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Fatores de risco para mortalidade em idosos

Resumos

OBJETIVO: Os fatores de risco para as doenças e mortes prematuras são importantes para a elaboração de condutas preventivas. O objetivo do trabalho foi analisar os fatores de risco para óbito entre idosos. MÉTODOS: O estudo foi realizado no Município de São Paulo, em participantes do estudo SABE (Saúde, Bem-estar e Envelhecimento), em 2000. Foram entrevistados 2.143 indivíduos com 60 anos ou mais, utilizando-se o questionário padronizado do estudo SABE. A amostra foi obtida de setores censitários em dois estágios, com reposição e com probabilidade proporcional à população, com complementação da amostra de pessoas de 75 anos ou mais. Os dados finais foram ponderados para poderem ser expandidos. Entre os dois períodos de coleta de dados ocorreram 38 óbitos que compuseram a amostra do estudo. Para a análise dos dados, utilizou-se regressão logística, com nível de significância de 5%. RESULTADOS: Os fatores de risco encontrados foram: dificuldade de locomoção, idade avançada, gênero masculino, auto-avaliação de saúde como "má" e dificuldade para ir ao banheiro, OR=3,15; 2,93; 2,90; 2,69 e 2,51, respectivamente. CONCLUSÕES: Os resultados podem contribuir para a adoção de medidas preventivas para os idosos, visando à diminuição de desfechos fatais antecipados.

Saúde do idoso; Fatores de risco; Morbidade; Mortalidade; Estudos multicêntricos; SABE; Organização Pan-Americana da Saúde


OBJECTIVE: The risk factors for diseases and premature deaths are important in drawing up preventive measures. This study had the aim of analyzing the risk factors for death among elderly people. METHODS: This study was carried out among participants in the SABE (Health, Wellbeing and Aging) study, in the city of São Paulo in 2000. Interviews were conducted with 2,143 elderly people (60 years old or over), using a standardized questionnaire for the SABE study. The sample was obtained from census tracts, in two stages, with replacements and with probability proportional to the population, and with supplementation of the sample of people aged 75 years or over. The final data were weighted so that they could be expanded. Between the two data collection times, there were 38 deaths which comprised study sample. Logistic regression was utilized for the data analysis, with a significance level of 5%. RESULTS: The risk factors found were: locomotion difficulty, advanced age, male gender, self-assessment of health as "bad" and difficulty in going to the bathroom, OR=3.15; 2.93; 2.90; 2.69 and 2.51, respectively. CONCLUSIONS: The results may contribute towards the adoption of preventive measures for elderly people, with the aim of diminishing the expected number of fatal outcomes.

Aging health; Risk factors; Morbidity; Mortality; Multicenter studies; SABE; Pan American Health Organization


Fatores de risco para mortalidade em idosos

Flávia de O M MaiaI; Yeda A O DuarteII; Maria Lúcia LebrãoIII; Jair L F SantosIV

IHospital Universitário. Universidade de São Paulo (USP). São Paulo, SP, Brasil

IIDepartamento de Enfermagem Médico-Cirúrgica. Escola de Enfermagem. USP. São Paulo, SP, Brasil

IIIDepartamento de Epidemiologia. Faculdade de Saúde Pública. USP. São Paulo, SP, Brasil

IVDepartamento de Medicina Social. Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto. USP. Ribeirão Preto, SP, Brasil

Correspondência Correspondência: Flávia de O M Maia Hospital Universitário da Universidade de São Paulo Av. Professor Lineu Prestes, 2565 Cidade Universitária 05508-900 São Paulo, SP, Brasil E-mail: flaviamaia@hu.usp.br

RESUMO

OBJETIVO: Os fatores de risco para as doenças e mortes prematuras são importantes para a elaboração de condutas preventivas. O objetivo do trabalho foi analisar os fatores de risco para óbito entre idosos.

