sobre as desembargadoras que atuam/já atuaram no órgão.

As entrevistas seguiram um roteiro composto por quatro perguntas principais sobre a formação e a trajetória profissional, a experiência no Tribunal, a percepção dos motivos pelos quais há muitas mulheres na composição do TJPA e a sobre a relação entre tal composição diferenciada e a atuação jurisdicional do órgão, enfatizando os casos envolvendo mulheres. Com o intuito de assegurar o sigilo das entrevistadas, seus nomes foram todos substituídos por nomes fictícios e os nomes das comarcas onde trabalharam foram suprimidos. Nas transcrições, algumas expressões que, embora estivessem incorretas do ponto de vista da gramática normativa, demarcavam sinais de regionalidade, a exemplo da expressão “tu entendeu?” foram mantidas.

4. Caracterização e histórico do TJPA: buscando entender por que tem mais mulheres

O percentual de 64% de mulheres na composição do TJPA é atípico, tanto em relação aos demais tribunais de justiça do país, quanto na composição de cortes superiores em diversos outros países. Não apenas elas são maioria, como também têm exercido a maior parte dos mandatos de presidência do Tribunal, ao menos nos últimos 10 anos. Nossa primeira questão de pesquisa, então, foi tentar identificar elementos que pudessem explicar as razões para esse número expressivo de mulheres ali, já que a literatura analisada sobre feminização da magistratura, nacional e estrangeira, tem reiterado diagnósticos sobre a baixa presença de mulheres nas carreiras jurídicas, sobretudo na magistratura (KAHWAGE, 2017KAHWAGE, Tharuell Lima. Mulheres na magistratura paraense: uma análise das percepções das desembargadoras do Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJPA) sobre trajetória profissional e atuação jurisdicional voltada à efetivação dos direitos humanos das mulheres. 2017. Dissertação (Mestrado em Direito) – Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2017.; SEVERI, 2016SEVERI, Fabiana. O gênero da justiça e a problemática da efetivação dos direitos humanos das mulheres. Direito e Práxis, v. 7, n. 13, p. 81-115, 2016.).

A explicação para a composição de gênero do TJPA é contada, pelas entrevistadas, através de uma narrativa uníssona: a magistratura era uma carreira que pagava muito pouco e os homens, enquanto esteios da família, acabavam migrando para a advocacia - que, à época, remunerava bem melhor. Segundo algumas desembargadoras, foi apenas na década de 1980 que o salário da magistratura começou a aumentar e a atrair os homens à carreira. A semelhança entre as falas e a recorrência com que esta narrativa surgiu também nos corredores do Tribunal10 10 Antes das entrevistas, fizemos incursões no Tribunal para conhecer o local e alguns de seus servidores, e a maioria deu a mesma resposta para a composição do TJPA. sugerem ser uma história contada e ouvida várias vezes, quase uma espécie de lenda local.

A partir dos relatos acerca dos baixos valores percebidos na magistratura paraense, solicitamos informações11 11 A solicitação dos dados relativos à remuneração da magistratura paulista decorre da necessidade de comparar os valores percebidos e confirmar (ou não) a informação fornecida pelas entrevistadas acerca dos baixos salários na magistratura paraense. sobre os vencimentos de juízes e juízas, entre os anos 1970 até 2016, via e-mail, junto ao setor de transparência do TJPA e do TJSP12 12 O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) foi utilizado, na pesquisa, para fins de comparação com alguns dados do TJPA, a exemplo da remuneração total recebida na magistratura nos dois TJs. A escolha do TJSP se justifica por ser o Tribunal analisado pelo grupo de estudos do qual fazemos, o Grupo de Estudos em Direitos Humanos, Educação e Cidadania, que realiza pesquisas sobre o eixo temático democratização do sistema de justiça e composição de gênero dos Tribunais de Justiça do país. . Como resposta, recebemos tabelas com os vencimentos de juízas e juízes de 1ª, 2ª e 3ª entrâncias e de desembargadoras e desembargadores desde 1992 e 1994, respectivamente. Embora existam algumas diferenças entre as tabelas13 13 As diferenças existentes nas tabelas decorrem do fato de que os reajustes salariais não ocorrem simultaneamente nos dois tribunais. , selecionamos, para fins desta análise e comparação entre os tribunais, a categoria dos juízes de 1ª entrância, em três períodos específicos: 1995, 2000 e 2015.

Até 1998, a remuneração total da magistratura no Pará era composta pelo vencimento base, somado à uma gratificação de representação de 170% sobre o valor dos respectivos vencimentos base. Esse acréscimo era uma forma de aumentar a remuneração recebida pelos juízes e juízas no Pará, uma vez que os vencimentos base percebidos eram, de fato, muito baixos em relação a outros estados brasileiros.

A título ilustrativo, em 1995, o vencimento da magistratura paraense na 1ª entrância era de R$731,72 (setecentos e trinta e um reais e setenta e dois centavos), enquanto na magistratura paulista este montante era de R$ 5.260,61 (cinco mil, duzentos e sessenta reais e sessenta e um centavos). Com o acréscimo da gratificação (R$1.243,92), a remuneração total da magistratura de 1ª entrância passa de R$731,72 para R$1.975,64 (mil, novecentos e setenta e cinco reais e sessenta e quatro centavos), isto é, 38% do montante total percebido pelos juízes de 1ª entrância de São Paulo.

Em 1995, o salário mínimo era R$100,00 (cem reais), o que significa que, sem a gratificação de representação, uma juíza paraense recebia o corresponde a 7 salários mínimos, enquanto uma juíza paulista percebia mais de 50 salários mínimos. Com a inserção da gratificação, a remuneração total chega a quase 20 salários mínimos.

Em 2000, ano em que os magistrados paraenses não recebiam mais a gratificação de representação, temos que a remuneração total da magistratura paulista era de R$ 7.259,97 (sete mil, duzentos e cinquenta e nove reais e noventa e sete centavos), enquanto no Pará esse valor era de R$ 5144,25 (cinco mil, cento e quarenta e quatro reais e vinte e cinco centavos), ou seja, 71% da remuneração total de São Paulo.

