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A regulação da indústria de moagem de trigo no Brasil

The regulation of the wheat milling industry in Brazil

RESUMO

Este artigo discute o impacto da regulamentação do mercado brasileiro de trigo na estrutura industrial da farinha de trigo e a possibilidade de absorção de subsídios pela indústria. Primeiro, são observados os aspectos institucionais da indústria de farinha de trigo. Em seguida, a estrutura utilizada foi baseada em indicadores desenvolvidos na teoria da Organização Industrial, que indica que a regulamentação não é a causa do aumento da concentração do mercado nem que a indústria absorveu o subsídio. Pelo contrário, parece que o lucro real da indústria diminuiu durante o período relevante da política de subsídios (1970-80).

PALAVRAS-CHAVE:
Regulação; trigo; política agrícola; subsídios

ABSTRACT

This article discusses the impact of the regulation of the Brazilian wheat market on the industrial structure of the wheat flour and the possibility of the subsidy absorption by the industry. First, it is remarked the institutional aspects of the wheat flour industry. Then, the framework used was based on indicators developed in Industrial Organization theory, that indicates that the regulation is not the cause of the increase in market concentration nor that the industry absorbed the subsidy. On the contrary, it seems that the industry real profit decreased during the relevant period of subsidy policy (1970-80).

KEYWORDS:
Regulation; wheat; agricultural policy; subsides

1. INTRODUÇÃO

Duas questões básicas se colocam na análise da indústria de moagem de trigo brasileira: o impacto da regulação (DL 210/67) sobre a estrutura industrial e se houve absorção ou não do subsídio ao consumo de trigo pela indústria.

O trabalho aqui desenvolvido investiga as duas questões recorrendo a alguns indicadores clássicos de concentração e de grau de ociosidade na indústria entre 1967 /87, assim como a questão da existência de absorção do subsídio, através de alguns indicadores de evolução de lucro e margens de lucro.

O item 2 apresenta um breve retrospecto da regulação sobre aquela indústria. O item 3 analisa a evolução da estrutura industrial, segundo os diversos mercados regionais; o item 4 analisa a concentração técnica e sua ligação com a eficiência na produção e, o item 5, a concentração econômica e as perspectivas em face da desregulação do setor.

Os indicadores sobre margens da indústria são apresentados no item 6 e a discussão empírica sobre a absorção do subsídio é contemplada no item 7. Finalmente, apresenta-se uma conclusão sobre os principais resultados do trabalho.

2. RETROSPECTO

A indústria de moagem de trigo brasileira é relativamente antiga, mas se desenvolveu consideravelmente a partir da Lei n. 948, de 3/12/49, que isentou de tarifas alfandegárias, durante cinco anos, a importação de máquinas, desde que não houvesse similar nacional. Adicionando-se a isto o fato de que os moinhos recebiam cotas de trigo proporcionalmente à capacidade de produção, ocorreu uma rápida expansão do número de plantas do parque moageiro nacional.

A capacidade do parque moageiro tornou-se muito superior ao consumo doméstico e a instalação de novos moinhos reduzia o grau de utilização daqueles em funcionamento. Além disso, a obrigatoriedade do consumo de trigo nacional pelos moinhos em cotas proporcionais à sua capacidade, gerou fraudes na medida em que este produto era mais caro do que o importado. Para resolver o problema, os moinhos ampliavam sua capacidade (de fato ou apenas de registro), de modo a obter volume crescente do grão importado.

A excessiva capacidade ociosa da indústria e diversas fraudes na comercialização do trigo implicaram crescente estatização da comercialização e regulação da indústria, culminando com o Decreto-Lei n. 210, de 27/2/67, cujos objetivos eram: a) dar prioridade ao trigo nacional; b) regular a comercialização, mantendo-se o governo federal como monopolista no mercado de trigo nacional e importado; c) garantir o abastecimento adequado através da divisão do país em oito zonas de consumo para as quais seriam realizadas estimativas das necessidades do grão que, posteriormente, seria distribuído proporcionalmente à capacidade de moagem registrada dos moinhos; d) ampliar a capacidade de ensilagem dos moinhos; e) impedir o crescimento da capacidade de moagem do país.

