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Modelagem numérica do processo de rebitagem em palhetas de turbinas a vapor

Numerical modeling of riveting process on steam turbines blades

RESUMO

A fragilização estrutural devido ao processo de rebitagem vem sendo pesquisada em diversos componentes, como por exemplo, em estruturas aeronáuticas. Este processo afeta a confiabilidade dos equipamentos quando são submetidos aos carregamentos de operação. O rotor de alta pressão em estudo operou cerca de 3000 horas após a manutenção de repalhetamento até detectar a falhar. Esta falha foi relacionada com as técnicas utilizadas no processo de rebitagem das bandagens nas palhetas, que acabou gerando trincas no raio de arredondamento das espigas de diversas palhetas. Deste modo, o presente estudo avalia numericamente o comportamento mecânico do processo de rebitagem por meio de uma análise não linear utilizando o método dos elementos finitos (MEF). Para a geometria em análise (punção, espiga e bandagem) foi escolhido uma configuração 2D, com comportamento axisymmetric, utilizando o elemento plane183 para os componentes, assim como os elementos contac172 e targe169 para os contatos. Foi aplicado um comportamento elasto-plástico do material a fim de investigar as tensões residuais após do processo de rebitagem. Os resultados da simulação apresentaram boa correlação com as falhas das palhetas, indicando concentração de tensão no raio da espiga. As tensões próximas ao raio são aproximadamente 1200 MPa e 180 MPa para a tensão máxima e mínima principal, respectivamente. Foi observado que a tensão máxima principal está acima do limite de escoamento. Contudo, estudos futuros utilizando outros modelos, como o da mecânica da fratura, seriam aplicados a fim de que não ocorra a falha da união quando esta for solicitada na fase de operação.

Palavras-chave
Processo de rebitagem; elementos finitos; análise não linear; tensão residual

ABSTRACT

The structural fragility due to the riveting process has been investigated in several components, such as in aeronautical structures. This process affects the reliability of the equipment when subjected to the operation loads. The high-pressure rotor under study operated about 3000 hours after re-pair maintenance of blades until the failure detected. This failure is related to the techniques used in the riveting process of the shroud in the blade, which ended up generating cracks in the radius of tenon blade. Thus, the present study numerically evaluates the mechanical behavior of the riveting process by means of a nonlinear analysis using the finite element method (FEM). For the geometry, under analysis (punch, tenon, and shroud) a 2D configuration with axisymmetric behavior was adopted, using the plane183 element for the components and the contac172 and targe169 elements for the contacts. It was adopted the elastoplastic behavior of the material in order to investigate the residual stresses after the riveting process. The results of the simulation presented good correlation with the blades failures, indicating a stress concentration in the radius of the tenon. The stresses on the tenon radius are about 1200 MPa and 180 MPa for the maximum principal stress and minimum principal stress, respectively. However, future studies using other models, such as fracture mechanics, would be applied in order to avoid failure of the joint when requested during the operating phase.

Keywords
Riveting process; finite elements; nonlinear analysis; residual stress

1. INTRODUÇÃO

As turbinas a vapor estão expostas à falha de fadiga de serviço devido ao acúmulo e crescimento de danos. Embora os componentes sejam fabricados com materiais de alta resistência, estes são afetados por diferentes formas de degradação metalúrgica, como a fadiga e a fluência, provocadas pelas cargas cíclicas e ao período de serviço em elevadas temperaturas, respectivamente [11 CITARELLA, R., LEPORE, M., et al., “Fatigue crack growth by FEM-DBEM approach in a steam turbine blade”, Industrial Engineering & Management, v. 4, n. 160, pp. 2169-2173, May. 2015.]. Em alguns casos os mecanismos de falha se iniciam no processo de fabricação, por exemplo nas juntas rebitadas do rotor, as quais estão estruturalmente expostas à fragilização decorrente da força aplicada nas montagens. Dois mecanismos de ruptura diferentes afetam as falhas de juntas rebitadas: por quebra dos rebites ou pelas trincas que se propagam nos furos e rebites. Também deve-se considerar os efeitos dinâmicos no modo de falha e a resistência final das conexões [22 LANGRAND, B., PATRONELLI, L., et al., “Full scale experimental characterisation for riveted joint design”, Aerospace Science and Technology, v. 6, n. 5, pp. 333-342, Sep. 2002.].

