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O enfoque transdisciplinar de Celso Furtado acerca do desenvolvimento econômico

Celso Furtado’s transdisciplinary view on economic development

RESUMO

O objetivo principal deste trabalho é trazer uma visão diferente da exposta em trabalhos anteriores que abordaram o “processo de desenvolvimento” na obra de Furtado. Em consonância com seus escritos metodológicos, argumentamos que Furtado extrapolou, em sua formulação do “processo de desenvolvimento”, os limites da ciência econômica, divergindo, desse modo, dos modelos de crescimento econômico convencionais. Além disso, destacamos que o referido autor conseguiu combinar, de maneira criativa, diferentes aspectos das formulações precedentes sobre o desenvolvimento econômico.

PALAVRAS-CHAVE:
Celso Furtado; processo de desenvolvimento; transdisciplinaridade

ABSTRACT

The main objective of this work is to bring a different perspective from that presented in previous works on the “development process” in Furtado’s thought. In line with his methodological writings, we argue that Furtado extrapolated, in his formulation of the “development process”, the limits of economic science, thus diverging from conventional economic growth models. Furthermore, we emphasize that the referred author managed to combine, in a creative manner, different aspects of the previous formulations on economic development.

KEYWORDS:
Celso Furtado; development process; transdisciplinarity

INTRODUÇÃO

Furtado entendia o processo de desenvolvimento econômico como algo mais do que crescimento econômico ou acumulação de capital. Para ele, o desenvolvimento compreende também mudanças estruturais que ocorrem a partir de um determinado sistema de valores e de uma determinada estrutura social. Como o desenvolvimento não ocorre de forma automática, sendo o resultado de decisões tomadas por indivíduos inseridos dentro de um determinado contexto social e que ocupam posições de força no sistema, o “projeto de vida” de determinada coletividade (ou, ao menos, de seus elementos dominantes) determina os rumos desse processo. Ao se desenvolver, uma sociedade transforma a sua estrutura produtiva, mas também sua escala de valores, à medida que a renda cresce e o equilíbrio de forças tende a se alterar ao longo do tempo. Para tratar de um fenômeno com esta natureza, o conhecimento fornecido pela teoria econômica era considerado insuficiente por Furtado. É necessária, segundo o autor, uma visão “global” acerca do processo de mudança social - a qual, de maneira geral, escapa aos economistas -, entrosando saberes de diversas áreas da ciência social em um mesmo corpo teórico.

Desenvolvimento e subdesenvolvimento constituem o eixo central da obra furtadiana. Este trabalho ocupa-se do primeiro destes termos, mais particularmente da formulação analítica do autor acerca do “processo de desenvolvimento”, na qual são apresentadas, de forma mais ou menos esquemática, as mudanças ao longo do tempo e as relações entre as principais variáveis econômicas que se articulam nesse processo, quais sejam, produtividade, acumulação de capital, progresso técnico e diversificação da procura. Tal formulação passou por mudanças marginais até Teoria e Política do Desenvolvimento Econômico. Boianovsky (2010Boianovsky, Mauro (2010) “A view from the tropics: Celso Furtado and the theory of economic development in the 1950s”, History of Political Economy, 42(2): 221-266., p. 222) a descreve da seguinte forma: “Furtado’s application of the Harrod-Domar model to explain the ‘mechanism of development’. No entanto, consideramos que, em Teoria e Política, há uma variação importante na explicação de Furtado (não assinalada pelo referido autor), com a inclusão de variáveis sociais e políticas em seu bojo. Nesse novo formato, classes com interesses divergentes buscam ampliar a sua participação na renda e o poder que exercem sobre os demais, gerando modificações nos parâmetros econômicos. A interpretação sugerida neste artigo também vai de encontro à de Heller e d’Arbo (2012Heller, Claudia e Renata Cipolli d’Arbo (2012) “Evolução da abordagem analítica da teoria do desenvolvimento de Celso Furtado”, Cadernos do Desenvolvimento, 7(10): p. 17-40. Disponível em: < Disponível em: http://www.cadernosdodesenvolvimento.org.br/ojs-2.4.8/index.php/cdes/article/view/200 >. Acesso em: 30 jul. 2020.
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). Segundo elas,

[...] mesmo na última versão o conteúdo é o da teoria convencional do crescimento (baseada nas contribuições de autores como Harrod, Domar, Solow e Kaldor), sem as necessárias e prometidas adaptações para a questão do desenvolvimento ou subdesenvolvimento (Heller e d’Arbo, 2012Heller, Claudia e Renata Cipolli d’Arbo (2012) “Evolução da abordagem analítica da teoria do desenvolvimento de Celso Furtado”, Cadernos do Desenvolvimento, 7(10): p. 17-40. Disponível em: < Disponível em: http://www.cadernosdodesenvolvimento.org.br/ojs-2.4.8/index.php/cdes/article/view/200 >. Acesso em: 30 jul. 2020.
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, p. 19).

Com efeito, ao contrário do ponto de vista defendido neste artigo, ambos os trabalhos parecem negar que a orientação metodológica transdisciplinar de Furtado tenha sido aplicada em sua elaboração analítica acerca do processo de desenvolvimento. Cumpre assinalar que esse tipo de interpretação não é novo. Já nos 1970, pensadores importantes nas ciências sociais acusaram o estruturalismo latino-americano de ser economicista, ou seja, de deixar em segundo plano variáveis sociais e políticas, embora não seja exatamente este o caso em tela. Em contraposição, Fonseca (2009Fonseca, Pedro Cezar Dutra (2009) “A política e seu lugar no estruturalismo: Celso Furtado e o impacto da Grande Depressão no Brasil”, EconomiA, 10(4): 867-885. Disponível em: < Disponível em: http://professor.ufrgs.br/pedrofonseca/files/a_politica_e_seu_lugar_no_estruturalismo.pdf >. Acesso em: 30 jul. 2020.
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) não apenas mostra que Furtado considerava metodologicamente importante a integração de fatores dessa natureza, mas também que estes estavam presentes no seio de sua conhecida análise sobre os desdobramentos no Brasil da crise financeira de 1929, fornecida em Formação Econômica do Brasil. Nesse sentido, o presente trabalho é, em certa medida, complementar ao de Fonseca (2009Fonseca, Pedro Cezar Dutra (2009) “A política e seu lugar no estruturalismo: Celso Furtado e o impacto da Grande Depressão no Brasil”, EconomiA, 10(4): 867-885. Disponível em: < Disponível em: http://professor.ufrgs.br/pedrofonseca/files/a_politica_e_seu_lugar_no_estruturalismo.pdf >. Acesso em: 30 jul. 2020.
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), na medida em que aborda outros textos teórico-metodológicos em que Furtado trata da necessidade de uma abordagem que ultrapasse os limites estreitos da Economia, bem como joga luz sobre variáveis sociais e políticas que passaram praticamente despercebidas em interpretações anteriores sobre o processo de desenvolvimento em Furtado.

