Open-access Transformação digital na fruticultura: uma revisão sistemática na base Web of Science no período 2010-2021

Digital transformation in fruit culture: a bibliographic analysis in the Web of Science base

Resumos

Resumo  Os efeitos da transformação digital vêm promovendo uma revolução na produção rural no Brasil nos últimos anos. Nesse contexto, espera-se que tal transformação reflita-se na performance e sustentabilidade do agronegócio. Este estudo propõe avaliar como se avolumou a produção científica sobre a temática da transformação digital, atinente ao agronegócio frutícola, no período 2010-2021, mediante um levantamento sistemático bibliográfico realizado na base eletrônica de dados da Web of Science. A pesquisa caracteriza-se como quali-quanti, com abordagem exploratória e descritiva. Os resultados, logrados com a tabulação dos dados, apontam, dentre outros achados, que a partir do ano de 2017 há uma tendência contínua de crescimento no número de publicações relacionadas à temática aqui pesquisada. Quanto ao mapeamento científico sob uma estrutura longitudinal, observou-se a comunicação entre os clusters Inovação e Fruticultura entre os anos de 2013 a 2017 e posteriormente, dos clusters Fruticultura e Transformação Digital entre os anos de 2017 e 2021. Tais resultados comprovam a ascensão da temática transformação digital como mecanismo inovador para o ecossistema empresarial do agronegócio frutícola.

Palavras-chave:  agricultura digital; inovação; agronegócio; Indústria 4.0; tecnologia


Abstract  The effects of digital transformation have been promoting a revolution in rural production in Brazil in recent years. In this context, it is expected that such a transformation will be reflected in the performance and sustainability of agribusiness. This study proposes to evaluate how the scientific production on the subject of digital transformation, regarding fruit agribusiness, has grown in the period 2010-2021, through a systematic bibliographic survey carried out in the electronic database of the Web of Science. The research is characterized as quali-quanti, with an exploratory and descriptive approach. The results obtained with the tabulation of the data, point out, among other findings, that from the year 2017 onwards there is a continuous trend of growth in the number of publications related to the subject researched here. As for the scientific mapping under a longitudinal structure, communication between the Innovation and Fruit Growing clusters was observed between the years 2013 to 2017 and, later, the Fruit Growing and Digital Transformation clusters between the years 2017 and 2021. These results prove the rise of the theme of digital transformation as an innovative mechanism for the fruit-growing agribusiness business ecosystem.

Keywords:  digital agriculture; innovation; agribusiness; Industry 4.0; technology


INTRODUÇÃO

Considerando a existência de uma demanda crescente por alimentos em nível mundial, o agronegócio tem despontado como segmento de mercado chave para a economia brasileira, uma vez que este país se caracteriza como um dos maiores produtores agrícolas do mundo, o que torna o seu papel socioeconômico fundamental para o desenvolvimento nacional. Do cenário supramencionado, somado a outros fatores, como: integração global dos mercados, cadeias de suprimentos e sistemas de comunicação, emergem novas oportunidades de expansão comercial. E é nesse cenário que a transformação digital torna-se fator-chave para o desenvolvimento de tecnologias, otimizando a performance produtiva, a fim de promover a competitividade no setor agrícola (Chaves, 2010).

Diante do desafio de aumentar a produção agrícola, torna-se imprescindível o uso cada vez mais intenso de novas tecnologias que permitam alcançar os ganhos necessários de produtividade de forma sustentável. Nesse contexto, um novo fator de produção está modificando a base de crescimento econômico para os países em todo o mundo. Trata-se da transformação digital, uma nova abordagem em que as Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) desempenham papel-chave na transformação da estratégia, da estrutura, da cultura e dos processos das organizações. Utilizam o alcance e o poder da internet como elemento central para o desenvolvimento e perenidade dessa atividade, tanto em termos de crescimento econômico quanto social.

Acrescenta-se, como outro grande desafio aos agricultores, a necessidade de acompanhar a dinamicidade e o cenário de mudanças vivenciado de forma cada vez mais acelerada no agronegócio, uma vez que os gestores de tais empreendimentos necessitam de informações gerenciais úteis, de forma tempestiva; eles precisam estar progressivamente mais acessíveis, possibilitando, ao agricultor, a tomada de decisões mais assertivas em todos os momentos da produção agrícola. Com isso, utilizando-se de tecnologias voltadas à inovação, é possível controlar o desperdício de insumos, de tempo e de energia, contribuindo para o alcance de uma agricultura mais efetiva, competitiva e sustentável (Bittencourt et al., 2016).

De acordo com Ziegler et al. (2020), as transformações tecnológicas e as aplicações dessas à produção na esfera rural, com os consequentes benefícios econômicos produzidos, buscam fomentar políticas e ações que eliminem o hiato da conectividade rural. Nesse sentido, esta proposição diz respeito a forma como os negócios passam a ser realizados, gerando vantagens competitivas e contribuindo positivamente para as empresas, o meio ambiente e a sociedade.

Neste contexto, o grande desafio, interposto às empresas do setor agrícola, está vinculado à definição e implementação de estratégias que estimulem a sua capacidade inovadora e geradora de novos produtos e serviços, alinhados com as exigências oriundas do novo contexto competitivo, proposto pela inserção de tecnologias advindas da transformação digital. Assim, o setor agrícola brasileiro terá que construir ou aperfeiçoar suas bases estratégicas que contemplem características e ações de inovação, propiciando o aumento da qualidade e a diferenciação do seu produto, fatores decisivos para a rentabilidade dos empreendimentos, para a criação e manutenção de vantagens competitivas mais sustentáveis.

Desse modo, considerando que a transformação digital está remodelando todo o segmento agroindustrial, inclusive a fruticultura, é possível observar que algumas empresas alcançam o status de destaque, em um cenário onde a maioria parece defasar. Por essas razões, a inserção da transformação digital é uma das principais preocupações dos líderes seniores em todo o mundo (Massruhá et al., 2020).

