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A FALHA DOS DENTES: A ANTROPOFAGIA E A REVOLUÇÃO DE 19301 1 Artigo não publicado em plataforma preprint. Todas as fontes e bibliografia utilizadas são referenciadas no artigo, que é um desdobramento, revisto e ampliado, de pesquisa de doutoramento realizada na Universidade Federal do Pará (UFPA) e na École des hautes études en sciences sociales (EHESS) entre 2016 e 2020. Esta pesquisa foi financiada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), mediante bolsa do Programa de Formação Doutoral Docente (Prodoutoral-Unifesspa. Processos números 88882.466198/2019-01 e 88882.466209/2019-01) e do Programa de Doutorado Sanduíche no Exterior (PDSE-EHESS-Paris). Processo número 88881.189332/2018-01.

TOOTH FAILURE: ANTHROPOPHAGY AND THE REVOLUTION OF 1930

Resumo

Com este artigo procurou-se compreender o movimento antropofágico brasileiro e sua relação com a Revolução de 1930 por meio da análise da Revista de Antropofagia, especialmente sua segunda dentição, que estava sob a liderança do paulista Oswald de Andrade e do paraense Oswaldo Costa. A partir do estudo de suas páginas, percebeu-se o aprofundamento das características políticas do movimento, adentrando a década de 1930 como ponto de apoio ideológico para tomada de posições – aproximações com o Partido Comunista e com Luis Carlos Prestes, por exemplo – e publicações de jornais, como O Homem do Povo, de Oswald de Andrade, e o Jornal do Povo, de Oswaldo Costa.

Palavras-chave
Oswald de Andrade; Oswaldo Costa; Revista de Antropofagia ; Revolução de 1930; O Homem do Povo

Abstract

This article sought to understand the Brazilian anthropophagic movement and its relationship with the 1930 Revolution through the analysis of Revista de Antropofagia, especially its second dentition, which was under the leadership of Oswald de Andrade from São Paulo and Oswaldo Costa from Pará. From the study of its pages, it was noticed the deepening of the political characteristics of the movement, entering the 1930s as an ideological support point for taking positions - approximations with the Communist Party and with Luis Carlos Prestes, for example - and publications of newspapers, such as O Homem do Povo, by Oswald de Andrade, and Jornal do Povo, by Oswaldo Costa.

Keywords
Oswald de Andrade; Oswaldo Costa; Revista de Antropofagia ; Revolution of 1930; O Homem do Povo

Introdução

A situação “revolucionária” desta bosta mental sul-americana, apresentava-se assim: o contrário do burguês não era o proletário - era o boêmio! As massas, ignoradas no território e como hoje, sob a completa devassidão econômica dos políticos e dos ricos. Os intelectuais brincando de roda. De vez em quando davam tiros entre rimas (...) Com pouco dinheiro, mas fora do eixo revolucionário do mundo, ignorando o Manifesto Comunista e não querendo ser burguês, passei naturalmente a ser boêmio (ANDRADE, 1988 [1933], p. 132ANDRADE, Oswald de. Serafm Ponte Grande. 3 ed. São Paulo: Círculo do Livro, [1933] 1988.)

Entre a crítica e a autocrítica, Oswald de Andrade prefacia, em 1933, o livro que escrevera em 1928, Serafm Ponte Grande, apresentação essa em que se apresenta violento contra si mesmo e faz um pequeno resumo sobre sua visão acerca da realidade artística das décadas de 1910 e 1920. Naquela data, em que já findara a publicação da Revista de Antropofagia, doravante mencionada como RA, ocorrera o crack da bolsa em 1929, a Revolução de 1930 e a Revolução Constitucionalista de 1932, visualiza um passado em que já havia escrito em francês com Guilherme de Almeida, “quem diria?”, e que havia incorporado seu nascente anarquismo na “estupidez letrada da semicolônia”, na “ala molhada das letras”. Escrever juntamente com o conservador Guilherme de Almeida, em 1916, as peças Mon Coeur Balance e Leur Âme ou mesmo participar de grupos, jornais e revistas das décadas de 1910 e 1920 ao lado de intelectuais que pensavam as artes, a política e a sociedade de maneira divergente cultural e politicamente não é contraditório se pensarmos em termos sociológicos. Sérgio Miceli (2001)MICELI, Sergio. Intelectuais à brasileira. São Paulo, Companhia das Letras, 2001. dedica muitos dos seus estudos aos “homens sem profssão” deste período. Segundo ele, ao contrário do que intitula de “parente pobre” da oligarquia – a exemplo de Mário de Andrade – muitos modernistas eram originários de famílias de estirpe abastada, cujo sobrenome de boa cepa garantiu livre trânsito nos círculos dirigentes e intelectuais.

Estes “homens sem profssão”, como é o caso de Oswald de Andrade e Guilherme de Almeida, pertenciam a importantes famílias especializadas há diversas gerações em funções culturais, eram filhos da oligarquia, de advogados considerados ilustres e de magistrados, por exemplo. Frequentaram os mesmos colégios e muitos cursaram a Faculdade de Direito. Para Lilia Schwartz (1993), frequentar tal estabelecimento de ensino significa ser um “eleito da nação” devido ao prestígio social adquirido. Além deste prestígio, esta faculdade era considerada uma instância suprema em termos de produção ideológica, concentrando inúmeras funções políticas e culturais, e o Direito, estudo essencial para uma formação polivalente, cuja rentabilidade profssional é tanto mais apreciável quando se faz acompanhar de um capital de relações sociais. Nos dizeres de Miceli:

Até meados da República Velha (...) No interior do sistema de ensino [da Faculdade de Direito] destinado à reprodução da classe dominante, ocupava posição hegemônica por força de sua contribuição à integração intelectual, política e moral dos herdeiros (...). A Faculdade de Direito atuava ainda como intermediária na importação e difusão da produção intelectual europeia, centralizando o movimento editorial de revistas e jornais literários, fazia as vezes de celeiro que supria a demanda por indivíduos treinados e aptos a assumir os postos parlamentares e os cargos de cúpula dos órgãos administrativos, além de contribuir com o pessoal especializado para as demais burocracias, o magistério superior e a magistratura. (MICELI, 2001, p. 115MICELI, Sergio. Intelectuais à brasileira. São Paulo, Companhia das Letras, 2001.)

Voltando à epígrafe, Oswald de Andrade sugere que não havia no Brasil, ao contrário da Europa, clara definição e diferenciação entre burguesia e proletariado. Na falta de consciência de classe sul americana, o contrário de burguês seria o boêmio e, não raras as vezes, o boêmio era o próprio burguês que passava a ver o mundo por uma perspectiva de consciência social. Ignorando o Manifesto Comunista e não querendo ser burguês, tornou-se boêmio, afirma, passando “por Londres, de barba, sem perceber Karl Marx” (ANDRADE, 1988 [1933], p. 132ANDRADE, Oswald de. Serafm Ponte Grande. 3 ed. São Paulo: Círculo do Livro, [1933] 1988.). Estas afirmações necessariamente colocam em questão as relações entre modernismo enquanto movimento estético e político nos referidos períodos.

Neste sentido, João Lafetá (2000)LAFETÁ, José Luiz. 1930: a crítica e o modernismo. 1 edição 1974. São Paulo, Duas Cidades/ Editora 34, 2000., tramando conexões entre literatura, ideologia e psicanálise, discute como o Modernismo se transformou de “projeto estético” na década de 1920 em “projeto ideológico” nos anos 1930. É importante salientar, no entanto, que nessa urdidura de “projetos” não há momentos estanques. O “projeto estético”, diretamente ligado às modificações operadas na linguagem, e o “projeto ideológico”, atado ao pensamento e à visão de mundo de sua época, podem predominar em determinada década, mas são intrínsecos. Longe de ser uma forma mecânica e simples, o projeto estético se torna projeto ideológico na medida em que critica, por meio de uma nova linguagem, a linguagem anterior a se contrapor. Segundo o autor, ao atacar-se a maneira de dizer, ataca-se a maneira de ver, de ser e de conhecer uma época: “se é na (e pela) linguagem que os homens externam a sua visão de mundo (...) investir contra o falar de um tempo será investir contra o ser desse tempo” (LAFETÁ, 2000, p. 20LAFETÁ, José Luiz. 1930: a crítica e o modernismo. 1 edição 1974. São Paulo, Duas Cidades/ Editora 34, 2000.). Assim como Lafetá compreendeu a concepção de literatura em Mario de Andrade, observando no discurso poético a presença de ideias políticas, podemos seguir com Oswald de Andrade e Oswaldo Costa um caminho parecido, guardadas as proporções ideológicas, obviamente, ao exprimir no plano da criação e no da teoria a fusão inextricável destes dois “projetos”3 3 Lafetá afirma que em alguns momentos há a predominância de um projeto sobre o outro e ilustra sua argumentação a partir de Agrippino Grieco, essencialmente estético e alienado, Tristão de Athayde, que transitava entre o projeto estético e o projeto ideológico pela dimensão da moral e ética católica, Mário de Andrade, que melhor encontra o equilíbrio entre os dois projetos e Octávio de Faria, inteiramente ideológico sem compromisso com o projeto estético. .