A fadiga das juntas rebitadas é relacionada com a tensão residual induzida pela rebitagem, especialmente a distribuição de tensões na superfície de contato [33 ZENG, C., TIAN, W., et al., “Experimental and numerical studies of stress/strain characteristics in riveted aircraft lap joints”, Journal of Mechanical Science and Technology, pp. 1-11, Jul. 2019.]. De acordo com GIORGINI [44 GIORGINI, D.G., Otimização do processo de trefilação através da proposição de um modelo de previsão da força de trefilação adequado às condições reais da V & M do Brasil, Tese de M. Sc., UFMG, Belo Horizonte, MG, Brasil, 2013.] a maioria das operações por conformação a frio apresentam elevado nível de tensão residual, devido ao fenômeno do encruamento, que é responsável pelo aumento da resistência mecânica e dureza, em contrapartida da redução da ductilidade e tenacidade do material.

As diferentes variações geométricas, como furos e entalhes, arredondamento de aresta entre outros, geram na sua região o efeito de concentração de tensão [55 WRONICZ, W. “Numerical analysis of residual stress distribution in riveted lap joint under tension”, Journal of KONES, v. 25, n. 4, pp. 455-462, 2018.,66 CHAUDHARI, S.P., CHAUDHARI, K.K., “Comparison of static analysis of bonded, riveted and hybrid joints by using different materials”, International Journal, v. 4, p. 55-63, May. 2018.]. Essas regiões implicam em deformações acentuadas, o que leva à formação de vazios que poderão se converter em trincas de fadiga [77 PERES, L.O.R., Efeito de concentração de tensão na vida em fadiga de aço utilizado em spindle de laminador de chapas grossas – análise experimental e modelamento via MEF, Dissertação de M. Sc., UFOP, Ouro Preto, MG, Brasil, 2008.]. Pesquisas mostram o impacto significativo que as tensões residuais têm sobre os componentes e estruturas de engenharia, ao induzir fadiga e fratura. Essas tensões podem aumentar ou diminuir a vida útil em fadiga, dependendo da tensão resultante em função da tensão residual e da tensão aplicada [88 JAMES, M.N., HATTINGH, D.G., ASQUITH, D., et al., “Applications of residual stress in combatting fatigue and fracture”, In: 21st European Conference on Fracture, 11-25, Catania, Italy, 20-24 June 2016.,99 WRONICZ, W., KANIOWSKI, J., “Experimental and numerical study of strain progress during and after riveting process for brazier rivet and rivet with compensator-squeezing force and rivet type effect”, Fatigue of Aircraft Structures, v. 1, n. 3, pp. 166-190, 2011.,1010 TULONEN, J., SIITONEN, T., LAAKSONEN, A., “Behaviour of riveted stringer-to-floorbeam connections in cyclic load tests to failure”, Journal of Constructional Steel Research, v. 160, pP. 101-109, 2019.].

O rotor de alta pressão em estudo, pertencente a um turbo-gerador com capacidade de 50 MW, operou aproximadamente 3.000 horas desde sua última revisão, realizada em 2016. Neste contexto, em função da mudança significativa do comportamento dinâmico (vibracional) da turbina, decidiu-se realizar uma inspeção dos componentes. Após a abertura da carcaça externa e interna, foi constatado o desprendimento de bandagens das palhetas nos estágios 1A, 1B, 3º, 12º e 16º. As Figura 1 (a) e (b) mostram o desprendimento das bandagens nos estágios 1A e 1B.

Figura 1
Desprendimento das bandagens nos estágios 1A e 1B.

Conforme a análise preliminar, a causa mais provável da falha estaria no processo de rebitagem inadequado, causando trinca na espiga da palheta. Visto que, a propagação dessa trinca ocasionou a ruptura das seções das espigas durante a operação da máquina e consequentemente o desprendimento das bandagens, tal como se indica na Figura 1. A causa foi confirmada com um ensaio de ultrassom, a que indicou a presença de trincas, em vários estágios, na raiz da espiga da palheta. Para a validação de um processo de rebitagem, isento de defeitos, foram realizados vários testes com variação da: altura da espiga, ângulo da espiga, número de pancadas, pressão do martelete etc., todos os testes foram realizados em temperatura ambiente.