MÉTODOS: O estudo foi realizado no Município de São Paulo, em participantes do estudo SABE (Saúde, Bem-estar e Envelhecimento), em 2000. Foram entrevistados 2.143 indivíduos com 60 anos ou mais, utilizando-se o questionário padronizado do estudo SABE. A amostra foi obtida de setores censitários em dois estágios, com reposição e com probabilidade proporcional à população, com complementação da amostra de pessoas de 75 anos ou mais. Os dados finais foram ponderados para poderem ser expandidos. Entre os dois períodos de coleta de dados ocorreram 38 óbitos que compuseram a amostra do estudo. Para a análise dos dados, utilizou-se regressão logística, com nível de significância de 5%.

RESULTADOS: Os fatores de risco encontrados foram: dificuldade de locomoção, idade avançada, gênero masculino, auto-avaliação de saúde como "má" e dificuldade para ir ao banheiro, OR=3,15; 2,93; 2,90; 2,69 e 2,51, respectivamente.

CONCLUSÕES: Os resultados podem contribuir para a adoção de medidas preventivas para os idosos, visando à diminuição de desfechos fatais antecipados.

Descritores: Saúde do idoso. Fatores de risco. Morbidade. Mortalidade. Estudos multicêntricos. SABE. Organização Pan-Americana da Saúde.

INTRODUÇÃO

O envelhecimento é um desafio do mundo atual que afeta países ricos e pobres. Estima-se que cerca de um milhão de pessoas cruzam a barreira dos 60 anos de idade a cada mês, em todo o mundo. Possivelmente, no ano 2025, entre os 11 países com as maiores populações de idosos, oito situar-se-ão na categoria de países em desenvolvimento, evidenciando uma transposição das grandes populações idosas dos países desenvolvidos para países tidos como caracteristicamente jovens como a Nigéria, Brasil ou Paquistão.18,20

Na América Latina e no Caribe a maioria dos países encontra-se numa fase intermediária de transição demográfica. Para Palloni & Peláez,13 nesses países, essa transição caracteriza-se pela rapidez que, combinada com um contexto institucional instável e ambiente econômico desfavorável, gera condições que tornam o processo muito mais complexo que em outras áreas do mundo.

No Brasil, em 1940, os idosos eram 1,7 milhão e em 2000 atingiram os 14,5 milhões, um aumento de nove vezes. Estima-se que em 2020 alcancem os 30,9 milhões, colocando o País entre os sete com as maiores populações de idosos.5

Os grupos populacionais têm diferentes riscos de adoecerem, sofrerem acidentes ou morrerem. A presença de determinados fatores de risco indica uma probabilidade maior de aparecimento de danos à saúde. Uma vez identificados, esses fatores podem ser tratados ou modificados por ações de saúde, alterando eventos mórbidos ou fatais.

Fatores de risco podem ser definidos como condições que predispõem a um maior risco de desenvolver certo evento relacionado à saúde, após determinado tempo. Os fatores de risco passíveis de mudança e/ou tratamento são, portanto, de grande interesse e a promoção de medidas preventivas constitui aspecto central para a manutenção e recuperação da saúde do idoso.4,14

Com o envelhecimento, tem crescido também o interesse em estabelecer os fatores que, isolados ou em conjunto, melhor expliquem o risco que um idoso tem de morrer em curto prazo, adiando assim, um desfecho fatal precoce.17

A Organização Pan-Americana de Saúde coordenou um estudo multicêntrico, denominado Saúde, Bem-Estar e Envelhecimento (SABE), para traçar o perfil dos idosos na América Latina e Caribe. Participaram desse estudo Argentina, Barbados, Brasil, Chile, Cuba, México e Uruguai.1 No Brasil, o estudo foi composto pelos idosos residentes no Município de São Paulo no ano 2000.

Os fatores de risco para óbito entre idosos freqüentemente descritos pela literatura como imutáveis são a idade e o sexo. Dentre aqueles passíveis de serem alterados estão a hospitalização, a dependência para realização das atividades de vida diária, o déficit cognitivo, os hábitos de vida (como fumar e não praticar exercícios físicos), algumas doenças como a depressão e o câncer, o isolamento social e a falta de suporte familiar, o nível socioeconômico e a auto-avaliação negativa da saúde como um preditor de mortalidade.16,21

Dessa forma, o presente trabalho teve por objetivo verificar os fatores de risco para mortalidade entre idosos.