Oswald de Andrade, ao criticar o modernismo da década de 1920, não teria percebido o cunho ideológico incutido no “projeto estético” daquela fase e suas variantes ou percebeu e, por este motivo, atuou na construção do movimento antropofágico enquanto divisão clara do projeto ideológico que acompanharia o estético. O predomínio do projeto ideológico na antropofagia e, após a Revolução de 1930, contém um duplo viés. Lafetá, orientando de mestrado de Antônio Cândido na primeira metade da década de 1970, parte dos pressupostos teóricos que seu mestre construiu em Literatura e Cultura de 1900 a 1945, de 1950, publicado em capítulo no livro Literatura e Sociedade (2010 [1965]). Nele, Cândido estabelece uma relação dialética entre o localismo (nacionalismo literário) e o cosmopolitismo (imitação consciente dos padrões europeus) na literatura brasileira, defendendo que esta relação rege a criação literária do país. Entretanto, segundo ele, há momentos em que se alcança um equilíbrio entre os dois polos, surgindo assim grandes autores como Machado de Assis e Mario de Andrade, por exemplo, e grandes movimentos literários, em especial o romantismo e o modernismo. Parte-se, a partir dos pressupostos dialéticos de Cândido e Lafetá, da hipótese de que o movimento antropofágico, como vertente modernista, pode ser interpretado como a busca constante de um equilíbrio entre o projeto estético e o projeto ideológico – estes dois elementos se retroalimentam. A própria RA percorreu este caminho ao modificar-se consideravelmente de uma dentição à outra. Já o jornal O Homem do Povo, pioneiro na linguagem de aproximação com o público leitor paulistano, pode ser considerado mais profundamente um marco da transição de um Oswald agitador cultural para um Oswald agitador político propriamente dito (CARRERI, 2017CARRERI, Marcio Luiz. O socialismo de Oswald de Andrade: cultura, política e tensões na modernidade de São Paulo na década de 1930. Curitiba: CRV, 2017.).

“Fui com eles um palhaço de classe”, continua Oswald de Andrade na apresentação de Serafm Ponte Grande, ao reinterpretar seus escritos anteriores que teriam tido influência de Emílio de Menezes e Blaise Cendrars. Ajoelhado “com Jean Cocteau” perante a Virgem Maria, crendo de início e, antropofagicamente, descrendo depois, considerava-se, além de aliado à burguesia católica, “cretino, sentimental e poético”, cujo anarquismo jorrava apenas quando se utilizava do sarcasmo, servindo a burguesia sem nela crer, afirma. Sua “salvação” teria iniciado por meio do sarcasmo e culminado no que ele chamou em 1933 de “sarampão antropofágico” (ANDRADE, 1988 [1933], p. 133ANDRADE, Oswald de. Serafm Ponte Grande. 3 ed. São Paulo: Círculo do Livro, [1933] 1988.) de finais da década de 1920. Diversos autores, como Luis Bueno (2006)BUENO, Luís. Uma história do Romance de 30. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo; Campinas: Editora da Unicamp, 2006., Julio Cesar Bastoni da Silva (2015)SILVA, Julio Cesar Bastoni da. Depois do “sarampão antropofágico”: o cinema na obra de Oswald de Andrade pós-1930. In: Terra roxa e outras terras – Revista de Estudos Literários. Volume 29 (dez. 2015)., Augusto de Campos (1984)CAMPOS, Augusto de. Notícia impopular do O Homem do Povo. In: ANDRADE, Oswald de; GALVÃO, Patrícia; LIMA, Queiroz. O Homem do Povo: março/abril 1931. Edição fac-similar. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado, Arquivo do Estado, 1984., Antonio Candido (1977)CANDIDO, Antonio. Digressão sentimental sobre Oswald de Andrade. In: Vários escritos. São Paulo: Livraria Duas Cidades, 1977. e João Marques Lopes (2015)LOPES, João Marques. Uma leitura da Revista de Antropofagia: o espectro da revolução Bolchevique?. In: Historiae, Rio Grande, 6 (1): 142-166, 2015. consideram que o citado “sarampão” fosse sinônimo de doença e interpretaram este termo como sendo a negação de Oswald de Andrade da própria antropofagia por considera-la demasiadamente estética.

Recorde-se que a ambiguidade entre a revolução estética das vanguardas e o pendor nacionalista estavam entre os dramas da moderna literatura brasileira, algo que, inclusive, estaria na percepção de memória de Mário Andrade. No momento da Revolução de 30 e anos seguintes, completou uma espécie de consenso que fez com que a antropofagia, enquanto movimento intelectual, fosse alijada das análises do pensamento político e social da década que teve início com a movimento varguista. Salvos alguns poucos estudos literários e cênicos que tomam como base os teatros O homem e o cavalo (1934), A morta (1937) e O rei da vela (1937), a intitulada “trilogia da devoração”, assim definida por Sábato Magaldi (2004)MAGALDI, Sábato. Teatro da Ruptura: Oswald de Andrade. São Paulo: Global, 2004., encenadas apenas na década de 1960, esse esquecimento e ostracismo intelectual permaneceria incólume. Neste caminho, crê-se que a volta à temática antropofágica teria ocorrido apenas em finais da década de 1940 e que o movimento antropofágico tenha vindo à tona como procedimento estético somente nas décadas de 1960 e 1970 com o movimento tropicalista e com José Celso Martinez Correa, por meio do Teatro Oficina, em recuperar O Rei da Vela.

A atenção dada às relações entre a antropofagia e o movimento político de 1930 revelam escolhas sobre a memória histórica das “revoluções” brasileiras. Primeiramente, este “sarampão” não é necessariamente sinônimo de doença antropofágica que trouxe males ao país, como apontado por diversos estudiosos sobre o assunto para justificar um possível afastamento de Oswald da causa antropofágica na década de 1930. Estava em jogo algo que havia surgido em fins da década de 1920, com alto índice de propagação, composto por autores de diversas regiões do país em torno da RA, com clubes de antropofagia no Sul, no Norte e no Nordeste, por exemplo (GALVÃO JÚNIOR, 2019GALVÃO JÚNIOR, Heraldo Márcio; FIGUEIREDO, Aldrin Moura de. Revistas no Front: aproximações entre Belém Nova e Revista de Antropofagia por meio de manifestos na década de 1920. Revista Antíteses, v. 12, p. 166-195, 2019.; 2020GALVÃO JÚNIOR, Heraldo Márcio. Quem não pode morder não mostra os dentes: modernistas e antropofágicos entre São Paulo e Belém do Pará nos anos 1920. Tese (Doutorado em História). Belém: UFPA, 2020.). Também devemos levar em consideração que, além de não haver no prefácio nenhuma crítica contundente ao movimento antropofágico nem à RA, o constante uso de ironia e de sarcasmo foi característica fundamental do movimento que praticamente acabara de nascer em 1933. O fato de Oswald de Andrade ter utilizado “sarampão” e não “sarampo” ou “doença” revela irônica e sarcasticamente que a antropofagia era vista pelos modernistas que não aderiram à “descida antropophaga” como uma doença, mas que sua intenção era justamente diferenciar-se daquele modernismo de cunho apenas estético, do modernismo anterior à antropofagia, pois à época os responsáveis pelo movimento, como Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral, Raul Bopp e Oswaldo Costa se consideravam um movimento à parte.

A formação e a cristalização deste pensamento ocorreram pela eleição de certos autores e certas obras como representantes únicos de movimentos, o que fez com que o movimento antropofágico, desde seu surgimento aos dias atuais, tenha sido interpretado essencialmente a partir de Oswald de Andrade, da RA (mais em sua primeira fase, em que constam manifestos) e do Manifesto Antropófago a partir de São Paulo. Diversos autores, entre estudiosos da literatura e da história, como Aldrin Figueiredo (2003FIGUEIREDO, Aldrin Moura de. Um porto para novas ideias: oligarquia, política e modernismo em Belém do Pará na década de 1920. Anais do Simpósio Amazônia, cidades e geopolíticas das águas. Belém: Núcleo de Altos Estudos Amazônicos, 2003. p. 56-61.; 2010FIGUEIREDO, Aldrin Moura de. Flami-n’-assú na transversal do tempo: patrimônio histórico, cultura e identidade nacional na Amazônia. In: COELHO, Wilma de Nazaré Baía; MAGALHÃES, Ana del Tabor Vasconcelos. (Orgs.). Educação para a diversidade: olhares sobre a educação para as relações étnico-raciais. Belo Horizonte: Mazza Edições, 2010, p. 266-276.; 2012FIGUEIREDO, Aldrin Moura de. Os vândalos do apocalipse e outras histórias: arte e literatura no Pará dos anos 20. Belém: IAP, 2012.), Galvão Júnior (2019GALVÃO JÚNIOR, Heraldo Márcio. No estômago, de avestruz, azia: Abguar Bastos e o modernismo antropofágico. In: FERREIRA, Arcângelo da Silva et all (Orgs.). Nas curvas do tempo: história e historiografia na Amazônia em debate. Manaus: Editora da Universidade do Estado do Amazonas, 2019, v. 2, p. 144-163.; 2020GALVÃO JÚNIOR, Heraldo Márcio. Quem não pode morder não mostra os dentes: modernistas e antropofágicos entre São Paulo e Belém do Pará nos anos 1920. Tese (Doutorado em História). Belém: UFPA, 2020.), Alexandre Nodari (2021)NODARI, Alexandre. A oca de Clóvis de Gusmão: sobre a página antropófaga na revista O Q A (O que há). LANDA, v. 10, p. 188-243, 2021. e Luís Fischer (2022)FISCHER, Luís Augusto. A ideologia modernista: A Semana de 22 e sua consagração. São Paulo: Todavia, 2022. questionam a noção historicamente construída de que o modernismo paulista teria sido o ponto de partida para os diferentes modernismos “locais” ou “reginais”. Partindo da análise de autores e artistas de diversas regiões, como Amazônia, Rio de Janeiro, São Paulo e Pernambuco, os autores citados neste parágrafo desconstroem esta ideia posta demonstrando que, mesmo antes da Semana de Arte Moderna, havia modernistas espalhados pelo país, construindo especificidades. Do mesmo modo devemos compreender o movimento antropofágico, que contou com “sucursais” como o jornal O Estado do Pará e a revista O Q A, do Rio de Janeiro.4 4 Tanto a Semana de Arte Moderna quanto o movimento antropofágico, seguindo as pegadas de Le Gof (2000), não são inócuos ou símbolos máximos de um movimento literário. Não se pode considera-las como divisores de águas, exaltá-las nem as menosprezar, pois são, hoje, fruto de uma montagem da sociedade que a produziu, ou seja, conviveram em épocas sucessivas e foram manipuladas, ainda que pelo silêncio, pelos próprios idealizadores ou participantes do evento, assim como por literatos, críticos de arte/literatura, historiadores, e pelos próprios artistas que apoiavam ou faziam parte da vanguarda modernista. São, portanto, documentos e, sendo documentos, devem ser considerados monumentos, pois resulta do esforço dessa sociedade histórica para impor ao futuro determinada imagem de si própria.

