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Perfil da produção científica e tecnológica dos grupos de pesquisa em educação em enfermagem da Região Sul do Brasil

Resumos

O objetivo do estudo foi apresentar o perfil da produção científica e tecnológica dos Grupos de Pesquisa em Educação em Enfermagem (GPEE) da Região Sul do Brasil. Trata-se de pesquisa documental, quantitativa, exploratório-descritiva retrospectiva, guiada pela busca ativa das produções no Currículo Lattes dos pesquisadores dos GPEE pré-selecionados, a partir do Censo-2006 do Diretório de Grupos/CNPq, no período de 1995-2008. Os resultados indicaram que os 18 GPEE do Sul do Brasil produziram 453 trabalhos em anais, 371 capítulos de livros, 206 livros, 1437 artigos científicos e 8 produtos tecnológicos, porém, nenhuma patente registrada. A produção científica dos GPEE da Região investigada vem crescendo progressivamente nos últimos 14 anos. Para que essa estrutura seja fortalecida, pode-se utilizar como estratégia a formação de redes colaborativas que viabilizem articulações político-científicas no setor para avançar em ciência e tecnologia.

Enfermagem; Pesquisa em Educação de Enfermagem; Publicações de Divulgação Científica; Educação em Enfermagem; Tecnologia Educacional


This research aimed to present the profile of production of Nursing Education Research Groups’ (NERG) scientific and technological production in the South of Brazil. This documentary, quantitative, exploratory-descriptive retrospective research was guided by the active search for products in the Lattes curriculum of previously selected NERG researchers, based on the 2006 Census of the Research Group Directory/CNPq, between 1995 and 2008. The results indicated that the 18 NERG from southern Brazil produced 453 papers in proceedings, 371 book chapters, 206 books, 1,437 scientific articles and 08 technological products, but no patent was registered. NERG’s scientific production in the research region has grown progressively over the past 14 years. To strengthen this structure, the establishment of collaborative networks can be used as a strategy, so that political-scientific joint actions in the sector can advance science and technology.

Nursing; Nursing Education Research; Publications for Science Diffusion; Education; Nursing; Educational Technology


El objetivo del estudio fue presentar el perfil de la producción científica y tecnológica de los Grupos de Investigación en Educación en Enfermería (GIEE) de la región sur de Brasil. Se trata de una investigación documental, cuantitativa, exploratoria-descriptiva retrospectiva, guiada por la búsqueda activa de las producciones, en el Currículo Lattes, de los investigadores de los GIEE, preseleccionados a partir del Censo-2006 del Directorio de Grupos/CNPq, en el período de 1995-2008. Los resultados indicaron que los 18 GIEE del sur de Brasil produjeron 453 trabajos en anales, 371 capítulos de libros, 206 libros, 1437 artículos científicos y 8 productos tecnológicos, sin embargo, ninguna patente registrada. La producción científica de los GIEE de la Región investigada viene creciendo, progresivamente, en los últimos 14 años. Para que esa estructura sea fortalecida, se puede utilizar como estrategia la formación de redes colaborativas que viabilicen articulaciones político-científicas en el sector para avanzar en ciencia y tecnología.

Enfermería; Investigación en Educación de Enfermería; Publicaciones de Divulgación Científica; Educación en Enfermería; Tecnología Educacional


ARTIGO ORIGINAL

Perfil da produção científica e tecnológica dos grupos de pesquisa em educação em enfermagem da Região Sul do Brasil

Mônica Motta LinoI; Vânia Marli Schubert BackesII; Bruna Pedroso CaneverIII; Fabiane FerrazIV; Marta Lenise PradoV

Universidade Federal de Santa Catarina, SC, Brasil:

IEnfermeira, Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, Bolsista CNPq. E-mail: monicafloripa@hotmail.com

IIEnfermeira, Doutor em Enfermagem, Professor Associado, Departamento de Enfermagem, E-mail: oivania@ccs.ufsc.br

IIIAluna do curso de graduação em enfermagem, Bolsista PIBIC/CNPq, E-mail: olabruna@gmail.com

IVEnfermeira, Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, E-mail: olaferraz@yahoo.com.br