Todavia, antes de tratar desses pontos, na próxima seção realiza-se uma breve incursão nos comentários do autor acerca das teorias de desenvolvimento na ciência econômica, a fim de evidenciar os pontos de convergência e divergência com sua própria abordagem, algo que não fica muito claro se passarmos diretamente a esta1 1 De acordo com Bresser-Pereira (2001), o pensamento de Furtado é marcado por sua independência teórica. Ele extraía de cada teoria aquilo que julgava relevante para interpretar os fenômenos econômicos. Assim, embora tenha aprendido com Keynes e Marx, entre outros, ele não era nem marxista nem keynesiano, muito menos neoclássico (devendo pouco a esta escola). Sobretudo, ele não aplicava esse conhecimento absorvido de outros de maneira ortodoxa, sem críticas. . Na seção seguinte, são tratados os textos teórico-metodológicos de Furtado, no sentido mencionado acima. Em seguida, reconstitui-se sua formulação analítica concernente ao processo de desenvolvimento, chamando a atenção para as relações existentes entre as variáveis econômicas e não econômicas. Uma breve seção conclusiva encerra o trabalho.

AS TEORIAS DE DESENVOLVIMENTO NA CIÊNCIA ECONÔMICA

Começando em A Economia Brasileira e passando por Desenvolvimento e Subdesenvolvimento e pelas diferentes edições de Teoria e Política do Desenvolvimento Econômico, encontram-se versões ampliadas e levemente modificadas do texto “A teoria do desenvolvimento na ciência econômica”, no qual Furtado apresenta e analisa os pontos fortes e os problemas das diferentes teorias do desenvolvimento que se pode depreender das principais tradições no pensamento econômico. Nesta seção, são resumidos os comentários do autor presentes nesta última obra (edição Os Economistas), intercalados por outros textos de Furtado. Por conta da delimitação de espaço, não é possível apresentar as referidas teorias, de tal forma que o foco recai sobre os problemas assinalados por Furtado em cada uma delas.

Os economistas clássicos, com exceção de Adam Smith - que abordou o problema da produtividade do ponto de vista da divisão social do trabalho, fruto da “propensão natural à troca” e limitada pela extensão do mercado -, trataram da distribuição do produto social, sem, contudo, atentar para as causas e os mecanismos que levavam à expansão desse produto. Em outras palavras, a acumulação era um dado na questão (mais relevante) da distribuição. Esse enfoque distributivista dos autores clássicos, que ganhou corpo com David Ricardo, resultou no caráter essencialmente abstrato de suas teorias, um dos alvos das críticas de Furtado direcionadas a essas formulações. Para ele, a teoria do desenvolvimento tem necessariamente um duplo caráter. Por um lado, ela deve estabelecer, em nível mais elevado de abstração, relações estáveis entre variáveis quantificáveis e consideradas relevantes para a análise em questão. Tal trabalho refere-se basicamente à construção de modelos ou esquemas simplificados dos sistemas econômicos existentes. Por outro lado, é importante confrontar essas formulações abstratas com a realidade histórica, com vistas a verificar as limitações dos modelos e, dessa forma, propor alterações que os tornem válidos para determinada realidade. Ou seja, uma teoria do desenvolvimento (digna do nome) não pode ser tão somente a descrição histórica de casos de desenvolvimento, tampouco formulações abstratas que ignorem o fator tempo (isto é, a irreversibilidade dos processos econômicos) e as diferenças estruturais entre economias de graus distintos de desenvolvimento. Ao tratar o problema da acumulação do ponto de vista da distribuição, os economistas clássicos a partir de Ricardo ficaram mais sujeitos a negligenciar a dimensão histórica do desenvolvimento, a qual é geralmente trazida à tona quando abordamos o mundo da produção.

Outro ponto duramente criticado por Furtado é a tendência à estagnação presente (implícita ou explicitamente) nas formulações à época. Com base no “princípio da população” e na “lei de rendimento decrescentes”, desenvolvidos por Malthus e Ricardo respectivamente, chegava-se, convenientemente (por conta do objetivo político da argumentação), a um estado estacionário, onde os lucros dos capitalistas (elemento dinâmico da sociedade) eram pressionados tanto por aumentos arbitrários dos salários quanto por elevação da renda da terra. A ideia básica era de que salários acima do nível de subsistência causariam crescimento da população, o que levaria à ocupação de novas terras, de qualidade inferior. Por conta da menor produtividade dessas terras, os preços dos alimentos subiriam, gerando elevação do custo de mão de obra. Os grandes beneficiários desse processo seriam os proprietários de terra, em detrimento dos capitalistas e dos trabalhadores. Reconhecia-se que o emprego de máquinas (para se contrapor à elevação do custo da mão de obra), assim como a exportação de capitais, poderia alterar os termos do problema, mas, por não abordarem o problema do ponto de vista da produção, foram limitadas as conclusões extraídas desse fato pelos autores. As economias continuavam presas, de acordo com essas formulações, em sua propensão ao estado estacionário, transformada por Marx em momento seguinte:

Dessas leituras [de O Capital], ficaram-me, contudo, algumas ideias que se incorporarão definitivamente à minha forma de ver os processos econômicos. A primeira dessas ideias [...] é a da importância decisiva do progresso tecnológico. A outra é que os capitalistas tendem compulsivamente a acumular capital, ou seja, tentarão romper todos os obstáculos que lhes opuserem nesse caminho. Essa ideia permitirá afastar o mito do estado estacionário, implícito tanto nos esquemas clássicos como nos neoclássicos (Furtado, 2013Furtado, Celso (2013a) “A crise econômica contemporânea”. In: Rosa Freire d’Aguiar, org. Essencial Celso Furtado. São Paulo: Penguin Classics Companhia das Letras: 235-250.b, pp. 45-46, grifo do autor).

Porém, antes de entrar na leitura furtadiana de Marx, vejamos como Furtado se posicionou em relação à teoria de desenvolvimento neoclássica (se é possível usar esse termo), pois, como assinalado na citação acima, o estado estacionário também está presente nessa teoria. Mas não como uma situação-limite para a qual tendiam as economias, como em Ricardo e Malthus, e sim como aquela em que os recursos são utilizados da forma mais racional possível, como explicado no parágrafo abaixo. Ademais, há por parte do pensamento neoclássico um foco ainda mais exclusivo na distribuição do produto social, relegando à História o estudo da organização da produção e suas mudanças.

Embora se utilize de alguns instrumentos desenvolvidos por ela, Furtado critica o forte conteúdo apologético da teoria neoclássica, de justificação da ordem social vigente como a que proporciona o uso mais racional de recursos. Nesse sentido é que aparecem os termos “maximizar” e “otimizar” vinculados ao comportamento de todos os agentes econômicos. Além disso, a acumulação de capital é, dentro dessa chave de leitura, o resultado da boa disposição de indivíduos para realizar alguma forma de sacrifício (poupança). Da mesma forma, a teoria dos salários dos clássicos, de conteúdo sociológico, que postulava uma oferta ilimitada de mão de obra e a tendência aos salários se manterem ao nível de subsistência, é substituída por outra, que atribui a cada fator de produção a parte que lhe corresponde. Com isso, acabava-se também com a ideia de excedente, tão bem utilizada pelos críticos ao sistema como forma de apontar para a disparidade da remuneração de trabalhadores e capitalistas. Nesse quadro, as ideias de acumulação de capital e desenvolvimento tornam-se esdrúxulas, pois a primeira pressupõe perspectiva de lucro futuro e este somente pode existir se a distribuição ótima dos fatores ainda não foi alcançada. Caso se atinja esse estado de coisas, não existirá mais lucro e, portanto, motivação para acumular capital; do contrário, a existência de um excedente mostra que é possível aumentar a produtividade marginal de um ou outro fator por meio da realocação de recursos. O estado ótimo do sistema é o estado estacionário.

