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Concepções de redução de danos: discursos de profissionais de enfermagem da atenção primária à saúde

RESUMO

Objetivo:

analisar as memórias discursivas sobre a estratégia de Redução de Danos que perpassam os saberes de profissionais de enfermagem que atuam na Atenção Primária à Saúde.

Método:

estudo qualitativo e exploratório, fundamentado no referencial teórico-metodológico da Análise do Discurso de matriz francesa. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas com 14 profissionais de enfermagem que atuam na Atenção Primária à Saúde.

Resultados:

a análise indicou predomínio de memórias discursivas relacionadas ao modelo biomédico de concepção da saúde, bem como das abordagens religiosa e moral referente ao uso de substâncias psicoativas. A perspectiva da chamada “clínica ampliada” foi discreta, salientando o vínculo e prevenção de riscos e danos do uso de substâncias psicoativas que afetam a dimensão fisiológica.

Considerações finais:

o impacto deste estudo evidencia a necessidade de propostas de educação permanente sobre os conceitos de Redução de Danos na formação e qualificação do profissional de enfermagem.

Descritores:
Discurso; Profissionais de Enfermagem; Atenção Primária à Saúde; Saúde Mental; Redução do Dano

ABSTRACT

Objective:

to analyze the discursive memories about the harm reduction strategy, which permeate the knowledge of Primary Health Care nursing professionals.

Method:

a qualitative and exploratory study based on the French Discourse Analysis theoretical-methodological framework. Semi-structured interviews were carried out with 14 Primary Health Care nursing professionals.

Results:

analysis indicated a predominance of discursive memories related to the biomedical model of health conception as well as religious and moral approaches regarding psychoactive substance use. The perspective of an “expanded clinic” was discreet, highlighting the link and prevention of risks and harms from psychoactive substance use that affect the physiological dimension.

Final considerations:

the impact of this study emphasizes the need for permanent education proposals on harm reduction concepts in training and qualifying nursing professionals.

Descriptors:
Speech; Nurses; Primary Health Care; Mental Health; Harm Reduction

RESUMEN

Objetivo:

analizar las memorias discursivas sobre la estrategia de Reducción de Daño que permean el conocimiento de los profesionales de enfermería que laboran en Atención Primaria de Salud

Método:

estudio cualitativo y exploratorio, basado en el marco teórico-metodológico del Análisis Discurso de matriz francesa. Se realizaron entrevistas semiestructuradas a 14 profesionales de enfermería que laboran en Atención Primaria de Salud

Resultados:

el análisis indicó un predominio de memorias discursivas relacionadas con el modelo biomédico de concepción de la salud, así como enfoques religiosos y morales sobre el uso de sustancias psicoactivas. La perspectiva de la llamada “clínica ampliada” fue discreta, destacando la vinculación y prevención de riesgos y daños por el uso de sustancias psicoactivas que afectan la dimensión fisiológica.

Consideraciones finales:

el impacto de este estudio destaca la necesidad de propuestas de educación permanente sobre los conceptos de Reducción del Daño en la formación y calificación de los profesionales de enfermería.

Descriptores:
Discurso; Enfermeras Practicantes; Atención Primaria de Salud; Salud Mental; Reducción del Daño

INTRODUÇÃO

Redução de Danos (RD) é um conjunto de estratégias práticas e políticas que visa minimizar os riscos e danos psicossociais, econômicos e biológicos derivados do consumo de substâncias psicoativas (SPAs), sem necessariamente diminuir ou extinguir o consumo. Tem como princípios a abordagem empática, sem julgamentos, compromisso com a promoção de saúde coletiva, garantia dos direitos humanos e engajamento coletivo para promover transformações sociais. A RD é uma prática emancipatória que pressupõe a construção, em conjunto com o usuário, de estratégias de autocuidado, proteção e promoção de saúde(11 Moreira CR, Soares CB, Campos CMS, Laranjo THM. Harm reduction: trends being disputed in health policies. Rev Bras Enferm. 2019;72(suppl 3):312-20. doi: 10.1590/0034-7167-2017-0671
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-22 Ministério da Saúde (BR). A política do Ministério da Saúde para a atenção integral a usuários de álcool e outras drogas [Internet]. Brasília; 2004 [cited 2020 Jun 06]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_atencao_alcool_drogas.pdf
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). Esteve alinhada aos princípios da Reforma Psiquiátrica Brasileira; mas, após sancionado em 2019, o Decreto nº 9.761, de 11/04/2019, que instituiu a nova Política Nacional sobre Drogas, excluiu a RD como estratégia norteadora do cuidado, privilegiando, assim, a promoção e manutenção da abstinência(33 Presidência da República (BR). Decreto nº 9.761, de 11 de abril de 2019. Aprova a Política Nacional sobre Drogas. [Internet]. Brasília; 2019 [cited 2019 Nov 15]. Available from: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/decreto/D9761.htm#anexo
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). Apesar dessas mudanças políticas, entende-se que a RD ainda se configura em um dos marcos teóricos que orienta o cuidado às pessoas que consomem crack, álcool e outras drogas, materializando-se no cotidiano dos profissionais de saúde.

A RD utiliza estratégias que são construídas e concebidas por meio do vínculo, diálogo e relação entre o serviço, os profissionais de saúde e os usuários, com a finalidade de assegurar a autonomia e cidadania do usuário. A RD reconhece o sujeito na sua totalidade e em seus aspectos relacionais com o lugar social que este ocupa, procurando aumentar o acesso e a aderência ao cuidado(44 Machado LV, Boarini, ML. Políticas sobre drogas no Brasil: a estratégia de redução de danos. Psicol Ciênc Prof. 2013;33(3):580-95. doi: 10.1590/S1414-98932013000300006
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-55 Hawk M, Coulter RW, Egan JE, Fisk S, Friedman MR, Tula M, et al. Harm reduction principles for healthcare settings. Harm Reduct J. 2017;14(1):70. doi: 10.1186/s12954-017-0196-4
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). Dessa maneira, a RD constituir-se-ia em estratégia clínica a ser implementada por todos os dispositivos de acolhimento e acesso em que o usuário transita, envolvendo espaços de saúde, educação e assistência social(22 Ministério da Saúde (BR). A política do Ministério da Saúde para a atenção integral a usuários de álcool e outras drogas [Internet]. Brasília; 2004 [cited 2020 Jun 06]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_atencao_alcool_drogas.pdf
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). Os autores deste manuscrito trabalham, portanto, com o pressuposto da relevância de que a RD seja (re) colocada em ação em todos os dispositivos de saúde, incluindo os dispositivos de Atenção Primária à Saúde (APS). Evidências científicas que abordam a eficácia dessa estratégia fundamentam este pressuposto(66 Des Jarlais DC. Harm reduction in the USA: the research perspective and an archive to David Purchase. Harm Reduct J. 2017;14(1):51. doi:10.1186/s12954-017-0178-6
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-77 Wilson DP, Donald B, Shattock AJ, Wilson D, Fraser-Hurt N. The cost-effectiveness of harm reduction. Int J Drug Policy. 2015;26(suppl 1):5-11. doi:10.1016/j.drugpo.2014.11.007
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).