VEnfermeira, Doutor em Enfermagem, Professor Adjunto, E-mail: mpradop@ccs.ufsc.br

Endereço para correspondência

RESUMO

O objetivo do estudo foi apresentar o perfil da produção científica e tecnológica dos Grupos de Pesquisa em Educação em Enfermagem (GPEE) da Região Sul do Brasil. Trata-se de pesquisa documental, quantitativa, exploratório-descritiva retrospectiva, guiada pela busca ativa das produções no Currículo Lattes dos pesquisadores dos GPEE pré-selecionados, a partir do Censo-2006 do Diretório de Grupos/CNPq, no período de 1995-2008. Os resultados indicaram que os 18 GPEE do Sul do Brasil produziram 453 trabalhos em anais, 371 capítulos de livros, 206 livros, 1437 artigos científicos e 8 produtos tecnológicos, porém, nenhuma patente registrada. A produção científica dos GPEE da Região investigada vem crescendo progressivamente nos últimos 14 anos. Para que essa estrutura seja fortalecida, pode-se utilizar como estratégia a formação de redes colaborativas que viabilizem articulações político-científicas no setor para avançar em ciência e tecnologia.

Descritores: Enfermagem; Pesquisa em Educação de Enfermagem; Publicações de Divulgação Científica; Educação em Enfermagem; Tecnologia Educacional.

Introdução

O avanço no desenvolvimento científico e tecnológico é fundamental para o crescimento de um país. Nesse panorama, desde a década de 70 do século XX, inseridas na grande área da saúde, as pós-graduações da área de Enfermagem efetivam-se como propulsoras de desenvolvimento de pesquisadores, de ações investigativas e como protagonistas da construção do conhecimento, acompanhadas e avaliadas continuamente pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)(1).

No setor de Educação em Enfermagem, não é diferente. A busca pela excelência nas produções científicas é uma constante, devido à sua importância e necessidade à educação formal, à educação popular, à educação permanente em saúde, às tecnologias educacionais e, igualmente, ao bem viver humano. Além disso, a capacidade produtiva revela-se como cerne da atenção dos órgãos fomentadores e de avaliação e desperta, amiúde, discussão entre os membros dos Grupos de Pesquisa em Educação em Enfermagem (GPEE). A produção em ciência e tecnologia tem evoluído com vistas às necessidades concretas, despertadas na prática cotidiana de profissionais de saúde, e, a partir de seus produtos, é capaz de provocar mudanças no processo de trabalho das diferentes estruturas. Nesse âmbito, a atividade científica pode ser mensurada a partir da estatística sobre produção de artigos científicos, enquanto a produção tecnológica pode ser mensurada pelo sistema de inovação, que reflete no registro de patentes(2). Para o setor de Educação em Enfermagem, a tecnologia pode ser refletida por meio da tecnologia educacional, que é compreendida como um “conjunto sistemático de conhecimentos científicos que tornem possível o planejamento, a execução, o controle e o acompanhamento envolvendo todo o processo educacional formal e informal”(3).

Para compreender a amplitude desse setor, no ano 2006, existiam no Brasil trezentos e trinta e um Grupos de Pesquisa de Enfermagem, sendo que setenta e cinco encontravam-se na Região Sul. Especificamente nessa Região, há o cadastro de dezoito Grupos de Pesquisa em Educação em Enfermagem (GPEE), identificados a partir da palavra “educação/ensino/formação” no nome do Grupo. Desses, sete são pertencentes ao Estado do Paraná, três ao de Santa Catarina e oito ao do Rio Grande do Sul. Há cento e setenta e três pesquisadores registrados nesses GPEE, sendo setenta e sete no Estado do Paraná, vinte e cinco em Santa Catarina e setenta e um no Rio Grande do Sul. Do total, a grande maioria é da área de Enfermagem, pois apenas nove são de outras áreas do conhecimento. No tocante à formação, salienta-se que 86% do quadro de pesquisadores tem titulação de mestrado e doutorado e 49% possui, entre as titulações, uma na área de educação(4).