Dados mais recentes apontam que, em 2020, o Brasil foi o terceiro maior produtor em nível mundial de frutas, com 58 milhões de toneladas, perdendo apenas para China e a Índia. No entanto, ao analisar-se o recorte temporal de 2000 a 2020, em uma escala global, é possível observar que o Brasil vem perdendo participação no mercado mundial de produtores de frutas, uma vez que se manteve como o 11º exportador nesse mesmo período (Aragão & Contini, 2021). Por tais motivos, Sobel (2011) aponta ser relevante compreender a dinâmica tecnológica evolutiva na produção de frutas, visto que tal segmento vem sofrendo mudanças expressivas, iniciadas a partir da década de 1990, com a expansão das exportações da produção frutícola. Houve uma maior rapidez nos meios de distribuição, impulsionando as transações internacionais nesse segmento, colocando o Brasil em posição de destaque para a fruticultura no cenário mundial (Moreti, 2011).

Assim, tendo em vista a relevância social, econômica e científica que o fator Transformação Digital vem agregando ao agronegócio frutícola, acrescenta-se os saberes de Ribeiro & Clementino (2021), ao afirmarem ser inconteste que o conhecimento do estado da arte na produção científica é de alta relevância. Ele permite entender as lacunas, tendências e resultados já alcançados pelos pesquisadores e estudiosos da área, além de possibilitar o avanço do conhecimento nesse setor, a partir de novos horizontes de pesquisas. Dessa forma, o presente estudo tem por objetivo avaliar como se avolumou a produção científica sobre a temática da transformação digital no agronegócio frutícola, no recorte temporal correspondente aos anos de 2010 a 2021, vinculando, concomitantemente, essa temática com a área da inovação, por meio de levantamento sistemático bibliográfico realizado na base eletrônica de dados da Web of Science.

A questão norteadora, que permeia este estudo, está pautada em: Como se deu a evolução da produção científica sobre a temática da transformação digital para o ecossistema empresarial no agronegócio frutícola, entre os anos de 2010 - 2021?

Para responder essa questão, foram traçados objetivos específicos em que se buscou mostrar, de forma sistemática, o que a literatura apresenta sobre a contribuição da transformação digital ao ecossistema empresarial do agronegócio frutícola entre os anos de 2010 - 2021; mensurar a produção literária atinente à contribuição da transformação digital ao ecossistema empresarial do agronegócio entre os anos de 2010 - 2021; verificar sua evolução no período especificado, apontando as principais escolas; entender as tendências e resultados já alcançados pelos pesquisadores e estudiosos da área; e, por fim, apontar horizontes de pesquisas que possibilitem o avanço do conhecimento nesse setor. Para isso, buscou-se alcançar o estado da arte, onde foram levantados artigos, resumos de teses e/ou dissertações catalogadas na base eletrônica de dados da Web of Science, base essa que foi selecionada por contemplar importante fonte de artigos voltados ao tema aqui explorado.

Essa temática torna-se importante objeto de estudo, uma vez que a transformação digital no agronegócio frutícola é considerada parte importante da equação que impulsiona o aumento da produtividade no campo, e que o domínio das tecnologias digitais é imprescindível para a evolução do segmento. Conforme explanado por Brochado (2017), o agronegócio brasileiro terá que atentar para a nova globalização, surgida com a transformação digital, fenômeno que produz intensas mudanças na maneira como a tecnologia é concebida, gerenciada e empregada, a fim de desenvolver soluções tecnológicas que promovam o crescimento frente a outros países e se estruturem para o novo cenário competitivo.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

A EVOLUÇÃO DO AGRONEGÓCIO E SUA IMPORTÂNCIA PARA A ECONOMIA BRASILEIRA.

De acordo com Massruhá et al. (2020), a história da agricultura no mundo deve ser exaltada como uma das grandes conquistas da humanidade, considerando que, no início do século 20, tinha-se a agricultura 1.0 (tração animal); a força de trabalho era provida pela mão de obra das famílias, utilizando instrumentos manuais, ajudada pela tração animal. Era uma agricultura com baixa produção, em que os agricultores, além de lavrarem para o próprio consumo, geravam um excedente de alimentos que abastecia um número sempre crescente de pessoas.

Posteriormente, a partir de 1950, após a Segunda Guerra Mundial, a agricultura passou a ser reconhecida como 2.0 (Revolução Verde), uma vez que a ciência agrícola avançou rapidamente, diversas máquinas e implementos começaram a chegar aos campos (Mafra, 2022). Jacto (2018) acrescenta que tal acontecimento culminou na substituição da tração manual pela força mecânica nas lavouras da América do Norte e da Europa.

Cabe destacar, que um dos eventos mais importantes que marcam esse período é a Revolução Verde. De acordo com Octaviano (2010), a chamada Revolução Verde teve início na década de 60, em que instruiu a pesquisa e o avanço dos modernos sistemas de produção agrícola para a inserção de pacotes tecnológicos de aplicabilidade universal. Aspiravam à maximização da produtividade dos cultivos em diferentes situações.

De acordo com Santos et al. (2019), no decorrer dos anos, a Agricultura 3.0 (Sistemas integrados) deu-se pelo desenvolvimento do sistema Global Positioning System (GPS), o qual é utilizado até os dias atuais. Tal tecnologia é considerada como uma grande realização, para que os agricultores lograssem o melhor gerenciamento do seu plantio.

Atualmente, vivencia-se a Agricultura Digital, também denominada de Agricultura 4.0 (de Base Biológica), considerada uma similitude à Indústria 4.0, que corresponde ao resultado da transformação digital no setor agrícola; passou a incorporar a conectividade e automação, com uso de máquinas, veículos, drones, robôs e animais com sensores, entre outras tecnologias. Massruhá et al. (2020) afirmam que, essa agricultura emergiu, nos últimos anos, da necessidade de inserção de tecnologias disruptivas, que passaram a ser adotadas, proporcionando o surgimento da agricultura digital, compreendendo mais uma fase da revolução tecnológica. Brochado (2017) acrescenta que a agricultura 4.0 está apoiada na produção digital, uma vez que antevê os desafios que essa realidade exige a uma agricultura contemporânea e globalizada. A Figura 1 ilustra a evolução da agricultura e suas respectivas fases.

Figura 1
- Fases da evolução da agricultura. Fonte: Agricultura Digital: Pesquisa, desenvolvimento e inovação nas cadeias produtivas (Massruhá et al., 2020).