Para este último objetivo, foram realizadas provas físicas da capacidade dos moinhos ao longo de 1967, quando foram excluídos cerca de 40% do equipamento industrial para fins de distribuição de cotas, sendo o restante homologado para participação no sistema. A partir de então, não foram homologadas capacidades adicionais de moagem.

No caso da indústria moageira nacional, a regulação fornece sistematicamente, a partir de 1967, a estrutura setorial, através de portarias da SUNAB, que indicam nome, número de registro na SUNAB, localidade, capacidade de moagem diária registrada e cota específica e adicional disponível por ano.1 1 Convém lembrar que, nas portarias da SUNAB, registram-se apenas os moinhos participantes do sistema-trigo, deixando de lado os chamados moinhos coloniais, de pequeno porte, localizados na Região Sul, utilizados basicamente para autoconsumo de farinha pelos produtores de trigo e, em alguns casos, pelos vizinhos, sem caracterizar uma operação comercial. Os moinhos coloniais obedecem a definição e legislação próprias. Além disso, a SUNAB dispõe das provas físicas de capacidade atualizadas dos diversos moinhos, permitindo analisar a capacidade real do parque moageiro atual. A partir destas informações, é possível estabelecer índices de concentração da indústria, analisados a seguir.

3. ASPECTOS GERAIS DOS MERCADOS REGIONAIS DE MOAGEM DE TRIGO NO BRASIL

Conforme a Tabela 1, que apresenta a cota e a capacidade real registrada na SUNAB em 1967 e 1987, para cada zona de consumo, a regulação atual efetivamente reduziu o problema da ociosidade generalizada que ocorria em 1967: neste ano, a capacidade ociosa representava 65% da capacidade nacional instalada; em 1987, representava apenas 24%, tendo ocorrido, também, uma redução na capacidade ociosa em todas as Zonas de Consumo.

Tabela 1:
Evolução da capacidade real e capacidade ociosa na moagem de trigo, segundo as Zonas de Consumo e Brasil total - 1967 /87

Verifica-se também que, para o Brasil como um todo, a capacidade real do parque moageiro aumentou em apenas 7% nos últimos vinte anos. A expansão da capacidade real e seu grau de utilização, porém, foram desiguais entre as diversas regiões: a capacidade cresceu aceleradamente nas zonas 1, 2, 3, 4 e 6; foi reduzida nas zonas 5 e 7 e ficou praticamente inalterada na Zona de Consumo 8.2 2 Para identificação das Zonas de Consumo, ver observações à Tabela 1.

Verifica-se, nas diversas Zonas de Consumo, que houve modificações substantivas na capacidade, respondendo a estímulos de demanda regional. Essas mudanças de capacidade inter-regionais também estão inseridas no DL 210/67, no que se refere às transferências de zona de consumo, desmembramentos e incorporações de moinhos. Como a capacidade nacional cresceu em 7% entre 1967 e 1987, contudo, fica evidente que, apesar do sucesso da regulação em impedir a expansão global do parque moageiro nacional, trata-se de uma regulação regionalmente ultrapassada, à medida que as características desses mercados regionais sofreram alteração, havendo necessidade de aumentos efetivos na capacidade de algumas Zonas de Consumo.

4. CONCENTRAÇÃO TÉCNICA E EFICIÊNCIA DA INDÚSTRIA MOAGEIRA NO BRASIL (1967/1987)

Com relação à estrutura industrial, em nível de concentração técnica, ou seja, na planta, utilizaram-se três índices: Herfindhal, participação da maior unidade e das quatro maiores na capacidade registrada, todos eles por zona de consumo e em âmbito nacional.3 3 Como os moinhos atuam em mercados regionais definidos pelas Zonas de Consumo da regulação, apenas os índices de concentração regionais têm sentido, uma vez que os moinhos de uma Zona de Consumo não competem pelo mercado com moinhos de outras Zonas de Consumo. Apesar disso, decidiu-se incluir os índices de concentração nacional, basicamente para referência. Para uma discussão sobre os índices, ver Scherer (1970).

