RESENHAS
A política na "Província Esquecida": partidos e eleições no Paraná1 1 Agradeço a leitura e as sugestões de Lucas Massimo Tonial Antunes e Luiz Domingos Costa.
André Barsch Ziegmann
O estado do Paraná tem a sexta população do país e é a quinta economia entre os estados (IBGE, 2008). Sua representação política é respeitável, contando com 30 deputados federais, além dos três senadores. Possui uma posição geopolítica crucial, pois faz divisa com países importantes - Argentina e Paraguai - para as relações internacionais brasileiras. Em seu território, está a maior hidrelétrica do mundo, a usina de Itaipu, e, em seu litoral, está o segundo maior porto do Brasil, o de Paranaguá. Apesar disso, suas lideranças não assumem um papel mais relevante no cenário político nacional. O senso comum apregoa que as causas seriam certa singularidade política e o conservadorismo dos paranaenses. Será?
A coletânea Partidos e eleições no Paraná: uma abordagem histórica, organizada por Adriano Codato e Fernando José dos Santos, traz uma série de dados que mostram que a "província esquecida" está politicamente mais ligada do que se imagina ao resto do país. O livro exclui a "tese" da singularidade, ao demonstrar que fenômenos típicos da política brasileira - como clientelismo, corrupção eleitoral, fisiologismo nas relações entre os poderes Executivo e Legislativo, populismo e partidos fracos dependentes de lideranças personalistas - são recorrentes no estado. Quanto ao conservadorismo, os ensaios mostram que as grandes transformações ocorridas no Brasil nas últimas décadas - da escalada parlamentar do Movimento Democrático Brasileiro (MDB) até a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva - foram acompanhadas pelos paranaenses. Entretanto, a coletânea não responde por que as lideranças do estado não assumem papel mais destacado na cena nacional, embora deixe claro que as causas não são singularidades nem um dado conservadorismo dos gentílicos.
O livro é composto de dez capítulos, que apresentam pesquisas sobre partidos e eleições no Paraná desde o pós-guerra.
O primeiro capítulo, "A semilegalidade consentida: o desempenho eleitoral do Partido Comunista no Paraná em meados do século XX", da autoria de Márcio Kieller, apresenta uma detalhada trajetória da participação dos políticos paranaenses comunistas nas eleições do período de 1946 a 1964. O autor esmiúça a atuação do Partido Comunista Brasileiro (PCB) em dois momentos históricos. O primeiro, da legalidade, que compreende o biênio 1945-1947, mostra que a organização engajou-se de modo amplo nos pleitos eleitorais da época. O segundo, da cassação, que se estende até o golpe de 1964, descreve a contribuição dos comunistas nas frentes partidárias e lutas sociais que se desenvolveram no estado.
Entretanto, a boa apresentação dos dados contrasta com a subutilização das hipóteses sobre as estratégias políticas escolhidas pelo partido. O autor relaciona as alianças eleitorais com o perfil sociopolítico dos dirigentes comunistas, mas faz isso de maneira breve. Menciona, apenas no final do texto, que a participação em eleições livres e multipartidárias tinha a intenção de estruturar a militância, o próprio partido e disputar as bases dos movimentos sindical e social e que as lutas no período da semiclandestinidade justificavam-se pela intenção de apresentar o PCB como alternativa revolucionária para a população. Kieller descreveu muito bem a atuação do "partidão", mas deveria ter dado mais ênfase às teses explicativas e subordinado evidências empíricas e relatos históricos às formulações hipotéticas2 2 Uma discussão sobre modelos de partido (DUVERGER, 1951; PANEBIANCO, 2005) enriqueceria o trabalho. Além disso, um relato da participação de outras organizações comunistas, que atuaram sob democracias liberais, poderia contribuir para o entendimento dos caminhos que o PCB trilhou. .