Na APS, os profissionais de enfermagem assumem papéis fundamentais no cuidado dos usuários, familiares e comunidade, ao estabelecerem vínculos, acolherem as necessidades de saúde, realizarem atividades em grupo, identificarem demandas físicas, sociais e de determinantes de saúde, bem como elaborarem plano de cuidados(88 Ferreira SRS, Périco LAS, Dias VRFG. The complexity of the work of nurses in Primary Health Care. Rev Bras Enferm. 2018;71(suppl 1):704-709. doi: 10.1590/0034-7167-2017-0471
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). Tais práticas são permeadas por saberes que envolvem ideologias construídas social e historicamente que possibilitam a esses profissionais se tornarem potentes veiculadores da estratégia de RD. Os saberes colocados em prática por esses profissionais, enquanto sujeitos do discurso, na perspectiva da Análise do Discurso de matriz francesa, são constituídos de ideologias e memórias discursivas que afetam a produção de efeitos de sentidos(99 Orlandi EP. Análise de discurso: princípio e procedimentos. 12th ed. Campinas: Pontes Editores; 2015. 100p.) em relação às suas concepções sobre RD. As memórias discursivas, ou seja, as marcas históricas e sociais pré-construídas, são materializadas nos discursos(99 Orlandi EP. Análise de discurso: princípio e procedimentos. 12th ed. Campinas: Pontes Editores; 2015. 100p.) desses profissionais, influenciando seus saberes em relação ao cuidado com os usuários na perspectiva da RD.

Os estudos nacionais sobre as concepções de profissionais de saúde atuantes em serviços especializados em SPAs apontam um desconhecimento desses quanto às políticas de RD, parecendo trabalhar com perspectivas transpassadas pelo medo e preconceito moral(1010 Calassa GDB, Penso MA, Freitas LG. Redução de danos na visão dos profissionais que atuam no CAPS AD II do Distrito Federal. Psicol Pesq. 2015;9(2):177-87. doi: 10.5327/Z1982-1247201500020008
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11 Carvalho B, Dimenstein M. Discourse analysis about harm reduction in a CAPSad III and a therapeutic community. Temas Psicol. 2017;25(2): 647-60. doi: 10.9788/TP2017.2-13
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-1212 Souza DR, Oliveira MAF, Soares RH, Domanico A, Pinho PH. Resistências dos profissionais da atenção psicossocial em álcool/drogas à abordagem de redução de danos. J Nurs Health. 2017;7(1):16-24. doi: 10.15210/JONAH.V7I1.9276
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). Estudos que abordam a relação entre RD e APS, e que envolvem a enfermagem, limitam-se ao contexto de consultório na rua(1313 Engstrom EM, Teixeira MB. Manguinhos, Rio de Janeiro, Brazil, “Street Clinic” team: care and health promotion practice in a vulnerable territory. Ciênc Saúde Colet. 2016;2(6):1839-48. doi: 10.1590/1413-81232015216.0782016
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-1414 Simões TRBA, Couto MCV, Miranda L, Delgado PGG. Mission and effectiveness of Outdoor Clinics (Consultórios na Rua): an experience of consensus production. Saúde Debate. 2017;41(114):963-75. doi: 10.1590/0103-1104201711423
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), o que representa uma lacuna de conhecimento nesta temática. Diante da escassez de estudos que abordam a RD na perspectiva dos profissionais de enfermagem, principalmente na APS e sob a luz da Análise do Discurso de matriz francesa, busca-se responder à questão de pesquisa: quais são os efeitos de sentido das interpelações ideológicas que perpassam os discursos dos profissionais de enfermagem em relação às concepções sobre RD?

OBJETIVO

Analisar as memórias discursivas que perpassam os saberes de profissionais de enfermagem que atuam na APS, no que diz respeito à estratégia de RD.

MÉTODO

Aspectos éticos

Este estudo respeitou os preceitos éticos de pesquisa envolvendo seres humanos, conforme Resolução no. 510/2016 da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa do Conselho Nacional de Saúde, aprovado pelo Comitê de Ética de Pesquisa com Seres Humanos de uma universidade federal do estado de São Paulo. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, dando ciência quanto aos aspectos que envolvem o estudo.

Referencial teórico-metodológico

O estudo é fundamentado na Análise do Discurso (AD) de matriz francesa, para a qual o discurso não se constitui somente em processo linear de transmissão de informações e decodificações de mensagens, mas em efeito de sentidos entre locutores(99 Orlandi EP. Análise de discurso: princípio e procedimentos. 12th ed. Campinas: Pontes Editores; 2015. 100p.), ou seja, a produção oriunda da enunciação. A enunciação constitui em conjunto de enunciados, os quais são produzidos pela interação verbal e social dos sujeitos(1515 Di Fanti MG, Barbisan LB, editors. Enunciação e discurso: tramas de sentido. São Paulo: Contexto. 2012. 196p.). Nesse processo de interlocução, existem sujeitos e sentidos se afetando e sendo afetados pela ideologia e história, bem como sendo constituídos no momento da enunciação(1616 Pêcheux M. Semântica e discurso: uma crítica à afirmação do óbvio. 5th ed. Campinas: Editora da Unicamp, 2014. 288p.-1717 Brandão HHN. Introdução à análise do discurso. 3rd ed. Campinas: Editora da Unicamp, 2012. 120p.).

A AD possibilita analisar o discurso, situando-o no processo relacional entre a linguagem e o contexto e identificando os vestígios e as marcas das contradições ideológicas na materialidade linguística(1616 Pêcheux M. Semântica e discurso: uma crítica à afirmação do óbvio. 5th ed. Campinas: Editora da Unicamp, 2014. 288p.). Os discursos do sujeito são construídos e concebidos em um contexto histórico-social e determinados pela ideologia, de maneira que não são originados no próprio enunciador. Portanto, ao analisá-los, tais contextos devem ser considerados(99 Orlandi EP. Análise de discurso: princípio e procedimentos. 12th ed. Campinas: Pontes Editores; 2015. 100p.). A AD busca compreender as condições em que os discursos são produzidos. As condições de produção incluem o sentido estrito, ou seja, o contexto imediato em que um discurso está sendo emitido, e também o sentido amplo, que envolve o contexto sócio histórico, aspectos imaginários e ideológicos(99 Orlandi EP. Análise de discurso: princípio e procedimentos. 12th ed. Campinas: Pontes Editores; 2015. 100p.).

