RESUMO
Objetivo: avaliar a efetividade de um programa cognitivo-comportamental para controle de sintomas do trato urinário inferior pós-prostatectomia radical.
Método: estudo de ensaio clínico randomizado, com 41 participantes aleatorizados em intervenção (n=20) e controle (n=21), durante três meses. O grupo intervenção recebeu o programa cognitivo-comportamental, enquanto o grupo controle recebeu orientações de rotina do serviço. As variáveis desfechos foram intensidade da incontinência urinária e sintomas do trato urinário inferior, avaliados pelo Pad-Test e Urinary Incontinence Scale of Radical Prostatectomy e King’s Health Questionnaire.
Resultados: ao final do estudo, o grupo intervenção apresentou menor intensidade da incontinência urinária (p≤0,001), e houve menos chances de apresentar alterações da frequência urinária (p≤0,001), urgência miccional (p≤0,001), noctúria (p=0,005), incontinência urinária de esforço (p≤0,001) e urge-incontinência (p≤0,045).
Conclusão: o programa cognitivo-comportamental foi efetivo para a redução de sintomas do trato urinário inferior após a prostatectomia radical. Registro Brasileiro de Ensaios Clínicos: RBR-3sstqg.
Descritores: Enfermagem; Incontinência Urinária; Sintomas do Trato Urinário Inferior; Prostatectomia; Ensaio Clínico
ABSTRACT
Objective: to assess the effectiveness of a cognitive-behavioral program to control lower urinary tract symptoms after radical prostatectomy.
Methods: a randomized clinical trial study, with 41 participants randomized into intervention (n=20) and control (n=21), for three months. The intervention group received the cognitive-behavioral program, while the control group received routine guidance from the service. Outcome variables were urinary incontinence intensity and lower urinary tract symptoms, assessed by the Pad-Test and Urinary Incontinence Scale of Radical Prostatectomy and King’s Health Questionnaire.
Results: at the end of the study, the intervention group had a lower urinary incontinence intensity (p≤0.001), and there were less chances of presenting changes in urinary frequency (p≤0.001), urinary urgency (p≤0.001), nocturia (p=0.005), stress urinary incontinence (p≤0.001) and urge incontinence (p≤0.045).
Conclusion: the cognitive-behavioral program was effective in reducing lower urinary tract symptoms after radical prostatectomy. Brazilian Clinical Trial Registry: RBR-3sstqg.
Descriptors: Nursing; Urinary Incontinence; Lower Urinary Tract Symptoms; Prostatectomy; Clinical Trial
RESUMEN
Objetivo: evaluar la efectividad de un programa cognitivo-conductual para controlar los síntomas del tracto urinario inferior después de la prostatectomía radical.
Métodos: estudio de ensayo clínico aleatorizado, con 41 participantes aleatorizados en intervención (n=20) y control (n=21), durante tres meses. El grupo de intervención recibió el programa cognitivo-conductual, mientras que el grupo control recibió orientación rutinaria del servicio. Las variables de resultado fueron la intensidad de la incontinencia urinaria y los síntomas del tracto urinario inferior, evaluados mediante Pad-Test y Urinary Incontinence Scale of Radical Prostatectomy y King’s Health Questionnaire.
Resultados: al final del estudio, el grupo intervención presentó menor intensidad de incontinencia urinaria (p≤0,001), y hubo menos posibilidades de presentar cambios en la frecuencia urinaria (p≤0,001), urgencia urinaria (p≤0,001), nicturia (p=0,005), incontinencia urinaria de esfuerzo (p≤0,001) e incontinencia de urgencia (p≤0,045).
Conclusión: el programa cognitivo-conductual fue eficaz para reducir los síntomas del tracto urinario inferior después de la prostatectomía radical. Registro Brasileño de Ensayos Clínicos: RBR-3sstqg.
Descriptores: Enfermería; Incontinencia Urinaria; Síntomas del Sistema Urinario Inferior; Prostatectomía; Ensayo Clínico
INTRODUÇÃO
Após a prostatectomia radical (PR), disfunções miccionais transitórias ou prolongadas podem ser experienciadas, com destaque para a incontinência urinária (IU) e outros sintomas do trato urinário inferior (STUI). Os STUI referem-se a um conjunto de manifestações clínicas presentes quando algum dos componentes do processo fisiológico da micção se apresentam alterados. Segundo a Internacional Continence Society (ICS), os STUI podem ser classificados em sintomas de armazenamento, esvaziamento e/ou alterações pós-miccionais. A IU, por sua vez, é caracterizada como qualquer perda involuntária de urina, e, quando investigada detalhadamente, é caracterizada como uma condição clínica complexa e não apenas como um sintoma(1).