O segundo capítulo, intitulado "O voto integralista no Paraná: uma análise das eleições presidenciais de 1955", assinado por Amanda Litzinger Gomes, parte de duas questões intrigantes: por que o ex-líder integralista Plínio Salgado, então filiado a um inexpressivo partido, o Partido da Representação Popular (PRP), obteve votação tão significativa nas eleições presidenciais de 1955? O candidato, de orientação fascista, conquistou quase um quarto dos votos no Paraná, ficando atrás apenas de Adhemar de Barros3 3 Sobre o percentual de votos concedidos a Salgado, a autora usa fontes discrepantes, contudo, não há uma variação significativa que possa comprometer esse interessante problema de pesquisa. ; e por que o Estado apresentou um padrão de votação tão diferente das demais unidades federativas? As indagações ganham complexidade quando se descobre que o candidato a governador Moisés Lupion, da aliança PSD-PDC-PTN, teve, em Curitiba, percentuais de votação quase idênticos aos de Plínio Salgado. Contudo, não houve coligação formal nem informal4 4 Segundo a autora, Lupion rompeu com o candidato à presidência de seu partido, Juscelino Kubitschek. Porém, a pesquisadora não encontrou fontes que explicassem a causa da cisão ou comprovassem o apoio do candidato a governador ao ex-integralista. entre os dois. Para responder a esse intrincado problema de pesquisa, a autora lançou mão de cinco hipóteses5 5 As hipóteses são as seguintes: a insegurança dos paranaenses ante as transformações ocorridas no estado na década de 1950; o voto étnico, que enfatiza que os eleitores de Salgado foram os imigrantes italianos e alemães; e o voto ideológico, pois os eleitores votaram de acordo com as orientações fascistas do candidato. O que ocorreu no Paraná foi manifestação do populismo de direita, por isso a votação expressiva no concorrente do PRP, alcançada inclusive pela transferência de votos do candidato a governador Moisés Lupion para o ex-líder integralista. em sua investigação, porém, não as confrontou de modo mais direto com as fontes empíricas.
Mesmo com os dados, a descrição histórica e os estudos de casos - a propósito, uma combinação interessante -, Amanda Gomes refuta apenas a terceira tese de modo significativo, a qual sustenta que a votação foi fruto de uma identificação ideológica do eleitorado com a organização de Plínio Salgado6 6 O desempenho do partido de Plínio Salgado, o PRP, foi pífio nas eleições para as Câmaras de Vereadores. Isso mostra que, se houvesse uma identificação com o ideário da organização, os resultados nas eleições proporcionais teriam sido mais expressivos. . A pesquisadora não usa as evidências à sua disposição para descartar ou comprovar, de maneira mais clara, os elementos hipotéticos que formulou no início do texto, tampouco se aventura a formular uma explicação distintiva para o fenômeno. A quinta hipótese, que explicaria o desempenho do candidato do PRP pela transferência de capital político de Lupion, não seria uma tese em si, mas um fato. Caberia à autora reconstituir os enunciados no início do texto para abarcar essa evidência. O "casamento" das candidaturas Lupion e Salgado, por parte do eleitorado, deveria ser usado não apenas para testar as hipóteses, mas também para reformular, ampliar ou diminuir o leque de teses para a compreensão do fenômeno. As explicações lançadas para que se entendesse o desempenho do ex-integralista em 1955 no Paraná deveriam abarcar esse dado, levar em conta essa fonte. Os percentuais quase idênticos, em eleições distintas, de concorrentes que não se apoiaram formal ou informalmente deveriam ser tratados com mais cuidado, sendo objetos de formulações hipotéticas para sua explicação. Ou seja, por que isso aconteceu? O que explica tal relação? As votações de Lupion e Salgado cujos percentuais eram próximos não deveriam ser usadas, per se, como hipótese.
No terceiro capítulo, que traz o artigo "A votação do MDB no Paraná: uma análise histórica (1966-1978)", o autor Moacir Ribeiro de Carvalho Júnior faz uma ótima reconstituição da votação do MDB nas eleições de 1966 e 1978 nas cinco maiores cidades do Paraná7 7 Os municípios são Curitiba, Londrina, Ponta Grossa, Maringá e Cascavel. . O pesquisador procurou, ao longo do texto, articular os dados empíricos com o crescente processo de urbanização do estado. A principal hipótese do autor é que tal fenômeno demográfico contribuiu para a formação de uma postura crítica do eleitor diante da ditadura, o que redundou no acirramento da polarização política nos municípios em questão.