Assim, uma análise atenta da RA permite que identifquemos outros autores mais que tiveram importante participação para a construção do movimento, como o paraense Oswaldo Costa, que estudou, analisou e defendeu a diferenciação da antropofagia com o modernismo ao longo de toda a segunda dentição da RA, fase em que houve uma maior aproximação dos autores com os movimentos de esquerda, a intensificação das análises sociais e políticas que adentraram a década de 1930 como base para a formação de jornais próximos ao ideal comunista e contrários a Getúlio Vargas, como O Homem do Povo, de Oswald de Andrade em São Paulo, e o Jornal do Povo, de Oswaldo Costa no Rio de Janeiro.

Desta maneira, algumas perguntas chaves surgiram e passaram a guiar a pesquisa. De que forma o grupo ligado ao movimento antropofágico interpretou e atuou frente ao movimento de 1930, já que de certo modo se consagrou na historiografia que os revolucionários arregimentaram os intelectuais ligados ao modernismo tanto em relação ao golpe quanto no governo Vargas, como o exemplo icônico de Mário de Andrade? Há algum posicionamento efetivo de Oswald de Andrade em relação às eleições e ao movimento de 30 em relação ao candidato paulista indicado para a sucessão de Washington Luis, Julio Prestes, e a quebra da dita “política café com leite”?

Refetir sobre estas questões é inserir-se no debate atual da existência (ou não) de mais dentições da RA, assim como preencher os espaços destas falhas dos dentes antropofágicos ao objetivar compreender o movimento em meio ao novo governo que se instaurou a partir de 1930. Divide-se, portanto, o presente artigo em duas partes. A primeira visa compreender o início do movimento antropofágico a partir da RA em suas duas dentições, que abrangem uma experimentação estética na primeira e um delineamento político na segunda a partir de Oswaldo Costa, autor muito ativo que, ao lado de Oswald de Andrade, levou à cabo a segunda dentição e defendeu violentamente o movimento antropofágico frente o modernismo, diferenciando-os. Em um segundo momento compreender de que maneira a segunda dentição foi preponderante para a formação de jornais de esquerda pelos antropófagos Oswald de Andrade e Oswaldo Costa na primeira metade da década de 1930.

Caleidoscópio modernista e autoafirmação antropofágica

Primeiramente, deve-se ter em mente que a antropofagia foi um movimento que ocorreu a partir de um ideal de arte moderna pensado ao longo da década de 1920 e que teve como principal divulgadora a RA, mas não foi o único (GALVÃO JÚNIOR, 2020GALVÃO JÚNIOR, Heraldo Márcio. Quem não pode morder não mostra os dentes: modernistas e antropofágicos entre São Paulo e Belém do Pará nos anos 1920. Tese (Doutorado em História). Belém: UFPA, 2020.). Após a Semana de Arte Moderna, ocorrida em São Paulo em 1922, os modernistas paulistas que haviam se unido contra o romantismo e o parnasianismo para construir uma arte nacional a partir dos preceitos da modernidade que conhecera a capital paulista daquele início de século, grupos foram se formando ao redor de redações de jornais e revistas, defendendo sua maneira de interpretar a arte moderna, a política, a sociedade e a nacionalidade. Dois exemplos importantes são o movimento pau-brasil, iniciado em 1924 por Oswald de Andrade e Tarsila do Amaral, que buscava uma posição primitivista e de redescoberta, e o movimento verde-amarelo, iniciado por Cassiano Ricardo, Plínio Salgado e Menoti Del Picchia, que propunha um nacionalismo puro, com características nativistas, sem a interferência da arte europeia, como é apontado no seguinte trecho:

O grupo “verdamarelo”, cuja regra é a liberdade plena de cada um ser brasileiro como quiser e puder; cuja condição é cada um interpretar o seu país e o seu povo através de si mesmo, da própria determinação instintiva; o grupo “verdamarelo”, à tirania das sistematizações ideológicas, responde com a sua alforria e a amplitude sem obstáculo de sua ação brasileira. (…) Aceitamos todas as instituições conservadoras, pois é dentro delas mesmo que faremos a inevitável renovação do Brasil (PICCHIA et. al. 17 mai. 1929PICCHIA, Menoti de et al. O atual momento literário. Correio Paulistano, p. 2, 17 maio 1929.)

A partir de pau-brasil e contra o verde-amarelismo, foi pensado o movimento antropofágico, de início por Oswald de Andrade, Raul Bopp e Tarsila do Amaral e publicado o primeiro número da RA em maio de 1928. Essas lutas em torno de revistas, jornais e manifestos revela o projeto ideológico do modernismo em São Paulo entre 1924 e 1929, isto é, a construção de uma nova consciência nacional, mas vinculada ao posicionamento político de seus autores. De um lado, foi formado um grupo vinculado ao Pau-Brasil e à Antropofagia, ligado ao Partido Democrático e ao Partido Comunista e, de outro, autores ligado ao verde-amarelismo e ao grupo Anta, cuja aproximação ocorria em direção ao Partido Republicano Paulista, representante da oligarquia rural, e cujos membros, em grande parte, fzeram parte do movimento integralista brasileiro na década de 1930.

É importante destacar que o modernismo também deve ser considerado em bases sociológicas pois, segundo Sérgio Miceli (2003)MICELI, Sergio. Nacional estrangeiro: história social e cultural do modernismo artístico em São Paulo. São Paulo: Companhia das Letras, 2003., houve o apoio da aristocracia do café e da burguesia industrial para a construção e ascensão do discurso modernista. Desta forma, segundo o autor, o modernismo paulista se organiza como “superestrutura” da oligarquia cafeeira, pois o mecenato rural criou condições para que os jovens de 1922 impusessem seus modelos estrangeiros em produções artesanais de luxo a partir do mecenato. Também há de se relativizar a distância efetiva entre os dois grupos, afinal muitos dos verdeamarelos e futuros integralistas ou, como os identifica Antonio Arnoni Prado (2010)PRADO, Antonio Arnoni. Itinerário de uma falsa vanguarda: os dissidentes, a Semana de 22 e o Integralismo. São Paulo: Ed. 34, 2010., dissidentes ou falsa vanguarda, publicaram na primeira fase da RA. É necessário, portanto, aprofundar, nos limites do artigo, sobre a revista.

A revista teve duas fases, intituladas “dentições”. A primeira, publicada de maneira independente, com formato de 33 por 24 cm e 8 páginas por número, teve como diretores Alcântara Machado e Raul Bopp, apresentou números mensais até fevereiro de 1929, totalizando 10, e era vendida a 500 réis por número. Seu formato original possui uma apresentação simples, como se fosse uma revista concebida apenas para circular entre conhecidos, como ocorreu com outras revistas de vanguarda europeia, a exemplo de Projecteur, Z1 e Proverbe. Nela consta o Manifesto Antropófago, escrito por Oswald de Andrade, que traça as diretrizes do movimento antropofágico, explicando-o. Em sua primeira frase, “Só a antropofagia nos une. Socialmente. Economicamente. Philosophicamente”, Oswald de Andrade, além de sugerir que os artistas publicados em seus números seriam ligados pela antropofagia, mesmo com certas diferenças, dá a entender que o Brasil todo, apesar de suas especificidades regionais, estariam unidos em um movimento que seria inerente ao brasileiro, a antropofagia, pois seria um resgate de sua verdadeira identidade, afinal “nunca fomos cathechisados. Vivemos atravez de um direito sonâmbulo. Fizemos Christo nascer na Bahia. Ou em Belem do Pará” (ANDRADE, 1928, p. 3ANDRADE, Oswald de. “Manifesto antropófago”. In: Revista de Antropofagia, São Paulo, ano I, n. 1, maio 1928, p. 3 e 7.). Ao que parece, esse é um dos primeiros movimentos artísticos brasileiros que defende a integração efetiva das diversas regiões do país em torno de um movimento.