Homens submetidos à PR podem experimentar mais STUI em relação ao período pré-operatório, inclusive após seis meses da cirurgia(2). Quanto à IU, cerca de 57% dos homens relatam perdas urinárias involuntárias após um mês da PR. A redução espontânea da IU com o passar do tempo é esperada, contudo cerca de 44% dos homens ainda podem queixar perdas urinárias associadas a esforços e precisar de um ou mais absorventes ao dia(1,3).
Intervenções de enfermagem (IE) pautadas no controle da IU e outros STUI devem ser consideradas em tempo oportuno, com vistas à melhora do prognóstico pós-cirurgia. Essas intervenções devem envolver medidas comportamentais, com inclusão de exercícios da musculatura do assoalho pélvico (MAP), além da aquisição de hábitos e comportamentos, tais como ingestão adequada de líquidos, cessação do tabagismo, cafeína e ingestão de capsaicina (pimenta), apresentando a adesão ao tratamento com uma de suas limitações(1).
Neste sentido, o uso da abordagem cognitivo-comportamental como estratégia para implementação de IE tende a auxiliar no aumento da adesão ao tratamento, promovendo maiores chances de sucesso terapêutico. A abordagem cognitivo-comportamental descrita na Teoria Social Cognitiva (TSC)(4) visa integrar orientações à rotina do paciente com o uso de mecanismos de reforço positivo do processo terapêutico, como persuasão social, feedback positivo e reforço vicário. Ressalta-se que são escassos na literatura estudos sobre medidas comportamentais para controle da incontinência urinária pós-prostatectomia radical (IUPPR) pautadas neste referencial teórico. Dessa forma, acredita-se que os resultados deste estudo poderão contribuir para a incorporação na prática clínica de intervenções de baixo custo e com potencial êxito para controle dos STUI pós-PR, propiciando conhecimento e autogestão de controle.
OBJETIVO
Avaliar o efeito de um programa cognitivo-comportamental para controle de STUI pós-PR.
MÉTODOS
Aspectos éticos
No desenvolvimento deste estudo, foram adotadas as recomendações éticas referentes a pesquisas com seres humanos. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos, e registrado na Plataforma de Registros Brasileiros de Ensaios Clínicos, sob número de identificação Universal Trial: RBR-3sstqg.
Desenho, período e local do estudo
Estudo de ensaio clínico randomizado, mono-cego, com aleatorização 1:1, utilizando grupo intervenção (GI) e grupo controle (GC), desenvolvido no período entre novembro de 2019 e dezembro de 2020 em uma unidade ambulatorial vinculada a um Centro de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (CACON) filantrópico, da região Centro-Oeste do Brasil.
Na elaboração e execução do estudo, foram consideradas as recomendações do Consolidated Standards of Reporting Trials (CONSORT)(5).
Amostra; critérios de inclusão e exclusão
A amostra correspondeu a todos os participantes elegíveis no período de coleta de dados, totalizando 41 homens com IU pós-PR. Foram incluídos homens com idade superior a 18 anos, com IU leve, moderada ou grave, avaliada por meio do Pad-Test(1), com capacidade cognitiva preservada, avaliada por meio do Mini Exame do Estado Mental(6), com capacidade locomotora preservada, contato telefônico disponível e disponibilidade para retornos presenciais quinzenais. Foram excluídos homens com histórico de doenças que resultem em influências no controle miccional ou uso de medicações com efeito diurético, além de uso prolongado (> 21 dias) de cateter vesical de demora (CVD).
O recrutamento foi realizado por meio da agenda cirúrgica e ambulatorial da instituição. Os pacientes eram abordados após a retirada do CVD e apresentados aos objetivos do estudo. Mediante interesse em participar, eram convidados a retornar entre 15 e 20 dias para a leitura e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, avaliações clínicas e randomização entre GI e GC.
