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APENDICITE EM PEDIATRIA: A IDADE É IMPORTANTE

RESUMO

Objetivo:

Investigar a influência da idade do paciente no diagnóstico e tratamento de apendicite, bem como avaliar a frequência de complicações dependendo da faixa etária.

Métodos:

Análise retrospectiva dos 1.736 pacientes pediátricos que foram submetidos à apendicectomia laparoscópica em nosso hospital de janeiro de 2000 a dezembro de 2013. Os pacientes foram divididos em grupos de acordo com sua idade: grupo A eram crianças, grupo B eram pré-escolares, grupo C eram maiores de cinco anos de idade e grupo D eram menores de cinco anos de idade. Considerou-se estatisticamente significante p-valor <0,05.

Resultados:

Encontramos maior incidência de diagnóstico incorreto e sintomas atípicos em pacientes mais novos. A taxa de perfuração foi semelhante entre os grupos A e B (p=0.17); foi maior, porém, no grupo D que no grupo C (p<0.0001). A incidência de complicações no pós-operatório também foi maior em pacientes mais novos (p=0.0002).

Conclusões:

A idade faz diferença em casos de apendicite aguda. Por causa da sua apresentação rara em crianças menores de cinco anos, é frequentemente diagnosticada incorretamente, o que aumenta a morbidade. Apesar de sua apresentação clínica variar entre lactentes e pré-escolares, não foram observadas diferenças estatisticamente significativas na proporção de apêndices perfurados nem na de complicações pós-operatórias.

Palavras-chave:
Apendicite; Criança; Laparoscopia

ABSTRACT

Objective:

To investigate the influence of patient age on the diagnosis and management of appendicitis, as well as to evaluate the rate of complications according to the age group.

Methods:

We undertook a retrospective analysis of 1,736 children who underwent laparoscopic appendectomy in our center between January 2000 and December 2013. Patients were divided in groups taken into account their age: group A were infants, group B were preschoolers, group C were those ones older than five years old, and group D were those ones younger than five years old. A p value of 0.05 was considered statistically significant.

Results:

We found higher incidence of misdiagnosis and atypical symptoms in the youngest patients. The rate of perforation was similar between group A and B (p=0.17). However, it was higher in group D than in group C (p<0.0001). The incidence of postoperative complications was higher in the youngest patients too (p=0.0002).

Conclusions:

The age does make a difference in acute appendicitis. Because of its unusual presentation in children younger than five years old, it is often misdiagnosed, which leads to an increased morbidity. Although clinical presentation varies between infants and preschoolers, no statistically significant differences were observed in the rate of perforated appendix or postoperative complications.

Keywords:
Appendicitis; Child; Laparoscopy

INTRODUÇÃO

A apendicite aguda é uma das causas cirúrgicas mais comuns de dor abdominal aguda em pacientes pediátricos. O pico de incidência é considerado entre a primeira e a segunda década de vida.11. Marzuillo P, Germani C, Krauss BS, Barbi E. Appendicitis in children less than five years old: A challenge for the general practitioner. World J Clin Pediatr. 2015;4:19-24. Embora raramente seja considerado em crianças com menos de cinco anos de idade, pode ocorrer mesmo em recém-nascidos. Casos pré-natais também já foram descritos.22. Rothrock SG, Pagane J. Acute appendicitis in children: emergency department diagnosis and management. Ann Emerg Med. 2000;36:39-51.

A apresentação clássica da apendicite é a ocorrência de dor periumbilical que migra para o quadrante inferior direito, seguida por febre baixa, náusea ou vômito. Em crianças, particularmente nos mais jovens, esses sintomas são infrequentes e ocorrem em menos de 50% dos pacientes.22. Rothrock SG, Pagane J. Acute appendicitis in children: emergency department diagnosis and management. Ann Emerg Med. 2000;36:39-51.,33. Alloo J, Gerstle T, Shilyansky J, Ein SH. Appendicitis in children less than 3 years of age: a 28-year review. Pediatr Surg Int. 2004;19:777-9. Por causa de suas características clínicas atípicas, o diagnóstico incorreto em crianças em idade pré-escolar varia de 19 a 57%, acarretando em um alto índice de complicações.22. Rothrock SG, Pagane J. Acute appendicitis in children: emergency department diagnosis and management. Ann Emerg Med. 2000;36:39-51.