De acordo Ziegler et al. (2020), a evolução da agricultura para a era digital, tem contribuído para aumentar os níveis de produtividade dos cultivos nas regiões mais atrasadas, de modo que a conectividade tem um grande potencial para, por exemplo, contribuir para a transparência de preços na cadeia produtiva; facilitar a profissionalização no uso de tecnologias por parte dos pequenos produtores, a fim de combater o círculo vicioso que hoje gera insegurança, pobreza e emigração. Essa profissionalização que vem ocorrendo no agronegócio nos últimos 35 anos, fez com que o Brasil evoluísse da condição de importador para a de maior exportador mundial de alimentos (Massruhá et al., 2020). Nessa conjuntura, Chaves (2010) indica que investimentos públicos em educação, infraestrutura, pesquisa, desenvolvimento e inovação possibilitaram o desenvolvimento de um sistema produtivo agrícola altamente eficiente e eficaz, o qual levou o agronegócio a conquistar o papel de proeminência no desenvolvimento econômico, tecnológico e social do País.

Dessa forma, o agronegócio envolve necessariamente atividades econômicas relacionadas à agricultura, englobando a agropecuária e demais segmentos produtivos a ela relacionados. Para Barros (1987), o agronegócio é a expressão resultante da junção dos termos agricultura e negócio; visa atingir a determinados fins para satisfação de desejos ou necessidades de quem os executa ou de outrem, a partir da agricultura ou agropecuária, baseado no cultivo da terra e recursos naturais em geral.

Cabe enfatizar a importância que o agronegócio representa para o aumento do Produto Interno Bruto - PIB brasileiro, uma vez que cresceu 8,36% em 2021; vem ampliando sua participação na economia, passando a representar 27,4% para o mesmo ano, frente a 26,6% em 2020 (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada, 2022). Os números supramencionados revelam um desempenho significativamente superior à média dos demais segmentos de mercado que compõem a economia brasileira.

Corroborando com tal indagação, Breitenbach (2014) aponta que o Agronegócio tem se apresentado como o setor de maior contribuição para o Produto Interno Bruto (PIB) e para geração do superávit na balança comercial brasileira; trata-se do setor que mais exporta, atendendo demandas em diversos mercados do mundo, no que diz respeito aos produtos alimentícios primários, e não manufaturados, ramos nos quais o Brasil é grande produtor / exportador.

Nesse contexto, considerando o que diz a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (2014), identificar indícios de alterações relevantes e fornecer informações que subsidiem a tomada de decisão dos stakeholders, pode promover o aumento da capacidade de responder às oportunidades e às ameaças que se apresentarem ao setor, tornando-se insumo crucial para o desenvolvimento tecnológico do agronegócio. Por esse motivo, Massruhá et al. (2020) apontam que, para o Brasil assegurar, ou mesmo ampliar sua capacidade de produção com sustentabilidade, visando atender à demanda global por segurança alimentar e nutricional, como um grande exportador de commodities agrícolas, torna-se necessária a modernização, tecnificação e a inovação em todas as cadeias de produção agrícola, convergindo para a agricultura digital, como reflexo da transformação digital do setor.

A FRUTICULTURA BRASILEIRA

O Brasil é o terceiro produtor mundial de frutas, atrás apenas da China e da Índia, com um volume de mais de 41,3 milhões de toneladas (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2019) e participação de 4,6% na produção da fruticultura mundial (Food and Agriculture Organization, 2016). Das 20 fruteiras mais cultivadas no país, três são temporárias (abacaxi, melão e melancia) e 17 são permanentes, considerando-se o ciclo das mesmas (ver Tabela 1). Nesse caso, existe um predomínio das lavouras permanentes, com 87%, enquanto as temporárias participam com 13% da produção nacional. Com relação às principais fruteiras, destacam-se os citros (laranja, limão e tangerina), com participação de 48,2%, seguido da banana (16,7%), abacaxi (6,7%), coco-da-baía (6,5%), melancia (5,2%) e mamão (3,5%), perfazendo um total de 81,8%.

Tabela 1
- Produção de frutas no Brasil - 2019.

O setor frutícola contribui diretamente para a economia nacional por meio das exportações e do mercado interno, destacando-se por sua importância de caráter socioeconômico, uma vez que está presente em todos os estados brasileiros, gerando renda, emprego e desenvolvimento do agronegócio nacional (Fachinello et al., 2011).

A área total plantada com frutas está ao redor de 1,3 milhões de hectares (Tabela 1) e emprega aproximadamente 16% de toda mão de obra utilizada nas cadeias produtivas de alimentos de todo agronegócio brasileiro, gerando aproximadamente 5 milhões de empregos diretos, uma vez que cada hectare de fruta plantado necessita de uma média de 2 trabalhadores em regime de contratação permanente (Associação Brasileira dos Produtores Exportadores de Frutas e Derivados, 2020). Segundo os representantes da Associação Brasileira dos Produtores Exportadores de Frutas e Derivados - ABRAFRUTAS, os pacotes tecnológicos não são uniformes nas propriedades e pomares ao longo do território nacional; não é raro encontrar situações onde existem produtores extremamente tecnificados em uma cultura, como a banana, por exemplo, e ao mesmo tempo, existem ainda os que utilizam práticas e procedimentos ultrapassados e com muitas oportunidades de melhoria. Normalmente, os produtores mais tecnificados são responsáveis pelo abastecimento dos grandes centros urbanos e de alta concentração populacional, enquanto que os outros acabam comercializando suas frutas, mas regionalmente. Contudo, ambos são importantes na cadeia de suprimentos.

A Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) apontou uma produção total de 74,4 milhões de toneladas de hortifruti no Brasil (41,3 milhões de toneladas de frutas e 33,1 milhões de toneladas de hortaliças); o valor da produção apurado ultrapassa R$ 84 bilhões (R$ 49,8 bilhões da fruticultura e R$ 34,4 bilhões da olericultura) e a área cultivada supera 4,2 milhões de hectares (respectivos 2,6 milhões e 1,6 milhão de hectares) (Tabela 2). Apesar dos números apresentados, Gerum et al. (2019) já chamavam a atenção para a carência de estudos nos vários polos nacionais de produção de frutas tropicais, capazes de identificar as variações, peculiaridades e propriedades, de representar diferenciais mercadológicos, e apontar as necessidades tecnológicas.

Tabela 2
- Números gerais do setor de hortifruti no Brasil - 2020.