Furtado enquadra Schumpeter dentro da tradição neoclássica, embora não o considere um representante típico2 2 Em Pequena introdução ao desenvolvimento Furtado insere um matiz nessa classificação, situando-o em “uma posição especial entre a tradição historicista e a neoclássica” (1980, p. 31). . Partindo da teoria do equilíbrio geral, porém subvertendo-a, esse autor cria uma teoria do desenvolvimento que identifica no empresário inovador e no sistema de crédito, que lhe serve de esteio, os elementos propulsores do desenvolvimento. Nesse contexto, ao invés de justificar o lucro como fizeram os neoclássicos, Schumpeter o explica como resultado da introdução de novas combinações (inovação) e da posição de monopólio, que algumas firmas atingem, temporariamente, por terem introduzido algo novo ao sistema, cujo efeito consiste em o deslocar para um novo patamar. Em virtude de ter analisado o sistema capitalista do ponto de vista da produção, Schumpeter estava em posição privilegiada para entender a importância do progresso tecnológico para o seu desenvolvimento, e é por essa mudança de enfoque, principalmente, que Furtado considera sua obra tão atual e fecunda.

Todavia, são claras as suas divergências com o pensamento do economista austríaco. A primeira delas se refere ao fato de ter tratado o empresário fora do seu contexto histórico, de modo que a introdução da inovação aparenta ser fruto de um dom do espírito humano, à semelhança do comerciante natural smithiano. Para Furtado, há outras razões (que não esse espírito inovador), relacionadas à necessidade de encontrar fontes alternativas de aplicação dos recursos acumulados previamente e/ou introdução de novas técnicas que reduzam os custos de produção, que justificam o progresso tecnológico e as inovações. Como se sabe, o emprego de uma nova máquina somente faz sentido se representar uma economia para o empresário vis-à-vis o custo da mão de obra. Isso pressupõe determinado nível de acumulação de capital, levando-nos, por essa via, à segunda divergência explicitada por Furtado (mais relevante para o propósito deste trabalho), a saber: ele considera um grave equívoco da análise schumpeteriana tratar a introdução de novas combinações isolada do processo de acumulação de capital (difusão de inovações). Para Schumpeter, o verdadeiro ato de desenvolvimento é constituído pela introdução da inovação, sendo a sua propagação (difusão) - etapa na qual os demais empresários imitam o empresário inovador e eliminam, por esse meio, a taxa de lucro extraordinária obtida por este - de menor relevância. Furtado, por seu turno, trata a inovação e a difusão de inovações como dois lados (que se retroalimentam) do processo acumulativo, ambos essenciais do ponto de vista do desenvolvimento.

De outro lado, Marx desenvolveu essa teoria da acumulação de capital (e a vinculou ao progresso técnico), mas o fez em bases inconsistentes, de acordo com Furtado. Em primeiro lugar, partindo da observação da realidade em sua época, marcada pela introdução de máquinas na agricultura e consequente migração da mão de obra para os centros urbanos, bem como pela desorganização da atividade artesanal nesses centros, Marx supôs uma oferta de mão de obra perfeitamente elástica, mediante a introdução de um persistente “exército industrial de reserva” em seu modelo explicativo. Para Furtado, esse elemento foi incluído de forma arbitrária, a fim de permitir a Marx chegar à conclusão de que o desenvolvimento das forças produtivas resultava em um aumento do desemprego e na pauperização da classe trabalhadora. Para a colocar em bases consistentes, Marx teria que ter demonstrado que esse excedente de mão de obra, resultante de uma etapa da evolução do modo de produção capitalista, era uma característica mais perene do sistema, decorrente de suas contradições internas. Em vez disso, ele a atribui ao avanço da técnica e ao crescente “desemprego tecnológico”, o que, segundo Furtado, “carece de consistência lógica”, pelas seguintes razões: primeiro, uma vez que o capitalista é impelido a inverter seu capital, não seria fácil conciliar esse desemprego com a existência de capitais ociosos; segundo, supondo que todos os capitais estivessem sendo empregados produtivamente e que o avanço da técnica ocorresse mais rapidamente que a acumulação de capital, o aumento de produtividade decorrente do progresso tecnológico apareceria ou na forma de maiores lucros (e, neste caso, a mão de obra sobrante seria progressivamente absorvida mediante a aplicação desses capitais)3 3 Se o progresso tecnológico avança em um ritmo maior do que a acumulação de capital, a absorção dessa mão de obra seria retardada. ou de elevação dos salários reais (situação incompatível com a existência de uma grande massa de desempregados).

Em segundo lugar, Furtado aponta para uma contradição entre a ideia abordada acima de pauperização da classe trabalhadora e a segunda tese desenvolvida por Marx, para comprovar que o sistema se movia criando contradições crescentes, qual seja, a queda tendencial da taxa de lucro. Ao contrário dos autores clássicos que fundamentaram no “princípio da população” a tendência de declínio da taxa de lucro no longo prazo, Marx a tratou como decorrente do aumento da composição orgânica do capital, isto é, da substituição de trabalho por capital. Ocorre que somente se o custo da mão de obra for superior ao emprego de novas máquinas essa troca se realizará, de modo que o número de trabalhadores sem ocupação deve ser baixo. Em síntese, se a taxa de lucro estiver caindo, a parte do produto líquido destinada aos trabalhadores deve necessariamente aumentar, o que não é consiste com o persistente desemprego resultante da lei geral de acumulação capitalista4 4 São do texto original de Furtado os adjetivos “grande” e “persistente” para caracterizar o exército de trabalhadores reserva. .

A dificuldade de se criticar Marx, consoante Furtado, reside no fato que sua teoria econômica foi desenvolvida para fundamentar a posição filosófica do autor perante a história. Tal tese, devido ao seu conteúdo evolutivo-finalista, somente pode ser aceita ou rejeitada no plano dos juízes do valor. Ainda que Furtado não negue a tese de que o capitalismo tende a ser superado, considera que a tentativa de Marx de respaldá-la na ciência econômica não foi bem-sucedida, acusando-o de usar “com demasiada largueza os instrumentos da análise econômica” e provar “muito mais do que era possível fazê-lo com os instrumentos de análise que tinha em mãos” (1967Furtado, Celso (1967[1983]) Teoria e política do desenvolvimento econômico. São Paulo: Abril Cultural., p. 33). Para Furtado, a experiência histórica demonstrava que o desenvolvimento do capitalismo ocorria com salários reais crescentes e sem tendência sensível de modificação da distribuição do produto líquido em favor dos capitalistas. Tal cenário não poderia coexistir com uma massa amorfa de desempregados, permanentemente em posição defensiva. Os trabalhadores, ao contrário, ameaçavam a posição dos capitalistas, dando novo fôlego ao processo de acumulação.

Furtado observa que houve um vácuo importante na evolução das ideias econômicas em torno do desenvolvimento desde os clássicos (inclusive Marx) até praticamente Keynes, período no qual houve predomínio da ideologia liberal. Mais precisamente, foi com o aparecimento das teorias de ciclo econômico e a tomada de consciência de que eram necessárias medidas de caráter não monetário para a sustentação do nível de emprego que se retoma a temática do desenvolvimento. Keynes foi, para Furtado, um marco importante nesse processo, por ter superado a premissa neoclássica de pleno emprego e ter centrado sua análise no investimento, ao qual atribui fundamental na determinação da renda e do emprego. Por conta de sua perspectiva de curto prazo, porém, ignorou fenômenos importantes, como a acumulação de capital, o crescimento populacional, o progresso tecnológico etc. Alvin Hansen retomou esses pontos para analisar a estagnação da economia norte-americana nos anos 1930, mas suas reflexões eram dificilmente generalizáveis por estarem muito focadas nos problemas específicos dessa economia.