Na Tabela 2, a coluna indicada por H reúne o índice Herfindhal para cada zona de consumo e Brasil, em termos de participação de cada capacidade de moinho na capacidade regional e nacional. Observando-se o comportamento do índice nas várias zonas, em determinado período, e comparando-o com o valor nacional, comprova-se que a concentração regional é bem superior à nacional, mesmo na região menos concentrada.

Tabela 2:
Evolução da concentração técnica na indústria de moagem de trigo, segundo a capacidade real, por zona de consumo e Brasil total (final de 1967/87)

De modo geral, a moagem de trigo já era muito concentrada tecnicamente em 1967 e, nas Zonas de Consumo do Norte e Nordeste, apesar da queda da concentração devida ao crescimento do número de moinhos, esta é ainda bastante elevada. Em São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, apesar de a concentração ser menos acentuada, houve um aumento dela entre 1967 e 1987, graças, principalmente, ao crescimento das líderes em relação ao mercado.

A concentração da indústria moageira no Brasil remete à discussão do papel da regulação na (in)eficiência da estrutura produtiva brasileira. Em outros termos, o debate sobre a regulação deste mercado, especificamente no que diz respeito às cotas, passa pela análise da distribuição de benefícios às firmas participantes do sistema, seja pela sua manutenção no mercado ou pela obtenção de lucro elevado.

Há fortes evidências de que nessa indústria, do ponto de vista da eficiência técnica, existem vantagens de custo na produção em larga escala. Segundo Lockwood (1951, citado por Soares, 1980SOARES, R. P. (1980) Avaliação Econômica da Política Tritícola de 1967 a 1977. Brasília, CFP. (Coleção Análise e Pesquisa, vol. 20). , p. 30 e 111), os custos operacionais dos moinhos (excluindo-se custos de administração e comercialização) seriam da ordem de 12,55 pences por toneladas, para plantas com capacidade de 20 toneladas por dia, trabalhando 5 000 horas por ano, enquanto plantas com capacidade de 60, 120, 200 e 400 toneladas por dia teriam um custo operacional de 9,93, 9,00, 7,94 e 7 ,3 pences por tonelada, trabalhando o mesmo número de horas.

Entrevistas com representantes da indústria moageira de São Paulo, em 1988, indicaram que, também no período atual, para operar eficientemente, a capacidade dos moinhos deve se situar entre 200t/dia a 400t/dia, corroborando as indicações de Lockwood sobre eficiência na produção. Pode-se inferir que as vantagens de custos operacionais de moagem em larga escala sejam o resultado de maior especialização de trabalho, bem como da utilização de tecnologias de maior produtividade. Adicionando-se a estes fatores as vantagens financeiras e de distribuição da operação em larga escala, pode-se concluir que as vantagens totais de custos dos grandes moinhos, apesar de não quantificáveis aqui, são muito importantes, possibilitando a obtenção de lucros totais elevados.

Note-se que este raciocínio pressupõe que a diferentes tamanhos de firmas estão relacionadas diferentes combinações e qualidade dos fatores produtivos; portanto, pode-se deduzir que existem economias de tamanho, evitando-se a análise do tipo economias de escala, associada à expansão dos mesmos fatores de produção em proporções fixas e com a mesma tecnologia. O conceito de economias de tamanho, embora mais fluido, expressa melhor a realidade analisada.4 4 Ver Gold (1981) para uma discussão do problema, principalmente o fato de que os dois conceitos são muitas vezes usados indistintamente.

5. A CONCENTRAÇÃO ECONÔMICA

Os moinhos existentes no Brasil organizam-se em grupos econômicos, de modo que se pode considerá-los moinhos quase-firmas.5 5 Conceito de Williamson (1971), que indica que a unidade é independente da direção central no caso das decisões correntes, mas é subordinada a ela no caso do processo de crescimento. Sua existência pode estar associada a custos de distribuição elevados a partir de determinado nível de produto ou à estratégia de crescimento das firmas. O fato de que a farinha consumida no Brasil foi subsidiada no período de implantação do parque moageiro, principalmente através do mecanismo cambial, deve ter reforçado essa tendência, de modo que é mais eficiente a operação de várias plantas adequadamente distribuídas - perto das zonas produtoras no Sul e nos centros consumidores do Norte, Nordeste, Rio de Janeiro e São Paulo.