MÉTODOS

A população estudada foi composta pelos idosos residentes no Município de São Paulo, no ano 2000, como parte do estudo SABE realizado no Brasil. O estudo caracterizou-se como uma pesquisa transversal, exploratória, descritiva, com abordagem quantitativa.

A amostra foi composta por dois segmentos. O primeiro, resultante de sorteio, baseou-se em cadastro permanente de 72 setores censitários, disponível no Departamento de Epidemiologia da Faculdade de Saúde Pública da USP. Essa amostra foi tomada do cadastro da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD, 1995), composto por 263 setores censitários sorteados mediante amostragem por conglomerados, sob o critério de probabilidade proporcional ao número de domicílios. Esse segmento correspondeu à amostra probabilística formada por 1.568 entrevistados. O segundo segmento, composto por 575 residentes nos distritos em que se realizaram as entrevistas anteriores, corresponde ao acréscimo efetuado para compensar a mortalidade na população de maiores de 75 anos e completar o número desejado de entrevistas nesta faixa etária. O número mínimo de domicílios sorteados no segundo estágio foi aproximado para 90. A complementação da amostra de pessoas de 75 anos e mais foi realizada por meio da localização de moradias próximas aos setores selecionados ou, no máximo, dentro dos limites dos distritos aos quais pertenciam os setores sorteados, segundo o estudo SABE.11

Os dados foram colhidos simultaneamente, por meio de entrevistas domiciliares, feitas com um instrumento constituído por 11 blocos temáticos.* * Saúde, Bem-Estar e Envelhecimento. Estudo longitudinal sobre as condições de vida e de saúde dos idosos do Município de São Paulo. Disponível em http://www.fsp.usp.br/sabe [acesso em 10 out 2006] Foram captados numa primeira fase: dados pessoais; avaliação cognitiva; estado de saúde; estado funcional; medicamentos; uso e acesso aos serviços; rede de apoio familiar e social; história laboral e fontes de ingresso; e características da moradia. Na segunda fase, foram obtidos os dados sobre antropometria e testes de flexibilidade e mobilidade. Respeitou-se um intervalo máximo de seis meses entre as duas fases.11

Cada questionário teve um peso calculado de acordo com o setor censitário correspondente (peso=1/f). Para os questionários realizados com indivíduos em domicílios não sorteados (faixa etária 75 anos e mais), o cálculo do peso foi realizado de acordo com a relação da população de idosos nessa faixa etária, residente no Município de São Paulo em 1998, e o número total de idosos dessa faixa encontrado na amostra final do estudo.11 A descrição detalhada da metodologia empregada pode ser encontrada em Lebrão & Duarte.10

Os sujeitos da pesquisa foram 38 idosos residentes no Município de São Paulo, que morreram entre as duas fases de coleta de dados.

Para a análise dos fatores de risco para óbito, foram extraídas do questionário as variáveis pertinentes, agrupadas em seis blocos temáticos: informações pessoais, doenças referidas, assistência à saúde, estado de saúde, condições de saúde e atividades de vida diária.

Cada variável foi agrupada em duas classes: zero (0), como classe de referência e um (1) para o contraste (Tabela 1). Para tanto, as informações correspondentes a "não sabe" e "não responde" e as informações não preenchidas (missing values) foram desconsideradas.

Utilizou-se a regressão por passos (stepwise),7 pois se desejava hierarquizar a relevância de cada variável para a explicação do modelo na presença das demais. O nível de significância foi fixado em 5%, tanto para a inclusão de cada variável no modelo, como para o cálculo dos intervalos de confiança das razões de odds.

