Acessibilidade / Reportar erro

Balanço das emissões e da captura de CO2 em estruturas de concreto: simulação em função do consumo e tipo de cimento

Resumo

Apesar da indústria cimenteira ser considerada uma das mais poluentes do setor, responsável por aproximadamente 5% das emissões mundiais de CO2, o concreto tem a potencialidade de absorver esse gás, através do processo de carbonatação, compensando em partes as emissões geradas na sua produção. Com o objetivo de analisar este processo, o presente estudo avalia por meio de simulações as emissões e a captura de CO2 de concretos com consumos de 300 a 580 kg de cimento por metro cúbico de concreto, produzidos com diferentes tipos de cimento Portland (CP II F, CP II E, CP II Z, CP III, CP IV e CP V). Por meio da modelagem matemática fez-se o balanço das emissões, identificando o traço que apresenta boa resistência à carbonatação e maior absorção de CO2 durante o ciclo de vida do concreto. Os resultados apontam que concretos com consumo de cimento entre 380 e 420 kg/m³ e com maiores taxas de adições apresentam melhores balanços de emissões.

Palavras-chave:
sequestro de CO2; consumo de cimento; emissões de CO2; medidas compensatórias; sustentabilidade

Abstract

While the cement plant is considered one of the most polluting industry, responsible for about 5% of global CO2 emissions, the concrete has the potential to uptake this gas through the carbonation process, offset in part the emissions generated in its production. With the purpose to analyze this process, this study aims to evaluate emissions and CO2 uptake with cement content 300-580 kg produced with different cement types (CP II F, CP II E, CP II Z, CP III, CP IV and CP V). Through mathematical modeling, the emissions balance was made, identifying the mix that shows good resistance to carbonation and greater absorption of CO2 during the concrete life cycle. The results show that concrete with cement consumption between 380 and 420 kg/m³ showed better balance emissions.

Keywords:
CO2 sequestration; cement content; CO2 emissions; compensatory measures; sustainability

1. Introdução

As elevadas emissões gasosas do processo de produção do cimento têm chamado a atenção do setor produtivo, uma vez que a indústria cimenteira sozinha é responsável por cerca de 5 a 7% das emissões globais de CO2 [1[1] ALI, M.; SAIDUR, R.; HOSSAIN, M. A review on emission analysis in cement industries. Renewable and Sustainable Energy Reviews, vol. 15, pp. 2252-2261, 2011. doi: 10.1016/j.rser.2011.02.014.
https://doi.org/10.1016/j.rser.2011.02.0...
, 2[2] SNIC. Sindicato Nacional da Indústria do Cimento. “Relatório Anual,” Rio de Janeiro, 2010., 3[3] MEHTA, P. K.; MONTEIRO, P. J. M. "Concrete: Microstructure, Properties, and Materials", fourth ed., McGraw-Hill, 2014. ].

Como é crescente o consumo mundial de concreto, e consequentemente de cimento, muito se discute sobre alternativas para minimizar as emissões associadas ao concreto, segundo material mais consumido no mundo [3[3] MEHTA, P. K.; MONTEIRO, P. J. M. "Concrete: Microstructure, Properties, and Materials", fourth ed., McGraw-Hill, 2014. ]. De acordo com o Sindicato Nacional da Indústria do Cimento [4[4] SNIC. Sindicato Nacional da Indústria do Cimento. “Relatório anual”, Rio de Janeiro, 2013.], na América Latina, o Brasil se encontra entre os países que mais produzem e consomem cimento, chegando a uma produção de 68 milhões de toneladas no ano de 2012. No mesmo período, a China apresentou um consumo que ultrapassou a casa dos 2 bilhões de toneladas, sendo a maior produtora e consumidora de cimento do mundo, emitindo quase essa mesma quantidade de CO2, uma vez que segundo a literatura [5[5] LIMA, J. Avaliação das consequências da produção de concreto no Brasil para as mudanças climáticas, São Paulo: Tese (Doutorado em Engenharia) - Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, Departamento de Engenharia de Construção Civil, EPUSP, 2010. ], para a produção de uma tonelada de clínquer, mundialmente são gerados de 700 a 1100 kg de CO2.

No cenário nacional, devido a ações do setor cimenteiro, as emissões de CO2, por parte da produção do cimento, representam uma participação de 3%, segundo dados do 2º Inventário brasileiro de emissões e remoções antrópicas de gases de efeito estufa, com dados referentes aos anos de 1990 a 2005, sendo que o país emite em torno de 536 kg de CO2 por tonelada de cimento produzido [6[6] BRASIL. Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), “Relatório de referência. Emissões de Gases de Efeito Estufa nos Processos Industriais. Produtos Minerais. Parte I: Produção de Cimento”. Disponível em: www.mct.gov.br/upd_blob/0228/228962.pdf, Brasília, 2010.
www.mct.gov.br/upd_blob/0228/228962.pdf...
].

Porém, uma importante característica dos materiais a base de cimento refere-se a capacidade de reabsorção de CO2 da atmosfera durante o processo de carbonatação: reação entre o CO2, que ingressa através do concreto, e o hidróxido de cálcio (Ca(OH)2) presente na matriz cimentante, na presença de água. Segundo Pade e Guimarães [7[7] PADE, C.; GUIMARÃES, M. The CO2 uptake of concrete in a 100 year perspective. Cement and Concrete Research, vol. 47, nº 9, p. 1384-1356, 2007. doi:10.1016/j.cemconres.2007.06.009.
https://doi.org/10.1016/j.cemconres.2007...
], a carbonatação e consequente captura de CO2, ocorrem em toda a vida útil de uma estrutura de concreto e até mesmo após a sua demolição, onde é mais intensa.

Em estruturas de concreto armado, a carbonatação é considerada um mecanismo de deterioração, pois causa a diminuição do pH do concreto deixando a armadura suscetível à corrosão. O concreto à temperatura ambiente apresenta pH em torno de 12,5 em virtude da presença de Ca(OH)2. Com a redução do teor de hidróxido de cálcio no interior dos poros da pasta de cimento hidratado e, posteriormente sua transformação em carbonato de cálcio (CaCO3), devido às reações de carbonatação, o pH é reduzido para valores próximos ou inferiores a 9 [8[8] BAKKER, F. M. Initiation period. In: Corrosion of steel in concrete, London: Chapman & Hall, 1988, p. p. 22-5., 9[9] GENTIL, V. Corrosão, LTC, Rio de Janeiro: Ed. LTC. 3º Edição, 2006.. , 10[10] ANDRADE, C. Calculation of diffusion coefficients in concrete from ionic migration measurements. Cement and Concrete Research, vol. 23, nº 3, pp. 724-742, 1993., 11[11] HAMADA, M. Concrete carbonation and steel corrosion. Cement/Concret, nº 272, pp. 2-18, 1969.].