Apesar das melhorias na qualidade do atendimento e do desenvolvimento de ferramentas de diagnóstico mais avançadas, a ruptura apendicular continua a ser uma ocorrência comum em crianças pequenas.44. Fields IA, Cole NM. Acute appendicitis in infants thirty-six months of age or younger. Ten year survey at the Los Angeles County Hospital. Am J Surg. 1967;113:269-75. É difícil obter um diagnóstico rápido e preciso em bebês, devido à comunicação limitada e à variabilidade no curso clínico.11. Marzuillo P, Germani C, Krauss BS, Barbi E. Appendicitis in children less than five years old: A challenge for the general practitioner. World J Clin Pediatr. 2015;4:19-24.,22. Rothrock SG, Pagane J. Acute appendicitis in children: emergency department diagnosis and management. Ann Emerg Med. 2000;36:39-51.,33. Alloo J, Gerstle T, Shilyansky J, Ein SH. Appendicitis in children less than 3 years of age: a 28-year review. Pediatr Surg Int. 2004;19:777-9.,44. Fields IA, Cole NM. Acute appendicitis in infants thirty-six months of age or younger. Ten year survey at the Los Angeles County Hospital. Am J Surg. 1967;113:269-75.

O objetivo deste estudo foi investigar a influência da idade do paciente no diagnóstico e tratamento da apendicite, bem como avaliar a frequência de complicações de acordo com a faixa etária.

MÉTODO

No período de 14 anos entre 2000 e 2013, 1.736 pacientes pediátricos com 15 anos de idade ou menos foram submetidos a apendicectomia laparoscópica devido a apendicite aguda em nosso hospital terciário. Apendicectomias incidentais, intervalares e negativas foram excluídas deste estudo. Uma análise retrospectiva foi realizada e os pacientes foram subsequentemente divididos em quatro grupos de acordo com a faixa etária: o grupo A eram crianças de 0 a 2 anos; o grupo B eram pré-escolares (3 a 5 anos); o grupo C eram maiores de cinco anos; e o grupo D eram os menores de cinco anos (grupo A + B). Para os fins desta revisão, os grupos foram comparados da seguinte forma: grupo A com grupo B, e grupo C com grupo D.

Dados demográficos, pré-operatórios, intraoperatórios e pós-operatórios foram coletados dos prontuários médicos dos pacientes. Os parâmetros pré-operatórios incluíram a duração dos sintomas, sinais e sintomas físicos na apresentação, diagnósticos incorretos prévios e achados ultrassonográficos. As variáveis intraoperatórias incluíram tempo cirúrgico, achados operatórios, técnicas laparoscópicas, complicações intraoperatórias e conversão para cirurgia aberta. Os dados pós-operatórios foram tempo de permanência (TDP), antibioticoterapia, terapia analgésica, início da ingestão oral e complicações pós-operatórias.

Considerou-se diagnóstico incorreto prévio se os pacientes tivessem se apresentado previamente a um médico e um diagnóstico alternativo foi indicado. Febre foi definida como qualquer temperatura superior a 38,0°C. O diâmetro do apêndice maior que 6 mm foi considerado patológico. Estagiários cirúrgicos sob supervisão direta de cirurgiões pediátricos operaram a maioria dos casos. A apendicectomia multiporta assistida por laparoscopia foi o tratamento padrão em nosso hospital. No entanto, a técnica cirúrgica foi escolhida de acordo com a preferência do cirurgião. Apendicite perfurada foi definida como um buraco macroscópico identificável no apêndice durante a cirurgia. Nos casos de apendicite complicada (apendicite gangrenosa e perfurada), foram administrados ertapenem ou antibióticos triplos intravenosos (ampicilina, gentamicina e metronidazol) por pelo menos 5 a 7 dias de pós-operatório. Nos casos de apendicite não complicada, os pacientes receberam pelo menos um dia de terapia com amoxicilina e ácido clavulânico por via intravenosa.