Atualmente, a tendência é que a remuneração se torne equivalente em ambos os estados. Em 2015, a remuneração total em São Paulo foi de R$ 26.125,92 (vinte e seis mil, cento e vinte e cinco reais e noventa e dois centavos), enquanto no Pará este valor foi de R$ 24.509,65 (vinte e quatro mil, quinhentos e nove reais e sessenta e cinco centavos), ou seja, 94% do que recebe a magistratura paulista.

Um ponto que se destacou em algumas narrativas foi o caráter de complementação da renda familiar conferido à remuneração da magistratura. Para algumas entrevistadas, o valor obtido constituía uma espécie de ajuda ao marido e aos filhos, e não uma efetiva participação na organização financeira da família. Nesse sentido, o discurso sobre a complementariedade da renda das entrevistadas, presente em falas como “eu vou ajudar meu marido com esse pouquinho” (Entrevistada 4), “a mulher trabalhava só para ela ou apenas dava uma ajuda em relação aos filhos” (Entrevistada 5), “a mulher procurava uma atividade cuja contribuição era para seus gastos pessoais e com os filhos, né” (Entrevistada 7), simboliza a baixa remuneração recebida e também parece ter correlação com o histórico de desvalorização do trabalho feminino - que afeta, inclusive, carreiras de difícil acesso, como a magistratura.

É importante destacar que esta análise se baseou apenas nas respostas fornecidas pelas entrevistadas e nas tabelas de vencimentos obtidas junto aos Tribunais de Justiça de São Paulo (TJSP) e do Pará (TJPA), conforme mencionado acima, sem olvidar a possibilidade de interferência de outros fatores nos valores recebidos pelos magistrados, a exemplo do próprio custo de vida relativo às regiões Norte e Sudeste. Assim, outros elementos não devem ser desconsiderados como fatores de influência, cabendo posteriores pesquisas sobre a temática, para fins de aprofundamento da hipótese levantada pelas desembargadoras acerca dos baixos valores recebidos na magistratura.

5. Mais mulheres fazem diferença?

Perguntamos às entrevistadas se a configuração diferenciada do TJPA afeta a atuação jurisdicional do órgão, em especial, nos casos sobre direitos humanos de mulheres. Nenhuma respondeu haver diferenças, entre homens e mulheres, na forma de julgar; algumas foram mais assertivas em suas negativas, outras recaíram em contradições ao justificarem a resposta. Diante de tal cenário, tornou-se fundamental compreender os motivos por trás da unânime negativa de uma “voz diferente”.

As explicações fornecidas são variadas. Os aspectos mais recorrentes nas respostas foram: seis entrevistadas afirmaram que, em que pese não haver diferença de atuação, as mulheres são mais sensíveis se comparadas aos homens; sete mencionaram o princípio da imparcialidade como óbice à atuação diferenciada; e, por fim, duas delas, embora tenham respondido não existir diferença (em razão da imparcialidade), logo em seguida, apresentaram divergências e contradições em suas falas, ora afirmando que homens e mulheres julgam diferente, ora negando tal informação. Com base em tais respostas, organizamos o conteúdo das respostas em três grupos: 1) negação enfática de julgamentos diferentes; 2) crença em uma maior sensibilidade feminina, sem que isso afete os julgamentos; 3) existência de uma voz diferente, que, posteriormente, foi negada.

O grupo 1 (negação enfática de julgamentos diferentes com base no gênero) 14 14 Embora algumas entrevistadas do primeiro grupo tenham mencionado uma maior sensibilidade feminina, sua resposta mais definitiva e enfática foi em relação à negação de uma atuação diferente, entre homens e mulheres, razão pela qual optamos por separá-las do grupo ii), da sensibilidade. é constituído de três entrevistadas, que responderam de forma assertiva que homens e mulheres julgam, estritamente, com base nas provas dos autos ou com base no raciocínio abstrato: “eu penso que se julga, tanto as mulheres quanto os homens, de acordo com a prova dos autos” (Entrevistada 1); e “o intelecto independe de sexo, o intelecto tem que ser considerado em relação a pessoas... pessoas mais competentes, pessoas menos competentes, independente de sexo.” (Entrevistada 5).

No grupo 2 (mulheres são mais sensíveis do que homens, porém, esse fato não afeta os julgamentos), as entrevistadas acreditam que mulheres são mais sensíveis, mas que, não necessariamente, julgam de modo diferente em razão disso. A sensibilidade feminina pode, por exemplo, ensejar uma maior compreensão das situações vivenciadas por mulheres, mas isso não interfere no julgamento: “A compreensão [da sensibilidade] sim, eu estou falando em termos de julgamento (...) Pode ser a sensibilidade pelo fato, de nós, sermos mulheres, e a gente compreender melhor, né.” (Entrevistada 10).

Para a Entrevistada 2, muitos homens não têm a sensibilidade necessária para perceber a Lei Maria da Penha como uma ação afirmativa, faltando compreensão em relação às desigualdades de gênero. Contudo, em seguida, pontuou: “não que a mulher julgue melhor, mas ela por vivenciar, por ter essa percepção mais sensível, e não falando nenhum caso específico dentro do Tribunal de Justiça do Pará, mas já li algumas notícias que relatavam essa questão [da aplicação inadequada da LMP]”. Sua fala revelou, ao longo da entrevista, uma dupla preocupação: primeiro, de resguardar a instituição em que trabalha, enfatizando que nenhum dos casos mencionados se refere ao TJPA; segundo, em relação à imparcialidade judicial, dissociando-se de eventuais extremos – “não que a mulher julgue melhor”.