Posteriormente, houve, como se sabe, um esforço de dinamização do modelo keynesiano, que evoluiu, de um lado, mais próximo ao pensamento neoclássico, a partir da introdução de uma função de produção de coeficientes variáveis, através de um sistema de preços flexíveis. De acordo com Furtado, essa vertente dos modelos de crescimento restaurou a importância dos automatismos internos na determinação do equilíbrio dinâmico, ignorando o esforço do pensamento keynesiano em identificar as causas estruturais responsáveis pelo funcionamento inadequado das economias. De outro lado, indo ao encontro da tradição clássica, procuraram ligar os problemas do crescimento aos fatores de natureza estrutural que condicionam a repartição da renda. Tal esforço guarda semelhanças com o de Furtado, na medida em que analisa o comportamento de alguns agentes responsáveis por decisões de caráter estratégico. Entretanto, embora Furtado considere que as teorias de crescimento representaram avanços importantes para a análise macroeconômica e que tenham permitido fundar sobre bases mais sólidas as políticas econômicas, sua apreciação é menos positiva do ponto de vista da teoria do desenvolvimento. Uma vez que o fenômeno do desenvolvimento se caracteriza por transformações estruturais relevantes - e, portanto, pela interação entre o “econômico” e o “não econômico” - não cabe dentro dos marcos restritos dessas teorias. Em virtude da forma como apreendem a realidade econômica, não conseguem registrar as complexas relações que ocorrem na fronteira do sistema econômico, escapando-lhes sua “multidimensionalidade” (Furtado, 1980Furtado, Celso (1980[1981]) Pequena introdução ao desenvolvimento: enfoque interdisciplinar. São Paulo: Ed. Nacional. ).

Em Desenvolvimento e Subdesenvolvimento, Furtado observa que:

A teoria do desenvolvimento econômico não cabe, nos seus termos gerais, dentro das categorias da análise econômica. É esse um ponto de vista já bastante aceito hoje em dia, e caberia apenas citar os seminários sobre desenvolvimento, organizados pela Universidade de Chicago, a partir de 1951, dos quais participam sociólogos, antropólogos, e historiadores ao lado de economistas. A análise econômica não nos pode explicar a dinâmica das mudanças sociais senão de maneira limitada (1961, p. 84).

TRANSDISCIPLINARIDADE

Em diferentes momentos na sua vasta obra, Furtado enfatiza o caráter transdisciplinar do estudo do desenvolvimento econômico. A seguir, são abordados os trechos que consideramos ser os mais significativos.

No Anexo Metodológico, situado logo após a primeira parte de Teoria e Política do Desenvolvimento Econômico, Furtado argui que o comportamento dos parâmetros não econômicos “devem ser objeto de meticuloso estudo” (1967Furtado, Celso (1967[1983]) Teoria e política do desenvolvimento econômico. São Paulo: Abril Cultural., p. 72), pois a natureza destes pode modificar-se significativamente em fase de rápida mudança social ou quando se amplia o horizonte de análise e, sobretudo, o comportamento das variáveis econômicas depende em grande medida desses parâmetros. Essa observação, segundo ele, é particularmente pertinente com respeito a sistemas econômicos heterogêneos, social e tecnologicamente, como é o caso de países subdesenvolvidos. Por exemplo, seria de difícil compreensão a rigidez de oferta de alimentos, que se observa em algumas dessas economias, sem um conhecimento prévio de sua estrutura agrária. Da mesma forma, a orientação das inovações técnicas e a tendência à concentração de renda tornam-se inteligíveis somente a partir da análise do sistema de decisões (cujo controle pode estar nas mãos de grupos estrangeiros) e de seu dualismo estrutural, respectivamente.

Preocupada em identificar as características específicas das economias subdesenvolvidas e sua forma de “desenvolvimento”, a escola estruturalista latino-americana, a partir dos anos 1950, procurou pôr em evidência esses parâmetros não econômicos, desenterrando-os da matriz estrutural dos modelos5 5 Para Furtado, a matriz estrutural é constituída pela forma como o vetor de variáveis exógenas determina o vetor de variáveis endógenas, isto é, o conjunto de relações precisas entre as variáveis. Em função de chamarem atenção para os parâmetros não econômicos, que integram a matriz estrutural dos modelos, é que o grupo de economistas reunidos na Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), sob a liderança de Raúl Prebisch, recebeu o nome de “estruturalistas”. . Nesse sentido, Furtado considera que essa escola retomou a tradição do pensamento marxista, na medida em que este último colocou em primeiro plano a análise das estruturas sociais como meio para compreender o comportamento das variáveis econômicas. Porém, os estruturalistas o fizeram a partir de um sistema de enunciados gerais muito próximo da análise econômica convencional e, já em meados dos anos 1970, essa empresa estava em fase de rendimentos decrescentes, uma vez que o considerável aumento do fluxo de informações gerava modesta eficácia, em termos relativos, no plano explicativo. Era preciso, portanto, livrar-se das limitações impostas por esses enunciados gerais, cujo efeito foi delimitar o horizonte especulativo (Furtado, 1976Furtado, Celso (1976[1977]) Prefácio a nova Economia Política. Rio de Janeiro: Paz e Terra.).

Em Prefácio a nova Economia Política, Furtado propõe uma reconstrução do quadro conceitual com que trabalham os economistas. Para ele, o conhecimento superficial do conjunto da realidade social a partir do qual os modelos econômicos eram formulados era suficiente para abordar os problemas de curto prazo (“estática econômica”), mas não as questões que preocupam os teóricos do desenvolvimento, as quais dependiam da elaboração de uma “dinâmica econômica”. Ocorre que, nos esforços até a época empreendidos nesse sentido - como, por exemplo, no caso dos modelos de crescimento, em suas versões neoclássica e keynesiana, mencionados acima -, o fator tempo, que, anteriormente, havia sido eliminado a fim de que os problemas pudessem ser tratados com os instrumentos matemáticos e econométricos usuais, era reintroduzido mantendo, contudo, o mesmo grau de simplificação. Ou seja, a dinâmica econômica fora desenvolvida como se abordar as questões dessa ótica não implicasse necessariamente em torná-los mais complexos, ultrapassando os limites do econômico. Em contraposição, Furtado defendia que a reconstrução desse quadro conceitual passava por uma compreensão dos processos sociais globais, a partir de uma “teoria geral das formações sociais”. Nas palavras do autor,

Não se trata do que convencionalmente se chama enfoque interdisciplinário, e sim de sair em busca de uma teoria social global, na qual entronquem a teoria da reprodução da população, a teoria das decisões intertemporais, (acumulação), a teoria da estratificação e a teoria do poder (Furtado, 1976Furtado, Celso (1976[1977]) Prefácio a nova Economia Política. Rio de Janeiro: Paz e Terra., p. 11, grifo nosso).