Segundo SANDERS [1111 SANDERS, W.P., Turbine steam path components, Turbomachinery Internacional Publications, Norwalk, Conn, 1987.] a espiga deve ser conformada para prender a bandagem firmemente à palheta, produzindo o mínimo possível de empuxo lateral. Ainda assim, nenhuma trinca deve ser formada no material da espiga, em casos de suspeita de trinca as técnicas de ensaio não destrutivo devem ser usadas para confirmar sua existência.

A rebitagem deve impedir a movimentação da bandagem, em relação à palheta e ser suficiente para suportar a força centrífuga da bandagem, durante as solicitações de operação [1212 BLOCH, P.H., SINGH P.M., Steam turbine: design, application and re-rating, 2 ed., New York, McGraw-Hill Companies, 2018., 1313 SANDERS, W.P., Turbine steam path maintenance and repair, vol. 2, Tulsa, PennWell Corporation, 2002.]. Para isso, a bandagem deve ser mantida no extremo da palheta pelo ajuste com aperto entre a espiga e a superfície interna do furo da bandagem, situação aceitável quando a unidade não está submetida a forças vibratórias excessivas, devido a que causam a perda do ajuste por fricção. Além disso, a bandagem possui algumas funções específicas como: prevenir ou minimizar o vazamento através da ponta do perfil da palheta, fornecendo uma parede para ajudar a controlar o fluxo e a expansão do vapor, prover um meio de controlar a área de escape do estágio, proporcionando um limite externo contra o qual o vapor pode se expandir e minimizar a magnitude das vibrações quando estão firmemente presas às espigas.

Contudo, o estudo trata-se do desenvolvimento de um modelo numérico computacional, utilizando-se de técnicas de modelagem já existentes por meio do software ANSYS Student Edition 19.2. Foi considerado o contato entre as partes e o comportamento elasto-plástico do material afim de verificar as tensões residuais após o processo de rebitagem. Para isso foi necessário modelar o comportamento na fase plástica estável do material X22CrMoV12-1 utilizando o parâmetro Multilinear Isotropic Hardening.

2. PROCEDIMENTO EXPERIMENTAL

2.1 Método experimental

Para comparar o material utilizado nos ensaios de tração e testes experimentais, com os valores admitidos pela Norma EN10269 [1414 EUROPEAN STANDARDS – EN 10269 (2014-2). “Steels and nickel alloys for fasteners with specified elevated and/or low temperature properties”. Germany, 2014.] para o aço X22CrMoV12-1, foi realizado uma análise da composição química por espectrometria de emissão óptica com um equipamento da marca SPECTROCAST.

Os ensaios de tração foram realizados no equipamento universal de ensaios mecânicos INSTRON 300LX-J3, utilizando uma célula de carga de 300 kN. Foi adotada a norma ASTM E8/E8M-13 [1515 ASTM E8/E8M-13. “Standard Test Methods for Tension Testing of Metallic Materials”. 2013] para a realização dos ensaios em temperatura ambiente, onde foram determinadas as propriedades mecânicas do aço X22CrMoV12-1 como: limites de escoamento e limite de resistência. As dimensões do corpo de prova conforme a norma está indicada na Figura 2.

Figura 2
Corpo de prova: ensaio de tração em temperatura ambiente, norma ASTM E8/E8M-13.

As equações (1) e (2) foram utilizadas para determinar a tensão e deformação verdadeira, de acordo com RODRIGUES et al [1717 RODRIGUES, J., MARTINS, P., Tecnologia mecânica: tecnologia da deformação plástica, 2 ed., Lisboa, Ed. Escolar, 2010.]. A deformação plástica (εp) foi determinada a partir da equação (3), conforme LIU et al [1818 LIU, W., MA, J., KONG, F., LIU, S., KOVACEVIC, R., “Numerical modeling and experimental verification of residual stress in autogenous laser welding od high-strength steel”, Laser Manufacturing and Materials Processing, v. 2, pp. 24-42, Mar. 2015.].