A Entrevistada 6, por sua vez, apresentou-nos uma resposta contraditória, ora afirmando que a sensibilidade é do julgador (seja homem ou mulher), ora afirmando que as mulheres podem imprimir maior sensibilidade nos julgados, característica que, inclusive, é prestigiada pelos desembargadores do órgão:

A sensibilidade tem que ser do julgador, tanto homem como mulher, então isso não pode influenciar. É fato que a mulher pode imprimir uma maior sensibilidade no julgado, mas nada impede que eles reconheçam isso, e muito pelo contrário, eles prestigiam sempre isso, então não há, no nosso tribunal, algo que venha dizer que a mulher se destaca mais por isso, que o homem. (Entrevistada 6)

A pergunta sobre julgamentos diferentes foi interpretada pelas Entrevistadas 6 e 2 como sinônimo de superioridade feminina, posicionamento dissonante da imparcialidade exigida pela magistratura. Sobre esse aspecto, Maria Bonelli (2010)BONELLI, Maria da Glória. Profissionalismo e diferença de gênero na magistratura paulista. Civitas, v. 10, n. 2, p.125-138, mai./ago., 2010. afirma que ser magistrado significa não apenas se apresentar de forma séria, discreta, recatada - características compatíveis com a função - mas, sobretudo, viver quaisquer diferenças apenas na esfera íntima. O gênero, então, é uma das diferenças identitárias apagadas e interiorizadas como subjetividade pela adoção da identidade coletiva e profissional da magistratura. Assim, as entrevistadas tendem a, constantemente, reafirmar a igualdade, entre homens e mulheres, ou refutar quaisquer sinais de superioridade ou destaque feminino, já que isso corresponderia a uma espécie de desvio da identidade profissional da magistratura, da essência do ser magistrado.

Em consonância com o exposto por Bonelli (2010)BONELLI, Maria da Glória. Profissionalismo e diferença de gênero na magistratura paulista. Civitas, v. 10, n. 2, p.125-138, mai./ago., 2010., Hunter (2015)HUNTER, Rosemary. More tan Just a Different Face? Judicial Diversity and Decision-Making. Current Legal Problems, p. 1-23, 2015. justifica a dificuldade de encontrar diferenças de gênero entre juízes e juízas, em razão da existência de uma ideologia judicial. Trata-se da noção de que a formação acadêmica e o conjunto de normas do sistema jurídico são capazes de afastar a opinião ou a crença de um juiz quando ele exerce seu ofício. Um ponto relacionado à ideologia judicial é a individualidade da diferença, que consiste na ideia de que a demonstração de qualquer tipo de diferença é prejudicial à função judicial. Nesse sentido, o menor sinal de diferenciação abre margem para que a qualificação e a competência de mulheres sejam questionadas, já que ingressaram no Judiciário, sob a condição de uma atuação em conformidade com o ethos hegemônico – isto é, o masculino.

Outra ressalva apontada em relação à maior sensibilidade feminina consiste na contestação da sensibilidade outrora afirmada, seguida da afirmação da igualdade de sensibilidades entre homens e mulheres. Embora as mulheres sejam mais sensíveis, os homens também são, pois “a sensibilidade é do julgador”. Nesse ponto, é interessante notar como algumas entrevistadas recorreram à composição das varas de violência doméstica, em Belém/PA, para comprovar a igual sensibilidade:

Agora é claro que, como mulher, eu acredito que você tenha mais sensibilidade para tratar uma mulher, muito embora eu também não diga que o homem não tenha, porque nós temos um juiz homem na violência contra a mulher. Então, nós temos uma vara de violência doméstica e familiar contra a mulher, em que o juiz é homem e decide, decisões que, na verdade, em que você verifica, que há sensibilidade para isso. (Entrevistada 10)

Hoje nós temos na capital três varas de violência doméstica, né, dessas três varas duas varas são de juízes titulares homens, só uma de mulher, e eles têm feito um trabalho excelente, no que diz respeito à proteção aos direitos da mulher, divulgação de trabalho, entendeu? Então acho que isso (composição diferenciada) não interfere não. (Entrevistada 3)

A afirmação de uma maior sensibilidade feminina, seguida de sua negação, parece ter relação com os estereótipos de gênero sobre o perfil psicológico de mulheres: enquanto os homens são mais agressivos, firmes e assertivos, as mulheres têm comportamentos voltados à sensibilidade, empatia, emotividade etc. A atribuição de estereótipos de gênero às mulheres, em carreiras masculinizadas, como a magistratura, ajuda a perpetuar a ideia de que elas são “naturalmente” portadoras de características como cooperação e fraqueza. Como resultado dessa constante reafirmação de estereótipos de gênero, socialmente desvalorizados, as juízas acabam assumindo discursos e estratégias de afastamento de tais características, já que atuam em carreiras em que precisam demonstrar força e autoridade – isto é, masculinizar-se (HUNTER, 2013).

Mas os estereótipos de gênero nem sempre atuam, negativamente, em relação às mulheres. Um exemplo é a fala da Entrevistada 4, que interpreta o ser mulher - entendido aqui como sinônimo de maternidade e de cuidar da casa - como um reconhecimento positivo para a profissão, resultando em uma espécie de diferencial na gestão e na administração do trabalho:

Eu só creio que pode ser que a mulher, por ter essa... vamos dizer, a gente nasce para ser mãe, a gente nasce para ser dona de casa, a gente nasce para administrar uma casa, talvez, com essa qualidade, que eu acho que já vem no sangue de toda mulher, a gente tenha condições também de chegar em um gabinete, saber administrar melhor, ter mais sensibilidade, mas só isso. Eu penso que seja só isso. (Entrevistada 4).

A atribuição de estereótipos positivos, no exercício profissional, assegura às mulheres alguma vantagem na carreira, pois passam a ser identificadas como detentoras de maior capacidade de gestão de tempo e de administração, em virtude da divisão das tarefas com a casa, os filhos e a família. Assim, o que seria um problema se torna uma vantagem comparativa para alguns cargos de direção: a capacidade de administração do tempo como uma virtude feminina, frente à cúpula de um tribunal (FRAGALE et al, 2016).

Por fim, o grupo 3 compreende haver algum tipo de atuação diferenciada entre homens e mulheres, ainda que essa perspectiva tenha sido igualmente refutada em seguida. É o exemplo da fala da Entrevistada 7 que, durante a entrevista, chegou a afirmar que as visões masculina e feminina são diferentes, sendo esse ponto positivo para o colegiado, “porque os dois valorizam provas e têm visões que você chega a um resultado muito melhor, e a sociedade é feita pelo homem e pela mulher”.