Pela Tabela 3, pode-se verificar a evolução da participação dos principais grupos econômicos na capacidade real dos diversos mercados regionais, que indica o potencial de crescimento da concentração econômica no setor, em caso de desregulação.

Tabela 3:
Participação dos principais grupos econômicos na capacidade real dos mercados regionais de moagem de trigo, Brasil 1967/87 (%)

A partir do crescimento da capacidade produtiva, principalmente pelo maior grupo econômico, pode-se deduzir que a extinção do DL 210/67 provavelmente acirrará a concorrência (no sentido de rivalidade) entre os grandes grupos econômicos pelos diversos mercados regionais: a desregulação do setor vai gerar consequências diferentes sobre a estrutura industrial, dependendo das características específicas de cada região, principalmente no que diz respeito à capacidade ociosa e crescimento da demanda.

Conclui-se que, se de um lado, a regulação do DL 210/67 cumpriu seu objetivo no que se refere à proibição de expansão do parque moageiro nacional, para eliminação da excessiva capacidade ociosa, de outro lado, mantém uma estrutura industrial incompatível com a evolução dos diversos mercados regionais. A desregulação do setor vai levar a uma maior participação no mercado dos grandes grupos econômicos, que ao longo do tempo vêm ampliando sua capacidade.

Outro aspecto polêmico na questão da regulação do mercado brasileiro de trigo diz respeito à sua eficiência no repasse do subsídio ao consumo, que representou a parte mais significativa da política para o setor até 1987.6 6 Ver Silva (1989). A ineficiência da indústria nesse aspecto é discutida por Soares (1980SOARES, R. P. (1980) Avaliação Econômica da Política Tritícola de 1967 a 1977. Brasília, CFP. (Coleção Análise e Pesquisa, vol. 20). ), no âmbito acadêmico, bem como por diversos agentes envolvidos no mercado em questão.

Apresenta-se, a seguir, uma análise de alguns indicadores industriais, que serão úteis na discussão sobre a desregulação.7 7 Não será examinada a indústria de rações, pela impossibilidade de distinguir das demais as firmas que usam farelo de trigo e em que proporção. comparando-se a indústria de moagem de trigo com a de massas, biscoitos e panificação, no que se refere a margens de lucro.

6. INDICADORES INDUSTRIAIS

Os principais indicadores industriais foram desenvolvidos por Tavares (1978TAVARES, M. C. et alii. (1978) Estrutura Industrial e Empresas Líderes. Rio de Janeiro, FINEP. ) e obtidos a partir dos Censos Industriais, destacando-se o mark-up e a margem do excedente (MBE). O primeiro está relacionado originalmente com o “grau de monopólio” de Kalecki e indica a margem que é adicionada aos custos diretos da firma:

M A R K - U P = V P - S P - D O I / S P + D O I (1)

onde:

VP = valor da produção8 8 O valor da produção corresponde ao valor de venda dos produtos fabricados, excluídos os impostos indiretos.

SP = salários do pessoal ocupado na produção9 9 Inclui salários, retiradas, gratificações, ajuda de custo, 13o e remuneração de dez dias de férias, bem como previdência social relativa à parte do empregado.

DOI = despesas de operações industriais10 10 Inclui matérias-primas, materiais e componentes, energia elétrica, combustíveis e lubrificantes e custos dos serviços contratados.

O segundo indicador relevante é a margem bruta do excedente (MBE), que corresponde, em termos gerais, à parcela da massa de lucro bruto no valor adicionado pela firma:

M B E = V T I - S P / V T I (2)

onde:

VTI = valor da transformação industrial11 11 O VTI é o resultado da subtração do valor da produção dos custos das matérias-primas e componentes, material de embalagem, combustíveis e lubrificantes, energia elétrica e pagamento dos serviços contratados e corresponde ao valor agregado pela firma sobre as matérias-primas. O VTI inclui também outros custos indiretos como propaganda, viagens do staff etc.

Entretanto, a utilização desses indicadores deve ser cautelosa, pois os dados disponíveis referem-se a apenas três Censos Industriais (1970, 1975 e 1980) e dizem respeito a estabelecimentos industriais e não a firmas. O estabelecimento dos Censos Industriais é uma unidade de produção em que se produzem um ou mais produtos conexos, com o emprego das mesmas matérias-primas ou processos industriais, constituindo uma definição muito mais técnica do que econômica.