Para realizar essa tarefa de fundar uma teoria que integrasse em seu quadro conceitual os conhecimentos pontuados acima, Furtado sugere o conceito de excedente - abandonado, no século XIX, com a intenção de se fundar uma ciência econômica pretensamente pura, isto é, independente do conhecimento das estruturas sociais - como um ponto de partida privilegiado. A fim de que esse excedente seja formado, a divisão social do trabalho é condição necessária, mas não suficiente. Furtado relata que há evidências abundantes, derivadas das pesquisas antropológicas e históricas, de que a existência do homem sempre esteve ligada a formas de divisão social do trabalho, ou especialização, ao nível dos sexos, grupos etários ou grupos sociais mais complexos. De maneira geral, essa especialização acarretou aumento da eficiência do trabalho e, por conseguinte, incremento do produto social, o que deu origem a um crescimento populacional. O aumento da população seria, portanto, uma primeira evidência da formação de um excedente. No entanto, se esse maior produto fosse utilizado somente para satisfazer as necessidades básicas da população, não teria por que falar em excedente, que pela própria definição quer dizer algo além dos recursos necessários para garantir a mera sobrevivência. Assim, para que exista um excedente, é vital a estratificação da sociedade em grupos com diferentes graus de poder, de modo que sua fração dominante delimite o nível de consumo equivalente às necessidades básicas da população. Isto é, não é concebível excedente em uma sociedade onde todos recebem por aquilo que produzem, sem que um grupo, por sua posição de mando, possa se apropriar do trabalho alheio e, dessa forma, restringir o que lhe cabe dentro do produto social. De acordo com Furtado,

O grande alcance ideológico da ciência econômica, no sentido de contribuir para facilitar o desenvolvimento das forças produtivas no quadro do capitalismo, radica em que ela contribui para ocultar o elemento de poder que existe nas decisões econômicas, assimilando-as a “automatismos” ou “mecanismos”, cujas leis deviam ser “descobertas” e escrupulosamente respeitadas (1976Furtado, Celso (1976[1977]) Prefácio a nova Economia Política. Rio de Janeiro: Paz e Terra., p. 30).

O caso emblemático de ocultação desse elemento de poder que permeia as relações sociais - e, por conseguinte, econômicas - é o tratamento dispensado pela economia convencional à natureza das decisões tomadas pelas firmas. Estas são abordadas como correias de transmissão das informações fornecidas pelos mercados, alheias, portanto, a qualquer elemento de poder, o qual, quando reconhecido, como nos casos de concorrência imperfeita, agiria contra a eficiência do mercado. Para Furtado, ao contrário, as firmas apropriam-se de parcela do produto social exatamente graças às formas de poder que exercem, cobertas pelo “grau de monopólio” kaleckiano. Ao manipularem os preços, as empresas não apenas transferem renda entre elas, mas podem anular ganhos salariais conquistados pelos trabalhadores e reduzir, por conta da elevação do nível de preços, a parcela do produto social correspondente aos detentores de títulos; afetando também a parte destinada ao Estado e demais grupos sociais.

Os salários, com valores correspondentes à produtividade marginal do trabalhador (isto é, a parcela do produto gerado pelo indivíduo isolado), é outra ficção produzida pelo mainstream da economia que é alvo de críticas de Furtado, pois em um sistema de produção altamente diversificado, no qual todos os elementos são interdependentes, a interrupção de uma tarefa tem efeitos sobre o conjunto, sendo impossível estabelecer a priori se determinada atividade é mais importante do que a outra. O mesmo valendo para um setor de atividade econômica e para uma empresa, cuja atividade pode ser paralisada total ou parcialmente por conta da operação deficiente de uma máquina. De maneira que, a rigor, a produtividade do trabalho somente pode ser medida com respeito ao conjunto da força de trabalho de uma economia. Assim, são fatores não-econômicos, de cunho político-institucional, e, particularmente, a organização da classe trabalhadora e sua expressão política que respondem pelas diferenças nacionais concernentes à participação da classe trabalhadora na apropriação do produto.

Ou seja, os valores das variáveis macroeconômicas como preços, salários e juros são tratados por Furtado (2013Furtado, Celso (2013a) “A crise econômica contemporânea”. In: Rosa Freire d’Aguiar, org. Essencial Celso Furtado. São Paulo: Penguin Classics Companhia das Letras: 235-250.a, p. 238) como “expressão do equilíbrio existente entre as forças sociais que disputam a apropriação da renda”.

A taxa de juros é inicialmente de caráter institucional, sendo a expressão de uma relação de forças; só secundariamente ela traduz a ação de outros fatores, como modificação na oferta de poupança ou no nível de atividade econômica. Aqueles que podem criar liquidez e/ou administram os ativos líquidos e semi líquidos da coletividade [...] dispõe de considerável poder. Um banco se assemelha muito mais a um cartório do que a uma empresa marshaliana (Furtado, 1976Furtado, Celso (1976[1977]) Prefácio a nova Economia Política. Rio de Janeiro: Paz e Terra., p. 50).

Não se pode deixar de mencionar, por conta da importância que ocupa na exposição furtadiana no Prefácio a nova Economia Política e do método histórico utilizado pelo autor, que esse quadro conceitual formado a partir da ideia de excedente permite uma leitura de todas as formações sociais (pré e pós-capitalistas). Furtado divide as sociedades entre aquelas em que predominava a forma autoritária de extração do excedente - como, por exemplo, na escravidão, na qual o uso da coação constituía o elemento central - e outras formações sociais onde o excedente era extraído de forma mercantil, fruto do aumento de produtividade possibilitado pelas relações de intercâmbio. Mas destaca que a separação entre elas é imperfeita, como no caso de um agente que ocupa uma posição estratégica dentro de uma indústria ou está na vanguarda tecnológica, possibilitando que controle certos preços; ou no caso da exploração monopolista de um serviço público; ou, ainda, quando um especulador, mediante a manipulação da informação, obtém um ganho de capital com a valorização dos ativos imobiliários (Furtado, 1980Furtado, Celso (1980[1981]) Pequena introdução ao desenvolvimento: enfoque interdisciplinar. São Paulo: Ed. Nacional. ). Além disso, cumpre assinalar que para Furtado o modo capitalista de produção6 6 Furtado distingue modo capitalista de produção de capitalismo. Este ele define como toda formação social onde o uso de um excedente serve como instrumento para captação de outro excedente, ao passo que o primeiro se refere, de forma mais restrita, à aplicação à organização da produção da forma mercantil de apropriação do excedente. não surge como mera difusão da economia de mercado, como descrito pela parte majoritária da profissão, que tende a observar os fenômenos do seu lado externo. Como observado previamente, os fenômenos sociais aparecem como resultado das mudanças observadas ao nível das estruturas de poder, de modo que, nesse caso, foi a mudança na posição de força da burguesia, capacitando-a para atacar tanto a agricultura feudal quanto manufatura artesanal, que possibilitou a organização da produção nos moldes capitalistas.

Por fim, em Pequena introdução ao desenvolvimento, Furtado amplia ainda mais o escopo de suas reflexões sobre o caráter transdisciplinar do estudo sobre desenvolvimento7 7 O autor apresenta os principais argumentos contidos nos capítulos iniciais dessa obra, em duas versões de tamanhos diferentes, em Furtado (1980, 2013c). . Contra uma visão rasa do processo desenvolvimento, que o enxerga apenas como um incremento do fluxo de bens e serviços superior ao crescimento demográfico (isto é, aumento da renda per capita), o economista brasileiro o entende como uma transformação no conjunto da sociedade para o qual um sistema de valores empresta coerência e sentido. A referência ao sistema de valores é essencial pois a intensificação desse processo ocorre de forma deliberada pela sociedade, requerendo, portanto, escolhas com respeito aos fins desse processo. Isto é, irá se investir em escolas, hospitais, áreas de lazer para a população de menor renda etc., ou o foco será na produção e em uma maior eficiência econômica? E, se o caminho escolhido for o último, como os frutos desse aumento da produtividade serão repartidos entre o conjunto da sociedade e o excedente econômico? Ademais, nem mesmo ideia de satisfação de necessidades elementares da população (presente nas definições correntes de desenvolvimento econômico), quando afastada do mais essencial, encontra nitidez fora de um contexto cultural (isto é, isolada de um sistema de valores), uma vez que não há base objetiva para comparar dois conjuntos de bens materiais sem introduzir elementos subjetivos de cultura. Sabe-se, além disso, que os valores de uma sociedade refletem o equilíbrio de forças dentro dela, de modo que sua concepção de desenvolvimento não é alheia à sua estrutura social.