Como os dados não foram distribuídos normalmente, o teste não paramétrico foi usado para comparar os grupos. As variáveis contínuas foram analisadas pelo teste de Wilcoxon, enquanto as variáveis categóricas foram comparadas com o teste do qui-quadrado. Dados faltantes foram deixados de fora das análises. Todos os estudos estatísticos foram realizados utilizando o pacote de software Statistical Analysis System (SAS) 9. Resultados mostrando p inferior a 0,05 foram considerados significativos. O estudo foi aprovado pelo comitê de ética de nosso hospital.

RESULTADOS

No grupo A, havia um total de 50 pacientes (2,9%) com idade mediana de 1,72 anos (0-2 anos); 233 (13,4%) no grupo B com idade mediana de 3,9 anos (3-5 anos); 1.453 (83,7%) no grupo C com idade mediana de 9,92 anos (variação de 6 a 15 anos) e 283 no grupo D com idade mediana de 3,58 anos (variação de 0 a 5 anos). Não houve diferença na distribuição de gênero entre os grupos. No grupo A havia 32 meninos e 18 meninas, e 131 meninos e 102 meninas no grupo B (p=0,312). Por outro lado, havia 925 meninos e 528 meninas no grupo C, e 163 meninos e 120 meninas no grupo D (p=0,053).

Na primeira parte deste estudo, comparamos os parâmetros do grupo A com os do grupo B. Os sintomas pré-operatórios e os sinais físicos de ambos os grupos são apresentados na Tabela 1. Vômitos e febre foram os sintomas mais comuns em ambos os grupos. Não houve diferença estatisticamente significante nos vômitos, sintomas urinários e sintomas respiratórios. O sinal físico mais comum foi a dor abdominal em ambos os grupos. No entanto, diferentemente do grupo B, o grupo A desenvolveu dor abdominal difusa com maior frequência (p=0,001). Os pacientes do grupo A apresentaram a média de 2,68 dias após o início dos sintomas em comparação com 1,68 dias para aqueles do grupo B (p=0,01). As crianças procuraram atendimento médico prévio em oito casos (16%) no grupo A e em 37 casos (15,8%) no grupo B (p=0,97). Gastroenterite foi o diagnóstico incorreto mais comum em ambos os grupos (cinco casos no grupo A e 12 casos no grupo B, p=0,18). Os achados ultrassonográficos mostraram apêndice patológico em 39 casos (84,8%) do grupo A e em 185 casos (85,7%) do grupo B (p=0,12).

Tabela 1
Comparação dos sintomas e sinais entre os grupos A e B.

Foi encontrada apendicite perfurada em 11 pacientes (22,5%) no grupo A e em 47 pacientes (20,2%) no grupo B (p=0,17). A técnica preferida foi apendicectomia multiporta assistida por laparoscopia em ambos os grupos (p=0,77). Não houve diferença estatisticamente significante no tempo cirúrgico entre os grupos (grupo A: 55,9 min; e grupo B: 53,5 min, p=0,74). Complicações intraoperatórias ocorreram em três pacientes (6%) no grupo A e em 28 pacientes (12%) no grupo B (p=0,21). A taxa de conversão foi de 2% no grupo A e de 0,43% no grupo B (p=0,22).

As variáveis pós-operatórias são apresentadas na Tabela 2. A média de antibioticoterapia e analgesia, tempo de retomada da ingestão oral e tempo de internação foram estatisticamente maiores no grupo A. Não foram observadas diferenças significativas na taxa de abscesso intra-abdominal pós-operatório, infecção e obstrução intestinal entre os dois grupos. Nenhuma óbito ocorreu durante o período do estudo.

Tabela 2
Comparação das variáveis pós-operatórias entre os grupos A e B.

Na segunda parte do nosso estudo, fizemos uma comparação entre os grupos C e D. Os sintomas e os achados físicos de ambos os grupos são apresentados na Tabela 3. Vômitos, diarreia, febre e sintomas respiratórios foram significativamente maiores no grupo D. Dor abdominal difusa também foi observada com maior frequência no grupo D do que no grupo C (30,2 e 10,4%, respectivamente), bem como sensibilidade difusa (18,8 e 5,9%, respectivamente). Os pacientes do grupo C tiveram duração média dos sintomas de 1,14 dias, enquanto aqueles do grupo D tiveram duração média dos sintomas de 1,85 dias (p<0,001). Cento e trinta crianças (8,9%) do grupo C e 45 crianças (15,9%) do grupo D foram examinadas previamente sem diagnóstico correto (p=0,0003). Gastroenterite foi o diagnóstico incorreto mais comum em ambos os grupos (37 pacientes no grupo C e 17 pacientes no grupo D, p=0,001). Achados ultrassonográficos sugestivos de apendicite foram encontrados em 1.237 casos (89,1%) do grupo C e em 224 casos (85,5%) do grupo D (p=0,08).