Protocolo do estudo
Os participantes foram randomizados em cinco “blocos” de dez indivíduos. Desta forma, cinco listas de dez números aleatórios associados à letra “I” (intervenção) ou “C” (controle) foram geradas no Randomizer.org por um pesquisador externo. Este mesmo pesquisador confeccionou envelopes opacos para os números gerados. Após a aplicação dos instrumentos de coleta de dados e imediatamente antes da realização da primeira sessão da intervenção, o envelope foi aberto pelo participante para identificar em que grupo ele seria alocado.
No primeiro momento da coleta de dados, foi aplicado um formulário para caracterização da amostra pelo pesquisador principal, que não sabia, a priori, a qual grupo (GC e GI) os participantes tinham sido alocados. As avaliações subsequentes foram realizadas por outros pesquisadores previamente treinados, o que caracterizou o cegamento das etapas de coleta de dados do estudo.
A intervenção foi baseada em um programa cognitivo-comportamental (PCC) composto por IE para controle da IU e STUI pós-PR. Foram implementadas IE verbais e escritas por meio de material educativo (livreto) intitulado “Manual de orientações sobre incontinência urinária pós-prostatectomia radical”(7). O livreto contém orientações sobre queixas miccionais, incluindo estruturas e processos envolvidos na etiologia, hábitos de vida associados ao controle, como ingestão adequada de líquidos, cessação do tabagismo, redução da ingestão de bebidas contendo cafeína, alimentos irritantes vesicais na dieta(1,8). Foram, ainda, inseridas informações sobre a prática de exercícios da MAP(9).
O regime de treinamento da MAP proposto no livreto é baseado em diretrizes e recomendações de protocolos já implementados e validados em outros estudos(9), com a finalidade de promover força e controle miccional. Trata-se de um programa de seis etapas a serem realizadas ao longo de doze semanas, com contrações voluntárias máximas rápidas ou sub-máximas, sustentadas e realizadas nas posições deitada, sentada, de pé e caminhando. O avanço nas etapas ocorreu a cada semana, de acordo com o êxito do participante na etapa anterior. No presente estudo, foram realizados treinamentos presenciais (semanais, quinzenais ou mensais, de acordo com a propriocepção), além de contatos telefônicos semanais com todos os participantes do GI, para acompanhamento e reforço da importância da continuidade dos exercícios em domicílio.
A fim de incentivar e verificar a adesão às orientações recebidas presencialmente, foram realizados contatos telefônicos individuais regulares com os participantes do GI durante todo o tempo previsto no programa. Este acompanhamento consistiu de mensagens de texto via dispositivo móvel e contatos telefônicos semanais guiados por roteiro orientador oferecendo feedback positivo em caso de adesão aos hábitos e comportamentos ou reforçando a importância da adesão. Além dos aspectos educativos, fizeram parte do PCC a motivação pessoal, utilizando a persuasão social e experiência vicária (apresentação de vídeo sobre o êxito de um paciente com a terapia), e a disponibilização de um número telefônico para quaisquer necessidades, com vistas a favorecer o papel do enfermeiro como motivador e supervisor de todo o processo.
Homens alocados no GC receberam cuidados usuais, incluindo orientações verbais sobre restrição de cafeína e realização de contrações dos múculos pélvicos após a retirada do CVD.
A coleta de dados ocorreu em entrevistas estruturadas individuais, cuja duração média foi de 60 minutos. Foram realizadas pela pesquisadora principal e equipe previamente treinada, em ambiente privativo. Os dados foram coletados em cinco momentos em retornos ambulatoriais pré-agendados: 15 a 20 dias após a retirada do CVD (linha de base - T0); trinta dias após linha de base (T1); sessenta dias após linha de base (T2); e noventa dias após linha de base (T3).
Este estudo avaliou os efeitos positivos do PCC no controle da IUPPR (desfecho primário), bem como nos STUI (desfechos secundários). A intensidade da IUPPR foi avaliada pelo Pad-Test, método validado e frequentemente utilizado em pesquisas clínicas para quantificar o volume de perda urinária através do peso de um absorvente(10). O teste foi realizado em cinco etapas: 1) pesagem do absorvente em balança de alta sensibilidade (e-LABShop); 2) ingestão de 500 ml de água; 3) 15 minutos de repouso; 4) realização de uma série de exercícios físicos provocativos de perdas urinárias; e 5) nova pesagem do absorvente. Os resultados obtidos na pesagem classificam a perda urinária em leve (1,1 a 9,9 g), moderada (10 a 50 g) ou severa (acima de 50 g)(11).