Entretanto, em elementos de concreto não armado (i.e., barragens, paredes de concreto, pavers, peças de ornamentação e outras) a carbonatação pode ser benéfica, atuando como um processo de captura de CO2 da atmosfera, compensando parcialmente o CO2 gerado na produção do cimento [7[7] PADE, C.; GUIMARÃES, M. The CO2 uptake of concrete in a 100 year perspective. Cement and Concrete Research, vol. 47, nº 9, p. 1384-1356, 2007. doi:10.1016/j.cemconres.2007.06.009.
https://doi.org/10.1016/j.cemconres.2007...
, 12[12] GALAN, I.; ANDRADE, C.; MORA, P.; SANJUAN, M. Sequestration of CO2 by concrete carbonation. Environmental Science & Technolog, vol. 44, nº 8, p. 3181-3186, 2010. doi: 10.1021/es903581d.
https://doi.org/10.1021/es903581d...
, 13[13] POSSAN, E.; FOGAÇA, J.; PAZUCH, C. Sequestro de CO2 devido à carbonatação do concreto: potencialidades da barragem de Itaipu. Revista de estudos ambientais, vol. 14, nº 2, pp. 28-38, 2012., 14[14] YANG, K.; SEO, E.; TAE, S. Carbonation and CO2 uptake of concrete. Environmental Impact Assessment Review, vol. 46, pp. 43-52, 2014. doi:10.1016/j.eiar.2014.01.004.
https://doi.org/10.1016/j.eiar.2014.01.0...
], podendo ser considerada no balanço das emissões dos gases causadores do efeito estufa.

Neste contexto, o presente trabalho propõe realizar um balanço das emissões de CO2 e da captura deste gás através da carbonatação para concretos com diferentes tipos de aglomerantes e níveis de resistência, expresso pelo consumo de cimento do traço. Para tal, empregando simulação e modelagem matemática, será analisado um período de 100 anos, período este compreendido por 70 anos de vida útil da estrutura de concreto e 30 anos referentes ao período de pós-demolição.

2. Emissões associadas ao cimento e a captura de CO 2 devido à carbonatação do concreto

As emissões do processo de produção do cimento decorrem especialmente da descarbonatação da rocha calcária, conforme reação simplificada apresentada na Equação 1, e da queima de combustíveis fósseis para a produção do clínquer.

C a C O 3 C a O + C O 2 (1)

No ciclo de vida do cimento, 95% do total de CO2 emitido advém da etapa de produção [15[15] HARBERT, G.; ROUSSEL, N. Study of two concrete mix-design strategies to reach carbon mitigation objectives. Cement & Concrete Composites, vol. 31, pp. 397-402, 2009. doi:10.1016/j.cemconcomp.2009.04.001.
https://doi.org/10.1016/j.cemconcomp.200...
], sendo que quase toda a emissão na indústria cimenteira se concentra na produção do clínquer [5[5] LIMA, J. Avaliação das consequências da produção de concreto no Brasil para as mudanças climáticas, São Paulo: Tese (Doutorado em Engenharia) - Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, Departamento de Engenharia de Construção Civil, EPUSP, 2010. ], pois durante o processo de produção do cimento, metade do CO2 emitido se refere à calcinação da rocha calcária (descarbonatação), enquanto que a parte restante é decorrente da queima de combustíveis para a geração de energia no processo de clinquerização [6[6] BRASIL. Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), “Relatório de referência. Emissões de Gases de Efeito Estufa nos Processos Industriais. Produtos Minerais. Parte I: Produção de Cimento”. Disponível em: www.mct.gov.br/upd_blob/0228/228962.pdf, Brasília, 2010.
www.mct.gov.br/upd_blob/0228/228962.pdf...
].

Porém, tem-se discutido que o concreto tem a potencialidade de capturar CO2 da atmosfera por um processo denominado carbonatação [16[16] GAJDA, J.; MILLER, F. Concrete as a Sink for Atmospheric Carbon Dioxide: a Literature review and estimation of CO2 absorption by Portland Cement Concrete. PCA. R&D Serial no. 2255, Chicago, 2000., 7[7] PADE, C.; GUIMARÃES, M. The CO2 uptake of concrete in a 100 year perspective. Cement and Concrete Research, vol. 47, nº 9, p. 1384-1356, 2007. doi:10.1016/j.cemconres.2007.06.009.
https://doi.org/10.1016/j.cemconres.2007...
, 13[13] POSSAN, E.; FOGAÇA, J.; PAZUCH, C. Sequestro de CO2 devido à carbonatação do concreto: potencialidades da barragem de Itaipu. Revista de estudos ambientais, vol. 14, nº 2, pp. 28-38, 2012.]. Um dos resultados desta reação (Equação 2) é a redução do pH do concreto, que despassiva o aço imerso, deixando a armadura suscetível à corrosão, o que não é desejável do ponto de vista de durabilidade. Outro resultado é a captura do CO2 da atmosfera, gerando o carbonato de cálcio (CaCO3) que aprisiona o dióxido de carbono na estrutura de concreto, retirando-o da atmosfera, em um processo inverso ao de produção do cimento (Equação 1).

C a ( O H ) 2 + C O 2 C a C O 3 + H 2 O (2)

De modo geral, o processo de captura de CO2 devido à carbonatação do concreto pode ser esquematizado conforme a Figura 1.

Figura 1
Carbonatação do concreto versus captura de CO2 [22[22] FELIX, E.; POSSAN, E. Sequestro de CO2 em estruturas de concreto em uma perspectiva de 100 anos. In: 56º Congresso Brasileiro do Concreto, Natal, 2014. ]