O significativo aumento do eleitorado nos pleitos que foram o objeto da análise de Carvalho Júnior denota o enorme crescimento da população nos centros urbanos que serviram de referência para o estudo. Com base nesse dado, o pesquisador faz um inteligente paralelo entre as votações do MDB e da Arena nas eleições de 1966 e 1978. O autor compara os resultados eleitorais do MDB paranaense com outras seções estaduais do partido, tornando evidente que a crescente inserção do partido oficial de oposição ao regime nas maiores cidades não era um fenômeno da singular política do estado. Entretanto, o texto não tratou profundamente da influência das ações do governo sobre o eleitorado. À medida que o MDB foi disputando eleições, a sigla foi sendo conhecida pela população e identificada como receptáculo das insatisfações do eleitorado com o regime militar. Portanto, comparar o desempenho da organização em eleições no ano de sua fundação com os resultados obtidos 12 anos mais tarde numa conjuntura que convergia para o MDB é muito difícil e torna a hipótese sobre urbanização menos relevante8 8 Também o autor poderia ter analisado mais eleições parlamentares entre os anos de 1966 e 1978. . Caso o autor seguisse a tese do voto retrospectivo9 9 Para tal teoria, o comportamento político depende da ativação de idéias e valores. Contudo, esses sentimentos podem sofrer modificações em decorrência de crises e ações do governo, levando à reestruturação das atitudes e a novos estímulos para a decisão do voto (Cervi apud FIORINA, 2002). , talvez concluísse que o denominador comum entre paranaenses e brasileiros fossem as percepções e análises da ditadura elaboradas pelo eleitorado.
No quarto capítulo, "A votação da Arena no Paraná: uma análise histórica (1966-1978)", Jorge Eduardo França Mosquera desenvolveu uma análise semelhante à apresentada no artigo sobre o MDB. Contudo, ao estudar a votação do partido de situação no regime militar nas eleições de 1966 e 1978, o autor demonstrou outra hipótese explicativa: a tese de que a Aliança Renovadora Nacional tinha bons resultados no interior e desempenho pífio na capital.
Assim como no trabalho sobre o MDB, o texto deveria ter enfatizado os reflexos, no eleitorado, de crises e ações do governo. A dicotomia capital versus interior mostra-se adequada, mas secundária, se pensarmos na decadência do regime ao longo dos anos, fruto das práticas autoritárias, da crise econômica pós-milagre e do desgaste que qualquer governo sofre. A transferência, pelo eleitor, de suas frustrações com a ditadura para a Arena refletiu-se indubitavelmente no MDB. A inversão dos votos nas eleições analisadas evidencia que a clivagem entre interior (conservador) e capital (progressista) não se realizou no ano de 1978, mas, sim, que a população identificava a Arena, após vários pleitos, com um regime que era, cada vez mais, alvo da insatisfação social, ou seja, como um partido da situação.
No quinto capítulo, o texto "Opção pelo populismo: dissidência política e renovação eleitoral no município de Ponta Grossa", da autoria de Emerson Urizzi Cervi, apresenta uma explicação para a troca do grupo hegemônico por uma oposição legal no âmbito municipal. O que está por trás dessa intenção é o interesse em investigar a relação entre as elites políticas e o eleitorado em disputas locais. Tendo como objeto o pleito para a Prefeitura de Ponta Grossa (PR) em 1996, o autor analisa a substituição de uma aliança conservadora, que dirigia o poder Executivo havia 14 anos, por outra com características completamente diferentes, liderada por um político carismático e populista.