A Urinary Incontinence Scale of Radical Prostatectomy (UISRP) também foi utilizada para avaliar o desfecho primário. É o único instrumento específico para pacientes prostatectomizados e validado para a população brasileira. É composto de sete itens com escalas do tipo Likert de cinco pontos, no qual zero indica “nunca” e quatro indica “sempre”. A pontuação varia entre 0 e 32, e pontuações mais altas indicam maior intensidade da IU(12).
Os STUI (desfechos secundários) foram avaliados por meio de uma escala independente do King’s Health Questionnaire (KHQ), que avalia a presença e a intensidade de sintomas urinários. Não existe escore total para esta escala, e os itens são analisados de forma independente(13).
Na linha de base (T0), os participantes responderam a um formulário para caracterização sociodemográfica e clínica, e, na sequência, foram avaliados quanto à intensidade da perda urinária (Pad-Test). Em seguida, foram submetidos à avaliação da intensidade da IU pela UISRP e dos STUI pela escala específica do KHQ. Neste momento, os participantes foram randomizados em GC e GI. Os alocados no GI foram apresentados ao PCC de reabilitação precoce da IU e receberam orientações sobre a realização dos exercícios e mudanças no estilo de vida, sendo agendado um retorno em 15 dias para receberem reforço das orientações presencialmente, e outros, após 30 (T1), 60 (T2) e 90 (T3) dias, para as avaliações subsequentes. Aqueles alocados no GC seguiram em atendimento de rotina da instituição, e foi realizado o agendamento para nova avaliação em 30 dias. Em todos os retornos ambulatoriais para acompanhamento clínico (T1, T2 e T3), os homens de ambos os grupos foram avaliados quanto à intensidade da perda urinária (Pad-Test e UISRP) e submetidos à avaliação subsequente de presença de outros STUI.
Análise dos resultados e estatística
Os dados foram digitados em planilha eletrônica do programa Excel para Windows®, em dupla entrada, para verificação de equivalência. A análise foi realizada em software estatístico Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) para Windows®, versão 23. Foi realizado o Teste Shapiro-Wilk para testar se as variáveis estudadas seguiam a distribuição normal. As variáveis explanatórias do tipo nominais foram descritas pela distribuição de frequências e por tabelas, e as variáveis quantitativas, a depender da normalidade, foram descritas pelas medidas de tendência central e dispersão (média/desvio padrão, em caso de distribuição normal, e mediana/percentis, caso apresentassem distribuição não normal). A equivalência entre os grupos quanto às características sociodemográficas e clínicas no pré-teste foi verificada pelos Testes t de Student e Mann-Whitney. O Teste do Qui-Quadrado ou Exato de Fisher foi utilizado para variáveis categóricas.
Em relação à comparação entre GI e GC nos diferentes momentos do pós-teste e de cada grupo ao longo do tempo, as variáveis de desfecho primário (intensidade da IU) em diferentes intervalos de tempo foram analisadas pelo modelo longitudinal com o uso das Equações de Estimações Generalizadas ou Generalized Estimating Equations (GEE), a fim de avaliar o efeito da alocação de grupo, tempo e a interação entre o efeito do grupo e do tempo (grupo*tempo). Para efeitos significativos a 5%, a comparação das médias foi obtida por meio do teste post-hoc t, protegido por Bonferroni, que tem por finalidade ajustar o valor de significância do teste baseado no número de comparações, a fim de reduzir a chance de erro tipo I.
RESULTADOS
Dos 117 homens submetidos à PR, 57 foram avaliados para elegibilidade, e 41 foram elegíveis e randomizados, dos quais 21 foram alocados no GI e 20 no GC. Entretanto, durante o seguimento, quatro participantes do GI e três do GC foram descontinuados, em decorrência do impedimento para retornos presenciais por conta da pandemia de COVID-19. Desta forma, totalizaram 17 participantes no GI e 17 no GC, que compuseram a amostra para análise dos desfechos (Figura 1).
Fluxograma de recrutamento e inclusão dos participantes no estudo, em conformidade com o Consolidated Standards of Reporting Trials (CONSORT), Goiânia, Goiás, Brasil
De acordo com os dados de caracterização sociodemográfica e clínica, não houve diferença significativa entre GC e GI ao nível das variáveis idade, cor da pele, escolaridade, renda, situação conjugal, ingestão de café/chá, tabagismo, atividade física, número de fraldas, Índice de Massa Corporal, tempo de pós-cirurgia e dias de permanência com o CVD (p>0,05). Tais resultados demonstram homogeneidade entre os grupos.
