Accessibility / Report Error

CARACTERIZAÇÃO MORFOLÓGICA E PEDOLÓGICA DE UMA DEPRESSÃO (SERRA-ES-BRASIL)

Morphological and pedologic characterization of a depression (Serra-ES-Brazil)

RESUMO

Este estudo tem como objetivo principal caracterizar a cobertura e morfologia dos solos de uma depressão e levantar hipóteses de sua origem. A base metodológica utilizada foi a Análise Estrutural da Cobertura Pedológica integrando o reconhecimento da cobertura pedológica a partir de 4 (quatro) etapas: i) Levantamento topográfico; ii) Tradagens; iii) Elaboração de toposequência e; iv) Abertura de trincheira. Com base no reconhecimento da cobertura pedológica realizado e na elaboração de um mapa de formas de relevo da área, a partir de técnicas de fotointerpretação em fotografia aérea, foi possível identificar a existência de pequenas áreas deprimidas alinhadas no fundo da depressão. A toposequência elaborada mostrou que a cobertura pedológica apresenta oito (8) horizontes de solo e um desnível de aproximadamente 9 m do topo da vertente até o início da depressão. O avanço do horizonte gley e a intercalação de áreas deprimidas com áreas mais elevadas, desde a depressão, seguindo a montante na vertente, pode ser indício de uma evolução remontante (de jusante para montante) da depressão. A origem da depressão pode estar relacionada à perda de material por dissolução geoquímica. Foi possível estabelecer 6 (seis) estágios de evolução da depressão.

Palavras-chave:
Solos; Depressão; Análise Estrutural da Cobertura Pedológica; Dissolução geoquímica

ABSTRACT

This study aims to characterize the morphology of the soil cover and a depression and hypotheses of its origin. The methodological basis was a Structural Coverage Analysis Pedologic integrating the recognition of soil cover from four (4) steps: i) topographic survey; ii) auger; iii) elaboration of toposequency; iv) opening trench. Based on the recognition of realized and pedological cover the preparation of a map of landforms in the area, from photointerpretation techniques in aerial photography, it was possible to identify the existence of small depressed areas aligned in the bottom of the depression. The elaborate toposequency showed that soil cover features eight (8) soil horizons and a vertical drop of approximately 9 m from the top of the slope to the onset of depression. The advancement of gley horizon and merge depressed areas with higher elevations, from depression, following upstream in shed may be a sign of a remontant evolution (from downstream to upstream) of depression. The origin of depression may be related to loss of material due to geochemical dissolution. It was possible to establish six (6) stages of evolution of depression.

Keywords:
Soil; Depression; Structural Analysis Coverage Pedologic; Geochemical Dissolution

INTRODUÇÃO

O presente artigo trata-se de uma pesquisa de Geografia Física, de cientificidade bipartite – geomorfologia e pedologia – na linha de estudo da evolução geomorfológica, com ênfase no estudo dos materiais, representado pelos solos, a partir da aplicação do procedimento da Análise Estrutural da Cobertura Pedológica, em uma depressão localizada no topo de uma colina do embasamento pré-cambriano na borda do maciço Mestre Álvaro, município de Serra (ES), sudeste do Brasil.

A pesquisa teve como objetivo geral caracterizar a cobertura e morfologia dos solos da depressão e levantar hipóteses de sua origem a partir da abordagem Análise Estrutural da Cobertura Pedológica (BOULET, 1988BOULET, R. Análise estrutural da cobertura pedológica e cartografia. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIA DO SOLO, 21, 1988 Campinas. A responsabilidade social da ciência do solo. Campinas: SBPC, 1988, p.79-90.; BARROS, 1985BARROS, O.N.F. Análise estrutural e cartografia detalhada de solos em Marília, Estado de São Paulo: ensaio metodológico. 1985.146f. Dissertação (Mestrado em Geografia Física) – Programa de Pós-Graduação em Geografia Física, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, São Paulo, 1985.; QUEIROZ NETO, 2001QUEIROZ NETO, José Pereira de. O estudo de formações superficiais no Brasil. Revista do Instituto Geológico, São Paulo, v. 22, n. 1/2 p. 65-78, 2001. DOI: http:dx.doi. org/10.7154/RDG.1984.0003.0006
http:dx.doi. org/10.7154/RDG.1984.0003.0...
; BRICALLI, 2006BRICALLI, L. L. Evolução de uma depressão em embasamento cristalino e sua relação com os aspectos geológico-geomorfológicos regionais (Serra-ES).2006. 142f. Dissertação (Mestrado em Geografia Física) – Programa de Pós-Graduação em Geografia Física, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2006.).