Conhecido o número de GPEE da Região Sul do Brasil, bem como suas peculiaridades de constituição e abrangência, compreende-se como necessário investigar a produção que vem sendo desenvolvida nesse âmbito. Sendo assim,, este estudo responde a seguinte questão norteadora: qual o perfil da produção científica e tecnológica dos Grupos de Pesquisa em Educação em Enfermagem da Região Sul do Brasil?

Retratar o panorama da produção científica e tecnológica permite aos GPEE, bem como a seus pares, o reconhecimento do perfil produtivo desenvolvido em suas estruturas. Promove a reflexão desses Grupos sobre a contribuição que vem sendo agregada ao processo de produção científica e tecnológica do setor Educação em Enfermagem, podendo desdobrar-se na autocrítica e no consequente avanço dos índices de produtividade, evidenciados atualmente. Sob essa perspectiva e com interesse voltado para responder alguns dos desafios emergentes em Educação em Enfermagem, o estudo teve como objetivo apresentar o perfil da produção científica e tecnológica dos Grupos de Pesquisa em Educação em Enfermagem do Sul do Brasil.

Método

Trata-se de pesquisa do tipo documental, quantitativa, exploratório-descritiva retrospectiva. A coleta dos dados ocorreu por meio da busca do Currículo Lattes/CNPq dos pesquisadores cadastrados nos GPEE, da Região Sul do Brasil, e incluiu a captação de toda a produção científica e tecnológica, do período de 1995-2008, ou seja, a produção referente aos cinco últimos triênios de avaliação da CAPES. O registro dos 173 pesquisadores foi captado através do Banco de Dados e Estatísticas do Portal on-line do CNPq - Censo de 2006, que corresponde aos dados cadastrais dos anos 2005-2006. Convém destacar que se utilizou o referido Censo, visto que, no período de coleta dos dados, era o mais atual disponível no sistema.

A seleção da produção publicada pelos pesquisadores dos GPEE da Região Sul do Brasil incluiu artigos científicos, livros, capítulos de livros, trabalhos completos em anais de eventos e produtos tecnológicos, com ou sem patentes registradas pelos pesquisadores. Os achados foram armazenados em livrarias e, para posterior análise, foram sistematizados por ano de publicação, por Estados da Região Sul do Brasil e conforme a Instituição de Ensino Superior de origem, utilizando-se o gerenciador bibliográfico EndNote®. Cumpre destacar que o gerenciador bibliográfico em questão apresenta automaticamente os quantitativos da produção armazenada em seu banco de dados e exclui, automaticamente, toda produção duplicada devido à multiautoria, permitindo a posterior análise estatística simples dos achados.

Como se trata de pesquisa documental, cujo conteúdo disponibilizado é de caráter público, este estudo não foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos. Todavia, os pesquisadores seguiram todos os preceitos éticos necessários para a análise e divulgação dos dados da pesquisa.

Resultados

Entre os anos 1995-2008, os GPEE da Região Sul do Brasil produziram o montante de quatrocentos e cinquenta e três (453) trabalhos completos em anais de eventos, trezentos e setenta e um (371) capítulos de livros, duzentos e seis (206) livros, mil quatrocentos e trinta e sete (1437) artigos científicos e oito (8) produtos tecnológicos sem registro de patente. A partir do montante das produções dos GPEE do Sul do Brasil, optou-se, nesse momento, por apresentar com maiores detalhes os resultados referentes aos artigos científicos, visto sua relevância específica para o setor de Educação em Enfermagem (Tabela 1).

Nos últimos cinco anos (2004-2008), os GPEE da Região Sul do Brasil registraram a publicação do montante de setecentos e cinquenta (750) artigos científicos, o que corresponde a 52% de toda a sua produção de artigos científicos nos últimos 14 anos. Desses, duzentos e doze (212) foram produzidos pelos GPEE do Paraná, cento e oitenta e nove (189) pelos de Santa Catarina e trezentos e quarenta e nove (349) pelos grupos do Rio Grande do Sul. Esse resultado infere que a média produtiva de um pesquisador foi de quatro (4) artigos nos últimos cinco anos. A distribuição dessa média, no entanto, muda consideravelmente a partir de sua percepção por Estado: anualmente, o índice produção versus pesquisador é de dois a três artigos no Paraná, sete a oito artigos em Santa Catarina e quatro a cinco artigos no Rio Grande do Sul.