σ ' = σ e n g × 1 + ε e n g (1)
ε ' = ln 1 + ε e n g (2)
ε p = ε t o t a l - ε e (3)

Onde:

σ' a tensão verdadeira;

σeng a tensão de engenharia;

εeng a deformação de engenharia;

ε' a deformação verdadeira;

Para comparar os resultados da simulação com a condição real de deformação da espiga, foi fabricado um aparato experimental composto por suporte, espiga e bandagem, que são indicados na Figura 3. Foi utilizado uma prensa hidráulica manual com capacidade de 30 toneladas para realizar a rebitagem e um manômetro para identificar o valor da pressão máxima exercida pela prensa durante o experimento.

Figura 3
Configuração do aparato experimental.

A partir da medição da pressão P no manômetro, foi calculada a força máxima F, utilizando a equação (4) LINSINGEN [1919 LINSINGEN, I. V., Fundamentos de sistemas hidráulicos, 5 ed., Florianópolis, Editora UFSC, 2016.], sendo que sua área é A = 4417,9 mm2.

F = P . A (4)

2.2 Simulação computacional

Na modelagem do processo de rebitagem, utilizou-se o software ANSYS Student Edition 19.2. Apesar da limitação do número de nós e elementos desta versão do software, o modelo não ultrapassou esses limites devido ao uso do comportamento 2D axisymmetric ter proporcionado uma redução significativa do número de nós e elementos se comparado com um modelo 3D. Os elementos utilizados foram os disponíveis na biblioteca interna do ANSYS.

Por meio da interface Workbench, o módulo static structural foi utilizado para realizar a simulação, visto que a análise, neste caso, é conhecida como quase-estática, pois engloba grandes deformações, não linearidade física (material) e de contato e é solucionada por meio do solver implícito.

O comportamento plástico do aço X22CrMoV12-1 foi modelado através das leis de encruamento isotrópico utilizando o critério de Von Mises. O modelo constitutivo selecionado para a espiga e bandagem, simulou o comportamento elasto-plástico através das curvas multilineares. Segundo ALVES 2020 ALVES F. A., Elementos finitos: a base da tecnologia CAE/análise não linear, 1 ed., São Paulo, Editora Érica, 2012.], essas curvas tratam de uma idealização do diagrama tensão-deformação plástica, sendo que a opção atribuída ao modelo contém o efeito do encruamento, ou o aumento da resistência na fase plástica estável. A Figura 4 apresenta este modelo.

Figura 4
Modelo constitutivo adotado de tensão – deformação. Adaptado de ANSYS [2121 ANSYS Inc. Ansys student edition 19.2 manual. 2019].

A geometria do sistema de rebitagem, apresentada na Figura 5(a), foi criada no SpaceClaim, software CAD presente no pacote da versão ANSYS Student Edition 19.2. O modelo foi simplificado para ser analisado em 2D, com um comportamento axisymmetric, nesta simulação, se considera apenas uma semi-seção da geometria, conforme se mostra na Figura 5. Esse comportamento utiliza o eixo Y como o responsável pela revolução desta semi-seção, representando ainda a coordenada axial, assim como o X representa a coordenada radial.

Figura 5
Em (a) modelo 2D com comportamento axisymmetric e (b) malha de elementos.

A malha de elementos finitos possui cerca 16800 nós e 5410 elementos de segunda ordem, tendo uma maior densidade nas regiões de contato e no raio de arredondamento da espiga, como se indica na Figura 5(b). Este refinamento de malha se realiza por ser a região onde há o surgimento das trincas.

Para a discretização dos componentes da punção, espiga e bandagem no ANSYS [2121 ANSYS Inc. Ansys student edition 19.2 manual. 2019] foi empregado o elemento Plane183. Trata-se de um elemento 2D, de segunda ordem, que pode ter 8 ou 6 nós dependendo de sua geometria. Na simulação considera-se 2 graus de liberdade por nó, correspondente às translações nos eixos x (ou radial) e y (ou axial). O Plane183 foi utilizado por considerar alguns efeitos importantes como a plasticidade e as grandes deformações. A Figura 6 apresenta os detalhes dos elementos Plane183, Conta172, Targe169, utilizado no modelo numérico.

Figura 6
(a) Plane 183, (b) Conta172, (c) Targe169 utilizado no modelo numérico. Fonte: ANSYS [2121 ANSYS Inc. Ansys student edition 19.2 manual. 2019].