Os sentidos produzidos pelos sujeitos se inscrevem nas Formações Discursivas (FDs). Segundo Orlandi(99 Orlandi EP. Análise de discurso: princípio e procedimentos. 12th ed. Campinas: Pontes Editores; 2015. 100p.), uma FD é aquilo que em uma posição determinada e em uma conjuntura específica determina o que é permitido ou não ser dito. Perpassam pelas FDs dois eixos distintos: o intradiscurso e o interdiscurso. O intradiscurso se constitui no eixo da formulação do enunciado, ou seja, o dito em uma determinada circunstância dada. O interdiscurso envolve memórias discursivas ditas anteriormente, exteriormente e independentemente. Portanto, uma FD é transpassada por várias FDs e toda FD é atravessada pelo interdiscurso. As FDs se constituem na relação interdiscursiva, onde há trocas das FDs com componentes pré-concebidos e produzidos exteriormente a eles(1414 Simões TRBA, Couto MCV, Miranda L, Delgado PGG. Mission and effectiveness of Outdoor Clinics (Consultórios na Rua): an experience of consensus production. Saúde Debate. 2017;41(114):963-75. doi: 10.1590/0103-1104201711423
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).

As memórias discursivas atravessam a constituição de sentidos, sendo consideradas como saberes construídos anterior e exteriormente ao sujeito, e que retornam no enunciado, afetando as significações em uma determinada situação discursiva. Todos os sentidos produzidos antes e em outro lugar se inscrevem nos discursos. O modo como as memórias discursivas se tornam presentes no enunciado é considerado fundamental para compreender a constituição dos sujeitos, a produção de sentidos e o funcionamento discursivo(99 Orlandi EP. Análise de discurso: princípio e procedimentos. 12th ed. Campinas: Pontes Editores; 2015. 100p.).

Tipo de estudo

Estudo qualitativo e exploratório, embasado no referencial teórico-metodológico da AD de matriz francesa.

Procedimentos metodológicos

Cenário do estudo

O estudo foi realizado em um município do interior paulista, em unidades de saúde da rede de Atenção Primária à Saúde, compreendendo duas Unidades Básicas de Saúdes (UBS) e oito Unidades da Saúde da Família (USF). Salienta-se a existência de, pelo menos, uma unidade de saúde representativa de cada região territorial do município específico (no total, são cinco). Justifica-se tal fato pela intenção de captar a percepção dos profissionais de enfermagem inseridos nestes diferentes territórios.

Fonte de dados

O recrutamento e fechamento amostral dos participantes da pesquisa ocorreu por meio de técnica de amostragem de conveniência(1818 Etikan I, Musa SA, Alkassim, RS. Comparison of Convenience Sampling and Purposive Sampling. AJTAS. 2016;5(1):1-4. doi: 10.11648/j.ajtas.20160501.11
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) de quatorze profissionais de enfermagem, sendo nove enfermeiras, quatro auxiliares de enfermagem e uma técnica de enfermagem. Tais profissionais estavam acessíveis e disponíveis nas equipes de enfermagem das respectivas unidades de saúde escolhidas, durante o período de coleta de dados. Não houve desistência dos participantes depois que concordaram em participar. Os critérios de inclusão dos participantes do estudo foram: ter idade maior ou igual a 18 anos, ser profissional atuante no serviço de APS há, pelo menos, 1 ano (devido ao vínculo fortalecido com a unidade de saúde), ter vínculo efetivo e/ou temporário. Como critério de exclusão: estar em licença saúde, paternidade ou gestante no período da coleta de dados.

Contudo, este estudo buscou manter o rigor metodológico durante a relação pesquisadora-pesquisados, obtendo-se da amostra de participantes a profundidade e multiplicidade no processo de compreender um determinado grupo(1919 Minayo MCS. Amostragem e saturação em pesquisa qualitativa: consensos e controvérsias. Rev Pesqui Qual [Internet]. 2017[cited 2019 Nov 20];5(7):1-12. Available from: https://editora.sepq.org.br/index.php/rpq/article/view/82/59
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) sobre suas concepções da RD, articulados ao referencial teórico da AD.

Coleta e organização dos dados

As entrevistas semiestruturadas foram realizadas no período de fevereiro a outubro de 2019, com duração média de 24 minutos, as quais continham as seguintes questões norteadoras: você conhece as políticas de RD? Já ouviu falar? O que você entende por RD? Para você, qual é o sentido e a finalidade das políticas de RD? Foram realizadas duas entrevistas piloto, sendo o roteiro da entrevista revisto e aperfeiçoado. As entrevistas foram pré-agendadas, áudio gravadas e transcritas na íntegra.

Os participantes foram identificados como Sujeitos Discursivos (SD), seguidos por numeração sequencial correspondente à ordem das entrevistas (e.g. SD1). As sequências discursivas foram representadas pela sigla “sd”, seguidas da numeração sequencial (e.g. sd5) e estão sublinhadas neste estudo.

Análise dos dados

Foram utilizados os dispositivos analíticos do referencial metodológico da AD, o qual possibilita captar o dito e o não dito para além das evidências, compreendendo a determinação dos sentidos histórico e social, bem como a constituição inconsciente e ideológica do sujeito(99 Orlandi EP. Análise de discurso: princípio e procedimentos. 12th ed. Campinas: Pontes Editores; 2015. 100p.).

O processo de análise possui três etapas. A primeira é conhecida como passagem da superfície linguística para o objeto discursivo; há a transcrição na íntegra de todas as entrevistas e as escutas do material para a constituição do corpus de análise. Nesse processo, a pesquisadora se atentou aos vestígios, indícios, pistas, ao dito e ao não dito, buscando as regularidades dos processos de produção discursivas, ou seja, as marcas linguísticas constituídas por efeitos metafóricos, parafrásicos e polissêmicos(99 Orlandi EP. Análise de discurso: princípio e procedimentos. 12th ed. Campinas: Pontes Editores; 2015. 100p.). Durante a construção do objeto discursivo, é possível identificar o dito e o não dito e como esses dizeres são acometidos pelas memórias discursivas(2020 Silva MASM. Sobre a Análise do Discurso. Rev Psicol UNESP [Internet]. 2005 [cited 2019 Nov 22];4(1):16-40. Available from: http://seer.assis.unesp.br/index.php/psicologia/article/view/998
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).

A segunda etapa se caracteriza pela passagem do objeto discursivo para o processo discursivo, em que busca-se captar como a história se substancializa nos processos discursivos e aglutina teoria, corpus e análise(2020 Silva MASM. Sobre a Análise do Discurso. Rev Psicol UNESP [Internet]. 2005 [cited 2019 Nov 22];4(1):16-40. Available from: http://seer.assis.unesp.br/index.php/psicologia/article/view/998
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). Ainda nessa etapa, foram identificadas as sequências discursivas relevantes e realizados os primeiros recortes do material, selecionando os fragmentos discursivos que respondem ao objetivo, constituindo-se em FDs.