Verifica-se que há divergências na literatura em relação à potencialidade da captura de CO2 devido à carbonatação do concreto. Pade [17[17] PADE, C. The CO2 uptake of concrete in the perspective of life cycle inventory. In: International Symposium on Sustainability in the Cement and Concrete Industry, Norway, 2007. ] destaca uma potencialidade mundial de captura de CO2 devido à carbonatação de estruturas de concreto de 33-57%, enquanto Gajda [18[18] GAJDA, J. Absorption of Atmospheric Carbon Dioxide by Portland Cement. PCA, Serial no. 2255, Chicago, 2001.] relata que podem ser absorvidos apenas 7,6% do CO2 emitido. Na Coreia do Sul, Lee, Park e Lee [19[19] LEE, S.; PARK, W.; LEE, H. Lifecycle CO2 assessment method for concrete using CO2 balance and suggestion to decrease LCCO2 of concrete in South-Korean apartment. Energy Build, vol. 58, p. 93-102, 2013. http://dx.doi.org/10.1016/j.enbuild.2012.11.034.
http://dx.doi.org/10.1016/j.enbuild.2012...
] citam a captura de apenas 2,9% de CO2 em 20 anos de vida útil da estrutura. Em estudo desenvolvido na Noruega, Jacobsen e Jahren [20[20] JACBSEN, S.; JAHREN, P. Binding of CO2 by Carbonation of Norwegian OPC Concrete. In: CANMET/ACI International Conference on Sustainability and Concrete Technology, Lyon, 2002. ] estimaram que 11% do CO2 emitido na produção do cimento é reabsorvido pelo concreto devido à carbonatação durante sua vida útil. Nos Estados Unidos, Haselbach e Thomas [21[21] HASELBACH, L.; THOMAS, A. Carbon sequestration in concrete sidewalk samples. Construction and Building Materials, 2014. ] citam a captura de 28,2% de CO2 durante a vida útil. Pade e Guimarães [7[7] PADE, C.; GUIMARÃES, M. The CO2 uptake of concrete in a 100 year perspective. Cement and Concrete Research, vol. 47, nº 9, p. 1384-1356, 2007. doi:10.1016/j.cemconres.2007.06.009.
https://doi.org/10.1016/j.cemconres.2007...
], em estudo realizado na Dinamarca, estimam, para uma perspectiva de 100 anos, considerando a demolição da estrutura, que o concreto devido à carbonatação pode absorver até 57% do CO2 emitido na produção do cimento. Caso a demolição da estrutura não seja considerada, esse valor é reduzido para 24%. A metodologia adotada por Pade e Guimarães [7[7] PADE, C.; GUIMARÃES, M. The CO2 uptake of concrete in a 100 year perspective. Cement and Concrete Research, vol. 47, nº 9, p. 1384-1356, 2007. doi:10.1016/j.cemconres.2007.06.009.
https://doi.org/10.1016/j.cemconres.2007...
] assume que o concreto possui um grau de hidratação de 100%, sendo a difusão e concentração de CO2 considerados constantes no tempo. Também considera que os agregados gerados na demolição da estrutura serão 100% carbonatados durante um período de 30 anos, sendo que estrutura e os resíduos oriundos da sua demolição estão sob as mesmas condições ambientais.

Felix e Possan [22[22] FELIX, E.; POSSAN, E. Sequestro de CO2 em estruturas de concreto em uma perspectiva de 100 anos. In: 56º Congresso Brasileiro do Concreto, Natal, 2014. ] destacam que a carbonatação do concreto no pós-demolição é fortemente dependente das condições de exposição e das dimensões do material demolido, existindo alguns problemas de ordem prática na metodologia de cálculo empregada por alguns autores. Um dos grandes problemas encontrados é como viabilizar a exposição do resíduo gerado da demolição de uma estrutura, de forma que o mesmo fique em contato com o CO2 para que ocorra a carbonatação. Neste sentido, o tema de captura de CO2 devido à carbonatação do concreto no período pós-demolição da estrutura requer estudos adicionais a fim de constatar se o mesmo pode ser conduzido em escala real.

Felix e Possan [22] destacam que essas divergências encontradas na literatura sobrevêm dos diversos fatores que influenciam o fenômeno de carbonatação do concreto (resistência, ambiente de exposição, quantidade de cimento utilizada para produção, idade da estrutura, entre outros). São, também, dependentes da metodologia de cálculo utilizada e pressupostos assumidos pelo pesquisador, o que dificulta a comparação de resultados gerados em diferentes pesquisas.

3. Metodologia para a estimativa do balanço de CO 2

Tendo em vista que a temática sobre captura de CO2 associada às estruturas de concreto é recente, são poucos os trabalhos na literatura que descrevem detalhadamente a metodologia empregada para estas estimativas. Neste sentido Felix, Possan e Thomaz [23[23] FELIX, E.; POSSAN, E.; THOMAZ, W. Metodologia para estimativa da captura de CO2 devido à carbonatação do concreto. In: Estudos ambientais, vol. 4, C. Poleto, Ed., Interciência Ltda, 2017. ] desenvolveram uma metodologia de cálculo conforme fluxograma da Figura 2, à qual foi adotada neste trabalho.

Figura 2
Metodologia de cálculo para o balanço das emissões de CO2 [22[22] FELIX, E.; POSSAN, E. Sequestro de CO2 em estruturas de concreto em uma perspectiva de 100 anos. In: 56º Congresso Brasileiro do Concreto, Natal, 2014. ]

Composta por seis etapas, a metodologia inicia com a descrição do cenário da estrutura (Etapa 1), passando para as estimativas das emissões associadas ao cimento e aos agregados (Etapa 2) e da profundidade de carbonatação do concreto ao longo do tempo (Etapa 3). Nas Etapas 4 e 5 estima-se o potencial de captura de CO2 devido à carbonatação do concreto, durante a vida útil e no período pós-demolição da estrutura, respectivamente, culminando na etapa 6, no balanço das emissões (diferença entre CO2 emitido e CO2 capturado). Na sequência apresentam-se detalhadamente os métodos e os materiais adotados neste trabalho, em consonância com o fluxograma da Figura 2.

3.1 Etapa 1 - Determinação das características do concreto e das condições de exposição da estrutura

Tendo em vista que diversos fatores influenciam a carbonatação do concreto, especialmente o traço (consumo de cimento, resistência à compressão, fator água/cimento, tipo de cimento empregado, entre outros), as características geométricas da estrutura ou elementos estruturais (forma, volume e área superficial em contato com a atmosfera) e as características do ambiente de exposição da estrutura (teor de CO2 do ambiente, umidade relativa do ar, situação de exposição à chuva - ambiente interno ou externo, protegido ou desprotegido da chuva) [23[23] FELIX, E.; POSSAN, E.; THOMAZ, W. Metodologia para estimativa da captura de CO2 devido à carbonatação do concreto. In: Estudos ambientais, vol. 4, C. Poleto, Ed., Interciência Ltda, 2017. ], nesta etapa torna-se de importante descrever claramente as variáveis empregadas na simulação.

Em relação aos concretos, neste estudo foram simulados diferentes traços por meio do método ABCP/ACI. Os traços foram obtidos fixando uma relação água/cimento de 0,4. Para os materiais constituintes do concreto, adotou-se agregado graúdo de origem basáltica com diâmetro máximo de 19 mm, massa específica de 2.700 kg/m³ e massa unitária de 1.515 kg/m³. Para o agregado miúdo empregou-se areia natural quartzosa com módulo de finura de 2,9, massa específica e 2.660 kg/m³ e massa unitária de 1.490 kg/m³.

