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A moeda em um programa de pesquisa comum para o pós-keynesianismo e o neo-ricardianismo* * Traduzido por Gilberto Tadeu Lima.

Currency in a common research program for post-keynesianism and neo-ricardianism

RESUMO

É feita uma tentativa de diferenciar a teoria neoclássica de uma síntese do pós-keynesianismo e do neo-ricardianismo, chamada aqui de teoria pós-clássica. O programa de pesquisa neoclássica baseia-se em quatro elementos essenciais: instrumentalismo, individualismo, troca e racionalidade ilimitada. O programa pós-clássico (que também inclui institucionalistas e radicais) baseia-se no essencial oposto: realismo, organicismo, produção e racionalidade processual. A teoria monetária é dada como um exemplo de caso dessas dicotomias. Mostra-se que pós-keynesianos e neo-ricardianos têm visões convergentes sobre a endogeneidade da moeda e o caráter convencional das taxas de juros.

PALAVRAS-CHAVE:
Metodologia da economia; pós-keynesianismo; neoricardianismo

ABSTRACT

An attempt is made to differentiate neoclassical theory from a synthesis of post-keynesianism and neo-ricardianism, called here post-classical theory. The neoclassical research program relies on four essentials: instrumentalism, individualism, exchange, and unbounded rationality. The post-classical program (which also includes institutionalists and radicals) relies on the opposite essentials: realism, organicism, production, and procedural rationality. Monetary theory is given as a case example of these dichotomies. It is shown that post-Keynesians and neo-Ricardians have convergent views on the endogeneity of money and the conventional character of interest rates.

KEYWORDS:
Economic methodology; post-Keynesianism; neoricardianism

1. INTRODUÇÃO

O tema deste artigo deriva do seguinte conjunto de questões: as teorias pós-keynesiana e neo-ricardiana são distintas da teoria neoclássica?; e, caso possam ser provisoriamente consideradas distintas das teorias neoclássicas, é possível compatibilizá-las entre si? Sem dúvida, as duas questões são de certa maneira interligadas. Caso uma delas, ou ambas, não possa ser verdadeiramente distinguida da economia neoclássica, então não há muito sentido em indagar sobre sua dessemelhança ou compatibilidade. No caso da economia marxista tradicional, tais dúvidas são ilegítimas, uma vez que os problemas a serem resolvidos, as soluções empregadas, o método, os conceitos e as medidas afiguram-se bastante estranhas à economia-padrão. No presente caso, contudo, vários concordariam em que existe uma sobreposição com a economia neoclássica, assim como provavelmente existe com a economia institucional ou com a economia radical. Não obstante a chamada progressividade dos programas pós-keynesiano e neo-ricardiano, são essas escolas de pensamento verdadeiramente diferentes da economia da mainstream, ou apenas constituem um grupo de economistas citando-se mutuamente, num tipo de sociedade acadêmica secreta?

Nas páginas seguintes, pretendo mostrar que é legítimo postular que uma coerente alternativa à economia neoclássica pode ser construída com base nas tradições pós-keynesiana e neo-ricardiana. Acredito que nossa tarefa é “reconciliar” Keynes e Ricardo, ou, como colocou Robinson (1978ROBINSON, J. (1978). “Keynes and Ricardo”. Journal of Post Keynesian Economics , 1, outono, pp. 12-18., p.15), “os pós-keynesianos devem utilizar Sraffa para construir uma análise de longo período que evite que o equilíbrio neoclássico volte a se infiltrar na Teoria Geral”. Chamarei essa alternativa de programa de pesquisa pós-clássico, um termo pioneiramente cunhado por Henry (1982HENRY, J. (1982). “Les méthodes post- keynésiennes et l’ approache post-classiques”. L’Actualité économique, vol.58, janeiro-junho: pp. 17-61., p. 20) e adotado por Eichner (1983, p. 6) para caracterizar a síntese. Os economistas pós-clássicos estão, como enfatizam os neo-ricardianos, na tradição dos economistas clássicos, mas incorporam também as principais opiniões de Keynes, um economista que rejeitou as opiniões da escola clássica (neoclássica), como ele a chamava. Outros, na verdade aqueles que insistiram quanto à necessidade de uma síntese (Nell, 1972NELL, E. J. (1972). “Economics: the revival of political economy”. In BLACKBURN, R. (ed.) Ideology in Social Science. Fontana/Collins, pp. 76-95.; Kregel, 1973KREGEL, J.A. (1973). “The reconstruction of political economy: an introduction to post-Keynesian Economics”, Londres, Macmillan .), mencionaram um ressurgimento da economia política. Assim, o termo pós-clássico parece apropriado para descrever a síntese entre os programas pós-keynesiano e neo-ricardiano. Na verdade, em vista do fato de que tanto Joan Robinson como Nicholas Kaldor parecem ter prestado muito respeito a Michal Kalecki, um economista bastante influenciado por Marx, o termo pós-clássico parece ainda mais apropriado.1 1 Gerrard (1989: p. 181) também fala sobre uma síntese pós-clássica. Ele pretende integrar as economias neoclássica e pós-keynesíana, excluindo contudo os neo-ricardianos: “A influência neo-ricardiana sobre a presente análise foi inteiramente negativa ( ... ) Os neo-ricardianos partiram para um cantinho completamente equivocado ( ... )”.

Na primeira parte do artigo, apresentarei a maneira pela qual os programas pós-clássico e neoclássico podem se distinguir em termos gerais. Também se dedicará alguma atenção às compatibilidades entre as escolas pós-keynesiana e neo-ricardiana. Na segunda parte, tratarei da questão da moeda como um exemplo das diferenciações feitas anteriormente, procurando mostrar, em oposição a certas crenças, que existe uma substancial base comum em torno do tema entre os pós-keynesianos e os neo-ricardianos.2 2 Talvez deva adicionar que, grosso modo, sinto que os radicais e institucionalistas fazem parte do programa de pesquisa pós-clássico, uma vez que seus escritos estão claramente interconectados com os dos pós-clássicos (URPE, 1987; Hodgson, 1989). O mesmo poderia ser dito da escola evolucionária (schumpeterianos à la Dosi) e das escolas da regulação francesas.

2. ECONOMIA NEOCLÁSSICA VERSUS ECONOMIA PÓS-CLÁSSICA

2.1 Núcleos e pressupostos

Alguns metodologistas argumentam que os conceitos lakatosianos de núcleo rígido e cinturões protetores não podem ser aplicados diretamente ao campo da economia, em particular ao programa de pesquisa neoclássico. A razão consiste em que uma escola de pensamento pode abarcar um conjunto muito diversificado de tópicos, métodos e campos. Na medida em que deve se preocupar apenas com modelos formais, a noção de núcleo rígido não pode ser suficientemente geral. Três caminhos alternativos foram sugeridos. As duas primeiras propostas (Remenyi, 1979REMENYI, J. V. (1979). “Core demi-core interaction: toward a general theory of disciplinary and subdisciplinary growth”. History of Political Economy , 11(1), pp. 30-63.; e Fulton, 1984FULTON, G. (1984). “Research programs in Economics. History of Política/Economy, 16(2), 187-205.) restringem a aplicação dos núcleos rígidos aos campos ou teorias particulares de um programa ou, alternativamente, criam semi-núcleos aplicáveis somente a esses subconjuntos. Uma terceira posição, defendida por Leijonhufvud (1976LEIJONHUFVUD, A. (1976). “Schools, ‘revolutions’ and research programmes in economic theory”, ln LATSIS, S. J. (ed.) Method and appraisal in Economics. Cambridge: Cambridge University Press.), propõe a adição de pressupostos, ou seja, um conjunto de crenças usualmente sustentadas que, além de não poder ser colocadas de maneira formal, são anteriores aos núcleos rígidos. Fulton (1984FULTON, G. (1984). “Research programs in Economics. History of Política/Economy, 16(2), 187-205., p. 195) também argumenta casualmente dessa maneira. Esta é a posição aqui adotada, uma vez que um trabalho anterior nos levou a concluir que os elementos crucialmente distintivos entre as economias neoclássica e pós-clássica podem ser identificados com maior facilidade em termos de enunciados gerais que em termos de núcleos rígidos formais. Se a economia neoclássica pode ser, em certa medida, rigidificada, parece uma tarefa quase impossível buscar núcleos, cinturões e heurística. O mesmo se pode dizer da economia pós-clássica como um todo ou de seus dois componentes principais.