No entanto, quando questionada, especificamente, se as mulheres julgam diferente dos homens, a entrevistada afirmou que, embora as visões sejam diferentes, a aplicação da técnica, no momento da deliberação judicial, torna juízes e juízas iguais: “Tenho uma visão diferente, mas isso não me faz melhor ou pior do que ele, me faz igual a ele quando eu uso a técnica. É a técnica que nos faz igual... Não é o olhar diferente, mas é a técnica.” (Entrevistada 7).

A entrevistada relatou, ainda, que mulheres costumam ser mais duras do que os homens nos julgamentos. A dureza à que se refere corresponde à utilização estrita da técnica por mulheres, sem que quaisquer elementos estranhos à racionalidade dos julgamentos interfiram no processo:

Eu acho até que nós somos mais duras que os homens. (...) Pessoal nos olha com aquela coisa que... “Ah, as mulheres julgam com o coração”, né? Nos fragilizam, inclusive, profissionalmente, por causa disso, não é? Por incrível que pareça, a mulher é muito técnica na hora de proferir seus julgamentos, pelo que eu tenho observado, e ela é mais taxativa naquilo que ela acredita. (...) Nós temos a necessidade de demonstrar a todos que nós somos técnicas, profissionais, e muito mais seguras do julgamento que proferimos. (Entrevistada 7)

A menção da entrevistada à maior dureza feminina assinala a existência de uma voz diferente, no entanto, não no sentido de uma ética de cuidado15 15 Sobre a existência de uma voz diferente feminina que não se relaciona à ética de cuidado, retomamos a revisão bibliográfica realizada por Kate Malleson (2007). A autora encontrou pesquisas cujos resultados apontam para uma maior “dureza” no momento de proferir seus julgamentos. . A dureza na forma de julgar decorre da necessidade de ser respeitada na profissão e de fugir de determinados estereótipos do feminino - isto é, de não ser fragilizada e vista como “mulheres que julgam com o coração”.

A atuação profissional de mulheres é pautada na constante necessidade de distanciamento de estereótipos capazes de fragilizá-las e de questionar a sua credibilidade. Ressaltar a utilização da técnica nos julgamentos (“nós temos a necessidade de demonstrar, a todos, que nós somos técnicas, profissionais e muito mais seguras do julgamento que proferimos”) é, portanto, uma das formas encontradas de comprovar autoridade e credibilidade (“técnica e segurança”).

A segunda entrevistada do grupo (iii), por outro lado, aproximou-se de uma voz diferente, fundada em uma ética do cuidado. Partindo de suas experiências pessoais, atravessadas por dificuldades financeiras, a Entrevistada 10 demonstrou sensibilidade e empatia em sua fala:

Tem milhares de pessoas atrás disso aqui [processo], tem um velho querendo uma aposentadoria, tem uma criança pedindo pensão, tem uma empresa à beira da falência, né, tem uma pessoa querendo ser hospitalizada, e não tem hospital (...). Então por isso que eu te digo, as pessoas que sentam numa cadeira dessa, primeiro elas têm que ser humanas, para ter a sensibilidade de socorrer a pessoa que realmente está batendo na sua porta, está esperando uma decisão sua, porque são pessoas carentes (...).

O que acontece, a tua profissão ela pesa mais nas tuas costas porque tu conheces o peso da responsabilidade, e quem nunca passou por isso não valoriza, não quer nem saber, nasce em berço de ouro, entendeu, pobre que se lasque... Mas quem veio de baixo sabe o que é isso. (Entrevistada 10)

Embora, nesse caso, a entrevistada não esteja se referindo, especificamente, às experiências atravessadas pelo gênero, o fato de relacionar experiências pessoais ao seu desempenho profissional sugere uma aproximação com a hipótese de uma voz diferente. A trajetória e origem humilde parecem orientar a sua atuação jurisdicional e aproximá-la de uma ética de cuidado pautada em valores como cuidado, conexão e contexto/particularidade.

A entrevistada também demonstrou sensibilidade em relação à violência doméstica, ao afirmar que “nós sabemos o que é isso porque nós somos mulheres, é só você se colocar no lugar de uma mulher dessas e o sofrimento vai para a tua pele”. E acrescentou:

Você olha as coisas com mais sensibilidade, você entende o sofrimento de uma mulher dessas, sendo espancada (...). Aí você senta aqui, como mulher que tem seu lar, que tem seus filhos criados, você sabe o que é isso, tu achas que a gente vai ver esse tipo de violência para uma mulher e vai cruzar os braços? Não tem como cruzar, a gente tem que socorrer essas mulheres sim, tem sim. (Entrevistada 10)

A voz diferente, baseada na ética de cuidado, aparece na argumentação em favor dos direitos humanos de mulheres. Em seu modo de analisar tais casos, cruzam-se aspectos de gênero e de origem social que marcam sua experiência ou o processo de socialização. As condições de subordinação e de subjugação a que são submetidas as mulheres são, inevitavelmente, trazidas para o julgamento. Mas, a essa “sensibilidade” também pode estar associada à sua origem social, atípica em relação aos padrões gerais da magistratura brasileira.

A sensibilidade para com as questões de direitos humanos de mulheres é interpretada como resultado das experiências na família e maternidade, enfim, aquilo que é entendido como intrínseco à mulher, como ser mãe ou esposa: “a mulher já traz isso da sua essência, e isso se aperfeiçoa mais quando você vai trabalhar na justiça”. São experiências vivenciadas, principalmente, na esfera privada e trazidas para a esfera pública no momento do julgamento. Assim, a entrevistada se refere à noção de uma ética de cuidado “aperfeiçoada” quando conduzida à esfera pública.

Apesar da construção de uma narrativa pautada na importância das experiências pessoais, da sensibilidade e da empatia, quando questionada acerca de diferenças, na atuação jurisdicional, entre homens e mulheres, a entrevistada rejeitou tal divergência, em razão do princípio da imparcialidade judicial e da crença de que um julgamento diferente é sinônimo de julgamento enviesado:

Dizer que influencia nas decisões, isso eu te garanto que não, porque o juiz ele tem que ser imparcial, né, eu não posso julgar um caso “não só porque ele é homem eu vou condenar”. Mas o fato de ter mais mulher faz com que a gente dê mais atenção para esses casos. Você olha com mais cuidado, com mais carinho, você vai mais a fundo no julgamento, até na celeridade que você dá. Porque é aquilo que eu te digo, nós somos mulheres, a gente sente isso pelo fato da gente ser mulher, isso nos toca sim. (...) Pode ser a sensibilidade pelo fato de nós sermos mulheres, e a gente compreender melhor, né. (Entrevistada 10).