Além da distribuição quantitativa da produção de artigos científicos, também foi verificada a qualificação dos periódicos em que esses têm sido publicados, por meio da lista de veículo de divulgação científica denominada Qualis/CAPES (Tabela 2). Segundo esse indicador, a produção intelectual dos programas de pós-graduação strictu sensu apresentava a seguinte classificação até o final do ano 2008: no âmbito de circulação (Local, Nacional e Internacional), na qualidade (A, B, C) e por área de conhecimento: Enfermagem.

Para a apresentação dos resultados na perspectiva de qualidade das publicações, utilizou-se um índice de proporção da produção de artigos com Qualis/CAPES Internacional em relação à produção geral de artigos, denominado Índice Qualis-Qualitativo (IQQ). Esse índice foi criado pelas autoras do artigo, tendo em vista a necessidade de mensurar a razão de artigos nos diferentes tipos de Qualis/CAPES. Nesse sentido, se o valor de IQQ for um (1), representa que toda a produção de artigos científicos investigados tem âmbito de circulação internacional, segundo o Qualis/CAPES.

Para realizar o cálculo é necessário calcular a razão entre as produções internacionais (ni) pelo total de produções (n), como no caso, de artigos científicos. Exemplo: conforme apresentado na Tabela 2, em 2004 somou-se 50 artigos de Qualis/CAPES Internacional (ni) entre os 119 artigos totais do período (n). Para saber o IQQ, basta dividir (ni)/(n), o que seria: 50/119 = 0,42. Logo, pode-se afirmar que o IQQ das produções de artigos científicos internacionais no ano 2004 foi de 0,42, ou seja, 42% dos artigos eram de periódicos classificados como Qualis/CAPES Internacional.

O IQQ permitiu a análise da Tabela 2 com maior propriedade. A partir desse panorama, os GPEE do Sul do Brasil indicam um IQQ de 0,56 no período investigado, com a seguinte conformação: no Paraná, o IQQ é de 0,48; em Santa Catarina é de 0,66 e no Rio Grande do Sul o IQQ é de 0,55.

Discussão

Nos anos de 1970, houve movimento de incentivo à concentração de esforços para a atividade intelectual nos programas de pós-graduação. Nesse cenário, o primeiro grupo de pesquisa em Enfermagem no Brasil surge em 1973, denominado Núcleo de Estudos e Pesquisas do Idoso - NESP/UFBA, seguido pela criação do Grupo de Estudos sobre Cuidado de Saúde de Pessoa Idosa - GESPI/UFSC, nove anos depois(5). De 1973 a 2006, houve o salto de um (1) para trezentos e trinta e um (331) grupos de pesquisa em Enfermagem do Brasil, crescimento consequente, que acompanha a expansão dos programas de pós-graduação(4).

A partir da década de 1990, com a reestruturação da CAPES e com o fortalecimento do enfoque no acompanhamento e na avaliação dos cursos de pós-graduação strictu sensu brasileiros(6), aprofunda-se o destaque ao controle de qualidade da comunidade científica e acadêmica, cujo foco tem sido a formação e qualificação de pesquisadores, destacando-se, nesse sentido, os cursos de doutorado na área de Enfermagem, com ênfase à produtividade(7).

Nesse parâmetro nacional, a veiculação dos produtos científicos na área de Enfermagem é concretizada, em sua maioria, por meio de exposições em congressos, simpósios e reuniões científicas, resultando em número reduzido de publicações em periódicos científicos. A lenta difusão do conhecimento, portanto, pode ser atrelada à escolha do canal de divulgação das pesquisas científicas(5). No entanto, essa realidade é diferente no setor de Educação em Enfermagem do Sul do Brasil, tendo em vista que, mesmo com indicador importante de publicações completas em anais de eventos, a veiculação do conhecimento nos 14 anos de análise tem predominado a partir da publicação de artigos em periódicos científicos.