O que parece admirável para os outsiders do pós-keynesianismo e do neo-ricardianismo é que essas escolas de pensamento, incluindo seus principais proponentes, se vinculam aparentemente por um único aspecto, a saber, sua rejeição do paradigma neoclássico dominante (Klamer, 1984KLAMER, A. (1984). Conversations with economists. Totowa, Rowman and Allaheld., p. 4; Caldwell, 1989CALDWELL, B.J. (1989). “Post-Keynesian methodology: an assessment”. Review of Political Economy , 1(1), março: pp. 43-64., p. 24). Existem certamente boas razões para essa percepção. Uma delas é que alguns pós-keynesianos ainda definem seu programa num sentido negativo, vale dizer, em reação à economia neoclássica (Jarsulic, 1988JARSULIC, M. (1988). Effective demand and income distribution: issues in alternative economic theory. Londres, Polity Press., p. 24). Outra razão é que algumas resenhas realizadas por economistas pós-clássicos não tentaram realmente agrupar os elementos comuns do pensamento dos vários ramos e autores. Hamouda e Harcourt (1988HAMOUDA, O. F. & HARCOURT, G.C. (1988). “Post-Keynesianisrn: from criticism to coherence?” Bulletin of Economic Research , 40 (1), pp. 1-33.), por exemplo, apesar de apresentar uma resenha exaustiva, são mais descritivos que analíticos, acabando inesperadamente por concluir que a busca de uma visão integrada é um esforço infrutífero. Em sua opinião, a coerência dentro de cada um dos ramos da economia pós-clássica é suficiente. Sua concepção dessa economia, portanto, é similar à de Dow (1985DOW, S. C. (1985). Macroeconomic thought: a methodological approach. Oxford, Basil Blackwell ., p. 73), uma economista para quem os pós-keynesianos adotaram uma abordagem metodológica babilônica. No entanto, isso somente conduz os críticos da teoria pós-clássica a concluir que os pós-keynesianos e seus aliados ainda não forneceram uma alternativa adequada para a teoria neoclássica (Backhouse, 1988BACKHOUSE, R.E. (1988). “The value of post Keynesian economics: a neoclassical response to Harcourt and Hamouda. Bulletin of Economic Research, vol. 40, janeiro, 35-41.).

O que é desanimador em todas essas resenhas é que os trabalhos daqueles que exatamente têm buscado uma síntese das teorias neo-ricardiana e pós-keynesiana são de certo modo colocados de lado. Presta-se, por exemplo, reduzida atenção a Eichner (1987EICHNER, A.S. (1987). The macrodynamics of advanced market economics. Armonk, M. E. Sharpe.), um teórico que procurou reconciliar os preços de produção neo-ricardianos com os preços administrados das firmas, bem como a Schefold (1984SCHEFOLD, B. (1984). Sraffa and applied Economics: are there classical supply curves? Working Papers, Centro Di Studi Di Economici Avanzati.; 1985SCHEFOLD, B. (1985). “On changes in the composition of output”. Political Economy , 1(2), pp. 105-142.), teórico com objetivos semelhantes. Sempre me admirou também o fato de alguns autores, conhecidos por seu trabalho sobre o lado real da economia e o longo prazo, tais como Petri, Hagemann e Arena, por exemplo, terem demonstrado grande interesse por questões puramente monetárias. Assim, acredito ser possível. O problema é identificar os pressupostos que constituiriam tal síntese. Após algumas tentativas de definição de seu núcleo rígido, acabei por associar quatro pressupostos à economia neoclássica. Enquanto dois deles são de natureza metodológica, os dois restantes são de natureza técnica. Tais pressupostos são o instrumentalismo e o individualismo, por um lado, e a troca e a racionalidade essencial, por outro. Na verdade, é possível que alguém fique bastante insatisfeito com minha escolha e proponha outro elenco de pressupostos. Note-se, contudo, que algumas descrições recentes dos elementos fundamentais do programa neoclássico assemelham-se à nossa. Heijdra e Lowenberg (1988HEIJDRA, B.J. & LOWENBERG, A.D. (1988). The neoclassical economic research program: some lakatosian and other considerations”, Australian Economic Papers, dezembro, pp. 272-284., p. 275), por exemplo, em seu apelo por uma definição unificada do programa neoclássico, também sublinham o individualismo metodológico e a racionalidade individual. Adicionalmente, pode-se considerar que a economia neoclássica se desenvolve num ambiente caracterizado por situações de risco, possibilidades de substituição e escassez, características, como veremos a seguir, vinculadas a seu tipo de racionalidade e sua ênfase na troca.

A economia pós-clássica, por outro lado, está estabelecida, como mostra a Tabela 1, num ambiente de incerteza, complementaridade e abundância. Realismo, organicismo, racionalidade limitada e produção são os quatro pressupostos correspondentes da análise pós-clássica.3 3 Esses elementos fundamentais são estudados em maior detalhe em outro artigo (Lavoie, 1989). Tais classificações são bastante coerentes com as sugeridas por Baranzini e Scazzieri (1985, pp. 30-47). Eles sugerem duas linhas de pesquisa de longa duração, a saber, os programas de pesquisa da troca e da produção. Seus frameworks são, respectivamente: escassez, produção linear, uma visão individualista, possibilidade e simultaneidade, por um lado; e produtibilidade, produção circular, uma visão em termos de classes sociais, viabilidade e causalidade, por outro. Uma vez que simultaneidade e causalidade podem ser associadas, respectivamente, a instrumentalismo e realismo, os fundamentos de Baranzini e Scazzieri são idênticos aos definidos aqui. Assim, os elementos fundamentais aqui propostos possuem algum fundamento: não são arbitrários, possuem um significado em si mesmos.

Tabela 1:
Pressupostos e ambiente dos programas de pesquisa neoclássico e pós-clássico

2.2 Instrumentalismo versus realismo

O instrumentalismo é a epistemologia dominante na economia neoclássica. Embora tenham ocorrido debates infindáveis em torno do ensaio metodológico de Milton Friedman, creio que hoje existem dois consensos em relação a ele. Em primeiro lugar, Friedman estava basicamente adotando uma postura instrumentalista; em segundo lugar, sua posição é hoje endossada por seus companheiros economistas neoclássicos. Caso o primeiro ponto esteja correto, não é difícil entender o segundo. Os trabalhos empíricos realizados nas áreas mais “vulgares” da teoria econômica neoclássica são as predições do mais abstrato programa neo-walrasiano. Contudo, sabemos que, porquanto seus proponentes não tentaram negá-lo, a teoria neo-walrasiana não é descritiva. Não se despende nenhum esforço na adoção de hipóteses realistas. Os axiomas não são escolhidos em função de sua probabilidade, mas de fato por sua habilidade em permitir a existência e/ou a unicidade de um equilíbrio. Os neo-walrasianos descrevem o mundo como ele deveria ser, e não como efetivamente é. Uma vez que os economistas neoclássicos mais “vulgares” se baseiam na teoria do equilíbrio geral por uma questão de segurança científica, eles são forçados a partir de hipóteses irrealistas e não-descritivas.

Em sua recente contribuição sobre metodologia pós-keynesiana, Caldwell (1989CALDWELL, B.J. (1989). “Post-Keynesian methodology: an assessment”. Review of Political Economy , 1(1), março: pp. 43-64., p. 5) parece ter ficado admirado com o fato de que a principal crítica dos pós-keynesianos à teoria neoclássica diz respeito a seu irrealismo, enquanto mais realismo é requerido. Ele então recomenda o desenvolvimento desta última posição metodológica. Esta é, em minha opinião, uma avaliação descritiva e prescritiva correta.4 4 Ver também Eichner e Kregel (1975, p.1309), Rogers (1989, pp. 189-92) e Lawson (1989).

Para os economistas pós-clássicos, uma teoria não é correta se não incorporar hipóteses realistas. A necessária abstração para que qualquer teorização seja bem-sucedida não a isenta da necessidade de ser um tanto descritiva. Enquanto a análise neoclássica é realista somente em suas hipóteses auxiliares, os pós-clássicos exigem realismo em nível das hipóteses iniciais e essenciais. Isso explicaria o extremo interesse dos pós-clássicos por coeficientes de produção fixos, teorias de mark-up ou cost-plus, custos marginais constantes, moeda endógena, desemprego, e assim por diante.

A adoção do realismo como metodologia implícita ou explícita tem várias consequências importantes. Obviamente, as hipóteses-padrão se tomam muito mais sujeitas ao exame empírico do que as predições. Além disso, é preciso contar uma história. É isso, suspeito, o que Joan Robinson entendia por tempo histórico. Foi também definido por Caldwell (1989CALDWELL, B.J. (1989). “Post-Keynesian methodology: an assessment”. Review of Political Economy , 1(1), março: pp. 43-64., p. 58): “Os pós-keynesianos valorizam a explicação mais que as predições em economia”. Essa é precisamente a abordagem sublinhada pelos filósofos da ciência que consideram o realismo uma metodologia séria e legítima (Sayer, 1984SAYER, A.K. (1984). Method in social science: a realistic approach. Londres, Hutchinson., cap. 3). Enfatiza-se a capacidade demonstrada por uma teoria para explicar a geração de eventos ou estruturas e compreender os mecanismos em operação (Lawson, 1989LAWSON, T. (1989). “Abstraction, tendencies and stylized facts: a realist approach to economic analysis “.Cambridge Journal of Economics , 13(1), março, pp. 59-70., p. 63). De maneira um tanto superficial, Blaug (1980BLAUG, M. (1980). The methodology of Economics. Londres, Cambridge University Press., p. 16) atribuiu seu método de “contar histórias” aos institucionalistas, vinculando-o à exigência institucionalista por maior realismo. O mesmo pode ser dito, certamente, dos pós-keynesianos. Agora, para contar uma história apropriada, é preciso apresentar algum mecanismo causal, reconstruir algum processo causal. Uma consequência natural da abordagem realista é que a causalidade se toma a principal preocupação. Vários economistas neoclássicos evitam completamente o conceito ou o associam, como em algumas avaliações modernas, ao de ordenamento temporal. Os pós-keynesianos, por outro lado, foram particularmente cuidadosos na salvaguarda de relações causais e assimétricas.

