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Versão em português do Questionário da Personalidade Esquizotípica: SPQ

Portuguese version of the Schizotypal Personality Questionnaire: SPQ

CARTA AO EDITOR

Versão em português do Questionário da Personalidade Esquizotípica – SPQ

Portuguese version of the Schizotypal Personality Questionnaire – SPQ

Hélio TonelliI; Marcelo Daudt von der HeydeII; Cristiano Estevez AlvarezIII; Adrian RaineIV

IPsiquiatra, coordenador do Ambulatório de Transtornos do Espectro da Esquizofrenia do Hospital Nossa Senhora da Luz

IIPsiquiatra, supervisor do Ambulatório de Transtornos do Espectro da Esquizofrenia do Hospital Nossa Senhora da Luz

IIIPsiquiatra, responsável pela Disciplina de Medicina Baseada em Evidências da Residência Médica em Psiquiatria do Hospital Nossa Senhora da Luz

IVRichard Perry University Professor, Departments of Criminology, Psychiatry and Psychology, Jerry Lee Center of Criminology. University of Pennsylvania

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Dr. Hélio Tonelli Av. Cândido de Abreu, 526 cj. 311-B Curitiba, PR E-mail: hatonelli@terra.com.br

O transtorno esquizotípico de personalidade (TEP) é definido clinicamente no DSM-IV1 como um padrão invasivo de déficits sociais e interpessoais, marcado por desconforto agudo e reduzida capacidade para relacionamentos íntimos, além de distorções cognitivas ou perceptivas e comportamento excêntrico, que costuma surgir no início da idade adulta e estar presente em uma variedade de contextos, associando-se a pelo menos cinco dos nove traços esquizotípicos: ideias de referência; crenças bizarras ou pensamento mágico que influenciam o comportamento e são incompatíveis com as normas da subcultura do indivíduo (por exemplo: superstições; crença em clarividência; telepatia ou "sexto sentido"; em crianças e adolescentes, fantasias e preocupações bizarras); experiências perceptivas incomuns, incluindo ilusões somáticas; pensamento e discurso bizarros (por exemplo, vago, circunstancial, metafórico, superelaborado ou estereotipado); desconfiança ou ideação paranoide; afeto inadequado ou constrito; aparência ou comportamento esquisito, peculiar ou excêntrico; ausência de amigos íntimos ou confidentes, exceto parentes em primeiro grau; ansiedade social excessiva, que não diminui com a familiaridade e tende a estar associada com temores paranoides, em vez de julgamentos negativos acerca de si próprio.

O diagnóstico de TEP é considerado um importante fator de vulnerabilidade para o desenvolvimento de esquizofrenia, que tem um curso crônico e marcado por recaídas e remissões, manifestando-se costumeiramente no início da idade adulta2. Essas são fortes razões para a preocupação com a detecção de fatores de risco para esquizofrenia na população geral. De fato, o estudo e o reconhecimento de pródromos têm sido uma importante atividade de pesquisa em esquizofrenia. Cerca de 80% a 90% dos esquizofrênicos relatam uma gama de sintomas prodrômicos, que incluem mudanças nas percepções, nas crenças, na cognição, no humor e no comportamento, antes de ficarem psicóticos3. É, pois, importante identificar quais são as populações que, em um dado momento, manifestam possíveis sintomas prodrômicos e estarão sujeitas à evolução para um quadro de esquizofrenia. São considerados indivíduos de alto risco aqueles que têm um parente esquizofrênico em primeiro grau, mais frequentemente um dos pais ou irmãos. Todavia, recentemente foram propostos critérios de identificação para grupos de risco ultra-alto, subgrupados da seguinte forma4:

1. Indivíduos com síndrome de sintomas psicóticos atenuados: no último ano, sintomas positivos subclínicos ocorreram, mas não sintomas francamente psicóticos; os sintomas devem ter ocorrido no mínimo uma vez por semana no último mês.

2. Indivíduos com síndromes psicóticas intermitentes breves: nos últimos três meses, ocorreram sintomas psicóticos francos, que foram breves e autolimitados; tais sintomas não preenchem critérios do DSM-IV para algum transtorno psicótico; os sintomas não são seriamente desagregadores ou perigosos.