Quanto ao aglomerante, foram considerados nas simulações seis tipos de cimentos Portland, sendo três compostos (CP II E, com escória, CP II F, com fíler e CP II Z, com pozolana) [25[25] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). Cimento Portland composto - NBR 11578, Rio de Janeiro, 2001. Versão Corrigida:1997.], um com escória (CP III) [26[26] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). Cimento Portland de alto forno - NBR 5735 EB208, Rio de Janeiro, 1991.], um pozolânico (CP IV) [27[27] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). Cimento Portland Pozolânico - NBR 5736, Rio de Janeiro, 1991.] e um de alta resistência inicial (CP V ARI) [28[28] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). Cimento Portland de alta resistência inicial - NBR 5733 EB2, Rio de Janeiro, 1991.].

Os traços obtidos por meio do método ABCP/ACI (Tabelas 1 e 2) diferenciam-se pelo consumo de cimento, variando de 300 a 580 kg/m³.

Tabela 1
Traços empregados nas simulações (com cimentos compostos: CP II Z, E e F)
Tabela 2
Traços empregados nas simulações (com cimentos: CP III, IV e V)

Considera-se que a estrutura será construída em ambiente urbano, desprotegida da chuva, com umidade média anual de 70%1 e com um teor de CO2 local de 0,04%2. Não será considerada proteção da estrutura (concreto aparente, sem pintura). Todas estas variáveis avaliadas são apresentadas na Tabela 3.

Tabela 3
Dados de entrada para a determinação da profundidade de carbonatação

3.2 Etapa 2 - Estimativa das emissões de CO2

As emissões de CO2 decorrentes da produção do concreto foram estimadas considerando as emissões referentes à fabricação do cimento, à produção de agregados e ao transporte, até sua disponibilização no canteiro, seja este oriundo de central dosadora ou produzido em obra.

Assim, com base nas metodologias do IPCC [29[29] IPCC. Guidelines for National Greenhouse Gas Inventories. Intergovernmental Panel on Climate Change, 2006. http://www.ipcc.ch.
http://www.ipcc.ch...
] e do CSI [30], para a estimativa das emissões de CO2 referentes à produção do cimento (Ecim ) empregou-se a Equação 3, na qual são consideradas as emissões por uso de energia (Eene ), por decomposição da matéria prima (descarbonatação) (Edesc ) e pelo transporte na produção do cimento (Etrans ), sendo todas as emissões dadas em kgCO2/t.

E c i m = E e n e + E d e s c + E t r a n s ( k g C O 2 / t ) (3)

Para os cálculos de Eene , Edesc e Etrans utilizou-se a metodologia empregada por Lima [5[5] LIMA, J. Avaliação das consequências da produção de concreto no Brasil para as mudanças climáticas, São Paulo: Tese (Doutorado em Engenharia) - Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, Departamento de Engenharia de Construção Civil, EPUSP, 2010. ] em conjunto com os dados de energia coletados do Balanço Energético Nacional [31[31] BRASIL. Ministério das Minas e Energia (MME). Balanço Energético Nacional 2012: Ano base 2011. Empresa de Pesquisa Energética - EPE, Rio de Janeiro, 2012.] apresentados na Tabela 4.

Tabela 4
Emissões de CO2 (em kg) na produção de uma tonelada de cimento [29[29] IPCC. Guidelines for National Greenhouse Gas Inventories. Intergovernmental Panel on Climate Change, 2006. http://www.ipcc.ch.
http://www.ipcc.ch...
]

Deve-se ainda ter em conta que os diferentes cimentos Portland comercializados no Brasil (CPI, CP II, CP III, CPIV e CP V) possuem diferentes teores de adições, sendo necessário descontá-las no cálculo das emissões, uma vez que as mesmas são inseridas no final do processo produtivo do cimento, não passando pelo processo produtivo completo [23[23] FELIX, E.; POSSAN, E.; THOMAZ, W. Metodologia para estimativa da captura de CO2 devido à carbonatação do concreto. In: Estudos ambientais, vol. 4, C. Poleto, Ed., Interciência Ltda, 2017. ]. Desta forma, considera-se apenas o teor de clínquer contido em cada tipo de cimento, de acordo com os limites estabelecidos nas normas técnicas correspondentes [24[24] PAULETTI, C.; POSSAN, E.; DAL MOLIN, D. C. C. Carbonatação acelerada: estado da arte das pesquisas no Brasil. Ambiente construído, vol. 7, pp. 7-20, 2007.

[25] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). Cimento Portland composto - NBR 11578, Rio de Janeiro, 2001. Versão Corrigida:1997.

[26] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). Cimento Portland de alto forno - NBR 5735 EB208, Rio de Janeiro, 1991.

[27] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). Cimento Portland Pozolânico - NBR 5736, Rio de Janeiro, 1991.
-28[28] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). Cimento Portland de alta resistência inicial - NBR 5733 EB2, Rio de Janeiro, 1991.].

Na estimativa das emissões decorrentes da produção dos agregados, foram utilizados indicadores encontrados na literatura, sendo usado 5,81 kgCO2/t para a areia natural, e 15,46 kgCO2/t para a brita [32[32] MARCOS, M. Análise da emissão de CO2 em edificações através de uma ferramenta CAD-BIM. In: SIGraDi 2009 SP - From Modern to Digital: The Challenges of a Transition, São Paulo, 2009. ]. Já para a estimativa das emissões por transporte do concreto, Lima [5[5] LIMA, J. Avaliação das consequências da produção de concreto no Brasil para as mudanças climáticas, São Paulo: Tese (Doutorado em Engenharia) - Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, Departamento de Engenharia de Construção Civil, EPUSP, 2010. ] sugere adotar 8,4 kgCO2/t.

Assim, conforme Equação 4, somando-se todas as emissões de CO2 (em kgCO2/t) referentes à produção do cimento (Ecim ), da produção de agregados (Eagr ) e do transporte do concreto (Etrans-con ) é possível estimar as emissões para a produção do concreto (Econ ), desde que conhecido o traço (proporção de dosagem).