Embora possa parecer óbvio que a ala pós-keynesiana dos pós-clássicos reivindique repetidamente maior realismo em economia, alguns poderiam duvidar da existência de uma ligação entre o realismo e os neo-ricardianos. Não é bem assim. Milgate (1982MILGATE, M. (1982). Capital and employment. Londres: Academic Press., p. 11), por exemplo, define o método neo-ricardiano como o da “caracterização abstrata da economia concreta ( ... ) para capturar as forças sistemáticas, regulares e persistentes em operação no sistema”. Além disso, alguns neo-ricardianos descrevem o modelo sraffiano puro como um instantâneo, uma fotografia, do sistema econômico existente. Como tais, poucas hipóteses são super-impostas aos fatos tecnológicos observados. Na verdade, as hipotéticas curvas de oferta e demanda neoclássicas padrão são criticadas pelos neo-ricardianos em parte por não serem observáveis (Roncaglia, 1978RONCAGLIA, A. (1978). Sraffa and the theory of prices. Nova York: John Wiley & Sons., p. 104). Existe uma forte crença entre os neo-ricardianos de que os elementos teóricos devam ser observáveis e objetivos, e não metafísicos e subjetivos. Isso pode ser interpretado como uma exigência de realismo.

2.3 Individualismo versus organicismo

O segundo objeto de oposição é a distinção entre as abordagens individualista e holista. Na economia neoclássica, a análise parte do comportamento de agentes individuais (Boland, 1982BOLAND, L.A. (1982). The Foundations of economic method. Londres, G. Allen & Unwin., cap. 12). O indivíduo está no cerne da economia neoclássica. É este o contexto no qual a ideologia exerce sua influência. Os desejos e as preferências dos indivíduos são sagrados; portanto, devem ser colocados em primeiro plano pela teoria, como são, por exemplo, pela economia neo-walrasiana. Instituições, firmas e bancos são uma mera fachada para as preferências dos indivíduos. Estes, embora diferentes em termos de suas preferências características, são todos iguais quanto a seu impacto sobre a economia. Não existem classes de indivíduos. Essa visão filosófica tem um impacto sobre a teoria neoclássica do valor. Uma vez que as preferências dos indivíduos são sagradas, elas devem afetar os preços, como sabemos que o fazem na teoria neoclássica. Tal fascinação pelos direitos dos indivíduos pode ser encontrada em sua forma extrema entre os neo-austríacos. Não surpreende que o subjetivismo apareça tão fortemente ali.

Na economia pós-clássica, as escolhas individuais, embora não necessariamente negadas, são severamente restringidas pelas instituições existentes, classes sociais, pressões sociais ou mesmo eventos macroeconômicos. O comportamento individual é interdependente. O contexto social desempenha um importante papel na maneira pela qual se formam as crenças. Os indivíduos podem influenciar e são influenciados por seu ambiente social. Cada entidade é “o resultado de sua relação com as demais entidades” (Winslow, 1989WINSLOW, E. G. (1989). “Organic interdependence, uncertainty and economic analysis”. Economic Journal, vol. 99, dezembro, pp. 1173-1182., p. 1173). Pode-se falar de uma forma de abordagem holista, ou de organicismo.

Em todos os modelos pós-clássicos existem classes sociais, trabalhadores, capitalistas, empreendedores e rentistas. A consideração dessas classes sociais, quando se trata, por exemplo, da distribuição de renda ou da teoria da demanda efetiva, deriva do pressuposto de que a definição das preferências individuais não é suficiente para entender a sociedade. A consideração dos indivíduos como seres sociais, e não como seres atomísticos, não apenas permite introduzir explicitamente instituições dominantes e mercados imperfeitos, como possibilita ainda o surgimento de paradoxos macroeconômicos (Dow, 1988DOW, S.C. (1988). “Post-Keynesian economics: conceptual underpinnings”. British Review of Economic Issues , 10 (23), outono, pp. 1-18., p. 9). Todos os tipos de paradoxos, conflitando as lógicas micro e macroeconômica, emergem no framework pós-clássico, entre eles o famoso princípio da demanda efetiva. O relaxamento do individualismo nos permite ainda abandonar, dada a existência de restrições macroeconômicas superiores, os procedimentos de otimização individuais.

O abandono da abordagem individualista permite aos pós-clássicos focalizar, em vez da competição atomística neoclássica, as formas institucionais de competição. Mesmo assim, não existe uma multidão infinita de agentes ou produtores. Enquanto a mainstream visualiza as instituições como imperfeições impeditivas da competição perfeita, os pós-clássicos as visualizam como geradoras de certa estabilidade (Hodgson, 1989HODGSON, G. (1989). “Post-Keynesianism and Institutionalism: the missing link”. In PHEBY, J. (ed.). New directions in post-Keynesian Economics. Hants, Edward Elgar ., p. 116). Isso é particularmente importante num mundo de incerteza, onde as respostas racionais se desenvolverão na linha da interdependência orgânica e a estabilidade geralmente será fornecida por convenções sociais, até o momento em que estas se rompam, como veremos na próxima seção.

2.4 Racionalidade essencial versus racionalidade processual

Caldwell (1989CALDWELL, B.J. (1989). “Post-Keynesian methodology: an assessment”. Review of Political Economy , 1(1), março: pp. 43-64., p. 59) registrou recentemente que o princípio da racionalidade é um dispositivo muito poderoso, se não um requisito absoluto, para qualquer teoria nas ciências sociais. É necessário esclarecer, contudo, que o programa neoclássico não está fundado num tipo qualquer de princípio da racionalidade. A economia neoclássica está baseada na racionalidade essencial, um tipo muito peculiar de racionalidade. A principal característica da racionalidade essencial é que ela está estreitamente vinculada com informação e facilidades computacionais. O homem econômico racional da economia neoclássica é capaz de prever todos os eventos futuros, de utilizar uma distribuição de probabilidade para traçar todas as alternativas possíveis, ou ainda de formar expectativas incorporando todo conhecimento disponível. Assume-se que o ambiente econômico em que se insere o agente econômico é tal que essa racionalidade essencial possa sempre ser colocada em uso.

Alguns limites podem ser impostos à informação disponível quando algum realismo ou alguns resultados de política econômica autorizem tal intromissão. Mas o princípio básico da racionalidade essencial permanece preservado. Pode-se argumentar que, quando os autores neoclássicos modelam problemas decisórios mais realistas, eles o fazem ampliando o nível dos requisitos computacionais e de conhecimento dos agentes econômicos, afastando-se assim do comportamento observado. A racionalidade essencial é bastante compatível com o instrumentalismo, uma vez que parece legítimo assumir, mesmo que isso pareça perfeitamente irrealista, não apenas que todos os possíveis eventos sejam conhecidos, mas ainda que se tenha acesso a todas as suas consequências, bastando para isso fazer algumas predições.

Os autores pós-clássicos, por outro lado, adotam uma forma de realismo cognitivo, o da racionalidade processual, como definiu Simon (1976SIMON, H.A. (1976). “From substantive to procedural rationality”. In LATSIS, S. J. (ed.) Method and appraisal in Economics. Cambridge, Cambridge University Press.). A racionalidade processual é uma racionalidade limitada, com limitadas capacidades para adquirir informação, para tratá-la e para computar resultados. Os indivíduos não são oniscientes; eles devem se basear no comportamento do grupo, onde os números trazem confiança. Pode-se dizer que a racionalidade limitada é compatível com o organicismo, uma vez que, como consequência dessas deficiências da vida real na logística da realização de escolhas, procedimentos e normas práticas são comuns a um amplo leque de indivíduos, firmas e bancos. Eles fixam normas e convenções a seguir que produzem impacto sobre a economia real. Blaug (1980bBLAUG, M. (1980b). “Economic methodology in one easy lesson”, British Review of Economic Issues, vol. 2, maio: pp. 1-16., p. 15) conjecturou que os institucionalistas poderiam ser encarados como adeptos da ideia do “comportamento grupal sob a influência de costume e hábito”, o que, com certeza, se aplica igualmente aos pós-clássicos.

O ambiente onde a racionalidade limitada pode ser colocada em prática é bastante diferente do assegurado pela racionalidade essencial. Não é necessário conhecer a distribuição de probabilidade de todos os eventos possíveis. A incerteza genuína, da variedade Knight/Keynes/Shackle, pode ser admitida. Não se assume que indivíduos e firmas otimizam, é suficiente saber que seguem da melhor maneira possível as regras estabelecidas pelos vários subgrupos da sociedade. Não é necessário que as expectativas sejam do tipo neoclássico. As convenções predominam.

Poderiam argumentar que os neo-ricardianos externaram muitas vezes uma certa aversão pelo conceito de incerteza. Adotando o princípio da racionalidade limitada, deve-se notar que ela está implícita na ideia de instantâneo dos modelos sraffianos: não se presume que a técnica ótima foi de fato escolhida; os coeficientes técnicos são o que são: não necessariamente os ótimos (Neil, 1967, p. 22). Quanto à incerteza, Eatwell registra que é “um elemento, juntamente com a ‘convenção’, do ambiente geral onde os processos sistemáticos de produção e acumulação devem operar”. Na verdade, pode-se argumentar que as regularidades e aspectos permanentes da economia, tão caros aos neo-ricardianos, são fornecidos precisamente pela existência da incerteza fundamental e o consequente comportamento baseado em regras (Heiner, 1983HEINER, R.A. (1983). “The origin of predictable behaviour”, American Economic Review, vol. 73, setembro: pp. 560-595.). Por temerem que tais elementos possam ser associados a imperfeições, os neo-ricardianos minimizam o papel das expectativas e da incerteza em sua crítica da economia neoclássica. Contudo, feita a parte negativa do trabalho, os neo-ricardianos e os pós-keynesianos reconhecem que as teorias devem ser construídas num mundo incerto, com racionalidade processual.