Na terceira etapa, ocorre a transformação do processo discursivo em formação ideológica, em que se realiza o agrupamento dos recortes discursivos em blocos discursivos de acordo com as ideologias comuns encontradas(2121 Gomes AMT. Do discurso às formações ideológica e imaginária: uma proposta de análise de discurso com base em Pêcheux e Orlandi. Rev Enferm UERJ [Internet]. 2007[cited 2019 Nov 22];15(4):555-62. Available from: http://www.facenf.uerj.br/v15n4/v15n4a13.pdf
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). A análise dos dados evidenciou o bloco discursivo chamado As memórias discursivas que dão efeitos de sentido aos discursos sobre as concepções de RD. Salienta-se que, para garantir os aspectos de validade e fidedignidade dos resultados(2222 Noble H, Smith J. Issues of validity and reliability in qualitative research. Evid Based Nurs [Internet]. 2015 [cited 19 Dec 2019];18(2):34-5. Available from: http://ebn.bmj.com/content/18/2/34.full
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), dois pesquisadores enfermeiros experts na temática de RD e AD avaliaram as sequências discursivas, os recortes e os blocos discursivos finais.

RESULTADOS

O bloco discursivo materializou os efeitos de sentido produzidos sobre as concepções de RD, os quais são interpelados ideologicamente pelas memórias discursivas (interdiscurso) nos enunciados dos profissionais de enfermagem.

Os recortes de número 1 a 5 enunciam a RD como caminho para a obtenção da abstemia por intermédio da internação e prevenção da recaída. O SD2 relacionou o sentido de RD como um meio para se obter o objetivo final de abstemia às drogas, por intermédio do esforço máximo empenhado pelo usuário.

Recorte 1: eu acho que Redução de Danos seria o empenho ao máximo pra ele [usuário] ter fim desse vício (sd1). (SD2)

Os recortes 2 e 3 expressam vestígios de significantes de uma mesma FD, em que se pressupõe que os usuários ao atingirem a abstemia também podem vivenciar a recaída. Entretanto, no recorte 3, evidencia-se a responsabilidade da participação do serviço para acompanhá-los.

Recorte 2: a gente teve alguns casos de usuários de drogas, é... de usuário de crack também que fez tratamento aqui, que vinha sempre, tinha recaída (sd10), vinha conversava, chorava, começava de novo (sd11). (SD10)

Recorte 3: qualquer deslize, às vezes, ele consegue até ficar livre (sd9), mas qualquer deslize (sd10), se ele não tiver um bom acompanhamento, ele volta, né? (sd11). (SD11)

Os recortes 4 e 5 salientam efeitos de sentido de espaços de internação e confinamento, os quais constituem, na perspectiva dos profissionais de enfermagem, em instituições de tratamento que recolhem e evitam abandonar os doentes na rua.

Recorte 4: é ... locais pra internação (sd2) […]. Assim, eu acho que simplesmente largar eles aí assim, como é hoje, não é bom, é ruim (sd3). Tanto pra gente agora, tanto pra eles, como pra gerações futuras, né? É ruim (sd4). (SD2)

Recorte 5: eu acho que deveria ter um lugar [com] pessoas capacitadas, (sd4), pra isso, que, que recolhesse eles na rua e não tratasse eles na rua (sd5), entendeu? (SD3)

Os recortes 6 e 7 revelam a influência das crenças religiosas como alternativa para aceitação do tratamento e recuperação das drogas.

Recorte 6: isso que é a minha... a minha... a minha Redução de Danos: Jesus Cristo […] (sd12). [...] pede pra Deus te ajudar você sair dessa vida (sd14), que você entrou nesse caminho (sd15), que é um caminho sem volta, rapaz (sd16). (SD1)

Recorte 7: é que nem igreja, (sd17), se você for na igreja e você aceitar ou você tá aberto para aceitar, porque você tem que tá aberto para aceitar, se você tiver aberto para aceitar, seu coração vai transbordar e você vai melhorar (sd18). (SD6)

O recorte 8 salienta que reduzir danos envolve que o usuário aceite sua condição de doente e tenha força de vontade para querer mudar seu hábito de vida.

Recorte 8: pessoas assim, que a cabeça já não... (sd5), eles não querem se prender a nada (sd6), é difícil você tratar essas pessoas, eles têm que aceitar e aceitar que eles são alcoólatras (sd7) e, geralmente, eles não aceitam que são alcoólatras (sd8). (SD12)

O recorte 9 expressa a facilidade da pessoa em iniciar o consumo de drogas, mas a dificuldade de se recuperar, o que requer tempo e etapas.

Recorte 9: parece que é uma coisa muito fácil de cê entrar. Difícil de sair (sd32). [...] mas que você dá um passo de cada vez (sd33). (SD8)

Os recortes 10 e 11 abordam a RD, aproximando-se da perspectiva de clínica ampliada. Os discursos são atravessados pelo efeito de sentidos do conceito de cuidado integral ao usuário e usuária de SPAs, pois o foco não se limita a reduzir e se abster da droga, mas à prevenção de outras situações de vulnerabilidade que possam advir dos danos de seu consumo.

Recorte 10 : reduzir danos, na parte de droga , não é, às vezes, você tirar só a droga (sd22), mas é conscientizar a pessoa sobre o que ela pode ter no futuro. [...] às vezes, a gente acha que tem que tratar o paciente que é drogado só relacionado com a doença, à drogação, e a gente esquece, acaba esquecendo das outras doenças, né? Por exemplo, uma mulher, você acaba esquecendo de falar pra ela que às vezes, a prevenção... de prevenir uma gravidez, uma prevenção de fazer um Papanicolau pra prevenir um câncer de colo uterino, enfim tá focado só na droga [...] (sd3). A gente tem que ver como um conjunto (sd5), né? Tratar aquela mulher ou aquele homem como uma saúde total (sd6), não só vendo a saúde mental, mas ver ela também, o aspecto biológico dela como um todo (sd7). (SD6)

O recorte 11 pressupõe a aproximação do profissional para a construção e estabelecimento de vínculo com o usuário, de maneira a lhe possibilitar adesão ao serviço de saúde e planejar junto a ele o seu cuidado.

Recorte 11: [...] ir devagar e conquistando essa pessoa pra ver se você consegue chegar no seu objetivo final... e pra você também não afastar essa pessoa, você tem que fazer sugestões ponderadas ao ponto de vista dela, pra que ela... você não perca ela, porque senão ela se afasta [...] é manter vinculo [...] realmente, reduzir o dano que o álcool e a droga esteja fazendo nessa pessoa , diminuir a gravidade, o comprometimento, tanto social como fisiológico dessa pessoa (sd6). (SD5)

Os recortes 12, 13 e 14 referem-se à produção de efeito de sentidos sobre riscos e danos físicos, como neurológicos, bem como os relacionados ao comportamento sexual, tais como Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs).