E c o n = E c i m + E a g r + E t r a n s c o n ( k g C O 2 / t ) (4)

3.3 Etapa 3 - Estimativa da profundidade de carbonatação

Para a estimativa da profundidade de carbonatação faz-se necessário considerar as condições de exposição da estrutura (definida na etapa 1), assim como, empregar um modelo de comportamento da profundidade de carbonatação ao longo do tempo, para o qual foi utilizado o modelo matemático de Possan [33[33] POSSAN, E. Modelagem da carbonatação e previsão da vida útil de estruturas de concreto em ambiente urbano, Porto Alegre: Tese (Doutorado em Engenharia) - Escola de Engenharia, Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil, UFRGS, 2010. ], apresentado na Equação 5.

y = k c . ( 20 f c ) k f c . ( t 20 ) 1 2 . e x p [ ( k a d . a d 3 2 40 + f c ) + ( k C O 2 . C O 2 1 2 60 + f c ) ( k u r . ( U R 0,58 ) 2 100 + f c ) ] . k c e (5)

Onde:

y = profundidade de carbonatação média do concreto, em mm;

fc = resistência característica à compressão axial do concreto, em MPa;

kc = fator variável referente ao tipo de cimento empregado (Tabela 5.a);

kfc = fator variável referente à resistência à compressão axial do concreto, em função do tipo de cimento utilizado (Tabela 5.a);

t = idade do concreto, em anos;

ad = teor de adição pozolânica no concreto, em % em relação à massa de cimento;

kad = fator variável referente às adições pozolânicas do concreto - sílica ativa, metacaulim e cinza de casca de arroz, em função do tipo de cimento utilizado (Tabela 5.a);

UR = umidade relativa média, em %100;

kur = fator variável referente à umidade relativa, em função do tipo de cimento utilizado (Tabela 5.a);

CO2 = teor de CO2 da atmosfera, em %;

kco2 = fator variável referente ao teor de CO2 do ambiente, em função do tipo de cimento utilizado (Tabela 5.a);

kce = fator variável referente à exposição à chuva, em função das condições de exposição da estrutura (Tabela 5.b).

Tabela 5
Coefficients of the model according to: (a) concrete characteristics and environment conditions; (b) exposure conditions [33[33] POSSAN, E. Modelagem da carbonatação e previsão da vida útil de estruturas de concreto em ambiente urbano, Porto Alegre: Tese (Doutorado em Engenharia) - Escola de Engenharia, Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil, UFRGS, 2010. ]

O modelo de Possan [33[33] POSSAN, E. Modelagem da carbonatação e previsão da vida útil de estruturas de concreto em ambiente urbano, Porto Alegre: Tese (Doutorado em Engenharia) - Escola de Engenharia, Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil, UFRGS, 2010. ] é utilizado por apresentar bons resultados para a estimativa da profundidade carbonatada (representa 85% dos casos testados) além de exigir dados de entrada de fácil obtenção (resistência à compressão do concreto, tipo de cimento, teor de CO2 do ambiente de exposição) [34[34] DAL MOLIN, D. C. C.; MASUEIRO, A. B.; ANDRADE, J. J. O.; POSSAN, E.; MASUEIRO, J. R.; MENNUCCI, M. M. Contribuição à Previsão da Vida Útil de Estruturas de Concreto. In: Claudio de Souza Kazmierczak, Márcio Minto Fabrício. (Org.). Avaliação de Desempenho de Tecnologias Construtivas Inovadoras: Materiais e Sustentabilidade. 1ed.: Editora Scienza, v., p. 223-270, 2016.].

3.4 Etapa 4 - Estimativa da captura de CO2 ao longo da vida útil da estrutura de concreto

Para a estimativa da quantidade de CO2 capturada durante a vida útil (VU) das estruturas (período de 70 anos), foram conduzidos cálculos referentes à carbonatação por parte do concreto em um elemento estrutural representado na Figura 3.a para diferentes cenários (conforme Tabelas 1 e 2). Por meio de cálculos estequiométricos, estimou-se a captura de CO2 devido à carbonatação do concreto pela Equação 6.

C O 2 = y . c . C a O . r . A . M ( k g C O 2 ) (6)

Figura 3
Elementos de concreto durante: (a) vida útil; (b) pós-demolição

Onde: “y” é a profundidade de carbonatação do concreto (em metros), “c” é a quantidade de cimento empregada para produzir um m³ de concreto (sem considerar as adições) (em kg/m³), “CaO” é a quantidade de óxido de cálcio contido no cimento (em %), “r” é a proporção de CaO totalmente carbonatada (em %), “A” é a área superficial do concreto exposta à ação do CO2 (em m²) e “M” é a fração molar do CO2/CaO.

3.5 Etapa 5 - Estimativa da captura de CO2 no período pós-demolição

Para a estimativa da quantidade de CO2 capturada após a demolição da estrutura, simulou-se que os elementos de concreto foram britados e tiveram suas dimensões reduzidas a de agregados. Para tal, como a carbonatação ocorre da superfície para o interior da estrutura, retirou-se a “capa” de concreto já carbonatada durante a vida útil, transformando o “concreto não carbonatado” em cubos com pequenas dimensões (i.e., paralelepípedos de 30x30x30 mm), conforme representação gráfica da Figura 3.b, considerando a exposição destes elementos à ação do CO2 por um determinado período de tempo (30 anos ou até o tempo à qual ocorre a total carbonatação do elemento de concreto). Adotou-se formato cúbico para a simulação dos elementos triturados em função da facilidade proporcionada pela geometria para a descrição dos volumes carbonatados e não carbonatados do período de pós-demolição. Quanto ao comprimento adotado para as arestas do cubo, relata-se que foram analisadas amostras de resíduos de demolição, às quais em média, possuíam 30 mm de dimensão característica.

Assim, para a estimativa da taxa de CO2 capturado pelo concreto após a demolição, empregaram-se as seguintes subetapas:

  • a) Estimativa da profundidade de carbonatação ao final da vida útil da estrutura (70 anos), conforme Etapa 3;

  • b) Estimativa do volume de concreto carbonatado (Equação 7) e não carbonatado (Equação 8) durante a vida útil;

  • c) Definição das dimensões aproximadas dos elementos de concreto (paralelepípedos) após a demolição;

  • d) Cálculo da nova área superficial total dos elementos de concreto após a demolição;

  • e) Determinação da profundidade de carbonatação no período pós-demolição (aplicação da Equação 5);

  • f) Cálculo da nova área superficial carbonatada (Equação 9) para determinação da quantidade de CO2 (kg/m³) capturado no pós-demolição (Equação 6).

V c a r b = y . A s t ( m ³ ) (7)

V n c = V e e V c a r b ( m ³ ) (8)

A d e m = A p a r . V n c V p a r t ( m ² ) (9)

Onde:

Vcarb = Volume de concreto carbonatado durante a vida útil (em m³);

y = profundidade de carbonatação do concreto no tempo (em m);

Ast = Área superficial total do elemento de concreto que está em contato com a atmosfera na VU (em m²);

Vnc = Volume de concreto que ainda não passou pelo processo de carbonatação (em m³);

Vee = Volume de concreto total do elemento estrutural na VU (em m³);

Adem = Área superficial dos elementos de concreto (paralelepípedo) que está em contato com a atmosfera no pós-demolição (em m²);

Apar = Área superficial dos elementos de concreto (paralelepípedos) (em m²);

Vpart = Volume do elemento fragmentado de concreto (paralelepípedo) (em m³).