2.5 Troca e produção

Chegamos ao último dos elementos fundamentais distintivos, qual seja, troca versus produção, conforme foi colocado por autores de vários matizes (Hicks, 1976HICKS, J.R. (1976). “Revolutions in Economics”. In LATSIS, S. J. (ed) Methods and Appraisal in Economics. Cambridge, Cambridge University Press., p. 13; Henry and Seccareccia, 1986HENRY, J. & SECCARECCIA, M. (1982). “Introduction à la théorie post-keynésienne: contributions et essais de synthêse”, L ‘Actualité économique, vol. 58, janeiro-junho, pp. 5-16., p. 6; Baranzini and Scazzieri, 1986BARANZINI, A. & SCAZZIERI, R. (1986). “Knowledge in Economics: a framework”, In BARANZINI, A. and SCAZZIERI, R. (eds.) Foundations of Economics: structure inquiry and economic theory. Oxford, Basil Blackwell.), que poderíamos chamar de pressuposto da produção versus pressuposto da escassez.

Já na primeira categoria de princípios, o estudante de economia se confronta com a definição básica do programa de pesquisa neoclássico, que é erroneamente atribuída à economia como um todo (ou seja, a todas as escolas de pensamento em economia). Os livros-texto, ao chamá-la de ciência da alocação (ótima) de meios escassos, utilizam a definição de economia de Lionel Robbins (1932ROBBINS, L. (1932). An essay on the nature and significance of Economic Science. Londres, Macmillan ., p. 16). Em minha visão, o conceito de escassez é o quarto elemento fundamental do programa neoclássico. A escassez é o fulcro da economia neoclássica. Várias condições são estabelecidas para preservá-la: pleno emprego, um estoque dado e fixo de moeda etc. A escassez justifica a análise de oferta e demanda, atribuindo aos preços um papel crucial. Ela governa o comportamento da economia. Ela explica por que os economistas neoclássicos atribuem tanta importância à alocação de recursos, ou por que muitos deles definem as técnicas de otimização com restrição como a epítome da economia neoclássica. Quando todos os recursos são escassos, eles estão plenamente empregados, e, portanto, todas as questões se referem ao uso adequado dos recursos existentes, e não à criação de novos recursos.

A escassez é particularmente óbvia em modelos de troca pura. As hipóteses suplementares que podem ser encontradas nos vários modelos de produção neoclássicos sofisticados são introduzidas, contudo, justamente para salvaguardar as principais condições e resultados do modelo de troca pura (Rogers, 1983). Na economia neoclássica, a produção é uma forma de troca indireta entre agentes consumidores individuais, proprietários de recursos que transitam através dos mesmos agentes individuais, só que agora batizados de produtores. Estes nada mais são que arbitradores procurando se beneficiar da escassez existente.

No programa de pesquisa pós-clássico, a noção de escassez é colocada de lado, enquanto a de reprodutibilidade é posta em primeiro plano (Roncaglia, 1978RONCAGLIA, A. (1978). Sraffa and the theory of prices. Nova York: John Wiley & Sons., p. 5). Com sua ênfase na produção, os economistas pós-clássicos embarcam na tradição dos economistas clássicos; que se preocuparam com as causas do progresso e da acumulação. Em sua resenha da crítica cambridgiana, Rymes (1971RYMES, T. K. (1971) On concepts of capital and technical change. Cambridge, Cambridge University Press ., p. 2) esclarece que a preocupação neo-ricardiana com a reprodutibilidade está na linhagem do pensamento econômico de Robinson, Kaldor e mesmo Harrod. Não surpreende que Pasinetti (1981PASINETTI, L.L. (1981). Structural change and economic growth. Cambridge, Cambridge University Press ., p. 24) e Rymes, autores que estudaram cuidadosamente a economia com crescimento do produto per capita como uma resultante do progresso técnico, coloquem tanta ênfase na noção de reprodutibilidade.

Nos modelos pós-keynesianos, onde o produto não é desagregado, a ênfase na produção aparece através da hipótese de que, em geral, nem os bens de capital nem o trabalho estão plenamente empregados. Sendo assim, os recursos não são escassos. O principal problema não é como alocá-los, mas como aumentar a produção ou a taxa de crescimento. O princípio da escassez é colocado de lado, uma vez que em geral é possível aumentar a taxa de utilização da capacidade e existem reservas de trabalho. O princípio da escassez é substituído pelo da demanda efetiva. A verdadeira restrição não é de oferta, mas de demanda efetiva. Em modelos mais recentes, é possível aumentar simultaneamente o consumo per capita e a taxa de crescimento (Rowthom, 1981; Amadeo, 1986AMADEO, E.J. (1986). “The role of capacity utilization in long-period analysis”. Political Economy, 2(2), 1 4-160.; Dutt, 1987DUTT, A.K. (1987). “Alternative closures again: a comment on ‘growth, distribution and inflation’”, Cambridge Journal of Economics , 11 (1), março, pp. 75-82.). Em tais modelos, os paradoxos de poupança aplicados por Keynes ao curto prazo são legitimamente estendidos ao longo período e à análise da acumulação.

Assim, embora os neo-ricardianos enfatizem bastante a fronteira salário/lucro, sinto-me preparado para argumentar que, enquanto a economia neoclássica é o programa de pesquisa de um mundo de escassez, a economia pós-clássica é o programa de pesquisa da abundância. É claro que alguns bens, mesmo os produzidos, podem se tomar escassos. Mas, como registrou Pasinetti (1981PASINETTI, L.L. (1981). Structural change and economic growth. Cambridge, Cambridge University Press ., p. 7), os autores clássicos, em particular Ricardo, acreditavam que os bens produzidos poderiam ser multiplicados ilimitadamente. Assim, julgavam, ao focalizar a análise no aspecto permanente da reprodutibilidade, que as condições de escassez poderiam ser de natureza apenas temporária. Este é o ponto em que neo-ricardianos e pós-keynesianos unem suas forças, enquanto Hayek, ao rejeitar a economia de Keynes, em 1940, está justamente invocando a importância básica da escassez (Parguez, 1988PARGUEZ, A. (1988). “Hayek et Keynes face à l ‘austérité”. In G. Dostaler & D. Ethier, ed. Friedrich Hayek: philosophie, économie et politique. Montreal, ACFAS, 143-160., p. 144). A escassez é a essência da economia neoclássica. Proclamar a existência de uma economia de abundância é negar os fundamentos da ortodoxia.

3. A MOEDA NO PROGRAMA DE PESQUISA PÓS-CLÁSSICO

3.1 Subprograma pôs-keynesiano versus subprograma neo-ricardiano

Alguns leitores podem estar surpresos, ou mesmo aborrecidos, com o fato de não termos incluído uma economia monetária entre os elementos fundamentais do programa pós-clássico. Wulwick (1987WULWICK, N.J. (1987). “The phillips curve: which? whose? to do what?”. Southern Economic Journal vol. 53, abril, pp. 34-857., p. 851), por exemplo, inclui a afirmação “as decisões são monetárias por natureza” entre seus oito elementos do núcleo rígido do programa de pesquisa pós-keynesiano5 5 Wulwick inclui Davidson, Kaldor e Garegnani em sua definição de pós-keynesianismo. Eichner e Kregel (1975EICHNER, A.S. & KREGEL, J.A. (1975). “An essay on post-Keynesian theory: a new paradigm in economics”. Journal of Economic Literature, dezembro, pp. 1293-1321., p. 1300), embora não a incluam em sua principal tabela, afirmam que a teoria pós-keynesiana é “uma teoria de uma economia de produção monetizada”, o que a distancia da variante neo-walrasiana do modelo neoclássico. Minha opinião é que, ao focalizar produção e realismo, a análise de uma economia de produção monetizada naturalmente se coloca em primeiro plano. Assim, realismo e produção são elementos fundamentais que, em minha visão, antecedem o conceito de moeda, uma vez que a visão da moeda será influenciada, em particular, pela importância da atividade produtiva num mundo de fartura, e não da troca num mundo de escassez.