Para cada bloco, foi aplicada uma regressão logística com a variável-resposta óbito, possibilitando a análise da importância das variáveis de cada bloco. Com as variáveis significativas de cada um, foi constituído o modelo geral e verificada a importância relativa à variável resposta.

RESULTADOS

A Tabela 2 mostra as variáveis que apresentaram significância estatística em cada bloco temático. No bloco "informações pessoais", as variáveis idade e sexo foram as mais importantes. Ter idade igual ou superior a 75 anos representa um risco de óbito aproximadamente quatro vezes maior em relação aos idosos com idades entre 60 e 74 anos. O sexo masculino implica possibilidade de morrer 2,7 vezes maior que o feminino.

No bloco temático "assistência à saúde", nenhuma das variáveis analisadas apresentou significância estatística. Assim, ter ou não sido atendido pelo sistema de saúde nos últimos quatro meses, por exemplo, parece não ter influenciado na ocorrência do evento fatal.

No bloco sobre "doenças referidas" estão as principais doenças e agravos que acometem os idosos. Dentre eles, a doença cardíaca mostrou-se a mais importante, aumentando o risco de óbito em 2,7 vezes.

O agrupamento "estado de saúde" contém os sintomas informados pelos idosos e, apenas "tosse persistente, catarro ou chiado no peito" mostrou-se estatisticamente significante na análise, aumentando o risco de óbito em 3,2 vezes em relação aos que não apresentavam tais sintomas.

No bloco "condição de saúde", a variável saúde referida como "má" mostrou-se 4,5 vezes mais significante que a variável saúde referida como "boa". As variáveis fumar, beber e não realizar atividade física, bem como as alterações cognitivas, não apresentaram resultados estatisticamente significantes para o risco de óbito.

No agrupamento "atividades de vida diária", as atividades que apresentaram significância estatística foram as relacionadas ao desempenho de atividades de auto-cuidado e, portanto, relacionadas aos idosos com maior grau de dependência. Dentre essas, as dificuldades para ir ao banheiro, para se alimentar e para atravessar um quarto caminhando, nessa ordem, aumentaram em 5,4; 3,3 e 2,8 vezes a possibilidade de o idoso morrer.

A dificuldade para ir ao banheiro, muitas vezes negligenciada nas avaliações dos idosos, mostrou-se uma informação muito importante, pois foi a que apresentou maior razão de risco em relação à ocorrência de um evento fatal. Os idosos com "dificuldade para deitar ou levantar de uma cama" apresentaram correlação negativa (0,24).

Na Tabela 3 estão descritas as variáveis dos blocos temáticos que, após terem sido submetidas novamente ao modelo de análise, mantiveram resultado significativo.

Na aplicação do modelo de regressão por meio da análise multivariável, observou-se que os principais fatores de risco de óbito entre idosos foram, em ordem decrescente: dificuldade de locomoção, idade igual ou superior a 75 anos, sexo masculino, saúde auto-referida como "má" e dificuldade para ir ao banheiro.

DISCUSSÃO

Dentre os fatores de risco analisados, a idade é considerada o melhor indicador de risco de morrer, pois a probabilidade de adquirir alguma doença crônica ou incapacidade aumenta com a idade.16,21 Como também diminuem, progressivamente, a capacidade e as reservas funcionais, aumentando a suscetibilidade aos problemas de saúde e, conseqüentemente, a possibilidade de morte. As taxas de mortalidade entre idosos brasileiros aumentam em ambos os sexos com a idade. Aumenta, também, a dependência para a realização das atividades básicas da vida diária (alimentação, higiene, transferência, vestir-se e controle de esfíncteres) e o relato de presença de condições crônicas, tais como hipertensão, diabetes, doenças ósteo-articulares entre outras. Segundo dados do presente trabalho ter idade igual ou superior a 75 anos representa um risco maior de morrer. Essa característica é compartilhada entre outros países desenvolvidos, nos quais a cada cinco anos acrescidos à idade, aumenta em 50% o risco de morte.4,16,21