Recorte 12: os danos ‘é’ cognitivo com certeza (sd17). Acredito que o neurônio que murchou ou que morreu jamais, ele vai [...] (sd18) só se ter uma medicina tão avançada que recupere o que perdeu, né? (sd19). (SD8)

Recorte 13: por exemplo, um paciente que é usuário, sei lá, de uma droga injetável, além de todos os danos que ele pode ter pelo uso da droga, ele pode contrair uma DST [Doença Sexualmente Transmissível] por conta, né, do... da seringa que ele tá usando, tudo mais. Então, é... se a gente não consegue intervir, né... que ele pare de usar, talvez a gente consiga oferecer outros recursos, como... uma seringa estéril, que seja só dele, uma agulha estéril, que seja só dele, e aí isso eu chamo de redução (sd24). (SD7)

O recorte 14 relaciona RD com o ato de medicalizar.

Recorte 14: que não deixa de ser uma forma de Redução de Danos, é... você entrar com medicamento, com medicação controlada quando a pessoa quer deixar (sd10). (SD10)

DISCUSSÃO

Os discursos dos profissionais de enfermagem deste estudo sobre a concepção de RD são permeados por diferentes saberes discursivos, os quais são subsidiados pelos modelos biológico/doença/asilar, moral, de prevenção de recaída (estrutura cognitiva-comportamental), religioso e da chamada clínica ampliada. Portanto, parafraseando Pêcheux(1616 Pêcheux M. Semântica e discurso: uma crítica à afirmação do óbvio. 5th ed. Campinas: Editora da Unicamp, 2014. 288p.) e Orlandi(99 Orlandi EP. Análise de discurso: princípio e procedimentos. 12th ed. Campinas: Pontes Editores; 2015. 100p.), é uma memória discursiva que não é acessível conscientemente a estes profissionais, mas é constitutiva deles e que retorna por meio do interdiscurso.

Assim, os recortes discursivos 1, 2 e 3 expressam sentidos de uma mesma FD subsidiada nas memórias discursivas de modelo de doença, de prevenção à recaída e de modelo moral. O modelo de doença pressupõe que a dependência de SPAs é uma doença e, portanto, busca-se atingir como meta terapêutica a cura, ou seja, a abstemia. Entretanto, pode ocorrer a recaída, a qual pode ser prevenida. Ambos os modelos são fruto de memórias discursivas construídas social e historicamente hegemônicas no cenário de tratamento de usuários de SPAs. Ao mesmo tempo, no recorte 1, a sequência discursiva sd1 (“seria o empenho ao máximo pra ele [usuário] ter fim desse vício”) expressa um discurso de modelo moral, o qual revela que o consumo da droga é uma escolha pessoal que desrespeita as normas e regras sociais(2323 Pillon SC, Luis MAV. Explanatory models for alcohol and drugs use and the nursing practice. Rev Latino-Am Enfermagem. 2004;12(4):676-82. doi: 10.1590/S0104-11692004000400014
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). Portanto, para a pessoa manter-se abstêmica, é requerido força de vontade, esforço individual e motivação interna, para controlar o comportamento aditivo(2323 Pillon SC, Luis MAV. Explanatory models for alcohol and drugs use and the nursing practice. Rev Latino-Am Enfermagem. 2004;12(4):676-82. doi: 10.1590/S0104-11692004000400014
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).

Os significantes “recaída”, “deslizes”, “começava de novo” nos recortes discursivos 2 e 3 denotam deriva de efeitos metafóricos de sentidos de que o dependente de SPAs pode deslizar (escorregar suavemente) para a queda ou várias quedas – “recaída”. Entretanto, a pessoa, ao se levantar de uma queda, recomeça o seu caminhar (“começava de novo”), porém a situação vivenciada da queda pode ser refletida. O efeito metafórico, enquanto processo semântico produzido pela transferência contextual (neste estudo, o “deslize”), provoca uma deriva de sentido no discurso, de acordo com a posição ideológica ocupada pelo sujeito(99 Orlandi EP. Análise de discurso: princípio e procedimentos. 12th ed. Campinas: Pontes Editores; 2015. 100p.). Tais efeitos de sentidos remetem ao interdiscurso do modelo de prevenção de recaída (PR) uma abordagem de tratamento de usuários de SPAs(2424 Knapp P, Bertolote JM, editors. Prevenção da recaída: um manual para pessoas com problemas pelo uso do álcool e de drogas. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994. 71p.-2525 Marlatt GA, George W. Relapse prevention and maintenance of optimal health. In: Shumaker S, Schron E, Ockene J, McBee W, editors. The handbook of health behavior change. 2nd ed. New York: Springer Publishing Company; 1998. p. 33-58), que consiste em uma série de ações preventivas, com vistas à mudança de comportamento da pessoa e manutenção da abstemia utilizando-se técnicas da abordagem de terapia cognitiva-comportamental.

Os recortes 4 e 5 enunciam significantes verbais “largar” e “recolher”, os quais estão correlacionados e ocasionam tensões de sentidos, pois produzem deslocamento para efeito de sentidos de confinamento. No sd3 do SD2, o verbo “largar” dá sentido para o enunciador de “abandono”, “sem cuidado”, requerendo um lugar para confinar os usuários, portanto, local de internação e reclusão como única alternativa (“é ... locais pra internação”- sd2 de SD2 ). Tais discursos são acometidos pelo interdiscurso advindo do modelo asilar, que marcou o início da história da psiquiatria, em que os considerados “alienados” eram submetidos ao confinamento e tratamento em hospícios e colônias(2626 Foucault M. História da Loucura na idade clássica. 2nd ed. São Paulo: Perspectiva, 2019. 688p.). Tais essências discursivas acima contradizem a estratégia de RD, a qual defende os direitos humanos, a autonomia da pessoa e a liberdade do e para o usuário, seja para suas próprias escolhas no referente a continuar o consumo de SPAs ou para decidir sobre suas condições de vida e habitação, corroborando a literatura(2727 Teixeira MB, Ramôa ML, Engstrom E, Ribeiro JM. Tensions between approach paradigms in public policies on drugs: an analysis of Brazilian legislation in 2000-2016. Ciênc Saúde Colet. 2017;22(5):455-1466. doi: 10.1590/1413-81232017225.32772016
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28 Lopes HP, Gonçalves AM. A política nacional de RD: do paradigma da abstinência às ações de liberdade. Pesqui Prát Psicossociais [Internet]. 2018[cited 2019 Nov 23];13(1):1-15. Available from: http://www.seer.ufsj.edu.br/index.php/revista_ppp/article/download/2858/1886
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-2929 Knaak S, Christie R, Mercer S, Stuart H. Harm reduction, stigma and the problem of low compassion satisfaction:tension on the front-lines of Canada’s opioid crisis. J Mental Health Addic Nurs. 2019;3(1):8-21. doi: 10.22374/jmhan.v3i1.37
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).