Nesse período, seu leitor era a elite intelectual brasileira, sem base social uniforme, igual a todo público de arte de exceção, panorama que irá mudar em sua segunda fase. Ao todo, nesse período, assinaram 62 autores entre nomes reais e poucos pseudônimos. O autor que mais publicou foi Antônio de Alcântara Machado, totalizando vinte artigos ao longo das dez edições. Se considerarmos intervenções juntamente com Raul Bopp, o número chega a 21. O autor tem, na revista, basicamente o mesmo papel que Mário de Andrade possuía em Klaxon, ou seja, editoriais e resenhas de livros. O segundo autor que mais publicou nessa fase foi Yan de Almeida Prado, ficando ausente apenas no primeiro número. Com cinco publicações temos Mario de Andrade, com quatro Augusto Meyer e Jorge Fernandes, com três Carlos Drummond de Andrade, Ascenso Ferreira e Rosário Fusco, com duas Oswald de Andrade, Raul Bopp, Plínio Salgado, Brasil Pinheiro Machado, Ruy Cirne Lima, Achilles Vivacqua, Manuel Bandeira, Mario Gracioti, João do Presente, Luis da Câmara Cascudo, Sebastião Dias e A. de Almeida Camargo. Com apenas uma publicação temos quarenta e três autores, entre eles dois paraenses, Oswaldo Costa e Abguar Bastos. Essa característica sugere um caráter de experimentação dessa primeira dentição, ao mesmo tempo em que engloba autores de diversas correntes do modernismo brasileiro, o que inclui questões sociais e políticas.

A partir de março, mudou sua confguração e passou a ser publicada em uma das páginas do Diário de S. Paulo, parecendo um suplemento literário que visava manter sua autonomia, pois continuava como RA. Um fato que chamou atenção foi que, em entrevista ao O Jornal, do Rio de Janeiro, publicada em 18 de maio de 1928, Oswald de Andrade apresentava o surgimento da RA enquanto um jornal antropofágico e, após fazer parte do Diário de S. Paulo, reafirmava-se enquanto revista autônoma. Intitulada como “segunda dentição”, teve como diretores Raul Bopp e Jaime Adour Câmara, como “açougueiro” Geraldo Ferraz e foram publicados 16 números. Dos 39 autores identificados, Oswald de Andrade aparece com 13 publicações, seguido de Oswaldo Costa, com 12. Esses números sugerem, de início, que a redação estava a cargo de um paulista e de um paraense, o que fortalece a tese de que o movimento antropofágico não estava a cargo essencialmente dos paulistas. Com cinco publicações temos Raul Bopp e Tarsila do Amaral, seguidos de Garcia Resende, Jorge Lima, Patrícia Galvão (Pagu) e Julio Paternostro, com 3 publicações cada um. Os paraenses Clóvis de Gusmão e Eneida de Moraes aparecem com duas publicações cada, ao lado de Álvaro Moreira, Jaime Adour Câmara, Heitor Marçal, Ascenso Ferreira, Aníbal Machado e Demócrito Rocha. Com apenas um artigo publicado, temos 23 autores, número relativamente alto, como encontrado na primeira dentição.

Não só seu formato se alterou, mas houve cisões entre os autores e seu conteúdo passou a ser mais combativo. O romantismo, o modernismo, a herança portuguesa, o conceito de família, a religião católica, o patriarcalismo, a sexualidade e a história oficial foram firmemente atacados a partir da devoração de Freud, Marx, Breton, Montaigne, Rousseau, Nietzsche, Padre Antonio Vieira, Montoya, folclore, lendas, culturas nacionais, entre outros. Benedito Nunes, comentando sobre o Manifesto Antropófago, uma das bases para segunda dentição, afirma que há nele um diagnóstico ou uma terapêutica da sociedade brasileira traumatizada pela repressão colonizadora que teria começado com a proibição do ritual antropofágico. A defesa da volta ao “matriarcado de Pindorama”, presente no manifesto e em diversas ocasiões, inclusive em publicações provenientes da Amazônia, seria um elemento recalcado pela cultura messiânica, como o ócio, a alegria e a ausência de classes. Para que houvesse um desrecalque brasileiro seria necessário promover uma operação freudiana, isto é, transformar o Tabu em Totem para recuperar a identidade nacional que estava em confito psicanalítico com a paternidade. A autonomia literária seria um questionamento da autoridade do pai, a literatura portuguesa, e a afirmação da maioridade.

Com a explícita intenção de não ser vista enquanto “escola literária”, de devorar e deglutir todos os grupos, tendências, manifestos e críticas, tem em seus quadros, na primeira dentição, diversas correntes do modernismo brasileiro. Entretanto, a partir da segunda dentição, seus redatores, como Oswald de Andrade, Oswaldo Costa, Geraldo Ferraz, Raul Bopp e Clóvis de Gusmão, passaram a selecionar os autores a publicar na revista entre os que estavam inteiramente de acordo com as diretrizes do movimento, excluindo de seus quadros autores como Antônio de Alcântara Machado, Yan de Almeida Prado, Mario de Andrade, Plínio Salgado, Meniti Del Picchia, entre outros ligados aos conservadorismo na política e na arte, como o grupo verde-amarelo, ou então aos apoiadores de Mario de Andrade, como o grupo da revista Verde, de Cataguases. Sua aproximação com o Partido Comunista pareceu ter se intensificado, gerando artigos em tom de acusação, em outros periódicos, como o que segue:

Alguns rapazes engraçados e communistas defendem, com mais pseudonymos do que argumentos, um programma derrotista e reaccionario na “RA” – páginas cheias de insultos á Pátria, á Religião, á Familia, á Sociedade e á Moral. (...) Chamamos a atenção do governo constituído, das autoridades ecclesiaticas, dos paes de família e especialmente do sr. dr. chefe de polícia para o caso. Como se vê, sob o disfarce de antropofagia o bolchevismo extende até nós as suas possantes garras. Paú nelles, não. Vamos requerer a sua expulsão do território nacional. (CAMPOS et. al., 1929, p. 17CAMPOS, Augusto de et. al. Olhinho de Moscow. Secção livre. Folha da Manhã. 01 mai. 1929. Caderno único. São Paulo, p. 17.)

Talvez a descrição acima, presente no jornal Folha da Manhã, de 01 de maio de 1929, mais agradasse do que ofendesse o grupo que compunha a segunda dentição da RA uma vez que em suas páginas havia diversas referências a Karl Marx, o uso de pseudônimos que lembravam eventos ou autores comunistas, argumentos contra o nacionalismo cego que gerara o imperialismo e neocolonialismo, contra a imposição da religião e da moral católica aos indígenas, contra o conceito de família enquanto pedra angular da sociedade, entre outras questões. Além disso, o próprio título do artigo, “olhinho de Moscow”, revela que os integrantes da RA poderiam ser informantes da União Soviética no Brasil ou até mesmo local por onde os comunistas tentariam se inserir na imprensa.

Obviamente sem a intenção de ter problemas com o “sr. dr. Chefe de polícia” e de terem sua “expulsão do território nacional”, o que se percebe nas páginas da revista é a incessante defesa de uma nova maneira de perceber e conceber o mundo que vão de encontro com a tradicional elite agrária paulista e nacional em âmbitos estéticos, políticos, sociais, culturais e religiosos. No trecho reproduzido acima, estes “rapazes engraçados” estavam, em uma revista literária, a questionar e desorganizar a ordem estabelecida no sistema social paulista e brasileiro, no sentido defendido por Raymond Williams (1992)WILLIAMS, R. Cultura. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992., ou seja, para este autor, há diversos sistemas inseridos e reproduzidos na sociedade, como sistema econômico, político, geracional e cultural em que cada um deles tem seu próprio sistema de significações. Williams defende que estes sistemas devem ser analisados separadamente e relacionados, pois todos os sistemas de significações fazem parte de um sistema de significação mais amplo e mais geral, um sistema social, ou seja, o sistema social é a soma dos sistemas de significações.

Dessa feita, cada item citado no artigo como componente ofensivo de afronta ao sistema social – “communistas”, “derrotista e reaccionário”, “Pátria”, “Religião”, “Familia”, “Sociedade”, “Moral”, “bolchevismo” – deve ser considerado individual e relacionalmente. A acusação ocorre devido aos autores da revista atentarem contra diversos sistemas de significações cristalizados socialmente como corretos na vida pública e privada, acusação esta a qual os escritores e artistas antropofágicos possivelmente confessariam, assumiriam, delatariam e se vangloriariam, este “sarampão antropofágico”.