TRANSFORMAÇÃO DIGITAL NO AGRONEGÓCIO E O MOVIMENTO AGTECH

A transformação digital traduz-se no uso das tecnologias da informação e comunicação (TIC) para ampliar, de forma significativa, a performance e o alcance das empresas por meio da mudança na maneira como os negócios são feitos (Massruhá et al., 2020). Acrescenta-se ao conceito de transformação digital, o que Uehara & Moura (2019) relatam ser essencialmente: repensar, reconfigurar e redesenhar processos, produtos e serviços a partir das possibilidades trazidas pelas tecnologias digitais. As autoras ainda reforçam que, mais que reduzir custos e otimizar o tempo, o desafio da transformação digital consiste, também, na identificação de novas oportunidades de agregar valor a clientes e usuários, e que tais desafios tornam possíveis pelo avanço da tecnologia.

Segundo o World Economic Forum (2017), algumas tecnologias tidas como críticas na transformação digital são: internet das coisas (IOT), computação em nuvem, Big Data, mídias sociais, mobilidade, inteligência artificial, ciência de dados, digital twins, realidade aumentada e realidade virtual, robótica, conectividade ubíqua, aprendizado de máquina e automação, além dos avanços na biotecnologia e na bioinformática e a nanotecnologia. Tais tecnologias possibilitam a coleta de inúmeros tipos de dados, como informações de solos, clima, características das plantas e dos animais, aplicação de insumos, colheita, produção, entre outras. A grande dimensão de dados extraídos por meio da agricultura de precisão compreende uma fonte de informação do campo (Bassoi et al., 2014).

Outro ponto de destaque é que a transformação digital está diretamente relacionada com as pessoas, por isso, Weiss (2019, pp. 203-214) afirma que os investimentos em tecnologias da informação e comunicação (TIC) emergem como uma perspectiva interdisciplinar coesa para o desenvolvimento socioeconômico; apresentam o potencial de instrumentar as pessoas ao envolvimento direto na sociedade, considerando que essas estejam presentes em uma estrutura legal, capazes de salvaguardar os direitos individuais dos cidadãos.

É importante observar que o agronegócio 4.0 exige, dos agricultores, investimentos em ferramentas de inovações tecnológicas voltadas ao controle, que possam contribuir, de forma efetiva, no aumento da produtividade, fortalecimento do negócio e no desenvolvimento social do ambiente rural. Dessa forma, de acordo com Shepherd et al. (2020), são necessárias habilidades para aplicar tais tecnologias digitais, no sentido de transformar os dados imprecisos em conhecimento para apoiar e impulsionar a complexa tomada de decisões na fazenda; ao longo do ciclo de produção, tais habilidades possibilitam a mudança da agricultura de precisão para a agricultura de decisão.

Por estes motivos Johnson & Evenson (1999) definem que o nível de eficiência tecnológica varia entre os produtores, a partir da capacidade de absorção do conhecimento externo (fatores endógenos) e pelo ambiente agrícola e características geográficas (fatores exógenos). Lopes (2016) acrescenta que, na dinâmica impactante que marca o futuro digital, uma coisa é certa: o mundo vivenciará uma nova globalização, e aqueles que se opuserem, presos aos paradigmas da era pré-digital, vão sucumbir ou viverão pressionados por constantes “ventos e trovoadas”.

À vista disso, é possível observar que a transformação digital no agronegócio tornou-se parte importante da equação que impulsiona o aumento da produtividade no campo, assim, estabelece-se como substrato à propagação de inúmeras outras inovações tecnológicas. Tais inovações refletem uma mudança de gestão generalizada dos recursos agrícolas para uma gestão altamente otimizada, individualizada, em tempo real, hiperconectada e baseada em dados (Van Es & Woodard, 2017).

De acordo com Massruhá et al. (2020), as consequências dos desafios, apresentados pela transformação digital no agronegócio, perpassam pela relação do aumento da digitalização, da colaboração digital e do desenvolvimento sustentável. Nesse sentido, uma das iniciativas efetivas para tratar esses desafios é a construção do Ecossistema de Inovação da Agricultura Digital, no sentido de promover o trabalho colaborativo e a integração dos diversos segmentos e setores envolvidos (Massruhá et al., 2020).

Em vista disso, cabe destacar que o agronegócio é uma das áreas da economia que mais tem experimentado o potencial da transformação digital. Melo (2017) aponta que o setor tem atraído um número crescente de fundos de investimentos e grandes companhias de tecnologia e empreendedores. Com isso, o setor agrícola está vivenciando um movimento que poderá se tornar uma das grandes ondas tecnológicas no futuro próximo (Walker et al., 2016).

Ao se mencionar a necessidade de construção do ecossistema de inovação da agricultura digital, destaca-se a existência do movimento de startups agrícolas, conhecidas como AgTechs. De acordo com Massruhá et al. (2020), AgTechs são empresas inovadoras ligadas à tecnologia que se destinam à construção de soluções tecnológicas para a agricultura, cujo papel é crucial na implantação da agricultura digital no Brasil.

De acordo com os dados do 2º Censo AgTech, - Startups Brasil de 2018, efetuado pela AgTechGarage em parceria com a Incubadora Tecnológica da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiróz/Universidade de São Paulo (2019), foi observado que os maiores esforços financeiros realizados pelas AgTechs estão no desenvolvimento de soluções tecnológicas para as áreas consideradas críticas de atuação no agronegócio, são elas: suporte à decisão, IOT & hardware, software de gestão agrícola e agricultura de precisão.

Considerando, então, que a transformação digital veio como um agente catalisador impulsionando os negócios, e as startups são as principais responsáveis pela inserção de novas tecnologias no agronegócio, Lemos (2017) constatou que as startups podem provocar grande impacto nas organizações que utilizam seus produtos ou serviços; isso porque a inovação é capaz de ser disruptiva para todo um segmento de mercado, modificando completamente, ou em parte, o seu negócio, tornando-o mais eficiente no sistema econômico em que atuam, ao melhorarem sua gestão.

METODOLOGIA

Após análise criteriosa dos possíveis caminhos que melhor representam os cenários pretendidos, optou-se pela realização de um levantamento bibliográfico sistemático, de caráter descritivo e exploratório, com recorte temporal de 2010 - 2021, utilizando a base eletrônica de dados da Web of Science. Quanto à forma de abordagem, trata-se de uma pesquisa com métodos quali-quanti, a fim de compreender a evolução da produção científica sobre a temática da transformação digital como ferramenta de inovação para o ecossistema empresarial no agronegócio frutícola, entre os anos de 2010-2021. Creswell (2013) afirmaram que a pesquisa quali-quanti está concentrada em coletar, analisar e processar dados quantitativos e qualitativos em um único estudo ou uma série de estudos; a combinação da abordagem proporciona um melhor entendimento dos problemas de pesquisa do que cada uma das abordagens isoladamente.