A maior visibilidade nacional e internacional da produção científica em Enfermagem requer, entre tantos fatores, pesquisadores competentes, ampla política de incentivo à pesquisa, a soma de esforços regionais e determinação no alcance de metas. Desdobra-se, ainda, em dimensão ampliada, tendo em vista que não basta o processo da construção de novos conhecimentos para fortalecer a área de Enfermagem, mas o real desafio que se impõe aos programas de pós-graduação é que esses produtos concebidos pelos seus pesquisadores sejam consumidos e tenham aplicabilidade na prática profissional, atribuindo benefícios à população a partir de temas de interesse social(1).

A atenção aos índices de impactos de pesquisa deve ser um parâmetro acompanhado e mensurado por pesquisadores da área de Enfermagem. Em especial, a avaliação do conhecimento produzido deve ser contínua para verificar sua utilização e a aplicabilidade de seus resultados na prática profissional. O maior desafio é a construção de pesquisas que sejam de caráter experimental, com pressupostos de mudanças para as práticas em saúde(8-9).

Os índices de proporção da produção de artigos com Qualis/CAPES internacional dos GPEE no Sul do Brasil são satisfatórios, tendo em vista o indicador IQQ mensurando larga produção. No entanto, ocorrem iniquidades regionais nesse sentido: Santa Catarina se insinua com maior representatividade na produção científica em Educação em Enfermagem, a partir do enfoque quantitativo e na qualidade dos periódicos nos quais publicam os artigos, pois apresenta a maioria de seus artigos distribuídos em revistas com Qualis Internacional. Entretanto, apenas os GPEE do Rio Grande do Sul concretizaram produções com Qualis Internacional A, tão almejadas por pesquisadores em todo o mundo. A partir dessa constatação, defronta-se uma questão: por que segue sendo tão difícil publicar em periódicos Qualis Internacional A?

Algumas barreiras importantes para atingir publicações de qualidade internacional na área da Enfermagem são anunciadas em várias pesquisas científicas, como a inversão do foco no plano educacional para a pesquisa, com a conversão pura os indicadores de produtividade, o insuficiente financiamento para o setor de ciência e tecnologia da área, a pouca experiência dos enfermeiros como pesquisadores, a necessidade e o estresse para exercer a função docente junto à carreira de pesquisador, o encontro tardio dos enfermeiros com a pesquisa científica - o que pode ser facilmente relacionado à baixa presença de estudantes de graduação na composição dos grupos de pesquisas, ainda, atualmente, com as poucas, disputadas e mal distribuídas, bolsas de iniciação científica ofertadas para esse nicho(5-10).

A própria história pré-profissional da Enfermagem é marcada por mulheres subordinadas ao conhecimento e hegemonia masculina, à remuneração baixa, ao prevalente poderio médico e à inclinação forte ao biologicismo, tornando-se mundialmente profissão no século XIX e, no Brasil, a partir de 1920. Diante desse breve histórico, a Enfermagem, na atualidade, enfrenta desafios legados por herança. A busca da valorização profissional é desafio que pode concretizar mudanças na imagem da profissão para um caráter profissional reconhecido socialmente, cuja prática assistencial é aprimorada e orientada a partir do conhecimento gerado em pesquisas científicas(10).

Outros fatores ainda precisam ser vencidos como a baixa interdisciplinaridade e o caráter multiprofissional praticamente inexistentes na composição dos GPEE do Sul, cuja predominância é quase exclusiva de enfermeiros(4-10). A necessidade atual é que se estabeleçam parcerias entre diversos departamentos e áreas de conhecimento, fortalecendo a criação de redes e pesquisas de caráter multicêntrico, com várias lideranças e possibilidades de articulação político-científica.

Esta discussão não é nova para a área de Enfermagem, basta conferir na Política de Recursos Humanos em Saúde da Organização Pan-Americana da Saúde, nos resultados de embates dos mais diversos colóquios pan-americanos ou conferências ibero-americanas, nas discussões conduzidas pela Asociación Latinoamericana de Escuelas y Facultades de Enfermería (ALADEFE), nos fóruns de avaliação da área da Enfermagem na CAPES e outros espaços, a intenção de que se constituam redes colaborativas no campo da Educação em Enfermagem. O fortalecimento do setor tecnológico de Educação em Enfermagem carece de integração de interesses com propósitos solidários, a partir do desenvolvimento de redes coletivas, da união e fortalecimento de intelectuais da área, que poderia resultar, por exemplo, na produção de patentes de produtos tecnológicos que fomentariam suas linhas de pesquisa.