A discussão sobre progresso técnico feita pelos economistas também fica, de maneira geral, na superfície do problema. Este é tratado, do ponto de vista microeconômico, como a solução encontrada para contornar a escassez relativa de um fator de produção, ao nível da unidade produtiva. Furtado, ao contrário, argumenta que se tratam de mudanças nas estruturas sociais, no conjunto do sistema, que tornam possível a continuação do processo de acumulação de capital, o qual tende a um ponto de saturação, caso não haja redução da demanda por mão de obra ou diminuição das desigualdades sociais. A acumulação pode prosseguir sem alterações profundas nas estruturas sociais em um cenário de ampla elasticidade da mão de obra - como em países subdesenvolvidos ou na fase da transição para o modo capitalista de produção vivenciada pelas economias centrais -, mas, não, a partir do momento em que fez necessário transladados de população, ativação de mão de obra feminina etc., para fazer face à crescente rigidez desse fator. De tal modo que “A reprodução da economia capitalista não é concebível, nem mesmo teoricamente, sem modificações nas estruturas sociais” (Furtado, 1980Furtado, Celso (1980[1981]) Pequena introdução ao desenvolvimento: enfoque interdisciplinar. São Paulo: Ed. Nacional. , p. 10). Dessa forma,

Por trás do que chamamos progresso técnico enfileiram-se complexas modificações sociais, cuja lógica devemos tentar compreender como passo preliminar em todo estudo do desenvolvimento (Furtado, 1980Furtado, Celso (1980[1981]) Pequena introdução ao desenvolvimento: enfoque interdisciplinar. São Paulo: Ed. Nacional. , p. 9).

Contudo, o problema da inovação técnica é ainda mais complexo. Na visão de Furtado, as técnicas representam formas de comportamento, as quais não são independentes de um determinado sistema de valores. Assim, quando se difunde uma tecnologia, está, em realidade, se transmitindo um estilo de vida. Isso implica a adoção dos valores da sociedade difusora pela sociedade receptora, bem como a destruição dos valores preexistentes nesta sociedade. De especial importância no pensamento furtadiano é o processo histórico de difusão da civilização industrial, ou seja, a adoção por todos os povos da terra da forma de viver engendrada pela industrialização nos países que a lideram. Há, por parte destes, uma tentativa de ocultação desse vínculo entre acumulação e valores (“estilos de vida”), de forma a não deixar transparecer que existem modos de desenvolvimento hegemônicos que monopolizam a inventividade ao nível dos fins em benefício de certos países.

A fim de desenvolver essa visão mais ampla sobre o desenvolvimento econômico, Furtado reconhece a importância de alguns autores que trabalharam com um quadro conceitual mais amplo do que o da economia convencional. Keynes restabeleceu a primazia do político sobre o econômico, tendo com a macroeconomia keynesiana surgido uma teoria da coordenação das decisões econômicas que valoriza os centros de decisão a nível nacional. Para a teoria do desenvolvimento, a influência de Schumpeter decorre menos de sua visão do desenvolvimento como ruptura do circuito econômico do que de sua insistência nas forças sociais que provocam mutações estruturais e dão especificidade ao processo histórico do capitalismo. A teoria econômica de Marx foi de pouca valia para essa visão, mas sua obra sociológica e de história social tiveram crescente importância. François Perroux, economista francês, geralmente lembrado por seu conceito de “polos de crescimento”, lançou luz sobre o fato que as atividades empresariais são, no essencial, formas de dominação, sendo a inovação técnica um dos focos geradores de poder de maior relevância na sociedade capitalista. A teoria das decisões, presente na obra de Gunnar Myrdal, também exerceria considerável influência, na medida em que essas passariam a ser consideradas fatores de estruturação da realidade econômica, e não apenas reações a situações de mercado. Além deles, Raúl Prebish, Ragnar Nurkse, Arthur Lewis e os trabalhos da escola estruturalista latino-americana são também lembrados por Furtado, como tendo contribuído para atentar seja para heterogeneidade do processo de desenvolvimento seja para as especificidades das sociedades subdesenvolvidas.

A citação, a seguir, parece sintetizar as reflexões de Furtado sobre a multidimensionalidade do processo de desenvolvimento, constituindo, portanto, um fecho adequado para esta seção, cujo intuito foi demonstrar que suas reflexões desbordam, consideravelmente, os limites do econômico:

[...] intenta-se apreender o desenvolvimento como um processo global: transformação da sociedade ao nível dos meios, mas também dos fins; processo de acumulação e de ampliação da capacidade produtiva, mas também apropriação do produto social e de configuração desse produto; divisão social do trabalho e cooperação, mas também estratificação social e dominação; introdução de novos produtos e diversificação do consumo, mas também destruição de valores e supressão da capacidade criadora (Furtado, 1980Furtado, Celso (1980[1981]) Pequena introdução ao desenvolvimento: enfoque interdisciplinar. São Paulo: Ed. Nacional. , p. XI, grifo nosso).

O PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO

Esta seção está baseada principalmente na versão encontrada em Teoria e Política do Desenvolvimento Econômico, pelas razões mencionadas na Introdução. Outra fonte importante para essa reconstituição foi Dialética do Desenvolvimento Capitalista, na qual Furtado também trata de aspectos referentes ao processo de desenvolvimento, embora de forma menos esquemática.

Furtado tem como ponto de partida agentes em posição de força dentro da sociedade, que por conta dela conseguem modificar parâmetros estruturais da economia e condicionar o comportamento de outros agentes, de forma a redistribuir renda a seu favor (isto é, exercem poder sobre os demais). Há, na economia capitalista, diversos agentes com essas características, mas o conflito principal ocorre entre empresários ou capitalistas, de um lado, e trabalhadores de outro. Os dois têm como objetivo aumentar a sua participação no produto social, sendo que os trabalhadores buscam a elevação de seu salário em níveis absolutos ou relativos e os empresários visam a manutenção ou ampliação da remuneração do capital a ser investido vis-à-vis o capital previamente aplicado. Cabe pontuar que o autor enfatiza o aspecto impulsionador que a “luta de classes” tem sobre o desenvolvimento.

Dizer que o entrechoque desses grupos produz desenvolvimento não significa que eles detêm o mesmo poder. Furtado afirma que, ao longo da história, o pêndulo tendeu ora para um lado outro para o outro. Quando, no século XVIII, o modo de produção capitalista estava sendo constituído, a partir da desarticulação da agricultura feudal e da manufatura artesanal, os empresários eram a força motriz do desenvolvimento. Nessa época a mão de obra era abundante, em função dos processos referidos acima, de sorte que os detentores do capital se apropriavam da quase totalidade dos frutos do aumento da produtividade. Assim, cabia a eles, movidos por seu desejo de dominação social, disseminar o modo de produção capitalista e desenvolver as forças produtivas. No entanto, a própria acumulação de capital levaria a balança tender para o outro lado, em um segundo momento. Com a absorção dos trabalhadores antes empregados na agricultura e nas atividades artesanais, a mão de obra passou a crescer de acordo com o crescimento vegetativo da população, bem como se reduziu o número de horas trabalhadas, em função do aparecimento das leis trabalhistas. Nessas condições o poder do trabalhador aumentou, tornando-se a força principal do processo desenvolvimento. Ao contrário do modelo de Marx apreciado acima, a partir desta segunda fase de evolução do modo de produção de capitalista, aos trabalhadores, por meio de sua luta por melhores condições de vida, coube a iniciativa do desenvolvimento, restando aos empresários uma estratégia meramente defensiva.