A explicação de Emerson Cervi é exemplar. O autor analisou todas as eleições que ocorreram naquele município de 1982 a 2000 e interpretou a troca das elites como resultado de cisões na coalizão governante e expressão da insatisfação do eleitorado com a administração da cidade, que passava por um longo período de estagnação econômica. Essa conjuntura, portanto, foi perfeita para a ascensão de um líder populista. Porém, o pesquisador não apresenta uma discussão conceitual sobre o populismo, por essa razão, não se filiou a nenhuma corrente para explicar o fenômeno, embora pudesse ter recorrido ao conceito de neopopulismo. Esse fenômeno caracteriza-se pela persuasão das massas (e não pela repressão) por uma liderança carismática, sob a vigência de uma democracia (GOMEZ, 2001)10 10 Há outras duas teses sobre o fenômeno populista, uma de caráter estrutural, que se filia à teoria da modernização e atribui à população rural que migrou para a cidade - em um contexto de transição de uma economia tradicional e uma política com participação restrita para uma economia de mercado com uma política que permitia ampla participação - uma passividade e dependência do Estado que gerariam o populismo (FERREIRA, 2001). Outra explicação afirma que o objeto em discussão é uma conjugação entre repressão e manipulação política e atendimento de algumas demandas dos assalariados. Populismo seria, portanto, um estilo de governo e uma política de massas (WEFFORT, 1978). . Essas evidências estão presentes no objeto pesquisado por Cervi em seu ótimo trabalho.
O ensaio de Alessandro Cavassin Alves, "Clientelismo eleitoral e coronelismo político: estudo de um pequeno município", que corresponde ao sexto capítulo, traz uma interessante pesquisa sobre a política numa cidade com menos de 20 000 habitantes. Segundo o autor, a análise de eleições para prefeito e vereador na cidade de Itaperuçu (PR) revelou a formação de redes de apoio compostas de políticos que atuam nas três esferas - municipal, estadual e federal -, cuja intenção era tirar proveito do poder público, qualquer que fosse a instância (União, Estado ou município).
Esse texto conseguiu captar a essência da política em pequenos municípios. Inspirado no conceito desenvolvido por Vítor Nunes Leal em Coronelismo, enxada e voto: o município e o regime representativo no Brasil11 11 Segundo o autor, o coronelismo seria um compromisso entre o poder público e os chefes políticos locais para a troca de proveitos (Cavassin apud LEAL, 2006). , o autor comprova a existência de um compromisso coronelista numa teia de relações que vai do eleitor até parlamentares governistas estaduais e federais. Contudo, para Alessandro Cavassin, as obrigações com chefes políticos locais foram retiradas da dependência econômica trabalhador-latifundiário, que serviu de fundamento para o fenômeno coronelista na República Velha, e passaram para uma relação de dimensão ideológica (SAES, 1994), em que a dependência e a dominação pessoal são estabelecidas por uma obrigação moral do eleitor com o chefe político local. Um debate com o livro O ultrapresidencialismo estadual, de Fernando Abrúcio (1998), traria interessantes contribuições ao texto, pois o pesquisador poderia relacionar o funcionamento da política municipal tanto com as estratégias de governabilidade do poder Executivo paranaense quanto com o comportamento parlamentar dos deputados estaduais. Mas, apesar de esse diálogo não ter sido estabelecido, a excelência do ensaio não foi comprometida.
O capítulo 7, escrito por Luzia Maristela Cabreira Bonette, cujo título é "Geografia do voto de esquerda no Paraná: uma análise do desempenho eleitoral do PT nas eleições presidenciais (1989-2002)", traz uma investigação sobre os variados condicionantes do voto a Luiz Inácio Lula da Silva no Paraná. Analisando as propostas do Partido dos Trabalhadores (PT), passando pela cena política estadual e nacional, chegando até o nível de instrução dos eleitores, a autora argumenta não ser possível fundamentar uma tese geral para o voto no concorrente à Presidência, justamente porque as razões teriam mudado de eleição para eleição.