Na comparação do desfecho primário (Tabela 1), constatou-se efeito estatisticamente significativo na interação grupo*tempo para o GI. Houve redução da intensidade da IUPPR, com diferença estatística apenas no primeiro mês de acompanhamento (T1) (p≤0,001) para os participantes do GI, quando avaliada pelo Pad-Test. Em contrapartida, quando avaliada por meio da UISRP, a intensidade da IU também reduziu de forma significativa, porém esta diferença permaneceu em todos os tempos de seguimento do estudo para o GI (T1 - p=0,003; T2 - p≤0,001e T3 - p≤0,001), como mostra a Tabela 1.
Modelo de Equações de estimações Generalizadas para avaliação da efetividade da intervenção sobre a intensidade da incontinência urinária, Goiânia, Goiás, Brasil, 2021 (n=34)
Ao realizar nova comparação entre os grupos, a partir da correção pelo teste post-hoc de Bonferroni, observou-se diferença estatisticamente significativa, ao final do estudo, tanto para a avaliação realizada pelo Pad-Test (p=0,016) quanto pela UISRP (p≤0,001). Na comparação entre a linha de base e os diversos momentos de avaliação no seguimento, o GC apresenta diferença significativa apenas a partir de sessenta dias de seguimento (T2). Já no GI, essa diferença foi observada na primeira avaliação (T1), permanecendo em todos os momentos para ambas as estratégias de avaliação (Tabela 2).
Análise da intensidade da incontinência urinária, verificada por meio do Pad-Test e Urinary Incontinence Scale of Radical Prostatectomy, expressa em média e desvio padrão, de acordo com o teste post-hoc t de Bonferroni - Equações de Estimações Generalizadas, Goiânia, Goiás, Brasil, 2021 (n=34)
O resultado relativo à comparação das médias de perdas urinárias (em gramas) pelo Pad-Test em T1, T2 e T3 apresentou melhora significativa quando comparado às médias de perdas urinárias (em gramas), obtidas na linha de base (T0), tanto no GC quanto no GI. Entretanto, o GC iniciou o estudo com média de 53,6±12,8 g e alcançou 15,1±3,9 g ao final do seguimento. Já o GI iniciou com média de 50,9±7,8 g, finalizando os noventa dias de seguimento com 3,4±2,8 g de perda urinária.
O mesmo ocorreu quando comparadas as médias dos escores obtidos na UISRP em T1, T2 e T3. O GC iniciou o estudo com média de 18,4±1,1, alcançando 13,0±1,2 ao final do seguimento. Já o GI iniciou com média de 18,5±1,2, finalizando os noventa dias de seguimento com 3,0±1,1.
Na Tabela 3, observa-se que, na comparação da proporção de participantes com sintomas urinários (KHQ), constatou-se efeito no tempo (linha de base e seguimento), independente dos grupos, para os sintomas de noctúria (p=0,020) e urge-incontinência (p=0,009).
Modelo de Equações de Estimações Generalizadas para avaliação da efetividade da intervenção sobre a presença de sintomas urinários avaliados pelo King’s Health Questionnaire, Goiânia, Goiás, Brasil, 2021 (n=34)
Quanto à interação grupo*tempo (linha de base e seguimento), ressalta-se que houve diferença estatisticamente significativa do GI em relação ao GC ao final do seguimento no que se refere aos sintomas de aumento da frequência (p≤0,001), urgência miccional (p≤0,001), noctúria (p≤0,005), IU de esforço (p≤0,001) e urge-incontinência (p<0,045). Ao final do estudo, o GI apresentou menos chance em 37,5% (β=0,625) de apresentar aumento da frequência urinária, 33,9% (β=0,661) de apresentar urgência miccional, 28,1% (β=0,719) de apresentar noctúria, 27,2% (β=0,728) de apresentar IU de esforço e 21,2% (β=0,788) de apresentar urge-incontinência, em comparação ao grupo que não recebeu orientações relacionadas a IE comportamentais contidas no programa em estudo.
DISCUSSÃO
Os achados encontrados no presente estudo convergem para a constatação de que, embora seja observada redução da intensidade da IUPPR para ambos os grupos (GI e GC), para participantes do GI, a redução da intensidade da IU (Pad-Test e UISRP) foi mais expressiva e célere, visto que, com trinta dias de pós-cirúrgico, já foi possível observar resultados clínicos. Esses achados comprovam que o PCC para controle da IU e de outros STUI acelera o processo terapêutico no que se refere aos desfechos avaliados neste estudo e na população estudada.