Outros aspectos distintivos da economia pós-clássica vis-à-vis a análise neoclássica, não apresentados aqui, foram sublinhados no passado. Vários autores da tradição pós-keynesiana certamente concordariam com a afirmação segundo a qual o tempo histórico é uma característica fundamental de uma abordagem pós-clássica (Henry, 1982HENRY, J. (1982). “Les méthodes post- keynésiennes et l’ approache post-classiques”. L’Actualité économique, vol.58, janeiro-junho: pp. 17-61., p. 44; Davidson e Weintraub, 1978DAVIDSON, P. & WEINTRAUB, S. (1978). “A statement of purposes”, Journal of Post Keynesian Economics , 1 (1), outono, pp. 3-7., p. 6). Isso demonstra claramente a existência de tensões dentro da síntese pós-clássica, uma vez que, como demonstrou Carvalho (1984CARVALHO, F.C. (1984-85). “Alternative analyses of short and long run in post Keynesian economics”, Journal of Post Keynesian Economics, vol. 7, inverno, pp. 214-234.-85), existem vertentes dentro da abordagem pós-clássica que aparentemente não se enquadraram no requisito de tempo histórico. Outra tensão entre o pós-keynesianismo e o neo-ricardianismo é a oposição levemente relacionada entre a análise de curto período e a análise de longo período. Em minha opinião, contudo, como procurei demonstrar (Lavoie, 1989LAVOIE, M. (1989). “Towards a new research programme for post-Keynesianism and neo-Rícardianism. Paper presented at the second Review of Political Economy Conference, Great Malvern, agosto.), essas oposições são em larga medida artificiais. Como bem sabemos, a própria Joan Robinson inclinou-se para a análise de tempo lógico, enquanto, por outro lado, aqueles que propuseram a abordagem de longo período sustentam análises no tempo histórico6 6 Considere-se a seguinte citação: “Quero casualmente deixar claro que eu pelo menos não acredito que ‘os únicos objetos da análise econômica são as posições de longo prazo do sistema e o comportamento de curto período é irrelevante· ( ... ) Como argumentei várias vezes, não apenas o produto e o emprego de curto período são acessíveis à análise, mas a análise de Keynes do grau de utilização da capacidade é obviamente de grande importância. A questão é se não precisamos de mais nada”. (Garegnani, 1988, pp. 252-3). . De acordo com o problema em mãos, o foco e o método de análise devem mudar. Esta é a maneira pela qual, em minha visão, uma abordagem metodológica babilônica deveria ter um papel. Como registrou Kregel (1980KREGEL, J. A. (1980). “The theoretical consequences of economic methodology: Samuelson’s foundation”, Metroeconomica, 32(1), fevereiro, pp. 5-38.), uma técnica não deve ser associada exclusivamente a uma escola de pensamento.

Embora não se devam subestimar as tensões entre o pós-keynesianismo e o neo-ricardianismo, existem, além dos quatro pressupostos descritos anteriormente, amplos segmentos de concordância teórica entre os dois ramos da economia pós-clássica. Um exemplo óbvio é a teoria dos preços, onde os preços de produção e os preços via mark-up são determinados pela oferta, dependendo de condições de custo e não de índices de escassez influenciados pela demanda. Um exemplo menos óbvio é a teoria da moeda.

No restante da presente seção, pretendo demonstrar que a teoria monetária pós-clássica tem um núcleo comum, como indicado na Tabela 2, distinto daquele da teoria clássica. Um dos principais temores dos pós-keynesianos é que um retorno à chamada abordagem clássica conduza à reintrodução da lei de Say ou da teoria quantitativa da moeda. Os nomes de Thomas Tooke e John Stuart Mill são um lembrete de que os autores clássicos não necessariamente endossavam as visões de Ricardo sobre a moeda. A teoria monetária pós-clássica pode ser considerada uma continuação da tradição de pesquisa iniciada pela banking school.

Tabela 2:
Características da moeda nos programas de pesquisa neoclássico e pós-clássico

Na sequência, focalizarei a presente análise nas três proposições que se destacam na visão pós-clássica da moeda: (i) a moeda é endógena; (ii) a taxa de juros é convencional; (iii) não existem restrições financeiras naturais à expansão. Paralelamente, tratarei do problema da reconciliação da teoria da preferência pela liquidez com sua aparente negação por alguns neo-ricardianos.

3.2 Moeda endógena

Lawson (1989LAWSON, T. (1989). “Abstraction, tendencies and stylized facts: a realist approach to economic analysis “.Cambridge Journal of Economics , 13(1), março, pp. 59-70.) argumentou que o realismo caracterizou a abordagem de Kaldor da teorização econômica, devendo igualmente caracterizar uma abordagem alternativa à teoria neoclássica. As três proposições sublinhadas acima são precisamente uma tentativa de empregar um framework teórico alternativo de economia monetária baseado em hipóteses realistas. Quando se propôs originalmente uma teoria da moeda endógena (Le Bourva, 1962LE BOURVA, J. (1962). “Création de la monnaie et multiplicateur du crédit”, Revue économique, vol. 13, janeiro: 29-56.), foi parcialmente como uma reação contra modelos que assumiam a existência de reservas em países onde tais reservas não existiam. Como decorrência, pouquíssimos países funcionam ou funcionaram de acordo com a fantasia da moeda primariamente emitida. De fato, quando os economistas tentaram descrever precisamente como os Bancos Centrais atuam ou poderiam atuar, invariavelmente abandonaram a fábula do excesso de reservas e contaram uma história de moeda endógena. A teoria monetária pós-clássica é um ensaio em economia realista.

Sabe-se que Kaldor (1970KALDOR, N. (1970). “The new monetarism “. Lloyds Bank Review, julho, pp. 1-17., 1982) e Moore (1988MOORE, B.J. (1988). Horizontalists and verticalists: the macroeconomics of credit money. Cambridge, Cambridge University Press .) advogam há muito tempo uma teoria da moeda endógena. Eles argumentam em favor de uma causação invertida, onde a demanda por crédito deriva dos aumentos esperados na demanda por bens, induzindo, com isso, uma demanda por moeda-crédito e finalmente uma demanda por moeda primariamente emitida. Nesse sentido, a moeda é determinada pela demanda, é dirigida pelo crédito. Esta é uma teoria pós-keynesiana típica (Lavoie, 1985LAVOIE, M. (1985). “The dynamic circuit, overdraff economies, and post-Keynesian Economics”. In M. Jarsulic, (ed.) Money and Macro Policy. Boston, Kluwer-Nijhoff.; Arestis & Eichner, 1988ARESTIS, P. & EICHNER, A.S. (1988). “The post-keynesian and institutionalist theory of money and credit”, Journal of Economic Issues, 22(4), 1003-1022.), embora alguns pós-keynesianos lhe acrescentem um certo grau de ecletismo (Rousseas, 1986ROUSSEAS, S. (1986). Post-Keynesian monetary economics. Armonk, M. E. Sharpe .; Davidson, 1988DAVIDSON, P. (1988). “Endogenous money, the production process and inflation analysis”. Economie Appliquée, 41(1), pp. 151-169.).

Contudo, é admirável notar que todos os diferentes ramos das teorias não-neoclássicas emprestam essa visão pós-keynesiana da moeda endógena. Sejam os radicais europeus (Lipietz, 1982LIPIETZ, A. (1982). “Credit money”. Review of Radical Political Economics, 14(2), pp. 49-57.), ou os radicais americanos (Devine, 1987DEVINE, J. A. (1987). “An introduction to radical theories of economic crises”, in The imperiled economy, book 1. Nova York, Union for Radical Political Economics., p. 26), os marxistas abandonaram a falácia da moeda-mercadoria e adotaram a visão da moeda dirigida pelo crédito. Por outro lado, há muito tempo os institucionalistas descrevem uma economia de produção monetária e, por essa razão, não encontram dificuldades em incorporar a teoria da moeda endógena (Parker Poster, 1987PARKER FOSTER, G. (1987). “Financing investment”. Journal of Economic Issues , vol. 21, março, pp. 101-112.).

Os neo-ricardianos também adotaram uma abordagem de moeda endógena. Enquanto no passado era necessário se basear na crítica de Sraffa a Hayek para cogitar a ideia de que contratos monetários ou valores monetários são de alguma significância para os neo-ricardianos, agora é possível se basear numa evidência mais direta. Não surpreendentemente, os neo-ricardianos franceses, provavelmente influenciados pelas fortes correntes de teoria anti-quantitativa que sempre estiveram presentes em seu país, lideraram a tentativa de integrar a teoria clássica da produção à visão monetária da banking school. De fato, como é possível perceber em Arena e Graziani ( 1985ARENA, R. & GRAZIANI, A. (1985). (ed.). Production, circulation et monnaie. Paris: Presses Universitaires de France.), sua busca de fundamentos não-ortodoxos para uma teoria monetária se deu em paralelo à do Grupo de Nápoles, na Itália, este último estando também bastante associado com a abordagem do circuito francesa.7 7 Casualmente, as visões de Arena (1987) sobre tuna possível síntese pós-clássica (que ele chama clássico-keynesiana) são razoavelmente próximas das defendidas por este autor. O mesmo poderia ser dito de Amadeo e Dutt (1987). Assim, existe certa ironia em notar que a maioria dos neo-ricardianos franceses, pelo menos aqueles interessados em lidar com a moeda, acabaram ressuscitando os mesmos autores clássicos e a mesma análise que os pesquisadores que trabalham na abordagem do circuito, uma escola que, ao lado do pós-keynesianismo americano, constituiu uma reação contra o que se sentia como uma análise exclusivamente real.

No front transalpino, os neo-ricardianos também tentaram integrar uma análise monetária a seus modelos sraffianos. Isso pode ser observado através dos modelos de preços de produção que incorporam custos de juros sobre débitos e receitas de juros sobre ativos (Panico, 1985PANICO, C. (1985). “Market forces and the relation between the rates of interest and profits”. Contributions to Political Economy , vol.4, pp. 37-60.). Contudo, o principal tratado monetário neo-ricardiano é o de Pivetti (1985PIVETTI, M. (1985). “On the monetary explanation of distribution”. Polítical Economy, 1 (2), pp. 73-103.). Citando Kaldor (1970KALDOR, N. (1970). “The new monetarism “. Lloyds Bank Review, julho, pp. 1-17.), ele explicitamente se refere a uma visão endógena da moeda (1985, p. 96). Pivetti se baseia na afirmação de Tooke de que “os preços da mercadoria não dependem da quantidade de moeda ( ...) mas, ao contrário, o montante de meio de circulação é a consequência dos preços”. Para Pivetti, “a oferta de moeda se acomoda às necessidades de troca”, de maneira que a quantidade de moeda é um efeito, e não uma causa, do nível de gastos monetários. Assim, deve-se concluir que existe um amplo consenso entre os pós-clássicos em torno da noção de moeda-crédito endógena.