A plataforma Web of Science foi escolhida para o processo de revisão bibliográfica, por permitir a imersão em milhares de citações, artigos e periódicos científicos de relevância na comunidade acadêmica, possibilitando identificar as pesquisas consideradas mais relevantes acerca da temática abordada. Além disso, essa ferramenta possibilita explorar as conexões temáticas existentes entre os artigos considerados mais importantes pelos especialistas da área de atuação do tema escolhido, resultando em uma pesquisa quali-quanti.

Sobre as etapas, o trabalho decorreu de quatro momentos distintos. A primeira etapa abarcou a coleta dos artigos científicos que tratam da transformação digital no agronegócio frutícola, publicados de 2010 a 2021, na Coleção Principal da base Web of Science, a partir da reunião de palavras-chave, julgadas apropriadas para transparecer o interesse da pesquisa.

A segunda etapa tem o enfoque quantitativo, pois recorreu à estatística descritiva para possibilitar a tabulação dos dados, assim como sua comunicação, a fim de produzir indicadores fundamentais para a compreensão do fenômeno. A partir de uma investigação qualitativa do conteúdo nas bases de dados, foram identificados os materiais voltados especificamente à área do conhecimento objetivada, agrupando as obras em áreas temáticas, consolidando-as em macrodimensões e apurando o número de publicações dessas áreas.

Na terceira etapa, foram apurados, confrontados e discutidos os materiais selecionados por meio da aplicação de técnicas bibliométricas, sendo feita uma análise estatística preliminar descritiva dos conteúdos de cada um dos campos bibliográficos dos artigos selecionados, observando-se as relações existentes entre os temas “transformação digital” e “fruticultura”. Num segundo momento, aprofundou-se a análise com recurso à técnica designada de coocorrência das palavras-chave. Essa técnica consiste em analisar o número de vezes que um determinado par de palavras-chave ocorre, ou é referenciado para identificar o conjunto de tópicos mais investigados na literatura científica selecionada (Ding et al., 2001). Nas análises bibliométricas, utilizaram-se duas ferramentas: o Microsoft Excel (para a coocorrência de palavras-chave) e o SciMAT v. 1.1 - Analysis View 4 (para a evolução temática da literatura no período).

Na quarta e última fase do processo, faz-se uma “síntese analítica” global dos indicadores-chave da investigação, para concluir sobre os temas motores, transversais, emergentes e periféricos da investigação realizada no setor da fruticultura.

ESTUDOS BIBLIOGRÁFICOS

Gil (1994) apontou que a pesquisa bibliográfica proporciona um amplo alcance de informações, além de permitir a utilização de dados dispersos em inúmeras publicações, auxiliando também na construção da melhor definição do quadro conceitual que circunda o objeto de estudo aduzido. Marconi & Lakatos (2010, p. 166) acrescentam que a pesquisa bibliográfica confere legitimidade ao estudo, propiciando subsídios para o entendimento, interpretações e análises de fenômenos ou situações, colocando o pesquisador em contato com tudo o que foi escrito, dito ou filmado sobre um assunto específico.

Conforme Cunha (1985), as técnicas bibliométricas permitem encontrar uma quantidade restrita de periódicos essenciais (denominados nucleares). Supõe-se possuir os artigos mais relevantes publicados sobre um assunto definido, partindo da prática estabelecida pela comunidade científica, de oferecer as referências bibliográficas de qualquer trabalho. Nesse sentido, a pesquisa bibliográfica, desenvolvida neste estudo, conduziu a uma descrição geral da evolução e da produtividade científica, voltada à temática da transformação digital, atinente a sua contribuição ao ecossistema da inovação empresarial no agronegócio frutícola, no recorte temporal correspondente aos anos de 2010 a 2021.

FONTES E ETAPAS DO PROCESSO DE INVESTIGAÇÃO DO ESTUDO BIBLIOGRÁFICO

FONTE DE INFORMAÇÕES

É importante destacar que, para atender aos objetivos propostos na etapa quantitativa da pesquisa, alguns protocolos foram estabelecidos. São eles:

  • 1º Passo: Escolha da base de dados eletrônica - preferiu-se a base de dados eletrônica da Web of Science, pois o objetivo principal da pesquisa é compreender como se avolumou a produção científica sobre a temática da transformação digital, atinente a sua contribuição ao ecossistema da inovação empresarial no agronegócio frutícola. Dessa forma, a supramencionada base de dados permite a imersão a milhares de citações, artigos e periódicos científicos de relevância na comunidade acadêmica; possibilita identificar as pesquisas consideradas mais relevantes acerca da temática abordada, além de ser uma base multidisciplinar, considerada a principal plataforma contemporânea de pesquisa para obter informações em Ciências, Ciências Sociais, Artes e Humanidades.

  • 2º Passo: Definição das palavras-chave e do período da pesquisa - a busca no banco de dados percorreu os anos de 2010 a 2021. Como palavras-chave, utilizaram-se as seguintes conjugações: digital transformation AND fruit growing OR innovation AND fruit growing. Tais conjugações foram aplicadas sobre os tópicos: título, resumo, as palavras-chave do autor e keywords plus. Afirma-se que foram consideradas todas as publicações em todos os tipos de documentos disponíveis no banco de dados.

  • 3º Passo: Seleção, tabulação, examinação e cruzamento dos dados - após o acolhimento e distinção dos artigos, resumos de teses e/ou dissertações filtrados na base de dados eletrônicos, apontados no passo anterior, foi provida a tabulação dos dados por meio da aplicação de técnicas quantitativas descritivas. Em seguida, foram feitos o exame e cruzamento dos dados para a argumentação dos resultados, estabelecendo as descobertas com os objetivos indicados na abordagem investigativa do estudo.

ETAPAS DO PROCESSO INVESTIGATIVO

Ao realizar a primeira fase do levantamento investigativo das publicações utilizadas no presente estudo, utilizaram-se, como referência, todos os registros científicos incorporados à base da Web of Science, acrescidos dos filtros mencionados no tópico Fontes de Informações deste estudo, quais sejam: palavras-chave, período de busca. Os tópicos de busca foram título, resumo, palavras-chave do autor e keywords plus, obtendo-se, nessa base, o total de 123 registros.