Para as condições de contato punção-espiga e espiga-bandagem foi utilizado os elementos Conta172 e Targe169. Esses elementos são utilizados em análises 2D e são localizados nas arestas de elementos como o Plane183, no entanto, o elemento Conta172 é usado para representar o contato e o deslizamento entre a superfície alvo. O elemento Targe169 é utilizado para representar a superfície alvo, porém, permite ainda considerar parâmetros como deslocamentos de translação ou rotação, temperatura, tensão, forças, momentos etc., a fim de extrair efeitos específicos na interação das partes.

As condições de contato punção-espiga e espiga-bandagem foram definidas como do tipo frictional. Para o par de contato punção-espiga foi utilizado um coeficiente de atrito de 0.01, a fim de eliminar problemas de convergência do modelo. Para o par de contato espiga-bandagem foi utilizado um coeficiente de atrito de 0.2, os detalhes dos contatos são apresentados na Tabela 1.

Tabela 1
Detalhe das condições de contato aplicadas no modelo.

Para as condições de contorno do modelo foram utilizadas restrições do tipo Displacement e Remote Displacement, estas condições possibilitam controlar os deslocamentos dos nós presentes nas faces, arestas e pontos, utilizando-se de constantes ou funções, por exemplo. As configurações das restrições podem ser observadas na Figura 7 e na Tabela 2.

Figura 7
Condições de contorno aplicadas no modelo.
Tabela 2
Detalhe das condições de contorno aplicadas no modelo.

A restrição “C” controla o deslocamento (∆s) da punção de rebitagem e sua configuração é indicada na Figura 8.

Figura 8
Configuração do deslocamento da punção.

CATANEO [2222 CATANEO, R., Otimização do projeto de um para-choque traseiro para veículos de carga com PBTC acima de 23,5 T utilizando a técnica de análise não linear, Instituto iESSS, Porto Alegre, RS, Brasil, 2016.] recomenda que a punção se desloca com movimentos seguindo o modelo de uma função senoidal com domínio do tempo, essa função foi utilizada para suavizar a entrada e a saída do contato entre a punção e a espiga, otimizando a convergência do modelo.

Para o controle de não linearidade foi utilizado a opção Full do método de Newton-Raphson, que por sua vez é mais robusto e de fácil convergência [2222 CATANEO, R., Otimização do projeto de um para-choque traseiro para veículos de carga com PBTC acima de 23,5 T utilizando a técnica de análise não linear, Instituto iESSS, Porto Alegre, RS, Brasil, 2016.]. No controle do solver foi habilitado o Large Deflection e mantido as demais configurações como Program Controlled. Na opção de controle de Step foi definido um step com duração de 10 segundos divididos em substeps conforme a Tabela 3.

Tabela 3
Detalhe do controle de steps.

3. ANÁLISE DOS RESULTADOS

A caracterização química do material usado assim como sua caracterização mecânica para diferentes temperado são expostos nos resultados. Também se analisa as simulações da espiga durante o processo de rebitagem é avaliado como um processo de conformação plástica as tensões locais no material.

A Tabela 4, apresenta os resultados da composição química média do material do corpo de prova, utilizado nos ensaios de tração e testes experimentais. Ao comparar com os valores máximos e mínimos especificados pela Norma EN10269 [1414 EUROPEAN STANDARDS – EN 10269 (2014-2). “Steels and nickel alloys for fasteners with specified elevated and/or low temperature properties”. Germany, 2014.], conclui-se que este material atende as especificações da norma.

Tabela 4
Comparação da composição química realizada com valores da norma EN10269.

A Figura 9(a), apresenta as curvas de tensão-deformação de engenharia e tensão-deformação verdadeira, realizadas por meio das equações (1) e (2). Os valores de limite de escoamento, limite de resistência e alongamento mínimo extraídos das curvas foram comparados com a Norma EN10269, conforme a Tabela 5.

Figura 9
Em (a) as curvas tensão-deformação de engenharia e verdadeira, em (b) curva Multilinear Isotropic.
Tabela 5
Comparação das propriedades mecânicas encontradas através dos ensaios com a norma EN10269 para o aço DIN X22CrMoV12-1.

A partir da equação (3), que calcula a deformação plástica e utilizando a curva de tensão-deformação verdadeira, foi determinado a curva de tensão-deformação plástica, utilizada para modelar o comportamento plástico do material no software ANSYS por meio da curva Multilinear Isotropic Hardening, indicada na Figura 9(b).