Tabela 3
Comparação dos sintomas e sinais nos grupos C e D.

A taxa de perfuração do apêndice foi inversamente proporcional à idade do paciente, ocorrendo em 9,7% dos casos no grupo C e em 20,6% dos casos no grupo D (p<0,001). A técnica padrão foi empregada com maior frequência no grupo D (91 versus 88,7%, p=0,02) e o tempo cirúrgico foi maior no grupo C (58 versus 54 min, p=0,02). A taxa de complicações intra-operatórias e conversão também foi maior no grupo C, embora não significativamente (14,5 versus 11% e 1 versus 0,7%, p=0,11 e p=0,60, respectivamente).

Os resultados pós-operatórios e complicações foram resumidos na Tabela 4. A média de antibioticoterapia e terapia analgésica, início da ingestão oral e TDP foram estatisticamente maiores no grupo D. Abscesso intra-abdominal pós-operatório ocorreu em 6% dos pacientes no grupo C e em 12,7 % daqueles no grupo D (p<0,001). No entanto, as taxas de infecção da ferida e obstrução intestinal não foram afetadas pela idade. Não houve óbito nesses grupos.

Tabela 4
Comparação das variáveis pós-operatórias e complicações entre os grupos C e D.

DISCUSSÃO

Apendicite aguda é a principal causa de intervenções cirúrgicas abdominais em serviços de emergência em idade pediátrica e adulta.11. Marzuillo P, Germani C, Krauss BS, Barbi E. Appendicitis in children less than five years old: A challenge for the general practitioner. World J Clin Pediatr. 2015;4:19-24. Embora seja muito comum em crianças, é raro em bebês e ainda mais em neonatos.22. Rothrock SG, Pagane J. Acute appendicitis in children: emergency department diagnosis and management. Ann Emerg Med. 2000;36:39-51.,33. Alloo J, Gerstle T, Shilyansky J, Ein SH. Appendicitis in children less than 3 years of age: a 28-year review. Pediatr Surg Int. 2004;19:777-9.,44. Fields IA, Cole NM. Acute appendicitis in infants thirty-six months of age or younger. Ten year survey at the Los Angeles County Hospital. Am J Surg. 1967;113:269-75. Alguns autores atribuíram a baixa incidência nessa população à falta de tecido linfoide proeminente na infância.11. Marzuillo P, Germani C, Krauss BS, Barbi E. Appendicitis in children less than five years old: A challenge for the general practitioner. World J Clin Pediatr. 2015;4:19-24.,22. Rothrock SG, Pagane J. Acute appendicitis in children: emergency department diagnosis and management. Ann Emerg Med. 2000;36:39-51. As taxas de apendicite em nossa série foram de 2,9% em bebês/crianças e de 13,4% em pré-escolares, maiores do que as relatadas em outros estudos.55. Grosfeld JL, Weinberger M, Clatworthy HW Jr. Acute appendicitis in the first two years of life. J Pediatr Surg. 1973;8:285-93.,66. Bonadio W, Peloquin P, Brazg J, Scheinbach I, Saunders J, Okpalaji C, et al. Appendicitis in preschool aged children: Regression analysis of factors associated with perforation outcome. J Pediatr Surg. 2015;50:1569-73. Isto provavelmente se deve ao fato de nossa instituição ser um hospital de referência para cirurgia pediátrica.