Em seguida, constituíram-se a tabulação e a preparação da estatística descritiva. Os conteúdos extraídos da base de dados eletrônicos foram computados dentro do rigor metodológico devido e interpretados a partir das especificidades; isso foi por intermédio de indicadores gerais dos estudos da área, no interesse de entender as tendências e os indicadores gerais dos estudos da área de pesquisa. A estatística descritiva foi elaborada por meio da utilização dos seguintes indicadores: i) Indicador de publicações por período; ii) Indicador de país de origem da pesquisa; iii) Indicador de área de investigação, de acordo diferentes classificações da base analisada (Web of Science) e iv) Indicador de afiliações responsáveis pelas publicações.

Posteriormente, foram utilizados os softwares Microsoft Excel® e a SciMAT v. 1.1 - Analysis View para analisar a coocorrência de palavras-chave, a evolução temática da literatura no período, mensurando a produtividade e o impacto do pesquisador no meio científico, por meio da aplicação do fator de impacto como forma de avaliação dos periódicos científicos; e o Índice H (h-index)1, como forma de avaliação dos pesquisadores.

Por fim, foi executada a análise dos dados e elementos apurados no levantamento bibliográfico, apreciando, para isso, as múltiplas afinidades existentes entre os resultados obtidos a partir da base de dados selecionada.

A partir de dois grupos de indicadores bibliométricos, foram apresentados os principais desenvolvimentos científicos no campo da transformação digital aplicada à fruticultura:

  • Indicadores de atividade - contemplando o número de artigos e ano de publicação; país de origem dos autores; produções científicas por área de pesquisa; e produções científicas por afiliações responsáveis pela publicação;

  • Indicadores de citação - aferidos pelo número de citações dos artigos.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

INDICADORES DE ATIVIDADE

De acordo com a conjugação das palavras-chave, já especificadas no tópico “metodologia”, foi observado, inicialmente, o quantitativo dos artigos publicados no interstício analisado (2010-2021), nesse sentido, algumas considerações precisam ser destacadas frente aos resultados obtidos. Do total de 123 publicações voltadas à temática da transformação digital, atinente a sua contribuição ao ecossistema da inovação empresarial no agronegócio frutícola, no enfoque da produção científica sob a perspectiva da linha do tempo, constatou-se que, durante os anos de 2010 a 2014, houve um incipiente número de publicações voltados à temática aqui analisada, totalizando apenas 24 produções, conforme exibe a Figura 2.

Figura 2
- Quantidades de registros obtidos/ano na Base WoS Fonte: elaboração própria a partir de dados da base Web of Science.

Em outra direção, também é possível observar, na Figura 2, uma tendência contínua de crescimento no número de publicações voltados à temática a partir do ano 2017, com apenas uma micro oscilação não significativa no ano de 2018. Tal evolução no número de produções deve-se ao fato da temática transformação digital, aplicada ao contexto da inovação para o agronegócio frutícola, ser considerada ferramenta recentemente inserida no escopo das empresas de tecnologia (startups), o que, consequentemente, despertou o interesse na temática por pesquisadores.

Quanto aos países com maiores números de produções científicas na temática, registrados na base da Web of Science, foram predominantes os estudos oriundos da Itália, representando 14,75% do total, com 18 produções (Figura 3). Destaca-se também 11,47% dos Estados Unidos e 10,66% da Inglaterra nos resultados obtidos, correspondentes a 17 e 13 artigos respectivamente. Já o Brasil, figura com 8 produções, representando 6,56% do total apurado.

Figura 3
- Número de produções científicas por País/Território - Na base WoS (2010-2021) Fonte: elaboração própria a partir de dados das bases Web of Science.

Quanto às áreas temáticas apontadas na base da WoS, as análises foram feitas automaticamente pelos critérios individualizados, utilizados e exibidos pela plataforma na distribuição dos artigos produzidos quanto ao enfoque. Como pode ser visto na Figura 4, três áreas de produção científica merecem destaque. Com 45,53% de participação na produção, a área da agricultura desponta como a principal produtora, seguida das áreas de Ecologia de Ciências Ambientais e Tecnologia em Ciência de Alimentos, com 13,82% e 13,01% de contribuição, respectivamente. Por tal razão, as respectivas áreas despontam como principais, evidenciando a maior preocupação dos pesquisadores, atuantes nas áreas supramencionadas, em desenvolver estudos voltados à temática aqui analisada.

Figura 4
- Produções científicas por área de pesquisa - Na base WoS (2010-2021) Fonte: elaboração própria a partir de dados das bases Web of Science.

Com relação aos resultados obtidos na base de dados da Web of Science, referentes às produções científicas catalogadas por afiliações responsáveis pelas publicações, é possível notar, na Figura 5, que existiu certa diversidade no número de instituições colaboradoras. Nesse sentido, as afiliações que mais contribuíram com publicações foram: o Centre de coopération internationale en recherche agronomique pour le développement (CIRAD); Consiglio per la ricerca e l'analisi dell'economia agraria; Universidade de Bolonha e a Universidade da Califórnia, com 4, 3, 3 e 3 produções, respectivamente.

Figura 5
- Produções científicas por afiliações responsáveis pela publicação - Na base WoS (2010-2021) Fonte: elaboração própria a partir de dados das bases Web of Science.

INDICADOR DE CITAÇÃO

O número de citações representa um dos principais indicadores de mensuração da atividade científica, uma vez que compreende o impacto dos artigos para a comunidade. Dessa forma, como pode ser constatado na Tabela 3, entre 2010-2021, registou-se uma forte tendência de crescimento no número de citações por ano, podendo-se destacar o terceiro recorte temporal que compreende os anos de 2018 a 2021, em que houve o ápice de 884 citações.

Tabela 3
- Evolução do número de citações/ano das publicações em Transformação Digital na Fruticultura, na base WoS (2010-2021).

O crescimento exponencial, evidenciado na Tabela 3, segmentou o horizonte temporal de análise (2010-2021) em três períodos; permite constatar que, do primeiro período (2010-2013) para o último (2018-2021), o número de citações acumuladas passou de 132 para 884, e a média de 33 citações/ano para 221. É possível considerar também, que o crescimento no seu número está diretamente ligado ao aumento no número de publicações.