Na academia, ao se comparar a análise da educação do doutorado na área de Enfermagem do Brasil com outros cursos na Europa e América do Norte, por exemplo, é verificado que possuem pressupostos semelhantes, mas ainda existe a necessidade de interlocução entre as diferentes universidades, prestadores de serviços, indústrias e pesquisadores para a formação de rede internacional(9). Nota-se que a pós-graduação na Enfermagem brasileira, em especial a oferta de doutores em Enfermagem, cresceu significativamente nos últimos anos, atingindo visibilidade no sistema de ensino superior do país. No entanto, infelizmente, esse crescimento ocorre de forma desigual nas diferentes Regiões do Brasil, e essa desigualdade também se reflete sobre as iniciativas de atividades de pesquisa em parceria com investigadores internacionais - redes colaborativas - pois elas existem, porém, ainda são tímidas e limitadas a alguns programas de pós-graduação fortemente consolidados, principalmente na Região Sudeste do país(8). Sobre esse aspecto, percebe-se que o setor de Educação em Enfermagem da Região Sul do Brasil reitera a constatação apresentada na área de Enfermagem brasileira.

A partir do contexto de interesse em visibilidade internacional, os programas de pós-graduação em Enfermagem aumentaram o grau de exigência de seus pesquisadores em relação à qualidade e quantidade de produções, seguindo a tendência de competitividade internacional. Diferente da realidade internacional, na qual muitas instituições contratam doutores para ser pesquisadores exclusivamente, no Brasil, a política da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão reflete a dissonância no cenário de produção científica/tecnológica versus ensino. Nesse panorama, cumpre destacar alguns entraves como o amplo investimento de tempo e interesses dos docentes na área da pesquisa, em detrimento do ensino, desse modo, muitas vezes, a pesquisa segue como prioridade face à qualidade do ensino, porém, quando a base educacional desvanece, perde-se o conteúdo de integração e inserção social e econômica(7).

Nesse cenário, inclusive o profissional de Enfermagem, na condição de aluno de pós-graduação, envolve-se numa problemática complexa, tendo em vista a necessidade de quantidade e qualidade de sua produção acadêmica enquanto mantém o exercício de suas funções no espaço institucional. O eixo do ensino desses programas é a formação de pesquisadores, sendo espaço de legitimação do saber e de trabalho intelectual do enfermeiro, no qual atribui um reconhecimento e prestígio que, possivelmente, não era encontrado no trabalho assistencial(11) devido a alguns determinantes históricos da profissão. Os orientadores, por causa de pressão ambivalente, indicam preferência por orientandos mais jovens e com experiência prévia em bolsa de iniciação científica, enquanto os mestrandos e doutorandos se sentem pressionados quanto à qualidade da produção e ao cumprimento de metas, o que exige maior disponibilidade por parte do docente(11).

A produtividade, portanto, tornou-se expressão do progresso científico, mas precisa de liberdade para que aconteça. Para a criação, a renovação e a inovação, é necessário que os pesquisadores, a partir de ritmo próprio, avancem no processo criativo e não se percebam como máquinas em competição, obsessivos no cumprimento de índices(7). A própria constatação da inexistência de patentes registradas de produtos tecnológicos pelos GPEE do Sul indica a necessidade do avanço nesse processo para o contínuo desenvolvimento do conhecimento. Manter a originalidade torna-se difícil em meio à burocratização progressiva da ciência e, justamente por isso, unir esforços entre membros de diferentes GPEE é vital a partir dessa análise(4).

O trabalho dos GPEE é fundamental para que se tenha infraestrutura para agregar pesquisadores e membros para as atividades de pesquisa, o que possibilita trabalho integrado e incrementos do potencial de pesquisa(5). No entanto, a realidade dos GPEE do Sul do Brasil, em sua composição, está distante do processo multiprofissional, interdisciplinar e da articulação em rede para o desenvolvimento de pesquisas, visto que suas publicações e composição são quase que totalmente concretizadas por enfermeiros e situada em focos específicos(4).