A essas duas forças equivalem dois tipos de consumidores: um consumidor de tipo A, que têm sua renda oriunda da aplicação do capital, e um consumidor de tipo B, a renda deste dependendo essencialmente do salário. No caso do primeiro tipo, além de o nível de consumo praticamente independer da renda, sendo influenciado, sim, pelos padrões de comportamento social e as possibilidades de consumo oferecidas pelo sistema, sua cesta de bens é bem mais diversificada do que a do segundo tipo, requerendo, portanto, uma estrutura produtiva mais sofisticada, com maior dotação de capital por trabalhador. O consumidor de tipo B, por sua vez, tem seu consumo constrangido pelo nível de renda e a estrutura produtiva necessária para atender suas necessidades é relativamente simples. Da mesma forma, do lado da oferta, Furtado faz uma diferenciação entre duas formas de acumulação de capital, a saber, a acumulação-incorporação de inovações e a acumulação-difusão de inovações. A realização da primeira representa um deslocamento do horizonte de possibilidades tecnológicas, ao passo que a segunda gera uma ampliação do uso das técnicas já conhecidas.

Assim, combinando o lado da oferta e da demanda, o que se tem é o seguinte: toda vez que o consumidor A consegue se apropriar da maior parte do aumento da produtividade, em virtude da maior sofisticação da sua cesta de consumo, o desenvolvimento ocorrerá pela via da acumulação-incorporação de inovações. Esse modelo de desenvolvimento é caracterizado por uma menor demanda por mão de obra e pela ampliação do leque de bens à disposição do consumidor. Ao passo que, se ocorre o contrário, com os trabalhadores sendo bem-sucedidos em sua luta por melhores salários, o consumidor do tipo B irá se aproximar do tipo A, através do consumo de bens que antes somente eram acessíveis a este, e a acumulação se dará pela difusão das possibilidades técnicas desenvolvidas no caso anterior8 8 É importante chamar a atenção a que, ao fazer essas demarcações, Furtado se distancia tanto dos neoclássicos quanto de Schumpeter. Dos primeiros por reconhecer a existência de mais de um tipo de consumidor, enquanto a diferença para o segundo está em atribuir o mesmo grau de importância para a inovação e sua difusão. .

Para Furtado, o desenvolvimento depende da elevação na produtividade e de modificações no perfil da procura. O primeiro gera incremento da quantidade de bens e serviços à disposição da coletividade, o qual se reverte - a não ser em situações periódicas de desocupação dos fatores de produção ou de deterioração dos termos de intercâmbio, quando o aumento de produtividade ocorre no setor exportador - em aumento do fluxo de renda real, provocando alterações na cesta de bens consumida pela população. É fato notório que, quando a renda aumenta, diminui proporcionalmente o consumo de bens alimentícios e se eleva a renda gasta em produtos manufaturados. Isso tem efeitos também sobre a estrutura do sistema produtivo. Assim, o desenvolvimento não poderia prescindir de aumentos contínuos de produtividade, mas, se estes não gerassem diversificação da procura, uma vez satisfeitas as necessidades básicas da população, parte crescente da capacidade produtiva ficaria ociosa, com os ganhos de produtividade resultando apenas em horas suplementares de ócio.

Em níveis baixos de produtividade, a capacidade produtiva é absorvida, em ampla medida, pela satisfação das necessidades elementares da população, restando um excedente ínfimo para cobrir formas diferenciadas de consumo ou inversões. Isso explica as dificuldades das sociedades para superar a tendência à estagnação presente em suas fases iniciais de desenvolvimento. Na ausência de acumulação de capital e progresso técnico, que levem a uma recombinação mais produtiva dos fatores de produção, a única forma de romper este círculo é por meio de alterações no perfil da procura, mas como a procura nessas comunidades concentra-se em produtos essenciais à sua subsistência, essa força deve vir de fora, isto é, do comércio exterior9 9 Esse enredo é valido tanto para as economias subdesenvolvidas quanto para as desenvolvidas, as quais também se valeram do comércio exterior nessa fase inicial de desenvolvimento. O foco desta seção, contudo, é nas economias que atingiram um nível elevado de desenvolvimento, pois as de perfil subdesenvolvido exigem uma análise separada, uma vez que, de acordo com Furtado, possuem formações sociais diferenciadas, com o subdesenvolvimento não constituindo, portanto, uma etapa pela qual passaram todas as economias. .

Desse modo, o contato com outras comunidades cria a renda necessária para dar início a um processo de acumulação de capital. Em virtude de o aumento da produtividade ficar, nesse primeiro momento, restrito ao setor exportador, ele terá principalmente a forma de maiores lucros, abrindo espaço para inversões. Mas, à exceção de casos extremos onde esse comércio não produz aumento algum das remunerações ou o consumo das elites é totalmente satisfeito pelas importações, a diversificação da procura também exercerá um papel relevante, interagindo com a estrutura produtiva local e estimulando, dessa forma, o surgimento de uma produção doméstica que concorra com a advinda do estrangeiro. Importante para determinar a contribuição da procura será o próprio formato da economia de exportação. Se ela tiver uma alta dotação de capital, como no caso da mineração, é provável que o aumento da produtividade não cause grandes efeitos multiplicadores internos, pois a renda ficará concentrada nas mãos de poucos, que têm seu consumo atendido, em sua maior parte, por importações. A importância da procura será mais pronunciada se, por outro lado, essa economia de exportação for formada, por exemplo, por pequenas propriedades agrícolas, nas mãos de muitas famílias. Nesse caso, essa nova renda irá criar uma economia doméstica de maior monta e mais complexa do que na situação acima.

Descrito dessa forma o desenvolvimento parece ser mais uma série de relações entre variáveis do que um processo direcionado pelas decisões de agentes em condições de efetivamente intervir nos valores dessas variáveis. A intensificação deste depende da taxa de inversão (I/Y) e da produtividade dessas inversões (Y/K). Se o aumento de produtividade produzir uma ampliação da participação das inversões no produto, o processo de desenvolvimento ganha força, perpetuando-se por vários ciclos. Mas isso não ocorrerá se o aumento de produtividade em determinada indústria resultar tão somente na alteração dos preços relativos. Portanto, é essencial que existam agentes que, por conta da posição estratégica que ocupam, consigam impedir a queda de preços e a elevação na remuneração dos trabalhadores empregados, redistribuindo renda em benefício próprio. Isso criará um ciclo virtuoso, puxado por novas e mais produtivas inversões. Também vital é a presença, em um momento posterior, de agentes em condições de redistribuir os benefícios do desenvolvimento em favor da coletividade, de forma a manter a rentabilidade das inversões. Segundo Furtado, esse processo normalmente escapa aos economistas, por terem sua visão excessivamente ocupada por dados agregados. Contudo, a todo instante, há setores da atividade econômica em que os empresários, em virtude de sua posição temporária de maior poder em relação aos trabalhadores e seus concorrentes, são capazes de concentrar os ganhos de produtividade, enquanto em outros ocorre o contrário, com a luta dos trabalhadores proporcionando a redistribuição desses frutos.