É sabido que a inflamação se dá mais rapidamente no apêndice de pacientes mais jovens.77. Baglaj M, Rysiakiewicz J, Rysiakiewicz K. Acute appendicitis in children under 3 years of age. Diagnostic and therapeutic problems. Med Wieku Rozwoj. 2012;16:154-61.,88. Bansal S, Banever GT, Karrer FM, Partrick DA. Appendicitis in children less than 5 years old: influence of age on presentation and outcome. Am J Surg. 2012;204:1031-5.,99. Blair GL, Gaisford WD. Acute appendicitis in children under six years. J Pediatr Surg. 1969;4:445-51. Além disso, variações no desenvolvimento do apêndice de acordo com a idade do paciente poderiam explicar diferenças na progressão da doença. O apêndice de paredes finas e a função de barreira inadequada do omento em pacientes mais jovens podem levar a uma disseminação rápida da infecção.88. Bansal S, Banever GT, Karrer FM, Partrick DA. Appendicitis in children less than 5 years old: influence of age on presentation and outcome. Am J Surg. 2012;204:1031-5.,99. Blair GL, Gaisford WD. Acute appendicitis in children under six years. J Pediatr Surg. 1969;4:445-51. Além disso, bebês têm um pequeno lúmen apendicular. Portanto, a pressão crítica necessária para a perfuração é obtida mais cedo do que em adultos.99. Blair GL, Gaisford WD. Acute appendicitis in children under six years. J Pediatr Surg. 1969;4:445-51.

Um diagnóstico rápido e preciso em pacientes pediátricos não é simples. Crianças menores de dois anos não conseguem expressar bem quais são suas queixas e, consequentemente, seus cuidadores devem completar o histórico médico. Bebês não conseguem localizar a dor e frequentemente são pacientes não cooperativos, o que complica o exame físico.44. Fields IA, Cole NM. Acute appendicitis in infants thirty-six months of age or younger. Ten year survey at the Los Angeles County Hospital. Am J Surg. 1967;113:269-75.,99. Blair GL, Gaisford WD. Acute appendicitis in children under six years. J Pediatr Surg. 1969;4:445-51. Além disso, não é incomum a presença de sintomas que possam mimetizar doenças mais prevalentes nessa idade, como gastroenterites, infecções do trato urinário, patologia ginecológica, infecções do trato respiratório superior ou distúrbios do canal inguinal.22. Rothrock SG, Pagane J. Acute appendicitis in children: emergency department diagnosis and management. Ann Emerg Med. 2000;36:39-51.,55. Grosfeld JL, Weinberger M, Clatworthy HW Jr. Acute appendicitis in the first two years of life. J Pediatr Surg. 1973;8:285-93. Isto implica o risco de erros e atraso no diagnóstico. Muitas pesquisas destacaram a taxa elevada de diagnósticos inadequados nessa população.11. Marzuillo P, Germani C, Krauss BS, Barbi E. Appendicitis in children less than five years old: A challenge for the general practitioner. World J Clin Pediatr. 2015;4:19-24.,22. Rothrock SG, Pagane J. Acute appendicitis in children: emergency department diagnosis and management. Ann Emerg Med. 2000;36:39-51.,33. Alloo J, Gerstle T, Shilyansky J, Ein SH. Appendicitis in children less than 3 years of age: a 28-year review. Pediatr Surg Int. 2004;19:777-9.,55. Grosfeld JL, Weinberger M, Clatworthy HW Jr. Acute appendicitis in the first two years of life. J Pediatr Surg. 1973;8:285-93.,1010. Graham JM, Pokorny WJ, Harberg FJ. Acute appendicitis in preschool age children. Am J Surg. 1980;139:247-50. Em nossa série, observamos uma taxa menor de erros de diagnóstico (variação de 9,1-16,9%) em comparação com outras séries anteriores. No entanto, sentimos que ainda é muito alta, especialmente nos pacientes mais jovens. Como já demonstrado, a gastroenterite foi o diagnóstico incorreto mais comum.1010. Graham JM, Pokorny WJ, Harberg FJ. Acute appendicitis in preschool age children. Am J Surg. 1980;139:247-50. Verifica-se que atrasos no diagnóstico estão associados à idade do paciente.1010. Graham JM, Pokorny WJ, Harberg FJ. Acute appendicitis in preschool age children. Am J Surg. 1980;139:247-50.,1111. Sakellaris G, Tilemis S, Charissis G. Acute appendicitis in preschool-age children. Eur J Pediatr. 2005;164:80-3. Concordamos que quanto mais jovem o paciente, maior a duração média dos sintomas.