O elemento marcante da fala acima é a negação de uma deliberação judicial diferente, seguida da sua afirmação – “mais cuidado, com mais carinho, vai mais a fundo no julgamento, até na celeridade”. Assim como ocorreu com outras entrevistadas, a confirmação da existência de uma atuação jurisdicional diferente parece ser inaceitável. A dificuldade se relaciona à assunção de que julgamentos homens e mulheres são sinônimos de julgamentos enviesados, isto é, a favor da mulher, independente do que consta nos autos - “nós vamos julgar mesmo que a mulher não tenha razão” (Entrevistada 11); “eu não posso julgar um caso ‘não só porque ele é homem eu vou condenar’ (Entrevistada 10); “nós não podemos julgar com o coração, nós temos que julgar com a razão” (Entrevistada 5). A noção de que mulheres têm uma voz própria, julgam diferente ou são mais sensíveis equivale, portanto, a um julgamento com o coração, irracional, em estrita violação ao princípio da imparcialidade.

Apesar das respostas negativas, não podemos afirmar que não existem diferenças de gênero no Tribunal de Justiça do Estado do Pará, mesmo porque, ao longo das entrevistas, foram observadas diferenças (a exemplo das entrevistadas 10, 7 e 4) de atuação jurisdicional em algumas falas, a despeito das conseguintes tentativas de suprimi-las ao longo do discurso. Analisando as narrativas das entrevistadas, percebemos que o abafamento das distinções decorre, especialmente, de uma exigência de imparcialidade, inerente à magistratura.

Mas, afinal, o que seria essa imparcialidade? Como argumentaremos melhor no próximo tópico, para as entrevistadas, a noção de imparcialidade é sinônimo de uma atuação que despreza as características daqueles que buscam o sistema de justiça, desconsiderando as relações desiguais e opressões de gênero, sexualidade, raça, classe etc. existentes e que se perpetuam no Judiciário – tratando-se, portanto, de uma perspectiva androcêntrica da imparcialidade.

5. Por que não encontramos diferença?

Como demonstramos no tópico anterior, a imparcialidade foi mencionada com intuito de rejeitar a noção de julgamentos diferentes entre homens e mulheres. As entrevistadas defenderam a imparcialidade como um ato deliberado de indistinção das partes que postulam junto ao Judiciário: os litigantes são todos iguais, sendo indiferente se a parte de um processo é homem, mulher, negro, branco etc. Essa leitura se apresentou nas narrativas analisadas como uma demonstração de integridade e equivalência ao cargo, em uma espécie de afirmativa de pertencimento e adequação ao cargo que ocupam.

O princípio da imparcialidade, no ordenamento jurídico brasileiro16 16 Na legislação brasileira, a imparcialidade judicial é prevista nos artigos 144 (impedimento) e 145 (suspeição) do Código de Processo Civil de 2015. O princípio da imparcialidade não possui uma previsão substantiva em legislação, apenas os artigos previstos do novo CPC. , impõe a ausência de interesses, por parte do/a magistrado/a, na lide, ou de relações entre quem julga as partes. Ada Pellegrini Grinover (GRINOVER et al, 2011GRINOVER, Ada Pellegrini; CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; DINAMARCO, Cândido. Teoria Geral do Processo. São Paulo – Editora Malheiros, 9. ed. rev. e atual. 2011.), em uma interpretação substantiva da imparcialidade (e que se baseia na Declaração Universal dos Direitos do Homem), afirma que esse princípio compreende uma atuação jurisdicional desprovida de interesses na causa e sem relações próximas com as partes, de modo a assegurar elas sejam ouvidas e possam pleitear, em igualdades de condições, aquilo que for necessário para a resolução do litígio.

Nos termos propostos por Grinover (2011), se considerarmos que um dos fundamentos valorativos da imparcialidade consiste na igualdade substantiva – e não apenas jurídico-formal - de condições dos litigantes, devemos nos questionar se, e de que maneira, essa igualdade tem sido garantida às mulheres e aos demais grupos sociais historicamente subordinados. Ou, nos termos propostos por Fabiana Severi (2016SEVERI, Fabiana. O gênero da justiça e a problemática da efetivação dos direitos humanos das mulheres. Direito e Práxis, v. 7, n. 13, p. 81-115, 2016., p. 583), “qual o sentido de igualdade que estamos buscando construir ao defender o reconhecimento, o exercício e o gozo de direitos às mulheres?”.

Uma das principais críticas feministas ao Direito moderno liberal diz respeito à noção de cidadania universal, a qual, baseada nos ideais de abstração e de imparcialidade, assume uma perspectiva androcêntrica (SEVERI, 2016SEVERI, Fabiana. O gênero da justiça e a problemática da efetivação dos direitos humanos das mulheres. Direito e Práxis, v. 7, n. 13, p. 81-115, 2016.), ou seja, o homem é referenciado como o parâmetro das experiências humanas, e apenas o seu ponto de vista é passível de consideração. A perspectiva masculina, constantemente reafirmada em nossa sociedade, torna-se sistêmica e hegemônica; distanciada, imparcial. Uma vez que a perspectiva e os valores do homem (branco e heterossexual) formam o padrão a ser seguido, todos os demais olhares se tornam invisíveis, ainda que elas digam respeito à metade da população mundial, como é o caso das mulheres17 17 Em igual sentido, segundo Carmen Hein (2011), o contexto social e político, no qual as relações de discriminação de gênero são produzidas e perpetuadas, afeta a produção de doutrinas, o raciocínio jurídico e a elaboração de leis. Não faltam exemplos de decisões judiciais discriminatórias contra as mulheres, as quais corroboram o entendimento de que o Direito é baseado em valores e raciocínios androcêntricos. Da mesma forma que a neutralidade científica não passa de mera pretensão - uma vez que os sistemas conceituais das ciências, e as disciplinas acadêmicas, são marcados por marcadores de diferenças sociais, - a imparcialidade também é uma perspectiva que reflete valores e visões masculinas. .