É importante lembrar que a historiografia da década de 1980 sobre o movimento de 1930, representada principalmente por Edgard de Decca (1981)DECCA, Edgar de. 1930: o silêncio dos vencidos. São Paulo: Brasiliense, 1981. e Ítalo Tronca (1982)TRONCA, Ítalo. A Revolução de trinta: a dominação oculta. São Paulo: Brasiliense,, pretende desqualificar 1930 enquanto marco revolucionário e construir a ideia de que a revolução representaria um golpe preventivo da burguesia contra o movimento operário, encarado como séria ameaça à dominação burguesa. De acordo com autores diversos identificados com esta vertente, não seria o ano de 1930 o verdadeiro momento revolucionário, mas 1928, quando se explicita a luta de classes no país com a criação do Bloco Operário Camponês pelo Partido Comunista e a fundação do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo pelas classes dominantes em resposta à mobilização operária. Esta postura repressiva resultou na conotação do golpe enquanto instrumento de produção discursiva vitoriosa, com a intenção de apagar a memória da verdadeira luta de classes (FERREIRA; PINTO, 2006FERREIRA, Marieta de Moraes; PINTO, Surama Conde Sá. A Crise dos anos 20 e a Revolução de Trinta. Rio de Janeiro: CPDOC, 2006.). Por esta perspectiva, o movimento antropofágico e a RA, publicada em 1928 e 1929, já estavam inseridos em um contexto de discussões políticas e sociais próximas ao evento que depôs o presidente da república em 1930. Isto quer dizer que os antropofágicos, principalmente a partir da segunda dentição, defenderam uma divisão estética entre eles e os modernistas a partir de um discurso político-ideológico. Os modernistas que não aderiam à “descida antropophaga”, que defendia um viés de esquerda, acabavam sendo tidos como defensores das oligarquias ou da burguesia industrial repressora.

Assim, foram feitas diversas críticas ao modernismo por considerarem que seus autores haviam se apegado apenas à estética, mas não o fzeram como combate, como ocorria contra o parnasianismo, por exemplo. O modernismo era tido por eles, como apresentou Oswaldo Costa, como uma fase de transição para a antropofagia. Costa, nascido em Belém no ano de 1900 e falecido no Rio de Janeiro em 1967, foi um dos intelectuais que mais contribuiu com a RA, principalmente em sua segunda dentição, em que fez parte da redação e publicou muitos textos radicais. Geraldo Ferraz, em entrevista a Maria Eugênia Boaventura (1985)BOAVENTURA, Maria Eugênia. Vanguarda antropofágica. São Paulo: Ática, 1985., em 1977, atesta a relevância do paraense para a Revista, afirmando que foi uma fgura importante e preponderante, que explorou a maior parte do “negócio” e que mais por sua causa foi mantida a segunda dentição.

Mesmo sendo citado por Oswald de Andrade em entrevista ao O Jornal, do Rio, em 1929, como força extraordinária “que ao meu lado formaram na urgente obra de anticatequese que vamos levando efeito” (ANDRADE, 2009, p. 77), foi muito difícil encontrar quaisquer dados que façam referência a ele nos estudos mais consagrados que tratam da antropofagia, incluindo aqui Antonio Candido e Maria Eugênia Boaventura (1995)BOAVENTURA, Maria Eugênia. O salão e a selva. Campinas: Editora da UNICAMP/Ex-Libris, 1995.. Em um único estudo, foram encontrados dados mais pontuais sobre esse intelectual. Segundo Carlos Jáuregui (2015)JÁUREGUI, Carlos. Oswaldo Costa, Antropofagia, and the Cannibal Critique of Colonial Moderny. In: Culture & History Digital Journal. December, 2015., em 1918, Oswaldo Costa, que também escrevia seu nome com “v”, mudou-se para o Rio de Janeiro para estudar Direito e começou sua carreira como jornalista no Correio da Manhã. Na década de 1920, interessou-se pelos modernistas e ligou-se ao nascente grupo antropofágico. Oswald de Andrade, em Carta a Carlos Drummond de Andrade, em 1929, refere-se a

Oswaldo Costa como um “autêntico Cunhambebe” (ANDRADE, 1986, p. 101ANDRADE, Carlos Drummond de. Tempo, vida, poesia. Rio de Janeiro: Record, 1986.), fazendo referência ao famoso chefe “cannibal” Tupinambá do século XVI.

Cunhambebe é fgura exposta por Hans Staden em Duas viagens ao Brasil:

Cunhambebe tinha à sua frente um grande cesto cheio de carne humana. Comia de uma perna, segurou-a diante da boca e perguntou-me se também queria comer. Respondi: “Um animal irracional não come um outro parceiro, e um homem deve devorar um outro homem?”. Mordeu-a então e disse: “Jauára ichê”. Sou um jaguar. Está gostoso (STADEN, 1988, p. 132STADEN, H. Duas viagens ao Brasil,. Tradução de Guiomar de Carvalho. Belo Horizonte/São Paulo: Ed. Itatiaia, 1988.)

Segundo Viveiros de Castro (1986)VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. Araweté: os deuses canibais. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1986., essa passagem pode vir a ser uma “tirada humorística”, mas representa as diferentes visões dos protagonistas. Cunhambebe não era um homem a comer outro homem, era um jaguar a comer um homem, ou seja, um inimigo a comer um inimigo. Revela-se a perspectiva cultural e simbólica da própria ação canibalesca, que vai de encontro aos modernistas. Foram de Costa as maiores críticas ao movimento modernista, em geral, e ao Mario de Andrade, em especial, principalmente na coluna Moquém, publicada durante a segunda dentição, em que assina com o pseudônimo TAMANDARÉ. Em MOQUEM II: Hors d’oevre lança seu olhar sobre o modernismo brasileiro, criticando ferrenhamente seus participantes e o movimento em si sem, entretanto, chegar ao ponto de negar o movimento em todos os seus contornos. Seu valor, segundo ele, seria puramente histórico e documental, da mesma maneira que arcadismo, romantismo, parnasianismo e simbolismo o eram. Todavia, seria superior a todos os outros movimentos artísticos pois representaria uma tentativa de libertação; “já correspondia a uma necessidade, era sincero” (TAMANDARÉ, 1929, p. 6TAMANDARÉ (Oswaldo Costa). MOQUEM II: Hors d’oevre. Diário de S. Paulo, São Paulo, p. 6, 14 abr. 1929.). Teria sido o modernismo que retirara da arte brasileira “cacoetes deploráveis: a chave de ouro, a gramática de Coimbra, o respeito conselheiral por uma tradição que não era nossa”, segundo ele.

Sua crítica, então, vai a duas direções principais: romantismo e modernismo. Afirma que a antropofagia não é um decalque romântico do índio nem a deformação lírica do índio, pois ela “arrancou do bravo tupy das fções literárias a camisa dos sentimentos portugueses e as missangas da catequese” (COSTA, 1929, p. 10COSTA, Oswaldo. de antropofagia. Diário de S. Paulo, p. 10, 15 mai. 1929.), ou seja, o colocou novamente nu, como consideravam o correto e convinha. É movido por um sentimento anticolonial, pois considera que o Brasil vivia uma “servidão mental” para com os portugueses. Por isso a insistência em afirmar que a antropofagia nada tinha que ver com o romantismo indianista, com o índio “filho de Maria”, “irmão do santíssimo”, “degradado pela catequese” (COSTA, 1929, p. 10COSTA, Oswaldo. de antropofagia. Diário de S. Paulo, p. 10, 15 mai. 1929.).

Mesmo que, na visão de Costa, o modernismo fosse mais sincero que o romantismo, seus autores também não haviam compreendido o “nosso ‘caso’”, não enfrentaram os grandes problemas necessários para a compreensão do Brasil, limitando-se a uma simples revolução estética sem se preocuparem com a criação de um pensamento novo brasileiro. Para defender sua argumentação, o autor cria uma metáfora que compara o modernismo com o movimento de independência do Brasil: “Se o índio dos românticos era o índio filho de Maria, o índio dele [modernismo] era o índio major da Guarda Nacional” (TAMANDARÉ, 1929, p. 6TAMANDARÉ (Oswaldo Costa). MOQUEM II: Hors d’oevre. Diário de S. Paulo, São Paulo, p. 6, 14 abr. 1929.). Costa sugere, dessa forma, que o romantismo que excluíra o índio enquanto componente de uma cultura verdadeiramente nacional deu lugar ao modernismo que o inseriu enquanto cidadão brasileiro sem, contudo, considerar sua cultura, afinal os indígenas presentes na Guarda Nacional, mesmo que com patentes altas e lutando pela nacionalidade brasileira, não poderiam participar efetivamente da política por meio do voto, mantendo-os distantes das elites e mais próximos aos setores subalternos da sociedade. Além disso, indica que apenas os índios “civilizados” ou “católicos” fariam parte da Guarda Nacional e, consequentemente, do modernismo, diferente do que defendia o movimento antropofágico, isto é, o índio “bravo”, natural, antropófago. O índio modernista, assim, ainda seria o major catequisado da Guarda Nacional, o índio “irmão do Santíssimo”.