A autora discute o resultado de cada disputa presidencial desde 1989. Há, no ensaio, uma boa articulação entre os condicionantes de apoio a Lula, por cidade pesquisada e ano eleitoral. Luzia Maristela Bonette consegue entrelaçar fatores estruturais e conjunturais com as clivagens regionais de suporte ao candidato petista. Contudo, a pesquisadora deveria ter aprofundado a explicação para a adesão ou não ao político. A argumentação ficou sucinta demais, e ela poderia tentar ampliar o conjunto de razões para o fenômeno que se propôs a estudar. Apesar da pesquisadora ter salientado que o voto em Lula vai além da identificação partidária com o PT, ela deveria ter explorado melhor os dados que comprovam tal fenômeno, e deixado claro, desde o título, que apoio à organização não é o mesmo que suporte ao presidenciável12 12 O trabalho "Quem apóia o Presidente?", de Rachel Meneguello (2007), fornece apontamentos empíricos e conceituais sobre tal distinção. .
O texto "Corrupção eleitoral no Paraná - estudo de caso das eleições de 1996", da autoria de Fernando José dos Santos, traz um estudo detalhado do funcionamento da Justiça Eleitoral e do aparato legal para combater a corrupção. Usando uma ótima base de dados, o autor conclui que a estrutura da Justiça é insuficiente para combater os mais variados crimes contra a democracia.
Fernando José dos Santos pretendeu realizar um estudo de caso e fez um excelente trabalho, que resultou em um texto informativo e didático sobre fatos que são do interesse não apenas da comunidade acadêmica. Entretanto, o autor poderia ter explorado o arranjo institucional brasileiro13 13 Combinação entre presidencialismo e representação proporcional de lista aberta. como elemento que maximiza a corrupção eleitoral. E como ocorrem crimes contra a sofrida democracia brasileira. Tentar diminuí-los já seria uma grande justificativa para a reforma política, mesmo não existindo um modelo institucional perfeito.
O texto de Louise Ronconi de Nazareno, intitulado "Política local e a ocupação de cargos eletivos em Curitiba (1985-2000)", traz uma pesquisa sobre comportamento legislativo e formação de maiorias governistas na Câmara de Vereadores de Curitiba. O objetivo da autora foi evidenciar como práticas clientelistas, que norteiam o comportamento de boa parte dos agentes políticos, foram usadas para articular uma aliança parlamentar que deu suporte, de 1989 a 2005, a chefes do poder Executivo municipal, todos pertencentes ao mesmo grupo político.
O texto traz uma boa base de dados e a pesquisadora manteve, ao longo do trabalho, um excelente diálogo com a bibliografia relacionada. Mostrou, de maneira clara, como a construção do apoio legislativo ao governo transforma-se num ciclo vicioso, que extrapola os limites institucionais e reforça práticas reprováveis fora do parlamento. O clientelismo promiscui a formação de gabinetes, obstaculiza o fortalecimento dos partidos e mutila a própria democracia. A autora deixou claro que a formação de coalizões fisiológicas independe dos níveis de governo.
O décimo ensaio, "Institucionalização partidária: uma discussão empírica a partir do caso do PFL do Paraná", uma co-autoria de Adriano Codato e Emerson Urizzi Cervi, vem com uma discussão sobre as causas da não-institucionalização do Partido da Frente Liberal (PFL) no estado, mesmo após quase seis anos de mandato do Governador Jaime Lerner, que pertencia à legenda. O problema da pesquisa torna-se mais intrigante por tratar-se de uma organização que se destaca nacionalmente pela disciplina e pela coesão. Segundo os autores, mesmo após um significativo crescimento eleitoral do partido, não houve um correspondente fortalecimento da agremiação. A tese explicativa lançada pelos pesquisadores é de que não houve um controle do PFL sobre o poder Executivo estadual, quando aquele estava à frente deste, mas, sim, o contrário, um domínio do governo sobre a sigla.