TENDÊNCIAS EVOLUTIVAS DAS TEMÁTICAS ESTUDADAS

Com base em uma análise de coocorrência de palavras-chave, identificaram-se os principais temas tratados na literatura atinente à inserção das tecnologias provenientes da transformação digital para a fruticultura. Nesse contexto, a Figura 6 apresenta, nos respectivos períodos em que se segmentou a análise, os clusters temáticos mais relevantes, em que os volumes das esferas indicam a importância dos variados temas, sendo proporcionais ao indicador bibliométrico utilizado (h-índice).

Figura 6
- Temas mais estudados em Transformação Digital na Fruticultura, e sua evolução (h-índice). Fonte: Dados da Web of Science. Sistematização via: SciMAT4 v. 1.1 - Analysis View 4 - h-índice (medida de produtividade e impacto)

Com relação aos recortes temporais analisados, é possível observar na Figura 6, para o período 2010-2013, a identificação de um cluster importante de linha temática: Innovation, representando um conjunto de subtemas genéricos agrupados, associados à vertente temática.

Já o segundo recorte temporal (2014-2017) é evidenciado por dois clusters distintos, emergidos na linha temática: Fruit Growing e Agriculture. Destaca-se, porém, a existência de forte vínculo (linha contínua) entre o cluster Innovation (2010 - 2013) com o cluster Fruit Growing (2014-2017), e um menor vínculo com o cluster Innovation (2010 - 2013) com o cluster Agriculture (2014-2017) (linha a tracejado). Dessa forma, é possível visualizar que existiram subtemas, anteriormente pertencentes unicamente ao cluster Innovation, que passaram a interagir também com os clusters Fruit Growing e Agriculture.

O terceiro e o último período (2017 -2021) são caracterizados pela existência de um cluster temático: Agriculture 4.0/Technologies. Cabe enfatizar que, na sequência gráfica da Figura 6, a alternância de temas nucleares entre os recortes temporais, é um indicador da evolução temática, uma vez que novas abordagens passaram a ser utilizadas. Dessa forma, o interesse da comunidade científica convergiu para as tecnologias que caracterizam a Agriculture 4.0/Technologies (2018 - 2021).

Em síntese, a análise bibliométrica evidencia que, em cada período, há um conjunto de temas considerados nucleares, que podem gozar de estabilidade ou desaparecer ao longo do tempo. Tais temas centrais são constituídos por subtemas que, também eles, podem ser estáveis, desaparecerem ou, então, ascenderem à condição de tema central.

Como pode ser visto na Figura 7, para o primeiro recorte temporal (2010 - 2013) dos três temas fundamentais deste trabalho, o termo Innovation é inicialmente o tema central que se comunica com os subtemas Fruit Growing, Agriculture4.0/Technologies e Competition. Cabe destacar, que esse último subtema agrupa palavras-chave relacionadas aos avanços tecnológicos que compõem a transformação digital na fruticultura, como: Big Data, Systems, Softwares, IOT, digital twins, entre outros. Tal constatação evidencia a convergência da comunidade científica para o desenvolvimento de estudos correlacionados à inovação e à transformação digital aplicados à fruticultura.

Figura 7
- Tema central (innovation) e respectivos subtemas, em Digital Transformation e fruit growing, no período 2010-2013 Fonte: Dados da Web of Science. Sistematização via: SciMAT4 v. 1.1 - Analysis View 4 - h-índice (medida de produtividade e impacto)

A partir do segundo recorte temporal (2014 - 2017), dá-se uma mudança temática estrutural: o até então subtema Fruit Growing emerge como cluster temático central, passando a ter uma forte ligação com os subtemas Control e Postharvest (linhas em destaque), conforme Figura 8. O agora, subtema Innovation continua mantendo correlação com o tema principal, assim como emergem outras temáticas como: Sustainable Development, Quality, Supply chain, entre outros.

Figura 8
- Temas centrais (Fruit Growing and Agriculture) em Digital Transformation and fruit growing, no período 2014-2017. Fonte: Dados da Web of Science. Sistematização via: SciMAT4 v. 1.1 - Analysis View 4 - h-índice (medida de produtividade e impacto)

Outro cluster temático central que emergiu no segundo recorte temporal foi o Agriculture. Desta forma, como pode ser visto na Figura 9, os clusters Food Security, Yield, Business Management e Agriculture4.0/Technologies correlacionam-se com a temática central, objeto de interesse da comunidade científica para o estudo.

Figura 9
- Subtemas (Fruit Growing and Agriculture) em Digital Transformation and fruit growing, no período 2014-2017. Fonte: Dados da Web of Science. Sistematização via: SciMAT4 v. 1.1 - Analysis View 4 - h-índice (medida de produtividade e impacto)

Para o período de 2018-2021, emergiu, como tema central, o cluster Agriculture4.0/Technologies. Conforme mencionado anteriormente, o supramencionado cluster agrupa palavras-chave relacionadas aos avanços tecnológicos que compõem a transformação digital na fruticultura, como: Big Data, Systems, Softwares, IOT, digital twins, entre outros.

O ponto a ser observado na Figura 10, está relacionado à interligação dos diversos subtemas que emergiram nesse recorte. Desta forma, o cluster Agriculture4.0/Technologies fecha a lista dos temas centrais atuais, o que representa as novas preocupações em termos de características dos produtores rurais, como: Food Security, Yield, Business Management, Sustainable Development, Quality, Innovation, entre outros. Tal fato é revelador da necessidade de foco na qualidade e diferenciação dos próprios produtos, em resposta à forte pressão competitiva observada no setor frutícola.

Figura 10
- Temas centrais (Agriculture 4.0) e respectivos subtemas, em Digital Transformation e fruit growing, no período 2018-2021. Fonte: Dados da Web of Science. Sistematização via: SciMAT4 v. 1.1 - Analysis View 4 - h-índice (medida de produtividade e impacto)

CONCLUSÕES

Este estudo procurou alcançar o estado da arte no atinente à produção científica sobre a temática da transformação digital, como elemento propulsor para o ecossistema empresarial no agronegócio frutícola, no recorte temporal correspondente aos anos de 2010 a 2021; vincula, concomitantemente, essa temática com a área da inovação, por intermédio de levantamento sistemático bibliográfico realizado na base eletrônica de dados da Web of Science.