3.3 Taxas de juros convencionais

Esse consenso é mais evidente no trabalho de Rogers (1989ROGERS, C. (1989). Money, interest, and capital: a study in the foundations of monetary theory. Cambridge, Cambridge University Press .), cujo principal objetivo é demonstrar que as controvérsias de Cambridge tornaram ilegítimas todas as teorias reais da taxa de juros. Numa tentativa heroica, ele procura mesclar a análise monetária marshalliana de Davidson (1972DAVIDSON, P. (1972). Money and the real world. Londres, Macmillan.) com uma reinterpretação à la Kregel do capítulo 17 da Teoria Geral e as visões de moeda endógena de Kaldor e Moore. Rogers (1989, p. 253) sustenta que “a taxa de juros reflete fatores psicológicos, institucionais e históricos que não podem ser especificados a priori”. Em seu modelo indicativo reduzido, a taxa de juros é tratada como variável exógena (p. 247). Isso é precisamente o que faz Kaldor (1982KALDOR, N. (1982). The scourge of monetarism. Oxford, Oxford University Press., p. 24), representando, inclusive, a forma recomendada por Pasinetti (1974PASINETTI, L.L. (1974). Growth and income distribution: essays in economic theory. Cambridge, Cambridge University Press ., p. 44) para interpretar a teoria da preferência pela liquidez de Keynes. O modelo econômico torna-se recursivo, com a taxa de juros sendo exógena, ou seja, influenciada simplesmente pelas decisões das autoridades monetárias e os sentimentos do público em relação à liquidez.

O expoente mais vigoroso dessa teoria exógena da taxa de juros é, sem dúvida, Moore (1988MOORE, B.J. (1988). Horizontalists and verticalists: the macroeconomics of credit money. Cambridge, Cambridge University Press .), um economista que descreveu como o Banco Central poderia fixar a taxa de juros de curto prazo dentro de um leque restrito e como os bancos comerciais seguiriam seu exemplo. Argumenta-se contra Moore e sua teoria da moeda endógena que ela abandonou a teoria da preferência pela liquidez de Keynes, o que representa um revés para uma teoria monetária conveniente que incorpore expectativas e incerteza (Dow & Dow, 1989DOW, A.C. & DOW, S.C. (1989). “Endogenous money creation and idle balances”. in J. Pheby, (ed.) New directions in post-Keynesian Economics. Hants, Edward Elgar: pp. 147-163.). A análise de Rogers é bastante iluminadora a esse respeito. Ele estabelece a distinção, no sentido usual, entre taxas de juros de curto e longo prazos, e entre mudanças transitórias e permanentes na taxa de juros (1989, p. 252). Ora, se adicionarmos a isso uma generalização da preferência pela liquidez por moeda, estaremos em posição de sustentar a exogeneidade da taxa de juros, a endogeneidade da moeda-crédito e uma forma de teoria da preferência pela liquidez à la Keynes.

Le Heron (1986) forneceu tal generalização. Ele argumenta que, na Teoria Geral, Keynes erroneamente restringiu o conceito de preferência pela liquidez às famílias. Ele acredita que todos os agentes na economia mostram alguma forma de preferência pela liquidez. As firmas expressam sua preferência pela liquidez se recusando a investir ou a contrair empréstimos. Os bancos expressam sua preferência pela liquidez fixando taxas de juros de curto prazo (as taxas monetárias) um tanto diferentes daquelas oferecidas pelo Banco Central e resistindo às mudanças nas taxas de juros por ele iniciadas (Kregel, 1984KREGEL, J.A. (1984-85). “Constraints on the expansion of output and employment: real or monetary?”. Journal of Post Keynesian Economics , vol. 7, inverno, pp. 139-152.-5). A preferência pela liquidez das famílias e instituições financeiras não-bancárias, que chamaremos de rentistas, ou seja, aquelas que possuem capital financeiro, se reflete principalmente nas taxas de juros de longo prazo (as taxas de juros financeiras) ou, mais precisamente, no spread entre as taxas de juros de curto e longo prazos (Wells, 1983, p. 533). A preferência pela liquidez posiciona a taxa convencional de juros na vizinhança daquela determinada pelo Banco Central. Isso significa que a preferência pela liquidez, como esta é usualmente entendida, determina a estrutura a termo das taxas de juros (Mott, 1985-86, p. 224). A taxa de redesconto, da qual todas as outras taxas de juros dependem, é fixada pelo Banco Central, de acordo com sua avaliação da situação monetária e econômica, o que poderíamos chamar de “preferência pela liquidez” do Banco Central.

O que a teoria da preferência pela liquidez generalizada nos diz é que qualquer mudança nas taxas de juros orquestrada pelas autoridades monetárias será transitória caso os bancos e os rentistas não se ajustem a ela. A taxa de juros estabelecida pelas autoridades monetárias toma-se permanente quando a preferência pela liquidez do público deixa de desempenhar qualquer papel. Então, imperfeições à parte, a taxa de redesconto do Banco Central, a taxa do mercado monetário e a taxa de juros de longo prazo serão todas iguais.8 8 No tempo concreto, essas imperfeições sempre existirão e, consequentemente, a menos que seja por sorte, essas taxas nunca serão iguais.

Esta é, em minha visão, a maneira pela qual a não-importância atribuída à teoria da preferência pela liquidez da moeda pelos neo-ricardianos (Eatwell e Milgate, 1983EATWELL, J. & MILGATE, M. (1983), Keynes ‘s economics and the theory of value and distribution. Oxford, Oxford University Press., p. 7) pode se reconciliar com a ênfase pós-keynesiana nessa teoria. Uma vez que os neo-ricardianos geralmente estão preocupados com efeitos permanentes, e não com os transitórios, a análise acima mostra que, na chamada análise de longo período, a preferência pela liquidez não desempenha, de fato, qualquer papel. O que importa é a taxa de juros exógena, isto é, a taxa permanente, aquela que atua através dos canais que serão discutidos mais adiante. No curto período, poder-se-ia atribuir uma influência causal à preferência pela liquidez. Na realidade, esta é precisamente a maneira como Kregel (1976KREGEL, J.A. (1976). “Economic methodology in the face of uncertainty: the modelling method of Keynes and the post-Keynesians”. Economic Journal, vol. 86, junho, pp. 209-225., p. 219) nos recomenda “domar” o mundo real quando tratamos com modelos de crescimento e acumulação de capital. Embora algumas variáveis, tais como capacidade, se tomem endógenas, outras devem tomar-se dadas. Kregel oferece a preferência pela liquidez e as propensões a poupar como exemplos da última situação.

Essa visão da preferência pela liquidez corresponde amplamente à de Panico (1988PANICO, C. (1988). Interest and profit in theories of value and distribution. Londres, Macmillan .), um teórico que enfatiza bastante a natureza exógena e convencional da taxa de juros. Seguindo Keynes, Panico argumenta que o principal papel da preferência pela liquidez é forçar as taxas de juros de mercado a convergir para a taxa normal de juros. Esta última é determinada principalmente pelas autoridades monetárias, desde que, vale frisar, sejam suficientemente persistentes e consistentes. Como declarou Robinson: “Se elas (as autoridades) persistirem resolutamente, chegará um momento em que os ursos estarão convencidos de que a nova taxa baixa veio para ficar” (1952, p. 30). É claro que, a qualquer momento do tempo, o comportamento das autoridades monetárias pode ser influenciado pelo que os grupos mais poderosos da sociedade, presumivelmente os rentistas, imaginam que deva ser a taxa de juros normal. Mas, em última instância, a decisão de determinar a taxa normal de juros recai sobre as autoridades monetárias. Assim, o ponto central da análise de Panico é que a taxa de juros é de caráter convencional. Qualquer nível de taxa de juros localizado dentro de uma faixa razoavelmente ampla pode ser o nível durável.9 9 Embora no curto prazo possam não existir limites superiores e inferiores à fixação da taxa de juros, o mesmo não se aplica ao longo prazo. Todos sabemos, por exemplo, que os débitos acumulados no passado podem se tomar insustentáveis se as taxas de juros forem demasiadamente altas.

Ao apresentar sua teoria neo-ricardiana da moeda, Pivetti também enfatiza essa distinção entre mudanças permanentes e transitórias nas taxas de juros. Pivetti, como Fanico, apoia-se na taxa de juros altamente convencional de Keynes. Ele reconhece que variações para baixo transitórias nas taxas de juros podem aumentar as pressões inflacionárias, como advoga a economia da mainstream (1988, p. 278). Contudo, seu principal argumento é que uma análise de longo período deve lidar com as mudanças duradouras nas taxas de juros. Com taxas de juros permanentemente baixas, postula Pivetti (1985PIVETTI, M. (1985). “On the monetary explanation of distribution”. Polítical Economy, 1 (2), pp. 73-103., p. 83), os preços serão mais baixos. Por ser uma variável exógena, a taxa monetária de juros deve ser considerada um elemento causal de uma teoria da distribuição e do crescimento. A explicação proposta por Pivetti e amplamente endossada por Roncaglia (1988RONCAGLIA, A. (1988), “The neo-Ricardian approach and the distribution of income”. In A. Asimakopulos (ed.) Theories of income distribution. Boston, Kluwer Academic.) apoia-se explicitamente numa forma de teoria dos preços à la full-cost, onde o determinante das margens de lucro são os custos indiretos relativos aos pagamentos de juros sobre o capital emprestado e os custos de oportunidade do capital próprio das firmas.