3.6 Etapa 6 - Balanço de CO2

Para o balanço de CO2 durante o ciclo de vida (CV) das estruturas de concreto, utilizou-se a Equação 10, onde Bco2 é o balanço de CO2, Econ é a quantidade de CO2 emitida na produção do concreto (determinada na Etapa 2) e Ccap é a quantidade de CO2 capturada pelo concreto (determinada nas etapas 4 e 5).

B C O 2 = E c o n C c a p ( k g C O 2 ) (10)

4. Resultados e discussões

Na Figura 4 apresentam-se duas análises realizadas com os diferentes concretos listados nas Tabelas 1 e 2. A primeira (eixo das ordenadas esquerdo) refere-se ao consumo de cimento (kg/m³) necessário para produzir concretos com resistências à compressão de 20, 25, 30, 35, 40 e 45 MPa. A segunda refere-se às emissões de CO2 (em kg) associadas à produção do concreto (eixo das ordenadas da direita) em função da resistência à compressão. É possível observar que elementos de concreto com resistências mais elevadas necessitam de um maior volume de cimento para sua produção, de acordo como observado por Mehta e Monteiro [3[3] MEHTA, P. K.; MONTEIRO, P. J. M. "Concrete: Microstructure, Properties, and Materials", fourth ed., McGraw-Hill, 2014. ], também, estas liberam um maior volume de CO2 na atmosfera, comprovando que as emissões crescem gradativamente com o aumento de aglomerante consumido pelo concreto.

Figura 4
Consumo de cimento e emissões de CO2 em função da resistência de dosagem e do tipo do aglomerante

Na Tabela 6 apresenta-se a profundidade de carbonatação das estruturas ao longo do tempo para os consumos de 300, 400, 500, e 580 kg/m³ (calculadas pela Equação 4). Observa-se que em alguns casos (todos os concretos com consumo de 300 kg/m³, independentemente do tipo de cimento) no período de pós-demolição, o concreto foi totalmente carbonatado antes de finalizar o período de 30 anos. Tal fato deve-se ao formato e dimensões das partículas de resíduo utilizadas nas simulações, as quais foram assumidas como cúbicas de dimensões iguais a 30 mm. Considerando que o CO2 pode ingressar por todas as faces, a profundidade de carbonatação máxima de cada partícula é de 15 mm (ver detalhe da Figura 3b), a qual é conseguida facilmente em concretos com baixa resistência à compressão e/ou elevadas relações água/cimento.

Tabela 6
Profundidade de carbonatação ao longo do tempo, em função do tipo e consumo de cimento

A elevação do consumo de cimento tem influência direta na resistência à compressão (ver Tabelas 1 e 2) se mantida a mesma relação a/c. O aumento da resistência à compressão do concreto causa uma diminuição da profundidade de carbonatação do material [33[33] POSSAN, E. Modelagem da carbonatação e previsão da vida útil de estruturas de concreto em ambiente urbano, Porto Alegre: Tese (Doutorado em Engenharia) - Escola de Engenharia, Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil, UFRGS, 2010. , 35], reduzindo a quantidade de carbono absorvida da atmosfera (ver Figuras 5-6). Segundo Kumar e Bhattacharjee [36[36] KUMAR, R.; BHATTACHARJEE, B. Porosity, pore size distribution and in situ strength of concrete. Cement and Concrete Research, vol. 33, p. 155-164, 2003. ], devido à influência da relação água/cimento, concretos com resistências mais elevadas apresentam menor porosidade dificultando a entrada de CO2. Com isso, tem-se, consequentemente a redução do potencial de captura de CO2 devido à carbonatação do concreto, como observado neste estudo.

Figura 5
Evolução da captura de CO2 no tempo para concretos com cimentos compostos (CP II Z, E e F) e com diferentes consumos

Figura 6
Evolução da captura de CO2 no tempo para concretos com cimentos CP III, IV e V com diferentes consumos

Nas Figuras 5 e 6 são apresentados os valores de CO2 (kg) absorvidos da atmosfera pelas estruturas de concreto durante o período de vida útil (0 a 70 anos) e no período pós-demolição (71 a 100 anos) em função do tipo e consumo de cimento. Uma análise mais criteriosa destas Figuras, em paralelo com a Tabela 6, possibilita verificar que para consumos de cimento entre 300 e 400 kg/m³ a frente de carbonatação é maior, resultando em uma maior captura de CO2.

Nota-se que em concretos com consumo maior que 300 kg/m³ e resistência à compressão superior a 20 MPa, o potencial e a captura de CO2 devido à carbonatação do concreto na demolição da estrutura (considerando apenas os cinco primeiros anos do período de pós-demolição das estruturas), é em média 60% superior ao do período de vida útil, evidenciando a importância da consideração da demolição da estrutura no balanço das emissões de CO2. Este resultado é relacionado a maior área superficial de concreto que está exposta a ação do gás carbono (presente na atmosfera) no período pós-demolição da estrutura (ver Figura 7), gerando assim, um maior sequestro de CO2 devido à carbonatação, conforme exposto na literatura [19[19] LEE, S.; PARK, W.; LEE, H. Lifecycle CO2 assessment method for concrete using CO2 balance and suggestion to decrease LCCO2 of concrete in South-Korean apartment. Energy Build, vol. 58, p. 93-102, 2013. http://dx.doi.org/10.1016/j.enbuild.2012.11.034.
http://dx.doi.org/10.1016/j.enbuild.2012...
, 22[22] FELIX, E.; POSSAN, E. Sequestro de CO2 em estruturas de concreto em uma perspectiva de 100 anos. In: 56º Congresso Brasileiro do Concreto, Natal, 2014. , 37[37] POSSAN, E.; FELIX, E.; THOMAZ, W. CO2 uptake by carbonation of concrete during life cycle of building structures. Journal of Building Pathology and Rehabilitation, 2016. doi:10.1007/s41024-016-0010-9.
https://doi.org/10.1007/s41024-016-0010-...
].

Figura 7
Captura de CO2 em função da área superficial do elemento de concreto [22[22] FELIX, E.; POSSAN, E. Sequestro de CO2 em estruturas de concreto em uma perspectiva de 100 anos. In: 56º Congresso Brasileiro do Concreto, Natal, 2014. ]

Com relação aos balanços das emissões (volume de CO2 emitido vs. volume de CO2 capturado, conforme Equação 9) foi possível determinar, para os diferentes tipos de aglomerantes, os consumos aos quais resulta o maior balanço de CO2 (Figuras 8 e 9).