Independente do grupo no qual foram alocados, homens prostatectomizados incluídos neste estudo apresentaram redução da taxa de perda urinária avaliada pelo Pad-Test e redução de escores por meio da UISRP. Apoiando-se em tais resultados, pode-se inferir que os participantes de ambos os grupos tendem a obter redução da intensidade da IUPPR ao longo do tempo. Entretanto, observou-se que, mesmo apresentando melhora significativa da IUPPR durante o seguimento, ao final do estudo, os participantes do GC ainda apresentavam perdas urinárias mais graves (acima de 10 g de perda urinária)(11), se comparados ao GI(1).
Em suma, a IUPPR e outros STUI são condições clínicas que podem manifestar espontaneamente de forma transitória ou prolongar por um tempo maior na vida do indivíduo, principalmente quando associados a fatores, como idade avançada, sedentarismo e obesidade(14). De forma geral, espera-se que a intensidade da IU seja reduzida com o tempo(3); porém, os achados deste estudo constatam que, mesmo após noventa dias de pós-cirúrgico, homens que não recebem uma opção terapêutica podem experienciar IU moderada ou grave.
Esses achados corroboram com resultados apresentados por outros autores, os quais demonstram que, após seis meses de pós-operatório, aproximadamente 57% dos homens prostatectomizados apresentaram perdas urinárias involuntárias, sendo 41% IU leve, 14% IU moderada e 2% IU severa(3). Evidencia-se, portanto, a necessidade de investimento em opções terapêuticas em tempo oportuno, com o uso de estratégias que promovam a autoeficácia e crença positiva, com vistas ao aumento da adesão de comportamentos e, por conseguinte, redução de impactos físicos, psicológicos e sociais. Dessa forma, atitudes mais fortes para a adesão às IE propostas, apoiadas na crença de autoeficácia obtidas por meio das estratégias adotadas no PCC, podem ter sido as responsáveis pelas implicações benéficas no aumento da adesão e consequente redução da intensidade da IUPPR e STUI, de forma mais expressiva, nos participantes do GI. Para a TSC(4), essas estratégias são preditoras imediatas na tomada de decisão para a adoção do comportamento em saúde. Logo, pressupõe-se que as intenções projetadas por meio das estratégias contidas na abordagem cognitivo-comportamental, sustentadas pela crença de autoeficácia e motivação constante durante todo o processo terapêutico, reverteram-se em ações concretas para a efetivação real do comportamento para controle de STUI pós-PR. Ademais, no que se refere à avaliação de outros STUI na população estudada, é observado que, em relação à frequência e urgência miccional, noctúria, IU de esforço e urge-incontinência foram os STUI mais relatados pelos pacientes na linha de base tanto para GC quanto para GI. Para homens em que os STUI se apresentam clinicamente mais expressivos, intervenções terapêuticas comportamentais demonstram ser expressivamente mais relevantes e benéficas para aliviar esses sintomas(15). Corroborando com esta afirmativa, no presente estudo, homens cujos STUI foram mais expressivos em linha de base também apresentaram melhora mais expressiva e significativa após a implementação do PCC.
Até o momento, a maioria dos estudos que avalia os resultados funcionais pós-PR enfatiza a IUPPR como um desfecho primário da percepção da insatisfação do paciente após a cirurgia(1). No entanto, a IUPPR é apenas um componente de um complexo de sintomas(15), e usá-la como única métrica pode ser um viés, uma vez que esses sintomas têm um efeito significativo no bem-estar geral e são frequentemente a razão pela qual os homens buscam por investigação que culminam no diagnóstico de câncer de próstata.
Autores relataram redução de STUI após a PR, principalmente em homens com sintomas moderados a graves, entretanto destacam que o perfil dos STUI se modifica após a cirurgica. Anteriormente à PR, sintomas miccionais são mais prevalentes e, após a remoção da próstata, esses sintomas se tornam menos expressivos e dão lugar aos sintomas de armazenamento(16). Essas afirmativas corroboram com os achados apresentados neste estudo, uma vez que foi possível observar redução nos STUI miccionais e permanência de IUPPR, predominantemente do tipo de estresse e outros sintomas de armazenamento, como frequência, urgência e noctúria.