O movimento modernista teria sido, dessa forma, uma fase de transição. Uma simples operação de reconhecimento que trouxe muita “confusão” para a sua geração, acomodando “numa democracia de bonde da Penha, o sr. Sérgio Buarque de Holanda e o sr. Ronald de Carvalho, o sr. Mario de Andrade e o sr. Graça Aranha, e até o sr. Guilherme de Almeida” (TAMANDARÉ, 1929, p. 6TAMANDARÉ (Oswaldo Costa). MOQUEM II: Hors d’oevre. Diário de S. Paulo, São Paulo, p. 6, 14 abr. 1929.). A imagem do modernismo enquanto um bonde – muito usados nas criações modernistas como símbolo de progresso – carregando autores com diferenças marcantes, mas em um mesmo lugar, no Bonde, na Penha, deixa entrever a percepção clara de Oswaldo Costa sobre os modernistas em geral. Insere os artistas no bonde moderno, mas parece os retirar à medida que descem e se reconhecem enquanto antropófagos. Um movimento que iniciou também em meio a confusões na primeira dentição e foi se definindo mais concretamente.

Segundo Costa, a antropofagia seria mais verdadeira pois, pela primeira vez, se discutiu os verdadeiros problemas da nação; não como haviam feito os românticos e os modernistas ao estilizar e deformar o índio e o transformar em brasileiro, consecutivamente. A nossa história, segundo ele, continuou a ser escrita pelos modernistas com “as patranhas dos padres, ‘paty maranduba’” (TAMANDARÉ, 1929, p. 6TAMANDARÉ (Oswaldo Costa). MOQUEM II: Hors d’oevre. Diário de S. Paulo, São Paulo, p. 6, 14 abr. 1929.). As patranhas, ou seja, mentiras dos padres teriam prejudicado toda a intenção dos modernistas, que acabavam fazendo parte do “paty maranduba”. Esse termo, usado por Costa entre aspas, como uma citação, sugere algumas interpretações. Em primeiro lugar, “paty” vem do arcaico patim, que significa pequeno pátio ou patamar, enquanto maranduba, do tupi “mara’nduwa” é uma maneira regional encontrada na região norte que significa mentira ou história inverossímil. Assim, tal expressão poderia significar “pátio da mentira” por uma análise indígena e amazônica e, antropofagicamente falando, uma variante da forma popular “pátio dos milagres”, que lembra “La Cour des Miracles” (HUGO, 1831, p. 78HUGO, Victor. Notre Dame de Paris. Disponível em: http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/lv000089.pdf. Acessado em: 02 de janeiro de 2022.
http://www.dominiopublico.gov.br/downloa...
), presente no livro Notre Dame de Paris, de Victor Hugo.

Na obra, publicada em 1831 e que retrata da sociedade francesa do século XV, enquanto o poeta e filósofo Gringoire segue apaixonadamente, à noite, a cigana Esmeralda pelas ruelas labirínticas de Paris, chega a uma praça “onde jamais homem honesto algum havia entrado em semelhante horário” (HUGO, 1831, p. 78HUGO, Victor. Notre Dame de Paris. Disponível em: http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/lv000089.pdf. Acessado em: 02 de janeiro de 2022.
http://www.dominiopublico.gov.br/downloa...
. Tradução nossa), local lamacento, repleto de mendigos, aleijados, cegos, crianças, cachorros. Estes pátios dos milagres, comuns em algumas cidades da Europa desta época, com leis próprias, com um rei, repleto de bandidos, assassinos, mentirosos e falsos deficientes, seria também um “pátio da mentira”. Nele, todos os mendigos aprendiam, durante a noite, as melhores maneiras de mendigar. Pessoas aprendiam a imitar deficiências físicas ou psicológicas para pedir dinheiro durante o dia, mas quando voltavam para lá, todos eram, como um milagre, curados, e passavam a caminhar normalmente, assim como cegos passavam a enxergar. O milagre, antes de tudo, era uma ironia e uma mentira. Nesse sentido, temos Oswaldo Costa, por um viés popular da região norte, criticando o romantismo e o modernismo ao mesmo tempo em que teoriza por um viés antropofágico o “pátio dos milagres” francês e o transforma no “paty maranduba”, brasileiro, cujo sentido se dá pela relação entre o Catolicismo e bandidagem, comparando os padres a mentirosos, que fingem uma coisa e na realidade são outra. Padres que propõe a religião verdadeira, a salvação, mas que na realidade escondem a dominação e a exploração do indígena e do Brasil. Além disso, o “paty maranduba” é a representação brasileira e antropofágica do local em que se encontravam ainda os modernistas puramente estéticos, ao lado das patranhas dos padres.

Com o modernismo, de acordo com Costa, a poesia brasileira teria se libertado de alguns preconceitos para escorregar em outros; ao invés de uma poesia essencial, os modernistas teriam apresentado uma poesia de acidentes, de ornatos, de detalhes, de efeitos apenas. Preocupação estética exclusiva com pensamento velho de importação, sem a crítica necessária para perceber que tudo deveria vir abaixo, a falsa história, a falsa arte, a falsa religião, a falsa moral. Segundo Costa, a arte deveria tomar um novo rumo, isto é, o “sentido antropofágico” para afastar-se do sentido “estético da vida”, como havia sido proposto pelo modernista Graça Aranha em 1920. Segundo Octavio Ianni (2000)IANNI, Octavio. Tendências do pensamento brasileiro. Tempo social, São Paulo, v. 12, n. 2, p. 55-74, Nov. 2000., Graça Aranha faz parte de uma “linhagem” de autores que trata a sociedade, a política e a literatura como setores que podem ser considerados separadamente e que teriam certa autonomia. Seria como se a história do país se desenvolvesse por meio de signos, símbolos e emblemas sem que fosse necessário revelar as relações, os processos e as estruturas de dominação e apropriação com as quais podemos desvendar os nexos e os movimentos da realidade social, como tipologias do bandeirante, do viajante, do índio, do negro, do imigrante, do colonizador, do aventureiro, de uma história não-histórica. Especificamente sobre o livro “A esthetica da vida” (1921), Graça Aranha, assim como o fzeram diversos modernistas, valoriza as três raças formadoras da identidade brasileira, indígenas, negros e portugueses, como a unidade moral da antiga colônia e sua metrópole.

Sobre estes aspectos, Antonio Arnoni Prado (2010)PRADO, Antonio Arnoni. Itinerário de uma falsa vanguarda: os dissidentes, a Semana de 22 e o Integralismo. São Paulo: Ed. 34, 2010. apresenta a década de 1920 como fase essencialmente estética do modernismo, mas a insere enquanto momento de gestação de um pensamento conservador, que ele identifica enquanto falsas vanguardas ou vanguardas conservadoras. Segundo o autor, os clássicos da Semana de Arte Moderna não conseguiram espaço na política cultural na Primeira República, tampouco na década de 1930, com raras exceções. Enquanto Mário de Andrade se afastava dos movimentos artísticos à esquerda e buscava sua independência, há continuidade do ideário antropofágico de Oswald de Andrade e de Oswaldo Costa, que se aproximam do Comunismo e do anarquismo. Ao contrário destes, os dissidentes do modernismo assumiram um discurso antivanguardista e conservador para produzir uma política cultural que julgavam adequada para a formação do Estado Nacional, fundindo o colonizador com o natural e diluindo o negro neste ínterim. Além disso, apresentam o surgimento de uma concepção estético-política nacional baseada nos perigos do misticismo comunista próxima de algo que unia fascismo e catolicismo: “os exageros da Revolução (de 1924) e dos desmandos da Anarquia necessitam dos gritos de alarme do Conservadorismo” (SALGADO apud PRADO, 2010, p. 170PRADO, Antonio Arnoni. Itinerário de uma falsa vanguarda: os dissidentes, a Semana de 22 e o Integralismo. São Paulo: Ed. 34, 2010.).

O próprio editorial da Revista Novíssima (1923-1924), da qual participavam Graça Aranha, Cassiano Ricardo, Menoti del Picchia, Plínio Salgado e Guilherme de Almeida, por exemplo, saudou Mussolini no Rio em 1924 e apresentou uma foto dele com Ronald de Carvalho, que o recebera. Também a Revista Toda América, organizada por Ronald de Carvalho (1926-1930), apresentou seu caráter conservador na exaltação aos bandeirantes, aos senhores de engenho, aos fazendeiros, esses “homens que fzeram a nação” e contra todos os estrangeiros. Estes e outros exemplos mais explicitam a gestação do integralismo ainda na década de 1920 que nascerá, efetivamente, na década de 1930.

Oswaldo Costa utilizou Graça Aranha, desta forma, como exemplo a não ser seguido pois a defesa de uma continuidade da história portuguesa, para Aranha, seria uma maneira de crescimento do país e, da mesma forma, de chegar à civilização preparada para produzir arte essencialmente brasileira, ideia que Costa critica. Segundo Costa, o sentido estético da vida não seria nenhuma necessidade humana, nem entre os “nhambiquara”, indígenas considerados com menor contato com o homem “civilizado” na época, nem entre o “europeu super-degenerado pela civilização” (TAMANDARÉ, 1929, p. 6TAMANDARÉ (Oswaldo Costa). MOQUEM II: Hors d’oevre. Diário de S. Paulo, São Paulo, p. 6, 14 abr. 1929.). O sentido correto, antropofágico, seria compreender as cruzadas, as guerras, as lutas econômicas, o viajante, o aventureiro, o bandeirante de acordo com a história do Brasil e relacionado aos mais diversos seguimentos da vida. Dever-se-ia começar compreendendo não a catequização, mas as consequências da “conquista espiritual” da nação tupy.