No recorte 5, a sequência discursiva “que recolhesse eles na rua e não tratasse eles na rua” proporciona o deslizamento para o efeito metafórico de sentidos de guardar/tirar de circulação o usuário que incomoda a sociedade. Esse seguimento discursivo enuncia um saber Outro, isto é, a memória discursiva da política higienista-disciplinadora brasileira entre finais do século XIX e início do XX, que consistia em esconder/remover as pessoas do convívio social(3030 Nielsson JG, Wermuth MAD. “Os higienistas estão voltando”: biopolítica, classes subalternizadas e ocupação do espaço urbano no Brasil. Rev Dir Cid. 2018;10(2):596-619. doi: 10.12957/rdc.2018.30172
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), reflexo das condições de produção ampliadas do contexto histórico da época. Tal discurso corrobora a atual Política Nacional sobre Drogas (Decreto no. 9.761/19), a qual preconiza a construção de uma sociedade protegida de consumo de SPAs, por intermédio de intervenções de combate às drogas, redução de demandas (com foco na abstemia das drogas) e de ofertas (ações de segurança pública)(33 Presidência da República (BR). Decreto nº 9.761, de 11 de abril de 2019. Aprova a Política Nacional sobre Drogas. [Internet]. Brasília; 2019 [cited 2019 Nov 15]. Available from: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/decreto/D9761.htm#anexo
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). Contradizendo a sequência discursiva, as equipes do Consultório na Rua lidam com as diferentes demandas e necessidades de saúde da população em situação de rua(3131 Ministério da Saúde (BR). Portaria nº 122, de 25 de janeiro de 2012. Define as diretrizes de organização e funcionamento das Equipes de Consultório na Rua. Diário Oficial da República [Internet]. Brasília; 2012 [cited 2019 Nov 16]. Available from: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7498.htm2012
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). Essa proposta não tem pretensão de recolher alguém da rua, mas sim de produzir cuidados de saúde integrais às pessoas em situação ou experiência de rua, oferecendo-lhes ações de prevenção à saúde, RD e promovendo o acesso à saúde a todos.

Percebe-se que nos recortes de 1 a 5, o discurso é afetado pelo interdiscurso de um modelo asilar e de doença/cura, os quais valorizam a abstemia e a internação, respectivamente. Os dados corroboram estudo(3232 Borges SAC, Santos MLR, Porto PN. Discurso Jurídico-Moral Humanizador sobre drogas e violência sanitária na saúde da família. Saúde Debate. 2018;42(117):430-41. doi: 10.1590/0103-1104201811707
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) que evidenciou o discurso que defende o modelo de internações em instituições de saúde “humanizadas”, sob a prerrogativa de dar resposta à ineficácia dos outros dispositivos de saúde pública. Achados semelhantes foram encontrados em estudo com profissionais da APS, os quais sustentam discurso normatizador de promoção de abstemia, sob o domínio do modelo biomédico de saúde, desvalorizando a complexidade e a singularidade do fenômeno do consumo de SPAs(3333 Malvezzi CD, Nascimento JL. Cuidado aos usuários de álcool na atenção primária: moralismo, criminalização e teorias da abstinência. Trab Educ Saúde. 2018;16(3):1095-112. doi: 10.1590/1981-7746-sol00153
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).

Os recortes 6 e 7 enunciam efeitos de sentidos de discurso religioso, considerando que os sujeitos do discurso são interpelados pela ideologia do sistema de crenças e atitudes religiosas-cristãs. No recorte 6, percebe-se um efeito metafórico de que a fé cura, quando o enunciador atribui o significado de RD à personificação da figura de um Ser Superior-Jesus Cristo, o qual pode ajudá-lo e ser a resposta de seus problemas.

No mesmo recorte, as sd14 (“pede pra Deus te ajudar você sair dessa vida”) e sd15 (“que você entrou nesse caminho”) enunciam um silenciamento dos significantes “vida” e “caminho”, os quais ocultam e dão opacidade de um não dito de sentido de “perdição”, “caminho desviante”. Na sd16, esse “caminho sem volta” remete à ideia de que não é possível que a pessoa que usa SPAs possa, algum dia, ter uma vida diferente ou fazer escolhas diferentes. Em um único recorte, percebem-se indícios de dois discursos diferentes, o do discurso religioso e o do moral. É a heterogeneidade se materializando no discurso, considerando que o discurso sempre se constitui, interiormente, com outros discursos, ou seja, é atravessado por outros discursos, bem como por diferentes posições-sujeitos assumidas(99 Orlandi EP. Análise de discurso: princípio e procedimentos. 12th ed. Campinas: Pontes Editores; 2015. 100p.). O respectivo SD, em sua posição-sujeito de profissional de saúde, tensiona com outra de ser católica, ao apresentar um discurso religioso que coloca Deus como responsável pela “transformação”, e não o usuário. O discurso moral se articula a esse recorte, ao reconhecer que o usuário não tem forças por si só para abandonar o uso de SPAs, justificando-se pela fraqueza de seu caráter e falta de controle de seus desejos e ações, devendo se ancorar a um Ser Superior.

O recorte 7 do enunciador SD6 possibilita efeito de sentidos comparativos entre a pessoa estar aberta e motivada em aceitar/aderir ao tratamento e estar na igreja e aceitar Deus, reforçando o discurso religioso. Conciliando com tais fragmentos discursivos, a sd18 (“se você tiver aberto para aceitar, seu coração vai transbordar e você vai melhorar”) expressa marcas linguísticas e vestígios que derivam efeitos metafóricos de que o usuário, ao se reconhecer enquanto doente, aceitará o tratamento e, portanto, recuperar-se-á. O significante “coração” remete à interpretação simbólica de um saber discursivo dominante de “amor e caridade”, portanto, a sua abertura permite entrada de coisas boas (aceitação de Deus e tratamento); assim, o homem e o usuário se enchem de amor, transbordam esse sentimento amoroso e vão melhorar (plenitude do bem-estar e paz).

A irrupção do saber discursivo religioso de SD6 pode estar relacionada à condição de produção estrita em que esse discurso foi formado, bem como a posição-sujeito assumida pela entrevistada enquanto uma mulher religiosa e cristã. Além das condições de produção estritas que influenciam os discursos, as memórias discursivas das religiões predominantes no Brasil e de um Ser Superior permeiam as vivências e produções de sentido. Como tendência atual no debate político e assistencial no Brasil, o crescimento das Comunidades Terapêuticas, que reforçam o discurso religioso(3434 Alves YDD, Pereira PPG. A controvérsia em torno da internação involuntária de usuários de crack. Soc. Estado. 2019;34(2):513-38. doi: 10.1590/s0102-6992-201934020007
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), perpassa os saberes relacionados ao cuidado com o usuário.