Figure 8
Balanço das emissões de CO2 para concretos com cimentos CP II Z, E e F

Figure 9
Balanço das emissões de CO2 para concretos com cimentos CP III, IV e V

Para concretos com CP II Z (Figura 8), o consumo de 380 kg/m³ foi o que gerou o melhor balanço de emissões, reabsorvendo cerca de 94% de todo o CO2 emitido na sua produção. Para concretos com CP II E, CP II F, CP III, CP IV e CP V, os consumos que geraram os melhores balanços para cada tipo de cimento foram: 380, 380, 420, 420 e 300 kg/m³ respectivamente. Observa-se que em média os concretos produzidos com cimentos dos tipos II, III e IV, apresentam consumo ideal (frente ao balanço do CO2) entre 380 e 420 kg/m³ (Figuras 8 e 9), sugerindo que existe nesse intervalo um ponto ótimo (ponto de otimização) na curva consumo de cimento versus captura de CO2.

Por fim, para concretos com cimento CP V (Figura 9), o consumo de 300 kg/m³ foi o que conferiu os melhores resultados quanto ao balanço das emissões, garantindo que 86% do CO2 eliminado na sua produção fossem reabsorvidos da atmosfera durante os 100 anos de análise. Observa-se que o valor máximo de captura de CO2 por parte do concreto com CP V, foi muito abaixo dos outros quatro tipos de cimentos (entre 94 e 99%), e que o consumo que leva ao melhor balanço é de 300 kg/m³, valor menor que os outros tipos. Estes resultados encontrados são devidos a diferentes fatores, sendo eles: (i) menor teor de adições no cimento (e consequentemente, maior teor de clínquer); (ii) maior resistência mecânica e maior resistência à penetração do CO2 (em função da menor porosidade da matriz do concreto e da disponibilidade de reserva alcalina); (iii) menor consumo de cimento necessário para a produção de concretos com maiores resistências.

5. Conclusões

A captura de CO2 decorrente da carbonatação do concreto pode ser de relevância para a construção civil, pois conhecendo este processo é possível indicar concretos pelo desempenho: visando à durabilidade, o menor consumo de cimento e o potencial de captura CO2, podendo no futuro ser considerada como medida compensatória no projeto de estruturas de concreto.

No balanço das emissões, concretos com consumos entre 380 e 420 kg/m³ de cimento foram os que apresentaram melhores desempenhos, capturando mais de 90% do CO2 emitido na sua produção.

Concretos produzidos com cimentos CP II, CP III e CP IV apresentam, em média, os mesmos intervalos para o ponto ótimo entre consumo de cimento, profundidade de carbonatação e captura de CO2, e que o balanço das emissões para os diferentes consumos de cimento é em média de 74% (média do gás carbono que é sequestrado novamente da atmosfera pelo concreto, compensando as emissões da sua produção).

Concretos produzidos com cimento CP IV, apresentam em geral os maiores balanços independentemente do consumo de cimento a ser analisado, em média o balanço é de 81%. Os concretos podem ainda ser produzidos com maiores consumos de cimento, possuindo ainda um bom índice de sustentabilidade (referente às emissões de CO2).

Concretos com CP V apresentam os piores balanços de CO2, comparado com os demais, reabsorvendo em média 50% CO2 emitido.

O estudo também indicou a existência de um ponto ótimo entre consumo de cimento, profundidade de carbonatação e captura de CO2, situado entre 380 a 420 kg de cimento por m³ de concreto, o qual conduz a uma profundidade de carbonatação média durante a vida útil compatível com o desempenho de durabilidade (carbonatação menor que o cobrimento da armadura).

6. Agradecimentos

Os autores agradecem ao Centro de Estudos Avançados em Segurança de Barragens (CEASB), a Fundação Parque Tecnológico de Itaipu (FPTI) e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pelo fomento à pesquisa, assim como, a Universidade Federal da Integração Latino-Americana pela colaboração.