Mesmo após toda esta explanação, Costa afirma que a intenção não foi atacar os modernistas, também porque tinha mais a falar, mas reconhece a imensidão de sua obra de um certo ponto de vista. Eles teriam anunciado um mundo novo enquanto os passadistas eram a decadência, desprezível, “borra da Europa agonizante”. Segundo ele, sua intenção era tocar o “boré”, afirmar que a fase de transição já passou e que os modernistas, esses “curumins literários”, deveriam ir em direção à libertação da servidão mental, colocar de lado as “ditaduras espirituais” e entrar com o pé direito no “ciclo antropofágico”: “O que vale agora são as dentaduras”.

Oswaldo Costa, após participar da primeira e, efusivamente, da segunda dentição, conhece o Crack da Bolsa de 1929, a decadência da burguesia cafeeira, a ascensão de Getúlio Vargas ao poder em 1930 e o início das lutas entre democracia, fascismo e comunismo. Após esses eventos, Costa volta para o Rio de Janeiro, dedicando-se ao jornalismo e à política. Na década de 1930, ele se dedica à campanha antifascista e era membro do Comitê Central do Partido Comunista, responsável pela comunicação e propaganda. Junto a Apparício Torelly e ao antropófago Aníbal Machado, Oswaldo Costa funda o Jornal do Povo em 1934. Em 1935 era jornalista de A Manhã, quando participou da Intentona Comunista contra Getúlio Vargas, pela qual foi preso e acusado em 1936. As autoridades o consideraram o secretário intelectual do Partido. Após sair da prisão e ser condenado novamente, ele retoma suas atividades jornalísticas e modernistas no final da década de 1940 a partir de pseudônimos, especialmente Tamandaré, e após ser condenado a 5 anos, se refugia na embaixada do Chile e acaba cumprindo 2 anos apenas. Em 1942, ele sai da prisão e entra para o jornal de esquerda Diretrizes. Costa dedicou grande parte da sua vida ao jornalismo, contribuindo com diversos jornais, como Diário da Bahia, Correio da Manhã, Correio Paulistano, Folha de São Paulo (Edição do Rio de Janeiro), a RA, O Homem do Povo, Jornal do Povo, A Manhã e a Revista Diretrizes, à qual foi promovido a diretor em 1945. Em 1956 fundou o Jornal O Semanário, que atingiu uma distribuição nacional de 60.000 exemplares. O semanário foi fechado pela ditadura militar e ele e sua família foram investigados no período e tiveram seus direitos políticos caçados.

O hiato da memória: o “homem do povo” antropofágico

Se na primeira dentição começa-se a definir um conceito de antropofagia simbólico, cultural e estético, com a presença de diversas vertentes políticas e artísticas, na segunda dentição há mais claramente a tentativa de diferenciação do movimento antropofágico em relação ao modernismo a partir de discussões sobre a contestação do status quo, do marxismo, da Revolução Bolchevique, do aborto, do divórcio, do papel da mulher na sociedade, mas sem o desprezo pela questão estética. O fim da RA, em agosto de 1929, ocorreu devido a desentendimentos internos no Diário de S. Paulo, pois os ataques políticos, à moral religiosa e polêmicas fzeram com que houvesse uma diminuição nas tiragens e Rubens do Amaral, responsável pelo Diário, exigiu sua extinção. Raul Bopp (2008)BOPP, Raul. Vida e morte da Antropofagia. Rio de Janeiro: José Olympio, 2008. conta que as devoluções de jornais aumentavam dia a dia devido às páginas ácidas da Revista, em protesto contra os antropofágicos. Alexandre Nodari (2022) acredita que o acirramento ou afunilamento político da segunda dentição foi se acentuando devido a uma ligação – e adesão posterior – de vários membros do núcleo duro ao comunismo:

Assim, não é descabido, levando em consideração também o relato de Bopp, imaginar que a radicalização, que importava uma seleção ideológica de nomes e ideário, persistiu e mesmo se aprofundou na terceira dentição - o que não implica dizer que não houvesse contradições, acomodações e alianças, no mínimo, duvidosas, como aquela com o governo capixaba, que fazia da Antropofagia uma doutrina oficial... (NODARI, 2022, p. 199)

O fim da revista não significou, portanto, o fim ou o intervalo do movimento antropofágico, o que dão a entender diversos estudos que tratam apenas da década de 1920. Provou-se neste artigo que, tampouco, ele volte a ser considerada apenas nos teatros de Oswald de Andrade ou no final da década de 1940. João Marques Lopes (2015)LOPES, João Marques. Uma leitura da Revista de Antropofagia: o espectro da revolução Bolchevique?. In: Historiae, Rio Grande, 6 (1): 142-166, 2015. defende, a partir de escritos de Oswald após 1945, que houve ainda uma terceira dentição da RA, representada pelo jornal O homem do povo, publicado pela primeira vez em 27 de março de 1931 e que contou com oito números até 13 de abril do mesmo ano. Mais recentemente, o jornalista Jason Tércio publicou na Folha de S. Paulo, em 27 de junho de 2021, ter “descoberto”, por acaso, a “terceira fase da Antropofagia” ou mesmo a “terceira dentição” da RA em uma seção, de uma página, da revista semanal carioca de variedade O Q A (“O que há”), dirigida pelo antropofágico paraense Clóvis de Gusmão no Rio de Janeiro. Seguindo os passos e análises de Alexandre Nodari (2021)NODARI, Alexandre. A oca de Clóvis de Gusmão: sobre a página antropófaga na revista O Q A (O que há). LANDA, v. 10, p. 188-243, 2021., não houve uma terceira dentição da RA, mas pode ter havido outras fases do movimento. Interessa, no momento, mais do que indicar e defender a existência de uma terceira dentição ou de seus líderes, compreender que a antropofagia não se encerrou com sua revista para voltar pós-1945, mas que foi um movimento de cunho estético e ideológico que, a partir da sua segunda dentição, adentrou mais ferozmente a devorar o comunismo pós 1930, e cujo um dos resultados foi a formação do “marxismo antropofágico”, síntese socialista de Oswald de Andrade, como aponta Marcio Carreri (2015, p. 29).

Assim, mesmo contando com a liderança de Oswald de Andrade e a presença de Oswaldo Costa, preferimos trata-lo enquanto jornal político/partidário cujo pensamento e ideologia antropofágica se faziam presentes em uma fase de reestruturação da vida brasileira pós crise de 1929 e Revolução de 1930. Tais eventos trouxeram para a ordem do dia, mais incisivamente, discussões sobre dependência econômica, democracia, fascismo, comunismo e o jornal, cujos membros faziam parte do Partido Comunista, atuaram na tentativa de transformação de suas realidades, discutindo mais claramente os conceitos marxistas e leninistas do que nos números da RA da década de 1920.

Entretanto, mesmo com seus membros alinhados ao partido, o grupo antropofágico manteve o princípio da devoração interna e externa, atento sempre ao contexto brasileiro. A linha tênue entre o nacionalismo e o universalismo é fator preponderante para compreender este movimento que passou a lutar contra as oligarquias, a burguesia, se alinhou ao comunismo, mas também devorou o bolchevismo adaptando seus ideais à realidade nacional. Oswald de Andrade, no entanto, entre o fim da RA e a publicação do jornal O homem do povo tomou uma posição mais próxima a Luís Carlos Prestes, mantendo as raízes nacionais e ao mesmo tempo a postura universal diante da nova realidade política. Enquanto alguns modernistas aderiram à causa da Aliança Liberal e outros, principalmente paulistas, apoiaram as ações de Washington Luís ao indicar um paulista para o suceder, quebrando o acordo da conhecida “política café-com-leite”, Oswald de Andrade se afasta de ambas as concepções, mas também não tenta se filiar, inicialmente, ao Partido Comunista.

Segundo Marcio Carreri (2015), Luis Carlos Prestes, líder tenentista, foi principal referência de Oswald de Andrade para sua inserção no comunismo. Em Encontro com Marx, presente no livro Os Dentes de Dragão, Oswald de Andrade afirma que aderiu ao comunismo a partir de Patrícia Galvão, pois esta fzera uma viagem a Buenos Aires para um recital de poesia e voltou com panfetos, livros “e uma grande novidade: - Oswald, tem o comunismo... Conheci um camarada chamado Prestes. Ele é comunista e nós também vamos ficar. Você fica? – Fico” (ANDRADE, 1990, p. 234ANDRADE, Oswald de. Os dentes do dragão: entrevistas. São Paulo: Globo, 1990.).

Para Maria Eugênia Boaventura (1995)BOAVENTURA, Maria Eugênia. O salão e a selva. Campinas: Editora da UNICAMP/Ex-Libris, 1995., além o Oswald de Andrade enfrentar grave situação econômica nesta fase, o encontro com Luís Carlos Prestes enquanto este esteve exilado no Uruguai alterou os rumos de seus projetos pessoais. Tendo escrito uma carta a ele em 1930, chamou-o afetuosamente de general. Segundo ela, Andrade criticava a caminhada dos tenentes pelo país, “uma vergonha ideológica”, quando o sentido revolucionário escapava a seus líderes. Continua a autora que, antes de entrar para o Partido Comunista, o autor convidou Prestes a abandonar o comunismo, “o outro lado do cristianismo burguês”, e ingressar na “ideologia climatérica”, a antropofagia “como única solução americana dos nossos problemas vivo” e “livre doutrina da aventura pessoal”. Nesta fase política que se encontrava o Brasil, o convite a Prestes revela um papel decisivo no processo de democratização.