O sexo também é apontado como um fator de risco para morte entre idosos, sendo os homens mais suscetíveis que as mulheres. Essa diferença na mortalidade entre homens e mulheres ocorre por vários fatores que, isolados ou associados, fazem com que as mulheres vivam mais que os homens. A diminuição da mortalidade por causas maternas foi um fator que contribuiu para essa diferença. É uma característica feminina a procura por serviços de saúde, mais do que os homens, o que facilita o diagnóstico e o tratamento precoce das doenças. Existem, também, as diferenças biológicas consideradas como protetoras para a mulher, como por exemplo, o hormônio feminino, durante a idade fértil, em relação a eventos cardiocirculatórios. O ambiente doméstico, onde tradicionalmente permaneciam as mulheres, poderia ser considerado seguro, quando confrontado com aqueles a que os homens eram expostos. Os riscos ambientais e ocupacionais, como acidentes de trabalho, de trânsito e homicídios e o estresse associado às mudanças socioeconômicas contribuíram para a maior mortalidade entre os homens idosos. O hábito de fumar e o consumo de álcool, que aumentam o risco para inúmeras doenças, foi maior entre os homens que entre as mulheres da população idosa estudada. No entanto, essa relação pode se igualar ou ser invertida no futuro, devido às mudanças nos hábitos e comportamentos femininos.3,6

Dentre as doenças referidas, o conjunto das doenças do aparelho circulatório representou risco significativamente maior de morrer, o que corresponde à principal causa de óbito em idosos, segundo as estatísticas nacionais.** ** Ministério da Saúde, Datasus. Indicadores e dados básicos - Brasil, 2005 (IDB-2005). Disponível em http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/idb2005/matriz.htm [acesso em 11 out 2006] Tendo em vista que a cardiopatia coronariana é a principal causa de morte em vários países entre as doenças cardiovasculares e diante de sua importância entre idosos, a Organização Mundial da Saúde traçou estratégias preventivas e de estabilização das condições clínicas, com o intuito de evitar agravos, incapacidades e morte decorrentes dessas doenças.12

A hospitalização é considerada fator de risco para óbito entre idosos por provocar condições de agravo à saúde como infecções, isolamento social, iatrogenias, entre outras, que podem proporcionar perda de independência e autonomia, muitas vezes, levando-os à morte.15 Apesar disso, na presente análise, a hospitalização não se mostrou significante. Idosos hospitalizados apresentam um declínio físico progressivo e, após a alta hospitalar, nem sempre conseguem recuperar o seu desempenho funcional anterior, o que resulta em altas taxas de mortalidade após a hospitalização.15 Para Ponzetto et al,15 o prejuízo na capacidade funcional é um prognóstico mais confiável para mortalidade em idosos do que os diagnósticos realizados durante a hospitalização.

Esse fato foi corroborado por este estudo, onde as atividades básicas de vida diária apresentaram razões de odds significativas para ocorrência de óbito. A dependência para essas atividades é considerada um fator de risco para óbito entre idosos pelo fato de necessitarem de ajuda indispensável para a realização de atos elementares da vida. Sem uma estrutura adequada para atender às suas necessidades, o idoso dependente pode ser considerado em situação de risco para agravos à saúde e morte.

O prejuízo no desempenho cognitivo pode alterar a capacidade funcional e comprometer outros domínios, como o físico e o social. A deterioração do idoso, seja pela demência ou depressão, leva à perda da autonomia e da independência. O déficit cognitivo moderado a grave está associado a um maior risco para óbito entre idosos, mesmo quando controladas as condições demográficas e comorbidades crônicas.18 No entanto, essa relação não pôde ser percebida no presente estudo.

A auto-avaliação de saúde, em resposta à questão "Como o Sr(a) avalia a sua saúde?" tem sido amplamente utilizada em pesquisas com populações idosas. Apesar de ser uma avaliação subjetiva, tem mostrado resultados semelhantes aos de avaliações objetivas de condições de saúde.2,8 Além de ser uma informação facilmente obtida, pois depende apenas da opinião do idoso sobre sua própria saúde, mostrou-se muito importante, pois, quando considerada como sendo má, aumentou consideravelmente a possibilidade de o idoso morrer.