Ainda que ambos os grupos tenham apresentado melhora dos STUI, notavelmente homens submetidos ao PCC proposto desmonstraram menores chances de permanecerem com sintomas de armazenamento, como IU de esforço, urge-incontinência, noctúria e frequência. As IE, incluindo métodos terapêuticos comportamentais, sempre constituem a primeira etapa no manejo do STUI após a PR. Portanto, faz-se importante que os enfermeiros estejam cientes das características clínicas de STUI pós-prostatectomia, a fim de fornecerem cuidados de saúde personalizados às necessidades desses homens. Além disso, as IE devem ser implementadas com estratégias que forneçam apoio e suporte, de forma a promover a motivação e a crença de autoeficácia(17). Assim, reforça-se a ideia de que o PCC estruturado por IE, que visa promover o autocuidado por meio da adoção de comportamentos e hábitos em saúde utilizando estratégias de motivação e acompanhamento telefônico, mostra-se efetivo para a obtenção de melhores resultados clínicos. Neste contexto, autores(17) destacam que um programa de ensino associado ao acompanhamento telefônico possa permitir o aumento do conhecimento e vínculo entre enfermeiro e paciente. Além disso, esta estratégia poderá permitir que, por meio de um acompanhamento e comunicação efetiva, homens submetidos à PR possam manifestar melhores resultados clínicos por meio de adoção de comportamentos que conduzirão à redução de IUPPR e outros STUI.
Embora seja observada melhora progressiva da IUPPR e de outros STUI ao longo do tempo, para aqueles homens em que estes sintomas perduram, os impactos sociais, emocionais, físicos e econômicos podem se tornar extremamente avassaladores e impactantes. Assim, por meio de uma opção terapêutica com o uso de estratégias cognitivo-comportamentais(17), implementadas em tempo oportuno, as chances de retorno do controle miccional de forma integral e definitiva serão maiores(18). Com isso, é possível reduzir a chance de consequências físicas que podem impactar a vida dos sujeitos com IU(19), além de reduzir o impacto econômico tanto para pacientes quanto para serviços de saúde, com a consequente redução da necessidade de medidas terapêuticas mais complexas, invasivas e onerosas(20).
Limitações do estudo
Como limitação desta pesquisa, cita-se a restrição da generalização de seus resultados para contextos distintos. Essa intervenção foi proposta em um contexto acadêmico, no qual uma equipe de enfermeiras se dedicava exclusivamente às atividades propostas. Desta forma, sugere-se que, para uma reprodução exitosa, é necessário um profissional qualificado e empenhado na atividade, além de apoio da instituição onde o programa será implementado. Ademais, por se tratar de um estudo com reduzido número de participantes, pode-se citar a restrição da generalização dos resultados apresentados. Portanto, é importante implementar a intervenção em diferentes contextos e com quantitativo expressivo de participantes.
Contribuições para as áreas da enfermagem, saúde ou políticas públicas
A contribuição deste estudo para a prática clínica de enfermagem e áreas afins se concentra em possibilitar uma proposta terapêutica de baixo custo e exequível. Desta forma, espera-se que os resultados apresentados estimulem a realização de novos estudos com tamanho amostral expressivo para sustentar resultados de efetividade clínica apresentados neste estudo.
CONCLUSÃO
O PCC estruturado em IE se mostrou efetivo para a redução da intensidade da IU e dos STUI. A partir do programa proposto no presente estudo, maior suporte e motivação foram propiciados por meio das estratégias de persuasão social, feedback positivo e reforço vicário. Desta forma, é possível inferir que as estratégias elencadas por meio da TSC contríbuíram para aumento da adesão a hábitos e comportamentos que auxiliaram no controle dos STUI após a PR, além de propiciar maior confiança na relação enfermeiro-paciente e, por conseguinte, aumento da adesão às IE propostas.
MATERIAL SUPLEMENTAR
Considerando as práticas de comunicação da ciência aberta, os dados encontram-se no repositório SciELO Data sob DOI: https://doi.org/10.48331/scielodata.WYJ9UX.
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Editado por
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EDITOR CHEFE: Antonio José de Almeida Filho
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EDITOR ASSOCIADO: Alexandre Balsanelli
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
29 Jul 2022 -
Data do Fascículo
2022
Histórico
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Recebido
13 Mar 2021 -
Aceito
05 Abr 2022