Uma vez superados os obstáculos iniciais, o processo de desenvolvimento ganha esse aspecto pendular ou de mola, que favorece em determinado instante a causa dos trabalhadores por melhores salários, criando as condições para os seus antagonistas, posteriormente, ampliarem a sua participação no produto por meio da restrição do consumo da classe trabalhadora. Para finalizar, é importante assinalar que estas fases estão umbilicalmente ligadas. A melhora das condições de vida da população, causando, entre outras coisas, o deslocamento dos padrões de consumo das massas assalariadas em direção ao das classes privilegiadas, levará os empresários a adotar, a partir do ponto em que esses ganhos afetarem a remuneração dos seus capitais, tecnologias poupadoras da mão de obra. Como a inovação tecnológica, na sociedade capitalista, está à serviço da acumulação, não encontrarão dificuldades nesse sentido. Isso colocará o salário novamente em linha com a produtividade, ampliando a participação dos capitalistas na renda. A partir de então, o processo de desenvolvimento deixa o caminho da difusão das possibilidades técnicas já conhecidas e envereda pela via mais lucrativa da criação de novos produtos e da introdução de métodos produtivos mais eficazes. Nessa fase, a elite regozija-se com as possibilidades de consumo aparentemente infinitas que surgem na sua frente, distanciando-os cada vez mais dos padrões de consumo do restante da população. Mas, como estamos no capitalismo, há a necessidade da criação de novos mercados consumidores de forma a oportunizar inversões rentáveis aos capitais que se acumulam nas mãos dos empresários. Dessa forma, ainda que contrária ao seu projeto de ampliação do seu domínio social, a forma de acumulação marcada por um maior coeficiente de trabalhadores empregados por unidade de capital deve ser retomada, e assim por diante.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Celso Furtado, seguindo a tradição keynesiana, dá uma grande importância aos aspectos do lado da demanda em sua teoria do desenvolvimento. Mas a supera na medida em que articula, em um todo coerente, fatores de natureza política e social com os econômicos. Ele rechaça os argumentos econômicos marxistas que procuraram ver no sistema capitalista uma tendência de pauperização crescente da classe trabalhadora e queda tendencial da taxa de lucro, atribuindo, em seu modelo, um papel mais ativo à classe trabalhadora e aos ganhos periódicos obtidos por ela. Não obstante, enxerga no conflito entre trabalhadores e capitalistas uma fonte importante de dinamismo do sistema. O papel central da inovação tecnológica na teoria schumpeteriana é mantido por ele, mas colocado dentro de um quadro de permanente acumulação de capital e de difusão dos frutos do progresso técnico. Em contraste marcado com a teoria neoclássica, Furtado parte da perspectiva de classes sociais, com interesses conflitantes, e não de indivíduos isolados do contexto social mais amplo. Esses indivíduos, para o autor em questão, ao mesmo tempo que recebem informações do mercado, as criam, dando origem a situações completamente novas.

A excessiva compartimentalização dos saberes no meio acadêmico parece entrar no caminho da tarefa estabelecida por Furtado de formar uma “teoria social global”. O pensamento desse autor em torno do processo de desenvolvimento mostra quão enriquecedoras empreitadas nesse sentido podem ser para a compreensão da realidade social.

REFERÊNCIAS BIBLIOGÁFICAS

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    » http://www.cadernosdodesenvolvimento.org.br/ojs-2.4.8/index.php/cdes/article/view/200
  • 1
    De acordo com Bresser-Pereira (2001Bresser-Pereira, Luiz Carlos (2001) “Método e paixão em Celso Furtado”. In: Luiz Carlos Bresser-Pereira e José Márcio Rego, orgs. A Grande Esperança em Celso Furtado. São Paulo: Editora 34: 19-43. Disponível em: < Disponível em: http://www.bresserpereira.org.br/papers/2001/65FurtadoMetodo&Paixao.p.pg.pdf >. Acesso em: 30 jul. 2020.
    http://www.bresserpereira.org.br/papers/...
    ), o pensamento de Furtado é marcado por sua independência teórica. Ele extraía de cada teoria aquilo que julgava relevante para interpretar os fenômenos econômicos. Assim, embora tenha aprendido com Keynes e Marx, entre outros, ele não era nem marxista nem keynesiano, muito menos neoclássico (devendo pouco a esta escola). Sobretudo, ele não aplicava esse conhecimento absorvido de outros de maneira ortodoxa, sem críticas.
  • 2
    Em Pequena introdução ao desenvolvimento Furtado insere um matiz nessa classificação, situando-o em “uma posição especial entre a tradição historicista e a neoclássica” (1980Furtado, Celso (1980[1981]) Pequena introdução ao desenvolvimento: enfoque interdisciplinar. São Paulo: Ed. Nacional. , p. 31).
  • 3
    Se o progresso tecnológico avança em um ritmo maior do que a acumulação de capital, a absorção dessa mão de obra seria retardada.
  • 4
    São do texto original de Furtado os adjetivos “grande” e “persistente” para caracterizar o exército de trabalhadores reserva.
  • 5
    Para Furtado, a matriz estrutural é constituída pela forma como o vetor de variáveis exógenas determina o vetor de variáveis endógenas, isto é, o conjunto de relações precisas entre as variáveis. Em função de chamarem atenção para os parâmetros não econômicos, que integram a matriz estrutural dos modelos, é que o grupo de economistas reunidos na Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), sob a liderança de Raúl Prebisch, recebeu o nome de “estruturalistas”.
  • 6
    Furtado distingue modo capitalista de produção de capitalismo. Este ele define como toda formação social onde o uso de um excedente serve como instrumento para captação de outro excedente, ao passo que o primeiro se refere, de forma mais restrita, à aplicação à organização da produção da forma mercantil de apropriação do excedente.
  • 7
    O autor apresenta os principais argumentos contidos nos capítulos iniciais dessa obra, em duas versões de tamanhos diferentes, em Furtado (1980Furtado, Celso (1980[1981]) Pequena introdução ao desenvolvimento: enfoque interdisciplinar. São Paulo: Ed. Nacional. , 2013cFurtado, Celso (2013c). “O desenvolvimento do ponto de vista interdisciplinar”. In: Rosa Freire d’Aguiar, org. Essencial Celso Furtado . São Paulo: Penguin Classics Companhia das Letras : 197:235.).
  • 8
    É importante chamar a atenção a que, ao fazer essas demarcações, Furtado se distancia tanto dos neoclássicos quanto de Schumpeter. Dos primeiros por reconhecer a existência de mais de um tipo de consumidor, enquanto a diferença para o segundo está em atribuir o mesmo grau de importância para a inovação e sua difusão.
  • 9
    Esse enredo é valido tanto para as economias subdesenvolvidas quanto para as desenvolvidas, as quais também se valeram do comércio exterior nessa fase inicial de desenvolvimento. O foco desta seção, contudo, é nas economias que atingiram um nível elevado de desenvolvimento, pois as de perfil subdesenvolvido exigem uma análise separada, uma vez que, de acordo com Furtado, possuem formações sociais diferenciadas, com o subdesenvolvimento não constituindo, portanto, uma etapa pela qual passaram todas as economias.
  • 10
    JEL Classification: B30; O10.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Maio 2022
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2022

Histórico

  • Recebido
    31 Jul 2020
  • Aceito
    05 Maio 2021
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