Independentemente da estrutura temporal utilizada, a análise acima mostra que as preocupações dos pós-keynesianos com a análise monetária estão sendo agora respondidas por alguns neo-ricardianos. A análise de Pivetti, como ele próprio reconheceu (Pivetti, 1985PIVETTI, M. (1985). “On the monetary explanation of distribution”. Polítical Economy, 1 (2), pp. 73-103., p. 91), pode se ligar à margem de lucro exógena assumida pelos kaleckianos. Aqui, as margens seriam explicadas pelo nível da taxa de juros convencional. O próprio Kaldor admitiu que “os custos de juros são repassados para preços mais altos quase da mesma maneira que os custos de salários” (1982, p. 63). Num mundo onde os governos têm amplos débitos e incorrem em déficits, pagamentos crescentes de juros poderiam facilmente sustentar margens de lucro crescentes, através de seu efeito sobre a demanda agregada. Ademais, mudanças nas taxas de juros monetárias terão um impacto sobre a distribuição de renda e, portanto, sobre a demanda efetiva (Pivetti, 1985PIVETTI, M. (1985). “On the monetary explanation of distribution”. Polítical Economy, 1 (2), pp. 73-103., p. 99; Robinson, 1956ROBINSON, J. (1956). The accumulation of capital. Londres: Macmillan ., p. 253).

3.4 O papel causal do investimento

Várias consequências se derivam de uma teoria da moeda endógena com taxas de juros convencionais. Como observamos acima, as teorias-padrão de inflação, baseadas numa oferta monetária excessiva ou em taxas excessivas de crescimento da oferta monetária, perdem sua validade em tal contexto. O mesmo se pode dizer do efeito Pigou ou de outros efeitos à la Patinkin. Nesta seção, contudo, gostaria de focalizar as consequências de uma teoria da moeda endógena para o papel causal do investimento em relação às poupanças, em particular porque vimos a importância assumida pelos esquemas causais numa abordagem realista.

Como todos sabemos, vários pós-keynesianos argumentaram que o vínculo causal do investimento para a poupança é um aspecto distinto crucial da economia pós-clássica.

“A diferença fundamental entre a economia neoclássica e a economia keynesiana permanece, assim, a mesma, qualquer que seja o contexto de análise - um modelo de curto período de flutuações ou um modelo de crescimento de longo período; um modelo de subemprego ou um modelo de pleno emprego. Em cada um dos casos, acham-se presentes suposições sobre a cadeia de causação que, por assim dizer, estão ‘por trás das equações’ - no neoclássico, onde a taxa de juros é o principal regulador e as poupanças governam o investimento; no keynesiano, onde o investimento governa as poupanças e a parcela dos lucros no produto é o principal regulador” (Kaldor, 1962KALDOR, N. (1962), “Comment”, Review of Economic Studies, vol. 29, pp. 246-250., p. 249).

Assim, a cadeia de causação ‘por trás das equações’, tanto no longo como no curto período, se baseia na habilidade do sistema econômico “para criar direitos monetários previamente ao produto efetivo” (Kregel, 1973KREGEL, J.A. (1973). “The reconstruction of political economy: an introduction to post-Keynesian Economics”, Londres, Macmillan ., p. 159). Este é o importante papel desempenhado pela moeda-crédito. Como consequência, os neo-ricardianos também percebem esse vínculo crucial entre a moeda e a causalidade keynesiana. “A moeda desempenha um papel essencial para a demanda efetiva por ( ... ) permitir que o círculo produção-renda-demanda-produção se rompa no elo poupanças-investimento” (Garegnani, 1983GAREGNANI, P. (1983). “Two routes to effective demand”, ln Kregel, J.A. (ed.) Distribution, effective demand and international economic relations, Londres, Macmillan , pp. 69-90., p. 78). Na economia neoclássica, a moeda, assim como as demais mercadorias, deve ser escassa para ter algum valor; sua oferta é, portanto, usualmente considerada um estoque, isto é, uma dotação dada. Na economia pós-clássica, a moeda como tal não é escassa; a taxa de juros não é, ao menos tanto como uma variável distributiva, seu preço; a moeda-crédito não depende de um estoque preexistente de ouro ou moeda primariamente emitida. “A moeda-crédito não existe como estoque fixado ‘fora·da economia” (Moore, 1988MOORE, B.J. (1988). Horizontalists and verticalists: the macroeconomics of credit money. Cambridge, Cambridge University Press ., p. 296). Pode-se fazer uma analogia entre essa visão de não-escassez da moeda e a recusa em considerar os preços (de produção) como índices de escassez.

Os partidários da abordagem do circuito foram bastante perspicazes na descrição de como a moeda-crédito e a produção estão relacionadas (Graziani, 1989GRAZIANI, A. (1989). “The theory of the monetary circuit”, Thames Papers in Political Economy , primavera.). A escola do circuito, uma tentativa particularmente acurada de representar com uma abordagem realista as economias de produção monetárias, nega que a produção possa ser concebida sem moeda-crédito. Como diz Gerrard (1989GERRARD, B. (1989). Theory of the capitalist economy: Towards a post-classical synthesis. Oxford, Basil Blackwell ., p. 43), “toda economia de produção monetária é um setor monetário”. Os circuitistas consideram que qualquer produção deve ter início obtendo acesso ao crédito. Ou as firmas contraem empréstimos ou utilizam seu capital circulante, o fundo rotativo sugerido por Keynes em seu artigo de 1937, que se deriva, de certa forma, de empréstimos ainda não restituídos. Este é o financiamento inicial de Graziani (1984GRAZIANI, A. (1984) “The debate on Keynes’ finance motive”. Economic Notes, março, pp. 5-32.) ou o fundo de financiamento de construção de curto prazo sugerido por Davidson (1986DAVIDSON, P. (1986) “Finance, funding, saving and investment”. Journal of Post Keynesian Economics , vol. 9, outono, pp. 101-110.).

No estágio final de financiamento, os circuitistas argumentam, em termos de fluxo de caixa, que o financiamento só pode ser idêntico ao montante requerido. Esta é a muito discutida identidade (e não condição de equilíbrio) de Keynes entre poupanças e investimento. Assim, os circuitistas argumentam que, esteja a economia em equilíbrio ou em desequilíbrio, o fundo de financiamento de longo prazo estará sempre a caminho. Não são necessárias variações na taxa de juros para a equalização das poupanças ao investimento. Assim, esse tipo de análise contradiz a tentativa de Asimakopulos ( 1983ASIMAKOPULOS, A. (1983). “Kalecki and Keynes on finance, investment and saving”. Cambridge Journal of Economics, vol. 7, dezembro: 221-233.) de ressuscitar a necessidade de poupança das famílias para a acumulação. Ao contrário, as crenças dos circuitistas, quais sejam, que qualquer tipo de produção requer moeda-crédito e a ausência de poupança não é capaz de restringir financeiramente o investimento, atualmente prevalecem entre os pós-keynesianos (Moore, 1988MOORE, B.J. (1988). Horizontalists and verticalists: the macroeconomics of credit money. Cambridge, Cambridge University Press .: cap. 12; Eichner, 1987EICHNER, A.S. (1987). The macrodynamics of advanced market economics. Armonk, M. E. Sharpe., seção 12.5.1; Neil, 1986, p. 30).

A resposta da ortodoxia-padrão a essas postulações é sublinhar os efeitos-portfólio derivados dos estoques acumulados. Assume-se que existem montantes dados de moeda e títulos (financeiros e de propriedade acionária), que o público pode ser convencido a reter ao preço (taxa de juros) apropriado. A resposta a essa objeção estoque/fluxo-padrão é que os estoques não são dados. Uma das contribuições mais fundamentais dos circuitistas é colocar em primeiro plano a teoria de fluxo/refluxo da banking school. Os estoques de moeda são criados e podem ser destruídos. Eles são sempre destruídos ao final de cada circuito, quando as firmas, após terem se apropriado de suas receitas de vendas, estão em posição de saldar os empréstimos iniciais obtidos junto aos bancos. O fato de esses excessos de moeda serem utilizados, sempre que surgem, para saldar junto aos bancos com os quais as firmas estão sempre em débito, já foi apontado por Kaldor (1982KALDOR, N. (1982). The scourge of monetarism. Oxford, Oxford University Press., p. 70). As consequências dessa análise de fluxo/ refluxo, não obstante aquelas para a teoria da inflação, são, na verdade, que a taxa de juros pode ser considerada uma variável exógena, determinada pelas autoridades monetárias (embora a preferência pela liquidez possa desempenhar um papel, ainda que limitado), e não uma variável endogenamente determinada pelo mercado, resultante de forças anônimas de oferta e demanda derivadas de efeitos-portfólio. Estes efeitos explicam a estrutura das taxas de juros, não podendo, contudo, explicar a taxa-base.