Em levantamento bibliográfico, Benyamini & Idler2 e Idler & Benyamini,8 mostraram que na maioria das pesquisas realizadas desde a década de 80, os idosos que auto-referiram saúde ruim apresentaram maior incidência de óbitos do aqueles que a consideraram excelente.

Entre os idosos a auto-avaliação da saúde pode apresentar maior sensibilidade para homens do que para mulheres. Como as mulheres vivem mais do que os homens e experimentam mais anos com doenças e incapacidades, tendem a avaliar mais negativamente a sua saúde, mas não necessariamente morrerão em função disso, em um curto período de tempo. Assim, a auto-avaliação negativa da saúde feita pelas mulheres, pode estar mais associada com a qualidade de vida. Os homens, no entanto, quando avaliam sua saúde de forma negativa, apresentam risco maior de serem acometidos por um evento fatal.9

Doenças relacionadas ao aparelho respiratório representam a segunda maior causa de internações hospitalares e a terceira causa de óbito no Brasil. O resultado encontrado no presente trabalho reforça a necessidade de haver acompanhamento dos idosos com quadros respiratórios crônicos, bem como do incremento de serviços de prevenção que atuem na vacinação desse grupo etário e de seus principais comunicantes contra gripe e pneumonia, além do monitoramento dos vírus circulantes, para contribuir na melhoria da composição da vacina oferecida à população.

Fumar, beber e não realizar atividade física estão mais associados ao risco de desenvolvimento das doenças, como por exemplo as cardiovasculares, do que diretamente com ao risco de morte.

A correlação negativa entre idosos acamados e óbitos leva a inferir que a dependência exige maior atenção, o que parece agir como fator de proteção contra a ocorrência de eventos fatais. Por outro lado, os medianamente dependentes, ou seja, com dificuldade de locomoção e transferência, apresentaram maior risco de óbito. Os resultados ora apresentados indicam a necessidade de maior reflexão na priorização assistencial e reorganização dos serviços.

As variáveis indicadas pelo modelo utilizado poderão auxiliar na construção de um instrumento de avaliação de risco para óbito, contribuindo para a prevenção de eventos fatais.

Os idosos que apresentam maior risco de óbito devem merecer atenção diferenciada dos órgãos responsáveis pela organização de serviços destinados a essa população e a seus familiares, o que resultará na diminuição da mortalidade prematura dos idosos.

Não se pretende, com isso, que a vida seja prolongada a qualquer custo. Ao contrário, a idéia é evitar mortes associadas à não-assistência, à falta de estrutura e recursos em uma sociedade que está envelhecendo rapidamente e, onde, muitas vezes, o idoso não tem suas necessidades atendidas adequadamente, o que aumenta a possibilidade de agravos à saúde, incapacidades, comprometimento da qualidade de vida e morte.

Recebido: 20/9/2005

Revisado: 27/4/2006

Aprovado: 12/7/2006

Baseado na dissertação de mestrado de FOM Maia apresentada à Escola de Enfermagem da USP, em 2005.

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  • Correspondência:
    Flávia de O M Maia
    Hospital Universitário da Universidade de São Paulo
    Av. Professor Lineu Prestes, 2565 Cidade Universitária
    05508-900 São Paulo, SP, Brasil
    E-mail:
  • *
    Saúde, Bem-Estar e Envelhecimento. Estudo longitudinal sobre as condições de vida e de saúde dos idosos do Município de São Paulo. Disponível em
    http://www.fsp.usp.br/sabe [acesso em 10 out 2006]
  • **
    Ministério da Saúde, Datasus. Indicadores e dados básicos - Brasil, 2005 (IDB-2005). Disponível em
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      27 Out 2006
    • Data do Fascículo
      Dez 2006

    Histórico

    • Aceito
      12 Jul 2006
    • Revisado
      27 Abr 2006
    • Recebido
      20 Set 2005
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