O ensaio articula uma série de variáveis e dados empíricos que evidenciam que o PFL, mesmo ocupando a chefia do poder Executivo estadual e monopolizando as questões-chave do governo, pagou caro pela dependência que tinha da figura do governador. Comparando dados que versam sobre momentos distintos, os autores mostraram que a dinâmica de emergência e míngua da legenda estava intimamente ligada à adesão de Jaime Lerner ao partido. No entanto, faltou ao texto um debate com as tipologias de Maurice Duverger14 14 Desenvolvida no livro Os partidos políticos, de Duverger (1957). , que se baseou na origem dos partidos, e Ângelo Panebianco15 15 Desenvolvida no livro Modelos de partido: organização e poder nos partidos políticos, de Panebianco (2005). , que pautou sua classificação no ambiente onde está inserida a organização (papel dos fatores ambientais). Panebianco desenvolveu, ainda, uma interessante discussão sobre processos de institucionalização partidária, formulando tipos ideais para tal fenômeno16 16 Também exposta em Modelos de partido: organização e poder nos partidos políticos, o autor desenvolve os tipos ideais de institucionalização fraca e forte. A primeira refere-se a organizações com pouca autonomia em relação ao ambiente e baixo grau de sistematicidade, ou seja, pouca coerência estrutural interna. A segunda apresenta as características opostas. Então, Panebianco formula uma tipologia para os processos de institucionalização, sempre se orientando pelos condicionantes ambientais. A classificação é a seguinte: difusão territorial (fraca), penetração territorial (forte), legitimação interna (forte), legitimação externa nacional (fraca), legitimação externa extranacional (forte), carisma (ausente-forte). . A inclusão das contribuições desses autores poderia enriquecer o trabalho e dar outra dimensão à tese explicativa.
Mas o que concluir dessa série de textos?
Trabalho pioneiro. É a melhor maneira de definir a coletânea. Nunca a política paranaense tinha recebido um tratamento científico tão sistemático. O livro versa sobre objetos clássicos da Ciência Política, como partidos e eleições; traz investigações sobre fenômenos tão próprios do Brasil, como populismo, clientelismo e fisiologismo nas relações entre os poderes Executivo e Legislativo; apresenta problemas de pesquisa que deixariam qualquer analista interessado, como, por exemplo: por que o candidato Plínio Salgado teve um índice tão elevado de votos no Paraná em 1955? Ainda existe o coronelismo em pequenas cidades? Como um partido que esteve por seis anos à frente do poder Executivo estadual não se institucionalizou? Enfim, a ciência começa a desbravar essa "terra incógnita" que é a política paranaense e, em seu rastro, vai deixando para trás dogmas e o senso comum.
OUTRA FONTE
Recebida em 1º de março de 2008.
Aprovada em 11 de março de 2008.
André Barsch Ziegmann (abziegmann@gmail.com) é Bacharel e Licenciado em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e mestrando em Ciência Política pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
- ABRÚCIO, F. L. 1998. O ultrapresidencialismo estadual. In : ANDRADE, R. C. (org.). O processo de governo no município : uma análise a partir de SãoPaulo. São Paulo : USP.
- CAVASSIN, A. A. 2006. Clientelismo eleitoral e coronelismo político : estudo de um pequeno município. In : CODATO, A. & SANTOS, F. J. (orgs.). Partidos e eleições no Paraná : uma abordagem histórica. Curitiba : Tribunal Regional Eleitoral do Paraná
- CERVI, E. U. 2002. Comportamento eleitoral volátil e reeleição : as vitórias de Jaime Lerner no Paraná. Revista de Sociologia e Política, Curitiba, n. 19, p. 123-134, nov. Disponível em : http://ojs.c3sl.ufpr.br/ojs2/index.php/rsp/article/viewFile/3623/2880 Acesso em : 5.mar.2008.
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- FIORINA, M. P. 1981. Retrospective Voting in American National Elections New Haven : Yale University.
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- LEAL, V. N. 1997. Coronelismo, enxada e voto : o município e o regime representativo no Brasil. Rio de Janeiro : Nova Fronteira.
- MENEGUELLO, R. 2007. Who Supports the President? Paper presented at the XXVII LASA Congress, occurred at Montreal (Canada), between September 5th and 8th. Digit.
- PANEBIANCO, A. 2005. Modelos de partido : organização e poder nos partidos políticos. São Paulo : M. Fontes.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
04 Nov 2008 -
Data do Fascículo
Jun 2008