Nesse aspecto, queremos argumentar que o que, comumente, se entende por imparcialidade tem sido interpretado a partir de uma perspectiva androcêntrica que, por ser dominante, apresenta-se como” neutra” e, portanto, não situada. Uma atuação jurisdicional pautada em uma noção androcêntrica de imparcialidade (isto é, em uma igualdade jurídico-formal), que ignora os marcadores sociais de diferenças daqueles que litigam, é uma forma de desconsideração da existência de desigualdades e de opressões engendradas, racializadas e classistas existentes em nossa sociedade – e que são levadas a juízo.

Regina Graycar (2009)GRAYCAR, Regina. The gender of judgments: an introduction. Legal Studies Research Paper, 2009, p. 262–282. entende que o ato de julgar, além de marcado pelo gênero, é implicitamente masculino, fato que deriva de uma série de práticas sociais, jurídicas, políticas e crenças profundamente enraizadas no corpo substantivo do Direito. Levando em consideração que as mulheres não podiam exercer o Direito até o século XX, para Graycar (2009)GRAYCAR, Regina. The gender of judgments: an introduction. Legal Studies Research Paper, 2009, p. 262–282. não existem dúvidas de que as doutrinas jurídicas substantivas utilizadas na prática jurisdicional foram desenvolvidas por homens, sobre homens e para os homens. Estas doutrinas refletem os problemas e as preocupações masculinas, bem como as suas perspectivas sobre o mundo. Para a autora, o recente ingresso de mulheres na profissão jurídica ainda não foi capaz de trazer mudanças significativas para as doutrinas e para o raciocínio jurídico, os quais parecem ter permanecido quase praticamente impermeáveis às perspectivas diferentes daquela (dominante) dos homens brancos de classe média.

Repensar o conceito de imparcialidade, compreendendo que o que fundamenta a atuação jurisdicional, hoje, é uma perspectiva parcial e androcêntrica, significa assumir uma postura em favor da igualdade substantiva de oportunidades. É dizer que, em um processo judicial, serão consideradas as particularidades dos jurisdicionados, a partir do reconhecimento de que as mulheres (assim como as pessoas negras, indígenas e quilombolas, LGBTI) estão em desvantagem, ou seja, elas não possuem o mesmo status jurídico quando comparadas aos homens brancos e heterossexuais - parâmetros da humanidade. Considerar essa desvantagem na condução processual, longe de ser um ato parcial, configura um meio de construção de uma igualdade substantiva, fundamento axiológico do princípio da imparcialidade, e de correção do histórico de desigualdades a que as mulheres foram submetidas.

Trazendo essas reflexões para o TJPA, entendemos que não se trata de negar a existência de uma voz diferente no órgão, ou mesmo afirmar que as entrevistadas não veem diferenças de gênero na atuação jurisdicional – mesmo porque, como observamos, há o reconhecimento destas diferenças, em diversos trechos. O que se destaca é que, mesmo reconhecendo a existência de diferenças, elas são ativa e reiteradamente negadas, em nome de uma perspectiva de imparcialidade androcêntrica e intimamente ligada a um significado masculino sobre a atividade jurisdicional.

Compreender as sucessivas negativas oferecidas pelas entrevistadas, nesse aspecto, passa pela noção de que a imparcialidade funciona como um dispositivo que impede que as diferenças aconteçam, mesmo em espaços que são compostos, em sua maioria, por mulheres. Em nome de uma dita imparcialidade da magistratura, suprimem-se diferenças constituídas pelos atravessamentos entre gênero, raça e classe para a manutenção de um modelo de atuação jurisdicional androcêntrico que não oferece margem para a diversidade – já que ela seria incompatível com a função judicial – além de suscitar dúvidas em relação à competência e capacidade da magistrada que ousa demonstrar quaisquer dissonâncias.

Ora, se as possibilidades de julgamento diferenciado são obstadas pela imposição de um ideal de imparcialidade que se fundamenta em valores pensados por, para e sobre um sujeito situado – que é o sujeito masculino –, o que, exatamente, esperamos das mulheres que ingressam na magistratura? Em outras palavras, a expectativa é pela existência de uma atuação jurisdicional diferente, com base em gênero, quando o maior esforço está voltado para “resistir ou sobreviver frente a uma situação de tamanha desvantagem ou estigmatização a que elas estão sujeitas são muito grandes”? (SEVERI, 2016SEVERI, Fabiana. O gênero da justiça e a problemática da efetivação dos direitos humanos das mulheres. Direito e Práxis, v. 7, n. 13, p. 81-115, 2016., p. 104)

Sobre o assunto, Erika Rackley (2002)RACKLEY, Erika. Representations of the (woman) judge: Hercules, the little mermaid, and the vain and naked Emperor. Legal Studies, v. 22, n. 4, nov., 2002. situa a maior presença de mulheres no Judiciário e a existência de vozes diferentes em termos paradoxais: se, por um lado, há o desejo de que o Judiciário seja mais diversificado e representativo de diversas localizações sociais, por outro, há também a expectativa de que os juízes e as juízas não tenham perspectiva – o que torna o próprio desejo por representatividade inócuo. E isto está intimamente relacionado à construção do imaginário social acerca de quem é (e pode ser) o juiz - o homem (branco e hetero), único indivíduo capaz de se despir de suas próprias características e assumir aquelas desejáveis à atuação jurisdicional: imparcialidade, independência, justiça etc.

A autora (2002) nos oferece, ainda, novos caminhos para reflexão ao afirmar que o mais importante é buscar compreender “o que acontece às mulheres, enquanto mulheres, quando elas reivindicam seu direito de participar autoritariamente de uma comunidade interpretativa que tem sido, durante a maior parte de sua existência, masculina.” (2002, p. 614). A questão, posta pela autora, sai do eixo da existência de uma voz diferente, e volta-se à pergunta: a profissão jurídica e/ou Direito fornecem espaço para qualquer voz que não reflita as características (pretensamente imparciais) da masculinidade? Há espaço, em nosso imaginário social acerca da figura do magistrado, para comportar outras imagens que não reflitam a do homem branco, heterossexual, proprietário e cristão? Assim, antes de pensar em uma atuação jurisdicional diferente, precisamos refletir sobre a estrutura da profissão jurídica e, principalmente, sobre a figura construída do magistrado.