No recorte 8, ocorre o efeito metonímico em que o SD12 expressa a sd5 (“pessoas assim, que a cabeça já não...”); e, a seguir, refaz e complementa com a sd6 (“eles não querem se prender a nada”). Na AD, o efeito metonímico consiste na substituição de um sentido para outro, de palavras de um mesmo universo semântico, sendo que essa substituição produz um deslocamento de sentidos em que o enunciador tem a ilusão de escolher as palavras para tornar claro seu dizer, quando, na verdade, esse processo discursivo é entrelaçado por questões históricas e ideológicas que constroem o sentido(3535 Cassana MF. Os deslizamentos de sentido: efeitos metafóricos e metonímicos no discurso do corpo. Letras Escreve. 2017;7(1):33-58. doi: 10.18468/letras.2017v7n1.p33-58
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). Assim, o sentido de “cabeça” é deslocado para o sentido de mente ou pensamentos. A não continuidade do significante do enunciado dá indícios de silenciamento, ou seja, o não dito, esconde outros sentidos possíveis - da “cabeça que não funciona” para os “pensamentos que não funcionam”, desencadeando uma “mente vazia”, que faz com que o usuário “não se prenda a nada” (sd6). Esse silêncio consiste na ocultação de outros sentidos possíveis que causem desconforto, ou seja, concebido como inconveniente(3636 Orlandi EP. As formas do silêncio: no movimento dos sentidos. 6th ed. Campinas: Unicamp, 2007. 181p.).

O SD8, no recorte 9-sd32, salienta que o processo para “sair” do consumo de SPAs é algo “difícil” e que envolve “passos”. A sd33 (“mas que você dá um passo de cada vez”), no recorte 9, parafraseia o lema do grupo de mútua ajuda denominado Alcoólicos Anônimos (AA), “Um dia de cada vez”. Tal paráfrase é marcada social e historicamente pelo interdiscurso advindo de organizações como AA, uma organização autodeclarada como “irmandade”, destinada a pessoas que procuram cessar completamente o uso de álcool. Estudo aponta que membros do AA compreendem o alcoolismo não só como doença no âmbito orgânico, mas também moral e espiritual(3737 Campos EA. As representações sobre o alcoolismo em uma associação de ex-bebedores: os Alcoólicos Anônimos. Cad Saúde Pública. 2004;20(5):1379-87. doi: 10.1590/S0102-311X2004000500033
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). Percebe-se que o paradigma moral atravessa os discursos e saberes de alguns sujeitos discursivos. Estudo(1111 Carvalho B, Dimenstein M. Discourse analysis about harm reduction in a CAPSad III and a therapeutic community. Temas Psicol. 2017;25(2): 647-60. doi: 10.9788/TP2017.2-13
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) sobre as concepções de RD com usuários, profissionais do CAPS AD e profissionais de Comunidades Terapêuticas concluiu que a lógica moral e condenatória do uso de SPAs ainda impera nesses cenários e faz parte das concepções dos profissionais, o que impossibilita que ações de RD sejam disseminadas e implementadas.

O recorte 10 aponta indícios de sentidos de RD associados à atenção à saúde do usuário em sua totalidade, como anuncia SD6 em suas sequências discursivas pelos significantes “total” e “conjunto” (“tratar aquela mulher ou aquele homem como uma saúde total” (sd6) e “a gente tem que ver como um conjunto” (sd5)). Apesar de os discursos ressaltarem o cuidado integral ao usuário, ainda se percebe um resquício de sentidos direcionados às demandas e necessidades dos usuários que envolvem danos físicos, os quais requerem ações de prevenção. No mesmo recorte, identifica-se outros vestígios que enunciam saberes discursivos de um cuidado integral, como, por exemplo, o adjetivo “só” (“reduzir danos, não é, às vezes, você tirar só a droga” (sd22); “a gente acha que tem que tratar o paciente que é drogado só relacionado com a doença, à drogação, e a gente esquece, acaba esquecendo das outras doenças” (sd3)). Tal fato possibilita compreender que a RD não tem foco somente na redução de consumo de SPAs e seus agravos, mas outros cuidados, tais como a saúde da mulher (“de prevenir uma gravidez, uma prevenção de fazer um Papanicolau pra prevenir um câncer de colo uterino”). Percebe-se, no recorte citado acima, um efeito metonímico de deslizamento de sentidos do adjetivo “só” para o “conjunto”; do único e singular para o todo e total; do foco nas SPAs para a saúde integral. Apesar de o SD6 ampliar o seu olhar sobre RD, percebe-se que a concepção de integralidade ainda se limita ao âmbito físico. O sentido de integralidade, de cuidado integral se restringe à saúde fisiológica.

O recorte 11 enuncia os significantes verbais “devagar” e “conquistando”, que produzem sentidos de aproximação e abordagem com o usuário. Tal abordagem se manifesta em efeito metonímico de que é uma relação que requer cuidado do profissional de enfermagem, pois pode ser “frágil” ou “efêmera”. É uma relação que envolve cuidado para “não afastar” o usuário, “não perder”. Assim, precisa ser consolidado aos poucos, para que algo não escape das mãos, não se “perca”.

O SD5 menciona que se consegue o estabelecimento de vínculo pelo respeito ao usuário, ofertando-lhe “sugestões ponderadas” e orientações, de acordo com as opiniões e perspectivas do usuário, do seu “ponto de vista”. Tal sequência discursiva demonstra sentidos e saberes que se aproximam da proposta da estratégia de RD. Além disso, o SD5 prevê ações de RD que não se restringem ao âmbito físico e nem ao social. O discurso de SD5 se aproxima do conceito de integralidade e, portanto, está coerente com os preceitos apontados pela literatura(3838 Ayres JRCM, Carvalho YM, Nasser MA, Saltão RM, Mendes VM. Ways of comprehensiveness: adolescents and young adults in Primary Health Care. Interface (Botucatu). 2012;16(40):67-81. doi: 10.1590/S1414-32832012005000021
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), em que a integralidade consiste na qualidade e sensibilidade em acolher, vincular e responder às demandas de saúde que não se limitem ao tratamento, prevenção e proteção de doenças físicas, mas que, ao mesmo tempo, não as negligenciem.

Percebe-se que as concepções de RD, congruentes com o aparato teórico e prático da clínica ampliada, ainda são discretas e pouco retratadas nos discursos dos SDs. Entende-se, ainda, que os saberes discursivos relacionados à RD transitam entre diferentes FDs e efeitos de sentido. Uma mesma FD é perpassada por outras FDs, o que demonstra um movimento de contradições e ambiguidades em um mesmo dizer.