Deste modo, os custos indiretos (administração, amortizações etc.), que normalmente são apropriados pela firma e não pelos estabelecimentos, não são devidamente captados pelos Censos Industriais, visando os indicadores quando a firma opera com multiplantas.

Esse problema é especialmente grave no caso do mark-up, uma vez que ele pode variar em função dos custos indiretos. Deste modo, um crescimento observado no mark-up não implica necessariamente o aumento do “grau de monopólio”, mas pode estar indicando um aumento dos custos indiretos.

7. A ABSORÇÃO DO SUBSÍDIO AO CONSUMO PELA INDÚSTRIA

A Tabela 4 apresenta os indicadores industriais dispostos em índices. Verifica-se um crescimento nos mark-ups. Apesar disso, a MBE só se eleva no caso da indústria de massas e mesmo declina ligeiramente na moagem e acentuadamente na panificação. No caso da moagem e panificação, a MBE teve uma tendência decrescente.

Tabela 4:
Evolução dos indicadores de margens das indústrias processadoras de trigo e farinha de trigo; Brasil (índice real; 1970 = 100)

Segundo esses indicadores, os lucros das indústrias sob maior controle de preços (moagem e panificação) perderam participação no valor adicionado - muito leve no caso da moagem e acentuada no caso da panificação, indicando que, indevidamente, não houve absorção do subsídio.

A questão da absorção indevida do subsídio é um terreno pantanoso, principalmente no que se refere à disponibilidade de dados, pois, mesmo em se verificando um crescimento no lucro da indústria, não se pode correlacioná-lo diretamente com o subsídio.

A evidência mais contundente sobre a questão provém da Tabela 5, que indica que o lucro real por tonelada de trigo distribuído foi sendo reduzido ao longo do tempo. Em 1980, auge do subsídio ao consumo, o lucro por tonelada de trigo distribuído foi o menor da amostra, indicando que houve grande redução na lucratividade da moagem como um todo, enquanto o subsídio ao consumo se elevava, contrariando a análise de Soares (1980SOARES, R. P. (1980) Avaliação Econômica da Política Tritícola de 1967 a 1977. Brasília, CFP. (Coleção Análise e Pesquisa, vol. 20). ) sobre a questão.12 12 A relação técnica entre a matéria-prima e o mix de produto final permite tratar a evolução do lucro por tonelada de matéria-prima como semelhante ao lucro por tonelada de produto final.

Tabela 5:
Lucro real por tonelada de trigo distribuído, Brasil, 1970, 1975 e 1980.

Apesar da redução do lucro real unitário da indústria, é possível ter ocorrido, de fato, uma absorção do subsídio por parte de moinhos que operam em condições vantajosas, em função da manutenção de um preço único para a farinha a partir da Portaria SUPER n. 56, de 02/12/76. Entre essas condições, estão os mercados regionais com custos de trabalho reduzidos, como também o caso de moinhos que integram grupos econômico-financeiros diversificados, capazes de criar novos produtos sofisticados a partir de matéria-prima barata, incluindo-se, nesse caso, a exportação de derivados de trigo. Entretanto, como o grosso do consumo de trigo é constituído por panificados, pode-se dizer que a absorção do subsídio é marginal no volume total de consumo de derivados, podendo ser facilmente corrigida por medidas específicas.

8. CONCLUSÃO

A absorção do subsídio ao consumo de trigo, apesar de existir, como em qualquer caso de subsídio geral, não parece ter sido suficientemente relevante ou impossível de ser corrigida por instrumentos adequados, de modo a tornar inadequado o conjunto da política passada para o trigo.

Ao contrário, pode-se dizer que a indústria moageira como um todo perdeu lucratividade, ao invés de ganhar, durante o período em que o subsídio ao consumo foi mais sistemático e elevado (1970/80).13 13 Ver Silva (1989).