3. Síndromes de risco genético ou deterioração recente: o indivíduo preenche critérios para TEP, ou tem um parente em primeiro grau com psicose, ou no último ano o funcionamento reduziu 30 pontos ou mais na Escala de Funcionamento Global, por no mínimo um mês.

Portanto, tendo em vista que indivíduos previamente diagnosticados como portadores de TEP têm risco aumentado para esquizofrenia, o reconhecimento de indivíduos com TEP e seu engajamento em programas de prevenção desse transtorno poderiam não só atenuar o sofrimento associado a ele, como diminuir custos relacionados à terapia farmacológica e institucional dos novos casos.

As Escalas de Predisposição à Psicose (EPP) são instrumentos que podem ser utilizados no reconhecimento de indivíduos predispostos em populações não clínicas. Alguns exemplos de EPP incluem as escalas Perceptual Aberration Scale, Magical Ideation Scale, Social Anhedonia Scale, Physical Anhedonia Scale, Impulsive Non-Conformity Scale5 e Schizotypal Personality Questionnaire (SPQ)6; todos os questionários autoaplicáveis, desenvolvidos originalmente em língua inglesa, exceto o SPQ, ainda não foram traduzidos para o português.

O SPQ foi elaborado a partir dos critérios do DSM-III-R para TEP e contém subescalas para os nove traços esquizotípicos. É composto por 74 asserções que podem ser respondidas com "sim" ou "não". Cada resposta "sim" corresponde a um ponto, e os escores totais possíveis variam entre 0 e 74. O instrumento original demonstrou ter alta confiabilidade interna (0,91) e a média dos valores de coeficientes alfa para cada subescala é de 0,74. A confiabilidade teste-reteste avaliada em dois meses foi de 0,82 e os valores de validade convergente foram de 0,81 em relação à Schizotypal Personality Scale (STA) e de 0,59 a 0,65 em relação à Schizophrenism Scale, escalas que aferem traços esquizotípicos discriminados pelo DSM-III-R6. Análises fatoriais do SPQ demonstraram que o instrumento tem três fatores: déficits cognitivo-perceptuais, déficits interpessoais e desorganização7.

A tradução para o português do SPQ foi feita pelo primeiro autor desse projeto (HAT), revisada pelos demais autores e retrotraduzida para o inglês por um tradutor profissional cego para o instrumento original. A versão retrotraduzida do instrumento foi revista e aprovada pelo autor do instrumento. Estudos de validade, confiabilidade e adaptação cultural na população brasileira precisam, contudo, ser feitos adicionalmente.

Recebido: 28/4/2008

Aceito: 30/7/2008

  • 1
    American Psychiatric Association. Diagnostic and statistical manual of mental disorders. 4.edition. Washington, D.C.: American Psychiatric Association; 1994.
  • 2. Yung AR, Killackey E, Hetrick SE, Parker AG, Schultze-Lutter F, Klosterkoetter J. The prevention of schizophrenia. Int Rev Psychiatry. 2007;19(6):633-46.
  • 3. Addington J. The prodromal stage of psychotic illness: observation, detection or intervention? J Psychiatry Neurosci. 2003;28(2):93-7.
  • 4. Thompson KN, MC Gorry PD, Phillips L, Yung A. Prediction and intervention in the pre-psychotic phase. J Adv Schizophr Brain Res. 2001;3(2):43-7.
  • 5. Chapman JP, Chapman LJ, Kwapil TR. Scales for the measurement of schizotypy. In: Raine A, Lencz T, Mednick SA, editors. Schizotypal personality. New York: Cambridge University Press; 1995, p.79-109.
  • 6. Raine A. The SPQ: A scale for the assessment of schizotypal personality based on DSM-III-R criteria. Schizophrenia Bull. 1991;17(4):555-564.
  • 7. Raine A, Reynolds C, Lencz T, Scarpa A. Cognitive-perceptual, interpersonal and disorganized features of schizotypal personality. Schizophrenia bull. 1994;20:191-201.
  • Endereço para correspondência:
    Dr. Hélio Tonelli
    Av. Cândido de Abreu, 526 cj. 311-B
    Curitiba, PR
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      14 Abr 2009
    • Data do Fascículo
      2009
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