Os recortes discursivos 12 a 14 enunciam sentidos da RD no âmbito de riscos e danos fisiológicos. Observa-se, neste estudo, que a ênfase nos processos biológicos é reflexo das condições de formação ampliadas em que esses discursos foram formados, considerando que as formações em ciências da saúde estão ainda muito voltadas para o modelo biológico-tecnicista e biomédico(3939 Moreira COF, Dias AMS. Diretrizes curriculares na saúde e as mudanças nos modelos de saúde e de educação. ABCS Health Sci. 2015;40(3):300-5. doi: 10.7322/abcshs.v40i3.811
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). No cotidiano do trabalho, profissionais formados sob o modelo biomédico tendem a ter mais dificuldades de incorporar novas abordagens centralizadas na saúde, e mantêm o foco de suas ações na doença(3939 Moreira COF, Dias AMS. Diretrizes curriculares na saúde e as mudanças nos modelos de saúde e de educação. ABCS Health Sci. 2015;40(3):300-5. doi: 10.7322/abcshs.v40i3.811
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).

Percebe-se um efeito de silenciamento fundante dos sentidos no recorte discursivo 12, na sd14 (“Acredito que o neurônio que murchou ou que morreu jamais ele vai”), quando há o apagamento do possível significante “recuperar” ou “viver”; efeitos contraditórios dos significantes “murchou” e “morreu”. O silêncio na sequência discursiva não é interpretado como um vazio, mas que possibilita gerar sentidos outros; é uma forma diferente de significar(3636 Orlandi EP. As formas do silêncio: no movimento dos sentidos. 6th ed. Campinas: Unicamp, 2007. 181p.).

O recorte 13 do SD7 (“ele pode contrair uma DST”), apesar de enunciar danos biológicos em detrimento dos danos psicológicos, sociais, entre outros, salienta as ISTs como possíveis danos derivados do consumo de SPAs. Para o SD7, a estratégia de distribuir o Kit com materiais estéreis, para evitar a incidência desse agravo, se materializa neste discurso (“gente consiga oferecer [...] uma seringa estéril, que seja só dele, uma agulha estéril que seja só dele e aí isso eu chamo de redução” (sd24)) e aponta memórias discursivas de um interdiscurso interpelado pela ideologia das primeiras intervenções de RD no contexto de prevenção de ISTs, focadas, principalmente, no risco de contaminação pelo HIV(44 Machado LV, Boarini, ML. Políticas sobre drogas no Brasil: a estratégia de redução de danos. Psicol Ciênc Prof. 2013;33(3):580-95. doi: 10.1590/S1414-98932013000300006
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).

O recorte 14, na sd10, o sujeito do discurso entende que uma ação de RD seria a oferta de medicamentos controlados para quem deseja cessar o uso. Discurso marcado pelos vestígios históricos e sociais sobre a cultura da medicalização e pelo modelo de doença/cura(4040 Caruso de Azevedo LJ. Considerações sobre a medicalização: uma perspectiva cultural contemporânea. Rev CES Psicol. 2018;11(2):1-12. doi: 10.21615/cesp.11.2.1
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). O significante “controlados” possui outros sentidos possíveis, dependendo da FD em que se inscreve, efeito chamado, na AD, de polissemia. Na polissemia, existe um processo de quebra nos processos de significação, dependendo de como são afetados pela língua e pela história, ou seja, os sentidos sempre podem sofrer processo de transformação e serem sentidos outros(99 Orlandi EP. Análise de discurso: princípio e procedimentos. 12th ed. Campinas: Pontes Editores; 2015. 100p.). O significante pode assumir sentidos diferentes, o de regulação e fiscalização, pois os medicamentos possuem protocolos específicos, ou o de contenção e repressão. Ambos significados são pertencentes ao mesmo universo de sentidos, o do usuário de SPAs.

Percebe-se que os saberes discursivos se apresentam arraigados, principalmente, no modelo biomédico de saúde, e os discursos carregam essas marcas em sua materialidade. O cuidado centrado no biológico/fisiológico, que não considera os aspectos econômicos, sociais, culturais e psicológicos de indivíduos e coletividades, limita novos olhares e perspectivas para além da doença, do corpo físico, coibindo o surgimento de práticas que possibilitam novas formas de cuidado, de relações, de autonomia e de autogestão dos sujeitos(3333 Malvezzi CD, Nascimento JL. Cuidado aos usuários de álcool na atenção primária: moralismo, criminalização e teorias da abstinência. Trab Educ Saúde. 2018;16(3):1095-112. doi: 10.1590/1981-7746-sol00153
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). Os profissionais de enfermagem desempenham fundamental papel na APS e na relação com o usuário/população, portanto, é importante que esses reflitam sobre suas concepções de conceito de saúde(4141 Fortuna CM, Matumoto S, Mishima SM, Rodríguez AMMM. Collective health nursing: de-sires and practices. Rev Bras Enferm. 2019;72(suppl 1):336-40. doi: 10.1590/0034-7167-2017-0632
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) e de RD.

Limitações do estudo

O limite do estudo se relaciona à amostragem de conveniência. Entretanto, houve significâncias na validade interna dos resultados, considerando inclusive a validação dos resultados pelos pares. Todavia, os resultados refletem pensamentos e simbologias de um grupo que está na base da assistência e que precisa projetar perspectivas de cuidado frente à pessoa no contexto do consumo de SPAs.

Contribuições para a área da enfermagem, saúde ou política pública

O estudo pode contribuir para sustentar propostas de educação permanente sobre os conceitos de RD na formação e qualificação do profissional de enfermagem. Ademais, contribui para ampliar a visão e o compromisso dos gestores de saúde pública quanto ao papel dos profissionais de enfermagem que atuam na APS como possibilidade de acolher e lidar com as necessidades de saúde de pessoas com uso problemático de SPAs.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os resultados apontam que a produção de sentidos sobre as concepções de RD nos discursos dos profissionais de enfermagem da APS é perpassada por memórias discursivas dominantes advindas de outros discursos que contradizem os preceitos desta estratégia. Salienta-se que os efeitos de sentido sobre a RD são interpelados, ideologicamente, por um interdiscurso que preconiza a obtenção da abstemia das SPAs por intermédio da internação do usuário, bem como a prevenção de recaída, predominando, respectivamente, o modelo de saúde biomédico e o cognitivo-comportamental. Os achados demonstram as tensões existente entre as memórias advindas do modelo moral e religioso, que resultam em práticas condenatórias e em uma abordagem com o usuário que limita sua liberdade de escolha e autogestão.

O estudo demonstrou que a concepção de RD, na perspectiva da chamada “clínica ampliada”, que enfatiza o estabelecimento de vínculo e a integralidade do sujeito, ainda é limitada. Apesar de alguns profissionais demonstrarem concepções coerentes com a proposta da estratégia de RD, estas ainda permaneceram focadas nas consequências do uso de SPAs, que afetam a dimensão fisiológica.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Dulce Barbosa
EDITOR ASSOCIADO: Hugo Fernandes

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Out 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    29 Mar 2020
  • Aceito
    07 Ago 2020
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