Ao comparar os sintomas de pacientes com apendicite entre diferentes grupos etários, observamos que diarreia e febre foram estatisticamente mais frequentes em bebês/crianças do que em pré-escolares. Da mesma forma, vômitos e sintomas respiratórios, bem como diarreia e febre, foram mais comuns em pacientes com menos de cinco anos do que os mais velhos. Esses resultados estão de acordo com outros estudos em que os autores enfatizam a presença de sintomas incomuns, como diarreia ou sintomas respiratórios, em pacientes mais jovens.1212. Daehlin L. Acute appendicitis during the first three years of life. Acta Chir Scand. 1982;148:291-4.,1313. Horwitz JR, Gursoy M, Jaksic T, Lally KP. Importance of diarrhea as a presenting symptom of appendicitis in very young children. Am J Sur. 1997;173:80-2.,1414. Cappendijk VC, Hazebroek FW. The impact of diagnostic delay on the course of acute appendicitis. Arch Dis Child. 2000;83:64-6. Crianças pequenas também têm uma taxa maior de dor e sensibilidade abdominal difusas.22. Rothrock SG, Pagane J. Acute appendicitis in children: emergency department diagnosis and management. Ann Emerg Med. 2000;36:39-51.,1515. Nance ML, Adamson WT, Hedrick HL. Appendicitis in the young child: a continuing diagnostic challenge. Pediatr Emerg Care. 2000;16:160-2.

Avanços na área da saúde têm melhorado os desfechos da apendicite. Uma queda significativa na mortalidade tem sido observada nas últimas décadas, especialmente em recém-nascidos.1616. Schwartz KL, Gilad E, Sigalet D, Yu W, Wong AL. Neonatal acute appendicitis: a proposed algorithm for timely diagnosis. J Pediatr Surg. 2011;46:2060-4.,1717. Jancelewicz T, Kim G, Miniati D. Neonatal appendicitis: a new look at an old zebra. J Pediatr Surg. 2008;43:e1-5. No entanto, a taxa de apendicite perfurada permaneceu quase inalterada. Perfuração apendicular em crianças menores de cinco anos pode ocorrer em mais da metade dos pacientes.1818. Stang RE, Flores F. Appendicitis in children under four years of age: review of 43 cases. Clin Proc Child Hosp Dist Columbia. 1963;19:72-81.,1919. Mallick MS. Appendicitis in pre-school children: a continuing clinical challenge. A retrospective study. Int J Surg. 2008;6:371-3. Em nosso estudo, a taxa de perfuração em crianças com menos de cinco anos de idade foi de 20,6%, o que está de acordo com a duração média dos sintomas e a taxa de diagnósticos incorretos nesses pacientes. Apendicite perfurada poderia explicar uma maior frequência de diarreia e sintomas respiratórios nesta população devido à peritonite poder produzir uma irritação do cólon e uma elevação diafragmática.22. Rothrock SG, Pagane J. Acute appendicitis in children: emergency department diagnosis and management. Ann Emerg Med. 2000;36:39-51.

A apendicectomia laparoscópica tem vantagens potenciais em comparação com a cirurgia aberta, e isso tem sido demonstrado em recém-nascidos.2020. Malakounides G, John M, Rex D, Mulhall J, Nandi B, Mukhtar Z. Laparoscopic surgery for acute neonatal appendicitis. Pediatr Surg Int. 2011;27:1245-8.,2121. Zwintscher NP, Johnson EK, Martin MJ, Newton CR. Laparoscopy utilization and outcomes for appendicitis in small children. J Pediatr Surg. 2013;48:1941-5. No entanto, os resultados pós-operatórios dependem não apenas de uma técnica cirúrgica meticulosa. O desenvolvimento de complicações está fortemente associado a atrasos no diagnóstico e, portanto, à idade do paciente.2222. Lee SL, Stark R, Yaghoubian A, Shekherdimian S, Kaji A. Does age affect the outcomes and management of pediatric appendicitis? J Pediatr Surg. 2011;46:2342-5. Os abscessos intra-abdominais são a principal complicação e estão associados ao aumento da morbidade.2323. Bech-Larsen SJ, Lalla M, Thorup JM. The influence of age, duration of symptoms and duration of operation on outcome after appendicitis in children. Dan Med J. 2013;60:A4678. Em nosso estudo, a incidência de abscesso intra-abdominal foi estatisticamente maior em pacientes com menos de cinco anos de idade. No entanto, essa diferença não existia entre bebês/crianças e pré-escolares. A duração da terapia com antibióticos e analgésicos, o início da ingestão oral e o TDP também foram maiores em pacientes com menos de cinco anos de idade, mas, nesse caso, esses parâmetros foram maiores em bebês/crianças pequenas em comparação aos pré-escolares. Com estes resultados, parece que a evolução pós-operatória depende tanto da idade, duração dos sintomas e diagnósticos incorretos quanto da taxa de perfuração do apêndice e peritonite generalizada.