Paul et al [2323 PAUL, S.K., ROY, S., et al., “A Simplified procedure to determine post-necking true stress–strain curve from uniaxial tensile test of round metallic specimen using DIC”, Journal of Materials Engineering and Performance, v. 27, n. 9, pp. 4893-4899, Jul. 2018.], calculou a curva de tensão verdadeira usando MEF e comparou com a experimental. Os ensaios foram realizados em corpo de seção transversal circular para vários níveis de tensão. Para melhorar a simulação é necessário fatores de correção, mas a diferença de valores estaria entre 2 a 17,9 %.

Os resultados da simulação dos esforços realizados pela espiga durante o processo de rebitagem simulado são apresentados por meio dos vetores das tensões principais o qual é mostrada na Figura 10. Ao observar o comportamento da tendência à deformação na Figura 10(a), a espiga está na fase de carregamento, onde é observado a predominância de esforços de compressão na região do raio de arredondamento da espiga. Enquanto na Figura 10(b) é apresentado os esforços após o descarregamento, quando sucede o retorno elástico das tensões, onde se observa que a região do raio passa a sofrer esforços de tração.

Figura 10
Vetores das tensões principais máximas (a) carregado e (b) descarregado.

A Figura 10(b) revela uma concentração de tensões na região do raio da espiga, oriunda da transição geométrica que compõe a raiz da espiga [55 WRONICZ, W. “Numerical analysis of residual stress distribution in riveted lap joint under tension”, Journal of KONES, v. 25, n. 4, pp. 455-462, 2018.,66 CHAUDHARI, S.P., CHAUDHARI, K.K., “Comparison of static analysis of bonded, riveted and hybrid joints by using different materials”, International Journal, v. 4, p. 55-63, May. 2018.,77 PERES, L.O.R., Efeito de concentração de tensão na vida em fadiga de aço utilizado em spindle de laminador de chapas grossas – análise experimental e modelamento via MEF, Dissertação de M. Sc., UFOP, Ouro Preto, MG, Brasil, 2008.], podendo ser extremamente prejudicial para uma falha por fadiga [33 ZENG, C., TIAN, W., et al., “Experimental and numerical studies of stress/strain characteristics in riveted aircraft lap joints”, Journal of Mechanical Science and Technology, pp. 1-11, Jul. 2019.,44 GIORGINI, D.G., Otimização do processo de trefilação através da proposição de um modelo de previsão da força de trefilação adequado às condições reais da V & M do Brasil, Tese de M. Sc., UFMG, Belo Horizonte, MG, Brasil, 2013.]. Analisando separadamente as tensões principais máximas e mínimas do modelo através da Figura 11(a) e (b) respectivamente, nota-se na região do raio da espiga que, tanto as tensões principais máximas quanto as tensões principais mínimas, estão com valores positivos, sendo que a tensão principal mínima na região crítica analisada é 179,7 MPa (tração) e a tensão principal máxima é 1211,3 MPa (tração).

Figura 11
Em (a) as tensões principais máximas e em (b) as tensões principais mínimas.

Segundo MANES et al [2424 MANES, A., GIGLIO, M., VIGANÒ, F., “Effect of riveting process parameters on the local stress field of a T-joint”, International Journal of Mechanical Sciences, v. 53, pp. 1039-1049, Sep. 2011.], a tensão máxima principal representa o parâmetro no qual as trincas por fadiga surgem e propagam-se. De acordo com MAYERS et al [2525 MEYERS, M.A., CHAWLA, K.K., Princípios de metalurgia mecânica, 1 ed., São Paulo, Edgard Blucher, 1982.], o modo I de abertura de trinca ou modo de tração como se observa na Figura 10(b)), é o mais comum em falhas por fadiga. A Figura 12 relaciona uma imagem microscópica da espiga contendo uma trinca com os resultados dos vetores das tensões principais. Esses resultados, juntamente com as tensões máximas principais apresentadas na Figura 11, justificam o surgimento das trincas por meio de defeitos superficiais pré-existentes na região do raio, como: descontinuidades originadas do processo de usinagem da palheta.

Figura 12
Relação de uma trinca com os vetores da tensão máxima principal.