Mesmo com todas as dificuldades já descritas anteriormente, no entanto, os GPEE vêm caminhando a passos lentos, mas progressivos, para avançar na produção tecnológica e científica. A produção de livros, felizmente, ainda não é considerada obsoleta para o setor de saúde, porém, é menos tradicional do que em outras áreas mais específicas, como sociais e humanas. Nesse aspecto, a inversão da produção de livros ou capítulos de livros por parte dos GPEE, em relação ao crescimento da sua produção de artigos científicos, pode ser explicada, entre outros fatores, pelo consumo científico internacional na área da saúde estar voltado à produção de artigos que sejam curtos e objetivos, que poupem tempo dos profissionais da prática para a apreensão do conhecimento novo e atualizado.

Cabe ressaltar os esforços da CAPES e do Ministério da Educação para a inclusão de seus pesquisadores no processo de maior autonomia e reconhecimento internacional no setor de pesquisa - a exemplo do Portal de Periódicos CAPES, o qual representa importante inversão financeira, permitindo o acesso a bases de dados com textos completos. Todavia, esse acesso é restrito para muitas instituições de ensino, limitando-se o processo de internacionalização do setor de Educação em Enfermagem no Sul do Brasil, bem como colocando em pauta a discussão acerca da produção do conhecimento como mercadoria ou um bem público.

A velocidade da novidade é feroz e atinge todos os setores com agressividade, não sendo diferente para os GPEE. Nesse sentido, a própria política nacional em ciência e tecnologia se mostra cruel e gera iniquidades: as instituições que mais produzem recebem maior financiamento; as que menos produzem e têm menor conceito pela CAPES recebem pouco ou nada em financiamento, menor número de bolsas científicas para a graduação, para a pós-graduação e para os próprios docentes pesquisadores. Essa política gera um círculo vicioso que em nada contribui para a superação desse cenário, de modo a permitir o fortalecimento equitativo das instituições no cenário científico. O incentivo ao desenvolvimento de patentes, por exemplo, é indicativo forte da presença imperativa do mercado até mesmo no setor acadêmico, que, no mundo dominante capitalista, desperta para um novo nome de desigualdade: a desigualdade intelectual.

Conclusões

O setor de Educação em Enfermagem no Sul do Brasil apresenta crescimento progressivo, em ciência e tecnologia nos últimos cinco anos, comparados com os dados apresentados nos anos de 1990. Porém, o setor ainda precisa avançar significativamente, de modo a contribuir para que a área da Enfermagem atinja parâmetros de produção científica das demais áreas da saúde. Para que essa estrutura seja fortalecida, pode-se utilizar como estratégia a formação de redes colaborativas para o desenvolvimento de trabalhos científicos, amplificando a produção em periódicos qualificados - e preferencialmente internacionais, com produção voltada às necessidades sociais - e o desenvolvimento de novas tecnologias educacionais. Essa é alternativa viável, tendo em vista a alta qualificação dos pesquisadores do setor, cuja articulação político-científica com outros grupos sociais poderia render centros de referência no Sul do Brasil.

Como todo estudo científico, este também apresenta a necessidade de análises mais aprofundadas por meio de trabalhos subsequentes que estão sendo produzidos pelas presentes autoras em relação aos temas: 1) avaliação de tendências da produção científica e tecnológica dos GPEE do Sul do Brasil, destacando quais referenciais têm sido mais publicados e evidenciando as disciplinas e subdisciplinas divulgadas pelos artigos científicos e, ainda, do ponto de vista de análise geográfica e 2) aprofundar a relação entre produção técnico-científica dos GPEE, estabelecendo correlação das iniquidades regionais no Brasil.

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  • Corresponding Author:
    Mônica Motta Lino
    Universidade Federal de Santa Catarina
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    CEP: 88040-970 Florianópolis, SC, Brasil
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Ago 2010
    • Data do Fascículo
      Jun 2010

    Histórico

    • Aceito
      21 Dez 2009
    • Recebido
      25 Mar 2009
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