Esse objetivo decorre da problemática central da investigação que se pode sintetizar da seguinte forma: “Quais lacunas, tendências e resultados já alcançados pelos pesquisadores e estudiosos da temática Transformação Digital, no tocante a sua contribuição à performance do ecossistema da inovação empresarial no agronegócio frutícola, no recorte temporal correspondente aos anos de 2010 a 2021?

No que se refere à metodologia adotada, tratou-se de uma revisão sistemática em uma pesquisa com abordagem exploratória e descritiva de métodos quali-quanti, na base de dados da Web of Science. Buscou-se compreender, por meio da bibliometria, como se deu a evolução da produção científica sobre a temática da transformação digital como ferramenta de inovação para o ecossistema empresarial no agronegócio frutícola, entre os anos de 2010 - 2021.

Quanto aos diversos resultados apresentados neste estudo, destacam-se os seguintes: a partir do ano de 2017, há uma tendência contínua de crescimento no número de publicações voltadas à temática da transformação digital como ferramenta indutora de inovação para o ecossistema empresarial no agronegócio frutícola, considerada a pesquisa na base eletrônica de dados da Web of Science, entre os anos de 2010-2021. Nesse sentido, constata-se que tal evolução no número de produções deve-se ao fato da temática transformação digital, aplicada ao contexto da inovação para o agronegócio frutícola, ser considerada ferramenta recentemente inserida no escopo das empresas de tecnologia (startups), despertando, consequentemente, o interesse na temática por pesquisadores.

No que concerne aos resultados obtidos sob a ótica dos países de origem das publicações, a Itália desponta como o maior produtor científico, ao contribuir com 14,75% do total, o que corresponde a 18 produções. Já o Brasil, ocupa a sexta posição no ranking desta classificação, com 6,56% do total, com 8 produções. Cabe notar que, embora o volume da produção científica, atinente ao tema estudado, venha em constante crescimento, precisa ser mais abordado, principalmente por pesquisadores brasileiros, uma vez que o Brasil é um dos principais fornecedores de produtos oriundos do agronegócio para o mundo e, apesar do seu potencial, o setor ainda carece de soluções tecnológicas, se comparado ao seu crescimento e a outros países.

No que se trata do mapeamento científico sob uma estrutura longitudinal, foi aplicada a estatística descritiva, possibilitando a tabulação dos dados e sua correlação entre as temáticas; gerou indicadores fundamentais para a compreensão do fenômeno, assim como uma síntese analítica global dos indicadores-chave da investigação, o que levou ao encontro dos temas motores, transversais, emergentes e periféricos da investigação realizada. A partir disso, observou-se que os resultados apontaram a comunicação entre os clusters Inovação e Fruticultura entre os anos de 2013 a 2017. Tal constatação evidencia a convergência da comunidade científica para o desenvolvimento de estudos correlacionados à inovação aplicados à fruticultura e, posteriormente, dos clusters Fruticultura e Transformação Digital entre os anos de 2017 e 2021. Tais resultados comprovam a ascensão da temática transformação digital, como mecanismo inovador, para o ecossistema empresarial do agronegócio frutícola.

Outro resultado considerado relevante foi apontado no recorte temporal de 2018 a 2021, sendo que o cluster Agriculture4.0/Technologies destacou-se entre temas centrais, considerados atuais, mais abordados pelos pesquisadores. Isso representa as novas preocupações em termos de características dos produtores rurais, como: Food Security, Yield, Business Management, Sustainable Development, Quality, Innovation, entre outros. Com isso, esse fato torna-se revelador da necessidade que o fruticultor vem buscando focar na qualidade e diferenciação dos próprios produtos, em resposta à forte pressão competitiva observada no setor.

Quanto às limitações do estudo, assume-se que, independentemente da sua vasta imersão, ele se mostra incompleto, uma vez que, apesar de ter abarcado a maior base de dados em âmbito internacional (Web of Science), outras bases de relevância significativa não foram consideradas no estudo desta pesquisa; isso aponta a sua limitação e, ao mesmo tempo, cria-se uma oportunidade para novos estudos de maiores abrangência, que podem ser desenvolvidos para complementar as lacunas aqui desassistidas. No entanto, ainda sim, por se tratar de uma contribuição original, que seguiu um método científico explícito e apresentou um resultado novo, esta revisão sistemática remete a reflexões sobre o estado da arte, no que se refere à ascensão da temática transformação digital como mecanismo inovador para o ecossistema empresarial do agronegócio frutícola.

Portanto, este estudo tem grande relevância científica e profissional, na medida em que oferece boas pistas e subsídios para o delineamento do processo de criação do conhecimento para o desenvolvimento de novos estudos e investigações futuras. Por fim, cabe salientar que os objetivos traçados, no início desta investigação, foram atendidos em sua integralidade, dado o caráter exploratório e descritivo desejado.

  • 1
    De acordo com Thomaz et al. (2011), o Índice H ou (h-index) foi proposto inicialmente por Jorge E. Hirsch para a avaliação qualitativa de pesquisadores da área da física, sendo rapidamente difundido para outras disciplinas, utilizado como forma de avaliar o impacto do pesquisador individualmente, sendo considerado por muitos autores como a forma mais segura de mensurar a qualidade científica do pesquisador, assim como avaliar a regularidade da produção e previsão do desempenho científico futuro, por meio da combinação da produtividade com impacto.
  • Como citar: Carvalho, L. C. L., Clementino, V. D. R., Gomes, E. C. S., & Farias, M. S. R. (2024). Transformação digital na fruticultura: uma revisão sistemática na base Web of Science no período 2010-2021. Revista de Economia e Sociologia Rural, 62(4), e270355. https://doi.org/10.1590/1806-9479.2023.270355
  • JEL Classification: O3.

REFERÊNCIAS

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Fev 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    12 Dez 2022
  • Aceito
    30 Dez 2023
location_on
Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural (SOBER) SRTVN Av. W/3 norte, quadra 702. Ed. Brasília Rádio Center, Sala 1049., CEP: 70719-900, Website: https://sober.org.br/, Telefone: +55 (16) 3509-7900 - Brasília - DF - Brazil
E-mail: sober@sober.org.br
rss_feed Stay informed of issues for this journal through your RSS reader
Acessibilidade / Reportar erro