6. Considerações finais

Buscamos compreender, neste artigo, dois principais aspectos sobre o TJPA: o que justifica a sua composição, majoritariamente feminina, e se há uma relação entre essa composição e uma atuação jurisdicional voltada à defesa dos direitos humanos de mulheres. Em relação à quantidade de mulheres no órgão, a resposta predominante entre as entrevistadas foi a de que a remuneração da magistratura paraense era muito baixa, o que levava os homens a migrarem para outras carreiras no Direito. Com base nas tabelas de dados fornecidas pelo TJPA e pelo TJSP, percebemos que, de fato, o montante percebido pelas magistradas paraenses era inferior ao recebido pelas magistradas paulistas, o que justifica, ao menos em parte, o desinteresse dos homens (considerados os “esteios” da família) pela carreira.

Em relação ao segundo aspecto, referente à composição e a existência de uma voz diferente no órgão, alguns desdobramentos devem ser mencionados. Nas entrevistas, encontramos respostas que apontavam para diferenças de gênero na atuação jurisdicional, quase sempre seguidas de negativas, com base no argumento da imparcialidade. Esse fato promoveu um deslocamento de nossa pesquisa, que, ao invés de voltar-se apenas ao eixo da voz diferente, passou a analisar quais as possibilidades de surgimento de vozes diferentes, considerando que o Poder Judiciário é marcado por um ethos masculino18 18 Sem desconsiderar o poder de agência de mulheres mesmo em instituições inóspitas à diversidade, em especial o das desembargadoras do TJPA, a questão envolvendo os constantes esforços no sentido de conformar-se a uma imagem socialmente estabelecida (e masculina) do juiz deve ser suscitada e objeto de reflexão nos debates envolvendo a democratização do Poder Judiciário. .

Em outras palavras, antes de depositarmos expectativas de mudanças substantivas do Judiciário apenas pela maior presença de mulheres, devemos questionar se as mulheres podem não apenas julgar, mas desalojar e tornar instáveis as afirmações tradicionais sobre a autoridade jurídica (RACKLEY, 2002RACKLEY, Erika. Representations of the (woman) judge: Hercules, the little mermaid, and the vain and naked Emperor. Legal Studies, v. 22, n. 4, nov., 2002.). Enquanto a nossa imagem de quem julga for a do homem capaz anular o próprio self e sua subjetividade para julgar litígios (assumindo os atributos acima mencionados), o surgimento de contra-imagens torna-se inviável, assim como de outras vozes. Por esse motivo, quaisquer mudanças na composição do Judiciário necessitam de transformações na cultura jurídica e, em particular, na compreensão do que significa exercer a magistratura - e, principalmente, quem pode julgar (RACKLEY, 2002RACKLEY, Erika. Representations of the (woman) judge: Hercules, the little mermaid, and the vain and naked Emperor. Legal Studies, v. 22, n. 4, nov., 2002.).

Desse modo, se, por um lado, entendemos que as mulheres podem fazer a diferença em termos de deliberação judiciais, havendo oportunidade e comprometimento pessoal para tanto (HUNTER, 2015HUNTER, Rosemary. More tan Just a Different Face? Judicial Diversity and Decision-Making. Current Legal Problems, p. 1-23, 2015.), por outro, não podemos desconsiderar a persistência de uma cultura masculina do Direito, que, com base em dispositivos como a imparcialidade e o imaginário social acerca de quem é/pode ser o juiz, suprime a emergência de novas imagens e vozes, perpetuando a exclusão e a marginalização do “outro”.