Exames laboratoriais, como contagem absoluta de neutrófilos (ANC) e contagem de leucócitos, têm sido usados há muito tempo no diagnóstico de apendicite. No entanto, seu valor no processo de decisão clínica ainda permanece incerto. Nos últimos anos, diversos estudos foram realizados para avaliar a sensibilidade e especificidade desses biomarcadores.2424. Stefanutti G, Ghirardo V, Gamba P. Inflammatory markers for acute appendicitis in children: are they helpful? J Pediatr Surg. 2007;42:773-6.,2525. Bachur RG, Dayan PS, Dudley NC, Bajaj L, Stevenson MD, Macias CG, et al. The influence of age on the diagnostic performance of white blood cell count and absolute neutrophil count in suspected pediatric appendicitis. Acad Emerg Med. 2016;23:1235-42. Um estudo prospectivo multicêntrico demonstrou que o desempenho diagnóstico da contagem de leucócitos e do ANC melhora com o aumento da idade.2525. Bachur RG, Dayan PS, Dudley NC, Bajaj L, Stevenson MD, Macias CG, et al. The influence of age on the diagnostic performance of white blood cell count and absolute neutrophil count in suspected pediatric appendicitis. Acad Emerg Med. 2016;23:1235-42. Além disso, a ultrassonografia está se tornando cada vez mais popular no diagnóstico de apendicite, e sua acurácia diagnóstica geral é satisfatória.2626. Hendrickson MA, Wey AR, Gaillard PR, Kharbanda AB. Implementation of an electronic clinical decision support tool for pediatric appendicitis within a hospital network. Pediatr Emerg Care. 2018;34:10-6.,2727. Cundy TP, Gent R, Frauenfelder C, Lukic L, Linke RJ, Goh DW. Benchmarking the value of ultrasound for acute appendicitis in children. J Pediatr Surg. 2016;51:1939-43. Observamos que os achados ultrassonográficos sugestivos de apendicite não variam por idade. As taxas de diagnóstico incorreto podem ser melhoradas com a realização de ultrassonografia precoce em caso de suspeita de apendicite em crianças pequenas, independentemente do valor dos biomarcadores.

A interpretação dos resultados deste estudo é limitada por sua natureza não randomizada e retrospectiva. Uma das limitações do estudo é o fato de que os achados ultrassonográficos são dependentes do operador, assim como a exploração física. No entanto, encontramos algumas diferenças devido ao tamanho grande da amostra, que nos forneceu dados detalhados.

Em conclusão, a idade faz diferença na apendicite aguda. Por causa de sua apresentação incomum em crianças menores de cinco anos de idade, muitas vezes é diagnosticada incorretamente, o que leva a um aumento da morbidade. Embora a apresentação clínica varie entre crianças pequenas e pré-escolares, não foram observadas diferenças estatisticamente significativas na taxa de apêndice perfurado ou complicações pós-operatórias. Esforços futuros devem ser focados em minimizar os atrasos no diagnóstico para evitar a perfuração do apêndice e suas possíveis complicações. Um ultrassom precoce pode ser a chave para evitar erros de diagnóstico e para obter o diagnóstico preciso.

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Financiamento

  • Este estudo não recebeu financiamento.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Jun 2019
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2019

Histórico

  • Recebido
    24 Fev 2018
  • Aceito
    29 Abr 2018
  • Publicado
    04 Jun 2019
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