7. Literature references

  • [1]
    ALI, M.; SAIDUR, R.; HOSSAIN, M. A review on emission analysis in cement industries. Renewable and Sustainable Energy Reviews, vol. 15, pp. 2252-2261, 2011. doi: 10.1016/j.rser.2011.02.014.
    » https://doi.org/10.1016/j.rser.2011.02.014
  • [2]
    SNIC. Sindicato Nacional da Indústria do Cimento. “Relatório Anual,” Rio de Janeiro, 2010.
  • [3]
    MEHTA, P. K.; MONTEIRO, P. J. M. "Concrete: Microstructure, Properties, and Materials", fourth ed., McGraw-Hill, 2014.
  • [4]
    SNIC. Sindicato Nacional da Indústria do Cimento. “Relatório anual”, Rio de Janeiro, 2013.
  • [5]
    LIMA, J. Avaliação das consequências da produção de concreto no Brasil para as mudanças climáticas, São Paulo: Tese (Doutorado em Engenharia) - Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, Departamento de Engenharia de Construção Civil, EPUSP, 2010.
  • [6]
    BRASIL. Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), “Relatório de referência. Emissões de Gases de Efeito Estufa nos Processos Industriais. Produtos Minerais. Parte I: Produção de Cimento”. Disponível em: www.mct.gov.br/upd_blob/0228/228962.pdf, Brasília, 2010.
    » www.mct.gov.br/upd_blob/0228/228962.pdf
  • [7]
    PADE, C.; GUIMARÃES, M. The CO2 uptake of concrete in a 100 year perspective. Cement and Concrete Research, vol. 47, nº 9, p. 1384-1356, 2007. doi:10.1016/j.cemconres.2007.06.009.
    » https://doi.org/10.1016/j.cemconres.2007.06.009
  • [8]
    BAKKER, F. M. Initiation period. In: Corrosion of steel in concrete, London: Chapman & Hall, 1988, p. p. 22-5.
  • [9]
    GENTIL, V. Corrosão, LTC, Rio de Janeiro: Ed. LTC. 3º Edição, 2006..
  • [10]
    ANDRADE, C. Calculation of diffusion coefficients in concrete from ionic migration measurements. Cement and Concrete Research, vol. 23, nº 3, pp. 724-742, 1993.
  • [11]
    HAMADA, M. Concrete carbonation and steel corrosion. Cement/Concret, nº 272, pp. 2-18, 1969.
  • [12]
    GALAN, I.; ANDRADE, C.; MORA, P.; SANJUAN, M. Sequestration of CO2 by concrete carbonation. Environmental Science & Technolog, vol. 44, nº 8, p. 3181-3186, 2010. doi: 10.1021/es903581d.
    » https://doi.org/10.1021/es903581d
  • [13]
    POSSAN, E.; FOGAÇA, J.; PAZUCH, C. Sequestro de CO2 devido à carbonatação do concreto: potencialidades da barragem de Itaipu. Revista de estudos ambientais, vol. 14, nº 2, pp. 28-38, 2012.
  • [14]
    YANG, K.; SEO, E.; TAE, S. Carbonation and CO2 uptake of concrete. Environmental Impact Assessment Review, vol. 46, pp. 43-52, 2014. doi:10.1016/j.eiar.2014.01.004.
    » https://doi.org/10.1016/j.eiar.2014.01.004
  • [15]
    HARBERT, G.; ROUSSEL, N. Study of two concrete mix-design strategies to reach carbon mitigation objectives. Cement & Concrete Composites, vol. 31, pp. 397-402, 2009. doi:10.1016/j.cemconcomp.2009.04.001.
    » https://doi.org/10.1016/j.cemconcomp.2009.04.001
  • [16]
    GAJDA, J.; MILLER, F. Concrete as a Sink for Atmospheric Carbon Dioxide: a Literature review and estimation of CO2 absorption by Portland Cement Concrete. PCA. R&D Serial no. 2255, Chicago, 2000.
  • [17]
    PADE, C. The CO2 uptake of concrete in the perspective of life cycle inventory. In: International Symposium on Sustainability in the Cement and Concrete Industry, Norway, 2007.
  • [18]
    GAJDA, J. Absorption of Atmospheric Carbon Dioxide by Portland Cement. PCA, Serial no. 2255, Chicago, 2001.
  • [19]
    LEE, S.; PARK, W.; LEE, H. Lifecycle CO2 assessment method for concrete using CO2 balance and suggestion to decrease LCCO2 of concrete in South-Korean apartment. Energy Build, vol. 58, p. 93-102, 2013. http://dx.doi.org/10.1016/j.enbuild.2012.11.034.
    » http://dx.doi.org/10.1016/j.enbuild.2012.11.034.
  • [20]
    JACBSEN, S.; JAHREN, P. Binding of CO2 by Carbonation of Norwegian OPC Concrete. In: CANMET/ACI International Conference on Sustainability and Concrete Technology, Lyon, 2002.
  • [21]
    HASELBACH, L.; THOMAS, A. Carbon sequestration in concrete sidewalk samples. Construction and Building Materials, 2014.
  • [22]
    FELIX, E.; POSSAN, E. Sequestro de CO2 em estruturas de concreto em uma perspectiva de 100 anos. In: 56º Congresso Brasileiro do Concreto, Natal, 2014.
  • [23]
    FELIX, E.; POSSAN, E.; THOMAZ, W. Metodologia para estimativa da captura de CO2 devido à carbonatação do concreto. In: Estudos ambientais, vol. 4, C. Poleto, Ed., Interciência Ltda, 2017.
  • [24]
    PAULETTI, C.; POSSAN, E.; DAL MOLIN, D. C. C. Carbonatação acelerada: estado da arte das pesquisas no Brasil. Ambiente construído, vol. 7, pp. 7-20, 2007.
  • [25]
    ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). Cimento Portland composto - NBR 11578, Rio de Janeiro, 2001. Versão Corrigida:1997.
  • [26]
    ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). Cimento Portland de alto forno - NBR 5735 EB208, Rio de Janeiro, 1991.
  • [27]
    ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). Cimento Portland Pozolânico - NBR 5736, Rio de Janeiro, 1991.
  • [28]
    ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). Cimento Portland de alta resistência inicial - NBR 5733 EB2, Rio de Janeiro, 1991.
  • [29]
    IPCC. Guidelines for National Greenhouse Gas Inventories. Intergovernmental Panel on Climate Change, 2006. http://www.ipcc.ch
    » http://www.ipcc.ch
  • [30]
    CSI: Cement Sustainability Initiative. WBCSD: World Business Council for Sustainable Developement, 2011. [Online]. Available: http://www.wbcsdcement.org/pdf/tf1_CO2%20protocol%20v3.pdf [Acesso em 14 4 2016].
    » http://www.wbcsdcement.org/pdf/tf1_CO2%20protocol%20v3.pdf
  • [31]
    BRASIL. Ministério das Minas e Energia (MME). Balanço Energético Nacional 2012: Ano base 2011. Empresa de Pesquisa Energética - EPE, Rio de Janeiro, 2012.
  • [32]
    MARCOS, M. Análise da emissão de CO2 em edificações através de uma ferramenta CAD-BIM. In: SIGraDi 2009 SP - From Modern to Digital: The Challenges of a Transition, São Paulo, 2009.
  • [33]
    POSSAN, E. Modelagem da carbonatação e previsão da vida útil de estruturas de concreto em ambiente urbano, Porto Alegre: Tese (Doutorado em Engenharia) - Escola de Engenharia, Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil, UFRGS, 2010.
  • [34]
    DAL MOLIN, D. C. C.; MASUEIRO, A. B.; ANDRADE, J. J. O.; POSSAN, E.; MASUEIRO, J. R.; MENNUCCI, M. M. Contribuição à Previsão da Vida Útil de Estruturas de Concreto. In: Claudio de Souza Kazmierczak, Márcio Minto Fabrício. (Org.). Avaliação de Desempenho de Tecnologias Construtivas Inovadoras: Materiais e Sustentabilidade. 1ed.: Editora Scienza, v., p. 223-270, 2016.
  • [35]
    PAULETTI, C. Estimativa da carbonatação natural de materiais cimentícios a partir de ansaios aceleradose de modelos de predição, Porto Alegre: Tese (Doutorado em Engenharia) - Escola de Engenharia, Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil, UFRGS, 2009
  • [36]
    KUMAR, R.; BHATTACHARJEE, B. Porosity, pore size distribution and in situ strength of concrete. Cement and Concrete Research, vol. 33, p. 155-164, 2003.
  • [37]
    POSSAN, E.; FELIX, E.; THOMAZ, W. CO2 uptake by carbonation of concrete during life cycle of building structures. Journal of Building Pathology and Rehabilitation, 2016. doi:10.1007/s41024-016-0010-9.
    » https://doi.org/10.1007/s41024-016-0010-9

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Fev 2018

Histórico

  • Recebido
    04 Nov 2016
  • Aceito
    29 Jun 2017
IBRACON - Instituto Brasileiro do Concreto Instituto Brasileiro do Concreto (IBRACON), Av. Queiroz Filho, nº 1700 sala 407/408 Torre D, Villa Lobos Office Park, CEP 05319-000, São Paulo, SP - Brasil, Tel. (55 11) 3735-0202, Fax: (55 11) 3733-2190 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: arlene@ibracon.org.br