Maria Augusta Fonseca relata, mais especificamente, o encontro de Pagu e de Oswald com Prestes:

Em 1931 Oswald e Pagu vão a Montevidéu. Lá encontram Luís Carlos Prestes, que, no exílio, já adotara o marxismo em substituição aos vagos propósitos do tenentismo. Oswald de Andrade cerca-se de entusiasmo ao conhecê-lo, um homem culto com quem afirma ter conversado durante três noites nos cafés da capital uruguaia. Confessa então ter acabado com a fase do Modernismo para começar uma outra. Na volta, o casal filia-se ao Partido Comunista Brasileiro (FONSECA, 1990, p. 197FONSECA, Maria Augusta. Oswald de Andrade: biografia. São Paulo: Art Editora, Secretaria do Estado da Cultura, 1990.)

Tendo como editor Álvaro Duarte e como secretários Pagu e Queiróz Lima, a redação d’O Homem do Povo estava localizada na praça da Sé, em São Paulo, e sua publicação era programada para circular terças, quintas e sábados, conforme consta na página 06 do número 2, embora tenham havido números às segunda e às sextas. Possuía como público alvo o operariado urbano e pode ser compreendido enquanto periódico que indica o que Oswald de Andrade, Patrícia Galvão e Oswaldo Costa compreendem enquanto soluções para um novo Brasil a partir de uma linguagem coloquial e fluida: “o jornal não é apenas um propagandista criativo e um agitador coletivo. Ele é também um organizador coletivo” (CARRERI, 2015, p. 134).

Além das discussões acerca do comunismo serem claras nas páginas do jornal, há de se considerar a parceria travada entre Oswald e Astrogildo Pereira, um dos fundadores do Partido Comunista no Brasil, que assinava com o pseudônimo Aurelino Corvo (QUADROS, 2009QUADROS, Aurora Cardoso de. Oswald de Andrade no jornal O Homem do Povo. Tese (Doutorado em Literatura). Universidade de São Paulo, 2009.). Por meio do novo jornal, em que satiriza a sociedade capitalista e burguesa dependente do capital externo, manifesta seu ativismo comunista com Astrogildo Pereira, Pagu e Quiroz Lima. Augusto de Campos, na introdução à versão fac-símile de 1984 aponta a continuidade do jornal enquanto prolongamento da segunda dentição da RA, mas Benedito Nunes adverte:

Não busque porém o leitor no pensamento de Oswald de Andrade a latitude do discurso refexivo-crítico, a delimitação cuidadosa de problemas e pressupostos, nem “essas longas cadeias de raciocínio” que caracterizam a filosofa stricto sensu. Busque, isto sim, a cadeia das imagens que ligam a intuição poética densa à conceituação filosófica esquematizada, aquém de qualquer sistema e um pouco além da pura criação artística. E, sem confundir seriedade com sisudez, aceite que o tempero da sátira tenha entrado, em altas doses, nesse banquete antropofágico de ideias, presidido pelo humor de Serafm Ponte Grande que fundiu o sarcasmo europeu de Ubu-Roi com a malícia brasileira de Macunaíma (NUNES, 1995, p. 39NUNES, Benedito. A antropofagia ao alcance de todos. Prefácio. In: ANDRADE, Oswald. A Utopia Antropofágica. São Paulo: Globo, 1995, p. 15-39.).

Seguindo esta linha, Nunes considera que a antropofagia oswaldiana é a metáfora do processo de politização que desencadeia no jornal, cuja renovação acompanha seu ideal utópico. Assim como na RA, em que autores como Oswald de Andrade, Oswaldo Costa e Clóvis de Gusmão defendem um primitivismo comunista, Oswald, a partir do jornal, encontra na Revolução Russa seu ideal socialista que já era vivido pelos indígenas, excetuando o “progresso técnico” que poderia ser compartilhado com tal país, sempre contra a “cabra-cega da produção capitalista” e contra os “importadores da consciência enlatada” (ANDRADE, 1931, p. 1ANDRADE, Oswald de. Ordem e Progresso. O homem do povo, São Paulo, p. 01, 27 mar. 1931.). Com “consciência enlatada” critica as ideias e ideologias que vêm prontas e são aceitas sem o elemento crítico nacional pois, de acordo com sua concepção, não chega a absorver toda e qualquer solução vinda da Revolução Bolchevique, mas devora, absorve, inclui, exclui de acordo com a realidade nacional. Nesta argumentação, devora o lema positivista de “Ordem e Progresso” impresso na bandeira nacional e o transforma em “Ordem econômica, progresso technico e social”, cuja aproximação com a Rússia é inevitável, pois:

Não temos generais nem profetas. Somos a opinião livre mas bem informada. Sabemos nos colocar no espaço-tempo. Sabemos que existe em São Paulo uma corrente separatista que prefere a ocupação estrangeira à evolução do Brasil na direção do estouro do mundo pela guerra e pela revolução social. Sabemos que nas fronteiras do Sul existe um grande chefe capaz de criar uma aventura de caráter romântico popular. Sabemos que o partido comunista, auxiliado pelos fatos, prepara as massas das oficinas e dos campos, enquanto a resistência Kulak se forma na dissolvência natural dos latifúndios. Nesse setor o determinismo histórico se biparte e defronta. Sabemos que há místicos estômagos vazios no Nordeste, cavadores ao Sul, indiferentes a Oeste, canhões imperialistas no nosso mar. Sabemos que existe a ala canhota no mundo e aqui. Nela se encartam os que acreditando ser da esquerda, não passam de direitistas confusos. Entre uns e outros nos colocamos com uma imensa e clara simpatia pelas reivindicações da nossa gente explorada. Nosso programa é simples – basta entrarmos na nossa bandeira. Dar vida, força e sentido a um lema que até ontem parecia vazio e irônico – ORDEM e PROGRESSO. Milagre das ideias chamadas subversivas!

À guisa de conclusão, a partir do trecho anterior elenca as questões políticas e sociais existentes no Brasil. Cita que na “Patria de Lenine” nunca houve superprodução de casas de pasto, ao contrário do Brasil, que estocava e queimava café, e a metalurgia encontrou ótimos resultados com o plano quinquenal, ao contrário do Brasil que, devido aos capitais estrangeiros que “deformaram estranhamente a nossa economia”, de um país que possui a maior reserva de ferro e o maior potencial hidráulico, fzeram um “país de sobremesa. Café, açúcar, fumo, bananas. Que nos sobrem ao menos as bananas” (ANDRADE, 1931, p. 1ANDRADE, Oswald de. Ordem e Progresso. O homem do povo, São Paulo, p. 01, 27 mar. 1931.).

  • 3
    Lafetá afirma que em alguns momentos há a predominância de um projeto sobre o outro e ilustra sua argumentação a partir de Agrippino Grieco, essencialmente estético e alienado, Tristão de Athayde, que transitava entre o projeto estético e o projeto ideológico pela dimensão da moral e ética católica, Mário de Andrade, que melhor encontra o equilíbrio entre os dois projetos e Octávio de Faria, inteiramente ideológico sem compromisso com o projeto estético.
  • 4
    Tanto a Semana de Arte Moderna quanto o movimento antropofágico, seguindo as pegadas de Le Gof (2000), não são inócuos ou símbolos máximos de um movimento literário. Não se pode considera-las como divisores de águas, exaltá-las nem as menosprezar, pois são, hoje, fruto de uma montagem da sociedade que a produziu, ou seja, conviveram em épocas sucessivas e foram manipuladas, ainda que pelo silêncio, pelos próprios idealizadores ou participantes do evento, assim como por literatos, críticos de arte/literatura, historiadores, e pelos próprios artistas que apoiavam ou faziam parte da vanguarda modernista. São, portanto, documentos e, sendo documentos, devem ser considerados monumentos, pois resulta do esforço dessa sociedade histórica para impor ao futuro determinada imagem de si própria.
  • 1
    Artigo não publicado em plataforma preprint. Todas as fontes e bibliografia utilizadas são referenciadas no artigo, que é um desdobramento, revisto e ampliado, de pesquisa de doutoramento realizada na Universidade Federal do Pará (UFPA) e na École des hautes études en sciences sociales (EHESS) entre 2016 e 2020. Esta pesquisa foi financiada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), mediante bolsa do Programa de Formação Doutoral Docente (Prodoutoral-Unifesspa. Processos números 88882.466198/2019-01 e 88882.466209/2019-01) e do Programa de Doutorado Sanduíche no Exterior (PDSE-EHESS-Paris). Processo número 88881.189332/2018-01.
  • Este artigo integra o Dossiê 1922/2022: o século da Semana – balanços e perspectivas organizadores
    Francisco Cabral Alambert Junior, Marcos Antonio da Silva, Nelson Tomelin

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Editado por

Editores Responsáveis
Miriam Dolhnikof e Miguel Palmeira

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    31 Mar 2022
  • Recebido
    31 Mar 2022
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