Além disso, conforme a análise apresentada anteriormente, no que tange à estrutura industrial, conclui-se que a melhor política seria atualizar as cotas dos diversos mercados regionais, compatibilizando-as com as necessidades atuais de consumo e a implementação de uma política de preços diferenciados por região e qualidade de trigo e farinha, ou seja, a atualização da regulação do DL 210/67, que se mostrou adequada à eliminação da capacidade ociosa e ao sistema de abastecimento de derivados de trigo, principalmente no caso de a política de subsídio ao consumo tornar-se novamente relevante.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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  • WILLIAMSON, O. E. (1971) “Managerial Discretion, Organization Form and the Multi-Division Hypothesis”. In: MARRIS, R. & WOOD, A. (orgs.). The Corporate Economy. Cambridge, Mass., Harvard University Press.
  • 1
    Convém lembrar que, nas portarias da SUNAB, registram-se apenas os moinhos participantes do sistema-trigo, deixando de lado os chamados moinhos coloniais, de pequeno porte, localizados na Região Sul, utilizados basicamente para autoconsumo de farinha pelos produtores de trigo e, em alguns casos, pelos vizinhos, sem caracterizar uma operação comercial. Os moinhos coloniais obedecem a definição e legislação próprias.
  • 2
    Para identificação das Zonas de Consumo, ver observações à Tabela 1.
  • 3
    Como os moinhos atuam em mercados regionais definidos pelas Zonas de Consumo da regulação, apenas os índices de concentração regionais têm sentido, uma vez que os moinhos de uma Zona de Consumo não competem pelo mercado com moinhos de outras Zonas de Consumo. Apesar disso, decidiu-se incluir os índices de concentração nacional, basicamente para referência. Para uma discussão sobre os índices, ver Scherer (1970SCHERER, F. M. (1970) Industrial Market Structure and Economic Performance. Chicago, Rand MacNally. ).
  • 4
    Ver Gold (1981GOLD, B. (1981) “Changing perspectives on size, scale and returns: an interpretative survey.” Journal of Economic Literature , Pittsburgh, 19 (1):5-33, March. ) para uma discussão do problema, principalmente o fato de que os dois conceitos são muitas vezes usados indistintamente.
  • 5
    Conceito de Williamson (1971WILLIAMSON, O. E. (1971) “Managerial Discretion, Organization Form and the Multi-Division Hypothesis”. In: MARRIS, R. & WOOD, A. (orgs.). The Corporate Economy. Cambridge, Mass., Harvard University Press. ), que indica que a unidade é independente da direção central no caso das decisões correntes, mas é subordinada a ela no caso do processo de crescimento.
  • 6
    Ver Silva (1989SILVA, V. M. (1989) A Regulação do Mercado Brasileiro de Trigo: seus beneficiários e prováveis consequências da desregulação. São Paulo, 1989. (Dissertação de mestrado na FEA-USP.)).
  • 7
    Não será examinada a indústria de rações, pela impossibilidade de distinguir das demais as firmas que usam farelo de trigo e em que proporção.
  • 8
    O valor da produção corresponde ao valor de venda dos produtos fabricados, excluídos os impostos indiretos.
  • 9
    Inclui salários, retiradas, gratificações, ajuda de custo, 13o e remuneração de dez dias de férias, bem como previdência social relativa à parte do empregado.
  • 10
    Inclui matérias-primas, materiais e componentes, energia elétrica, combustíveis e lubrificantes e custos dos serviços contratados.
  • 11
    O VTI é o resultado da subtração do valor da produção dos custos das matérias-primas e componentes, material de embalagem, combustíveis e lubrificantes, energia elétrica e pagamento dos serviços contratados e corresponde ao valor agregado pela firma sobre as matérias-primas. O VTI inclui também outros custos indiretos como propaganda, viagens do staff etc.
  • 12
    A relação técnica entre a matéria-prima e o mix de produto final permite tratar a evolução do lucro por tonelada de matéria-prima como semelhante ao lucro por tonelada de produto final.
  • 13
    Ver Silva (1989SILVA, V. M. (1989) A Regulação do Mercado Brasileiro de Trigo: seus beneficiários e prováveis consequências da desregulação. São Paulo, 1989. (Dissertação de mestrado na FEA-USP.)).
  • 14
    JEL Classification: Q18; L66.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Nov 2023
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 1991
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