  • 1
    A exemplo dos Estados Unidos, Reino Unido, Israel, Argentina, México, Canadá, Austrália, Nova Zelândia e Japão.
  • 2
    A existência de uma voz diferente também é defendida por teóricos críticos raciais. De acordo com Johnson e Rohwer (2004), “a teoria crítica da raça defendeu o conceito de ‘voice of color’, que afirma que as minorias falam com uma voz distinta ou, de certa forma, observam o mundo de maneira diferente dos brancos.” (2004, p. 11). Para os autores, a importância de uma voice of color, no Judiciário, reside na possibilidade de juízes, pertencentes a grupos minoritários abordarem o Direito a partir de uma perspectiva diferente, mudando os rumos de discussões, desafiando os estereótipos, limitando comentários inapropriados, e inserindo importantes informações até então desconsideradas e excluídas.
  • 3
    Nesse sentido, “as mulheres podem procurar soluções para problemas morais sem escolher respostas abstratas certas ou erradas, e tentarão manter o relacionamento das partes em dilemas morais constantes” (MENKEL-MEADOW, 2013MENKEL-MEADOW, Carrie. A sociologia comparada das advogadas: a feminização da profissão jurídica. Tradução: Lucinelli Kuster. Panóptica, Vitória, v. 8, n. 25, p. 67-96, 2013. Disponível em: https://scholarship.law.uci.edu/cgi/viewcontent.cgi?referer=https://www.google.com.br/&httpsredir=1&article=1519&context=faculty_scholarship. Acesso em: 10 mar. 2020.
    https://scholarship.law.uci.edu/cgi/view...
    , p. 86).
  • 4
    A autora cita a pesquisa: CROWE, Nancy. The effects of Judges’ Sex and Race on Judicial Decision Making on the U.S. Courts of Appeals. PhD dissertation, The University of Chicago, Department of Political Science, 1999.
  • 5
    Malleson (2007)MALLESON, Kate. La justificación de la igualdad de género en la magistratura: por qué la diferencia no funciona. Revista Jurídica de la Universidad de Palermo, año 8, núm. 1, Palermo, 2007. cita como exemplos de pesquisas em que os resultados apresentaram uma tendência, de juízas, à imposição de maiores penas de prisão às mulheres: STEFFENSMEIER, Darrel; HEBERT, Chris. Women and Men PolicyMakers: Does the judge’s Gender Affect the Sentencing of Criminal Defendants? Social Forces 77, 1999; GRUHL, John; SPOHN, Cassia; WELCH, Susana. Women as Policymakers: The Case of Trial Judges. American Journal of Political Science, 1981.
  • 6
    Nesse sentido, Malleson (2007)MALLESON, Kate. La justificación de la igualdad de género en la magistratura: por qué la diferencia no funciona. Revista Jurídica de la Universidad de Palermo, año 8, núm. 1, Palermo, 2007. pontua que há importantes investigações qualitativas que não se baseiam tão somente no conteúdo das sentenças, a exemplo de pesquisas que analisam as percepções de juízas sobre a natureza da diferença de gênero em decisões judiciais e seu papel na magistratura.
  • 7
    Hunter (2015)HUNTER, Rosemary. More tan Just a Different Face? Judicial Diversity and Decision-Making. Current Legal Problems, p. 1-23, 2015. oferece o exemplo de uma das magistradas que entrevistou: “Uma magistrada afirmou que estava limitada pela qualidade das provas apresentadas ao tribunal, e que, às vezes, era frustrante o fato de que, em casos de violência doméstica, a polícia não trazer todas as provas necessárias para a proteção das pessoas.” (HUNTER, 2015HUNTER, Rosemary. More tan Just a Different Face? Judicial Diversity and Decision-Making. Current Legal Problems, p. 1-23, 2015., p. 15). Outro exemplo mencionado pela autora foi o de um magistrado que afirmou que, no Tribunal onde trabalha, a tomada de decisões é altamente vinculada aos precedentes, o que diminui o espaço para uma atuação voltada a quaisquer perspectivas que não reflitam os posicionamentos tradicionais.
  • 8
    Esse ponto se tornou evidente para Hunter (2015)HUNTER, Rosemary. More tan Just a Different Face? Judicial Diversity and Decision-Making. Current Legal Problems, p. 1-23, 2015. quando ela realizou um estudo sistemático de todos os julgamentos da juíza australiana Marcia Neave, durante os três primeiros anos de sua indicação, para a Corte de Apelação Estadual. Marcia Neave era conhecida por seu histórico de comprometimento com a causa feminista, tanto na advocacia quanto na academia. Dos 204 casos sobre os quais se debruçou, durante os primeiros três anos, no Tribunal, Hunter (2015)HUNTER, Rosemary. More tan Just a Different Face? Judicial Diversity and Decision-Making. Current Legal Problems, p. 1-23, 2015. só encontrou questões feministas, ou relacionadas ao gênero, em 66 deles, o equivalente a 32%. A expressiva maioria dos casos era de natureza penal.
  • 9
    Famosas decisões feministas de juízas (como Bertha Wilson, na Suprema Corte do Canadá e Ruth Bader Ginsburg na Suprema Corte dos EUA) ocorreram em casos envolvendo women’s issues, como violência contra a mulher, direitos sexuais e reprodutivos, e a valorização do trabalho das mulheres, incluindo o trabalho de cuidados não remunerados.
  • 10
    Antes das entrevistas, fizemos incursões no Tribunal para conhecer o local e alguns de seus servidores, e a maioria deu a mesma resposta para a composição do TJPA.
  • 11
    A solicitação dos dados relativos à remuneração da magistratura paulista decorre da necessidade de comparar os valores percebidos e confirmar (ou não) a informação fornecida pelas entrevistadas acerca dos baixos salários na magistratura paraense.
  • 12
    O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) foi utilizado, na pesquisa, para fins de comparação com alguns dados do TJPA, a exemplo da remuneração total recebida na magistratura nos dois TJs. A escolha do TJSP se justifica por ser o Tribunal analisado pelo grupo de estudos do qual fazemos, o Grupo de Estudos em Direitos Humanos, Educação e Cidadania, que realiza pesquisas sobre o eixo temático democratização do sistema de justiça e composição de gênero dos Tribunais de Justiça do país.
  • 13
    As diferenças existentes nas tabelas decorrem do fato de que os reajustes salariais não ocorrem simultaneamente nos dois tribunais.
  • 14
    Embora algumas entrevistadas do primeiro grupo tenham mencionado uma maior sensibilidade feminina, sua resposta mais definitiva e enfática foi em relação à negação de uma atuação diferente, entre homens e mulheres, razão pela qual optamos por separá-las do grupo ii), da sensibilidade.
  • 15
    Sobre a existência de uma voz diferente feminina que não se relaciona à ética de cuidado, retomamos a revisão bibliográfica realizada por Kate Malleson (2007)MALLESON, Kate. La justificación de la igualdad de género en la magistratura: por qué la diferencia no funciona. Revista Jurídica de la Universidad de Palermo, año 8, núm. 1, Palermo, 2007.. A autora encontrou pesquisas cujos resultados apontam para uma maior “dureza” no momento de proferir seus julgamentos.
  • 16
    Na legislação brasileira, a imparcialidade judicial é prevista nos artigos 144 (impedimento) e 145 (suspeição) do Código de Processo Civil de 2015. O princípio da imparcialidade não possui uma previsão substantiva em legislação, apenas os artigos previstos do novo CPC.
  • 17
    Em igual sentido, segundo Carmen Hein (2011), o contexto social e político, no qual as relações de discriminação de gênero são produzidas e perpetuadas, afeta a produção de doutrinas, o raciocínio jurídico e a elaboração de leis. Não faltam exemplos de decisões judiciais discriminatórias contra as mulheres, as quais corroboram o entendimento de que o Direito é baseado em valores e raciocínios androcêntricos. Da mesma forma que a neutralidade científica não passa de mera pretensão - uma vez que os sistemas conceituais das ciências, e as disciplinas acadêmicas, são marcados por marcadores de diferenças sociais, - a imparcialidade também é uma perspectiva que reflete valores e visões masculinas.
  • 18
    Sem desconsiderar o poder de agência de mulheres mesmo em instituições inóspitas à diversidade, em especial o das desembargadoras do TJPA, a questão envolvendo os constantes esforços no sentido de conformar-se a uma imagem socialmente estabelecida (e masculina) do juiz deve ser suscitada e objeto de reflexão nos debates envolvendo a democratização do Poder Judiciário.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Abr 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2022

Histórico

  • Recebido
    05 Maio 2020
  • Aceito
    25 Nov 2020
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