Contudo, preocupou-se em investigar as tensões residuais que correspondem ao início e propagação das trincas durante o processo de rebitagem. A nucleação das trincas ocorre por meio das tensões cisalhantes cíclicas que atuam na região do raio da espiga, [11 CITARELLA, R., LEPORE, M., et al., “Fatigue crack growth by FEM-DBEM approach in a steam turbine blade”, Industrial Engineering & Management, v. 4, n. 160, pp. 2169-2173, May. 2015., 2626 ROSA, E., Análise de resistência mecânica – mecânica da fratura e fadiga, 1 ed., Florianópolis, Editora UFSC, 2002.]. No entanto, a simulação indica que a propagação da trinca é causada pela tensão perpendicular a trinca, ou seja, pela tensão normal ou axial atuante na seção transversal da espiga, visto que essa componente é a tensão principal máxima. Deste modo, a tensão perpendicular à seção da espiga é crítica na vida em fadiga da união.

A força máxima necessária para realizar o processo de rebitagem obtida na simulação computacional foi comparada com a força máxima obtida pelo aparato experimental, os valores são apresentados na Tabela 6.

Tabela 6
Comparação das forças de rebitagem.

O estudo realizado pelo método de elementos finitos e experimental por ZENG [2727 ZENG C., TIAN W., LIU X. Y., XUE J. T, “Experimental and numerical studies of stress/strain characteristics in riveted aircraft lap joints”, Journal of Mechanical Science and Technology, p. 1-11, 2019.], sobre as características de tensão induzidas pela rebitagem na superfície de contato, conclui que pequenas forças de compressão podem resultar em uma alta tensão residual de tração. Assim como uma alta tensão residual de compressão pode ser criada na camada próxima da superfície do furo. No entanto, o nível de estresse nem sempre é aumentado com o aumento da força de compressão, assim como a melhoria da vida de fadiga observada. Mais estudos ainda são necessários para explicar o efeito de diminuição da fadiga causado por uma alta força de compressão. Também foi avaliado o efeito de longa vida em fadiga ocasionado pela tecnologia de rebitagem com interferência, que foi justificado pelo estresse residual de compressão. Com o aumento da força de rebitagem de 10,2 kN para 18 kN em rebites de 4 mm, o nível de tensão de tração se reduziu e a tensão de compressão aumentou, não apenas com o aumento do nível de pressão de compressão, mas também com a região estendida com tensão residual compressiva. Com cargas intermédias também mostrou ocorreu maior duração de fadiga entre os espécimes testados.

4. CONCLUSÕES

A falha da junta de rebites de um rotor de uma turbina de vapor de alta pressão foi analisada pelo método de elementos finitos avaliando a concentração de tensões. Ao comparar com a imagem dos elementos extraídos se conclui que:

O modelo numérico proposto neste trabalho se aproxima razoavelmente à condição real de rebitagem, visto que não engloba condições de contorno e modelos constitutivos aplicados em carregamentos cíclicos e fadiga. No entanto, neste estudo pode-se compreender a dificuldade para a validação de um processo de rebitagem isento de defeitos. Na análise do modelo numérico, os parâmetros de contato como, métodos de cálculo e coeficientes de atrito, foram excluídos sem considerar a influência destes sobre os resultados.

Com a simulação computacional foi possível avaliar o comportamento do processo de rebitagem, indicando na fase de carregamento que o raio da espiga está submetido a compressão. No entanto, o descarregamento elástico do material apresentou a inversão do campo das tensões, de compressão para tração na região do raio da espiga. Além disso, o raio da espiga apresentou uma nova deformação plástica devido ao escoamento do material na fase de descarregamento.

Notou-se ainda a importância de ter-se um controle dos parâmetros de fabricação da palheta, mais precisamente do acabamento superficial na região do raio da espiga, visto que as descontinuidades superficiais geradas no processo de manufatura atuam como concentradores de tensões e facilitam o início e propagação das trincas.

Os resultados encontrados por meio da simulação foram coerentes com os ensaios experimentais, dado que o valor da força máxima para conformar a espiga no furo da bandagem, foi próximo ao valor obtido por meio do aparato experimental, do qual a diferença entre os valores foi de aproximadamente 3 %.

BIBLIOGRAFIA

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Jul 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    14 Ago 2019
  • Aceito
    04 Abr 2020
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