Isso ajuda a explicar por que a análise da escassez, tão cara aos economistas neoclássicos, não pode se aplicar nem mesmo aos mercados financeiros. Postular que uma economia em crescimento eventualmente engendra taxas de juros (reais) crescentes, presumivelmente em consequência do excesso de demanda por crédito ou da escassez de poupanças, significa reintroduzir a análise da escassez pela porta dos fundos. Ninguém negará, é claro, que em situações de aceleração do produto os Bancos Centrais são tentados a aumentar as taxas de juros nominais em função, por exemplo, de restrições de balanço de pagamentos. A verdade é que, desconsiderando forças inflacionárias que possam encorajar o Banco Central a responder ao lobby dos rentistas sem cláusulas de indexação, não existem forças naturais que inescapavelmente forcem uma subida das taxas de juros (nominais ou reais). Como registrou Robinson (1952ROBINSON, J. (1952). The rate of interest and other essays. Londres, Macmillan ., p. 128), “quando o boom se espalha pelo mundo ( ... ), é difícil visualizar porque o financiamento deveria restringir o crescimento”. Se as taxas de juros subirem, é porque os Bancos Centrais conscientemente tomaram a decisão política de fazê-lo. Quando se incorporam ao cenário as forças da preferência pela liquidez, pode-se argumentar que os aumentos na taxa de juros, gerados por uma queda na confiança, podem ser de natureza temporária. As autoridades monetárias têm o poder de impor uma taxa permanente de juros, bastando para isso que demonstrem certa consistência em seu propósito. Alguns pós-keynesianos, na tradição de Minsky (1975) ou Rousseas (1986ROUSSEAS, S. (1986). Post-Keynesian monetary economics. Armonk, M. E. Sharpe .), ainda acreditam que um crescente nível de atividade econômica necessariamente gera um aumento das taxas de juros (reais). Seus argumentos usualmente se baseiam em alguma forma de teoria da preferência pela liquidez generalizada, onde o crescente nível de atividade geraria saldos menos líquidos para firmas e bancos. O princípio do risco crescente de Kalecki é então usualmente invocado. Contudo, as implicações macroeconômicas desse princípio são tais que ele pode conduzir a taxas de juros mais baixas e empréstimos mais fáceis, um fato sublinhado por Robinson (1952ROBINSON, J. (1952). The rate of interest and other essays. Londres, Macmillan ., p. 23; 1956, p. 51).10 10 Ver também Lavoie (1986).

Recessões induzidas por causas monetárias ou financeiras não são um mal necessário e inatacável, são orquestradas pelas autoridades monetárias. Aqueles que continuam argumentando que o investimento é o fator causal precisam reconhecer que a moeda é endógena e as taxas de juros são convencionais. Do contrário, a causalidade proposta não se sustenta.

4. CONCLUSÃO

O objetivo deste artigo era duplo: propor uma estrutura de leitura de duas tradições de pesquisa opostas - as economias neoclássica e pós-clássica - através de quatro pressupostos binários; e aplicar essa estrutura ao campo da economia monetária, mostrando que, apesar de endossarem abordagens amplamente diferentes, os autores pós-clássicos têm uma visão comum do papel da moeda.

Na primeira parte, os pressupostos neoclássicos foram definidos como uma epistemologia instrumentalista, uma filosofia individualista e uma visão da economia baseada nas noções de troca e racionalidade ilimitada. Por outro lado, o programa de pesquisa pós-clássico, definido como a síntese do pós-keynesianismo e do neo-ricardianismo, baseia-se em quatro fundamentos opostos: uma epistemologia realista, uma ontologia organicista ou holista e uma visão da economia baseada na produção e na racionalidade processual. Esses quatro conjuntos de pressupostos representam a verdade geral de cada uma das tradições de pesquisa em questão. Representam as crenças metafísicas da grande maioria dos participantes de cada linha de pesquisa. São as tendências encorajadas pelo colégio invisível de cada um dos programas de pesquisa.

Em relação ao campo da moeda, mostrou-se, na segunda parte do artigo, como os pós-keynesianos e os neo-ricardianos visualizam a moeda como uma variável endógena, enquanto a taxa de juros resulta de um fenômeno convencional e não da análise de oferta e demanda. Ademais, mostrou-se que a predominância causal do investimento sobre as poupanças, questão crucial para os pós-clássicos, está baseada nessa visão da moeda. Enfatizou-se também que a visão pós-clássica da moeda se baseia em fundamentos realistas, centrados na tarefa da produção e não na da troca.

Embora os autores pós-keynesianos e neo-ricardianos pareçam endossar ferramentas analíticas amplamente diferentes, suas visões da natureza da moeda são bastante homogêneas. Além disso, embora suas visões da importância da preferência pela liquidez sejam aparentemente opostas, é possível, se pudermos estabelecer a distinção entre mudanças transitórias e permanentes, tomá-las consistentes. Assim, sinto-me preparado para argumentar que, embora existam várias teorias monetárias pós-clássicas, assim como várias teorias monetárias neoclássicas, existe uma visão comum da moeda entre as duas principais vertentes da economia pós-clássica.

Finalmente, acredito ser recompensadora a integração entre pós-keynesianos e neo-ricardianos, posto que os últimos chamaram nossa atenção para o impacto de mudanças nas taxas monetárias de juros sobre a distribuição de renda e a demanda efetiva, um efeito que vinha sendo geralmente omitido por aqueles preocupados com fatores monetários.11 11 O impacto das taxas de juros não é explicito nem nos mark-ups nem nas funções poupanças da maioria dos trabalhos pós-keynesianos.

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  • 1
    Gerrard (1989GERRARD, B. (1989). Theory of the capitalist economy: Towards a post-classical synthesis. Oxford, Basil Blackwell .: p. 181) também fala sobre uma síntese pós-clássica. Ele pretende integrar as economias neoclássica e pós-keynesíana, excluindo contudo os neo-ricardianos: “A influência neo-ricardiana sobre a presente análise foi inteiramente negativa ( ... ) Os neo-ricardianos partiram para um cantinho completamente equivocado ( ... )”.
  • 2
    Talvez deva adicionar que, grosso modo, sinto que os radicais e institucionalistas fazem parte do programa de pesquisa pós-clássico, uma vez que seus escritos estão claramente interconectados com os dos pós-clássicos (URPE, 1987; Hodgson, 1989HODGSON, G. (1989). “Post-Keynesianism and Institutionalism: the missing link”. In PHEBY, J. (ed.). New directions in post-Keynesian Economics. Hants, Edward Elgar .). O mesmo poderia ser dito da escola evolucionária (schumpeterianos à la Dosi) e das escolas da regulação francesas.
  • 3
    Esses elementos fundamentais são estudados em maior detalhe em outro artigo (Lavoie, 1989LAVOIE, M. (1989). “Towards a new research programme for post-Keynesianism and neo-Rícardianism. Paper presented at the second Review of Political Economy Conference, Great Malvern, agosto.).
  • 4
    Ver também Eichner e Kregel (1975EICHNER, A.S. & KREGEL, J.A. (1975). “An essay on post-Keynesian theory: a new paradigm in economics”. Journal of Economic Literature, dezembro, pp. 1293-1321., p.1309), Rogers (1989ROGERS, C. (1989). Money, interest, and capital: a study in the foundations of monetary theory. Cambridge, Cambridge University Press ., pp. 189-92) e Lawson (1989LAWSON, T. (1989). “Abstraction, tendencies and stylized facts: a realist approach to economic analysis “.Cambridge Journal of Economics , 13(1), março, pp. 59-70.).
  • 5
    Wulwick inclui Davidson, Kaldor e Garegnani em sua definição de pós-keynesianismo.
  • 6
    Considere-se a seguinte citação: “Quero casualmente deixar claro que eu pelo menos não acredito que ‘os únicos objetos da análise econômica são as posições de longo prazo do sistema e o comportamento de curto período é irrelevante· ( ... ) Como argumentei várias vezes, não apenas o produto e o emprego de curto período são acessíveis à análise, mas a análise de Keynes do grau de utilização da capacidade é obviamente de grande importância. A questão é se não precisamos de mais nada”. (Garegnani, 1988GAREGNANI, P. (1988). Actual and normal magnitudes: a comment on Asimakopulos. Political Economy , 4 (2), pp. 251-258., pp. 252-3).
  • 7
    Casualmente, as visões de Arena (1987ARENA, R. (1987). “L’école intemationale d’été de Trieste (1981-85): vers une synthêse classico-keynésienne?” Economies et Sociétés, vol. 21, março: 205- 238.) sobre tuna possível síntese pós-clássica (que ele chama clássico-keynesiana) são razoavelmente próximas das defendidas por este autor. O mesmo poderia ser dito de Amadeo e Dutt (1987AMADEO, E. J. & A. DUTT. (1987). “Os keynesianos neo-ricardianos e os pós­keynesianos”. Pesquisa e Planejamento Econômico, 17(3).).
  • 8
    No tempo concreto, essas imperfeições sempre existirão e, consequentemente, a menos que seja por sorte, essas taxas nunca serão iguais.
  • 9
    Embora no curto prazo possam não existir limites superiores e inferiores à fixação da taxa de juros, o mesmo não se aplica ao longo prazo. Todos sabemos, por exemplo, que os débitos acumulados no passado podem se tomar insustentáveis se as taxas de juros forem demasiadamente altas.
  • 10
    Ver também Lavoie (1986LAVOIE, M. (1985). “The dynamic circuit, overdraff economies, and post-Keynesian Economics”. In M. Jarsulic, (ed.) Money and Macro Policy. Boston, Kluwer-Nijhoff.).
  • 11
    O impacto das taxas de juros não é explicito nem nos mark-ups nem nas funções poupanças da maioria dos trabalhos pós-keynesianos.
  • *
    Traduzido por Gilberto Tadeu Lima.
  • 12
    JEL Classification: B41; B24.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Jun 2023
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 1992
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