A sistematização da ciência geomorfológica nasce com Davis (1899)DAVIS, W. M. The Geographical Cycle. Geogr. Journ. London, v. 14, n. 5, p. 481-504, 1899., que dando prosseguimento aos estudos de Gilbert (1877)GILBERT, G. K. The Geology of the Henri Mountains. Washington: United States Geographical and Geological Survey. 1877., estabelece uma interpretação dinâmica da evolução geral do relevo (Ciclo Geográfico) enfatizando a importância geológica na morfogênese. As ideias de Davis foram contestadas por Penck (1924)PENCK, W. Die morphologische analyse. Ein kapitel der physikalischen geologie. J. Engelhorn's Nachf. Stuttgart, 1924., que valorizou o estudo dos efeitos processuais. Num segundo momento a evolução dos estudos seguem tendências fundamentadas na Teoria Geral dos Sistemas e no processo de quantificação. Onde destaca-se os trabalhos de King (1953)KING, L. C. Canons of Landscape Evolution. Bull. Geolog. Society of America, Washington, v. 64, n. 7, p. 721-732, 1953., que estabelece proximidade ao conceito de estabilidade tectônica considerado por Davis e utilizando o modelo de recuo paralelo das vertentes, proposto por Penck (1924)PENCK, W. Die morphologische analyse. Ein kapitel der physikalischen geologie. J. Engelhorn's Nachf. Stuttgart, 1924.. E posteriormente Hack (1960)HACK, J.T. Interpretation of Erosional Topography in Humid-Temperate Regions. Amer. Journ. Sci, New Haven, Conn. v. 258-A, p. 80-97, 1960., com um enfoque acíclico do conceito de equilíbrio dinâmico e considerando o modelado como produto de uma competição entre a resistência dos materiais crustais e o potencial das forças de denudação (CASSETI, 2001CASSETI, V. Elementos de Geomorfologia. Goiânia: Editora da UFG, 2001.).

No Brasil, esses trabalhos tiveram grande influência, onde podemos reconhecer esse fato a partir do trabalho de Ab'saber (1969)AB’ SABER, A. N. Um conceito de geomorfologia a serviço das pesquisas sobre o Quaternário. Geomorfologia, São Paulo, n. 18, p.1-23, 1969. que estabelece três níveis sobre a pesquisa geomorfológica proposta na tríade dialética forma-estrutura-processos.

Durante muito tempo a geomorfologia enfatizou seus trabalhos no estudo do clima. Atualmente observa-se uma ênfase no estudo dos processos, onde estes seriam comandados por forças endógenas e exógenas (GUERRA, 2001GUERRA, A. T. Dicionário Geológico-Geomorfológico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001.).

Atualmente, principalmente no Brasil, a ênfase é dada para o estudo dos processos (GUERRA, 2001GUERRA, A. T. Dicionário Geológico-Geomorfológico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001.) para explicar a gênese das formas e poucas são as pesquisas que sugerem o estudo dos materiais (solo e rocha) – que estruturam o relevo – em geomorfologia.

Solo é uma “…massa de elementos agregados, geralmente friáveis, que encontra-se na superfície da parte emersa da crosta terrestre, resultante das ações da atmosfera e biosfera sobre a litosfera, durante um tempo determinado”, definição essa citada por Aubert na introdução do curso de Pedologia na ORSTOM e citado por Queiroz Neto (1984)QUEIROZ NETO, J. P. Pedologia: conceito, método e aplicações. REVISTA DO DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA, São Paulo, n. 3, p. 95-102, 1984..

A pedologia tornou-se ciência autônoma a partir dos trabalhos realizados na Ucrânia (Rússia) pelo geólogo e geoquímico Dokuchaiev entre 1887 e 1880 (AUBERT e BOULAINE, 1967AUBERT, G; BOULAINE, J. La Pédologie. Paris: Presses Universitaires de France e Boulevard Saint-Germain, 1967.) e que a partir desses estudos surge a primeira classificação de solos baseada na “Lei da zonalidade”.

Ao longo desses anos a evolução da pedologia passou por diversas correntes de pensamento.

Na década de 60 percebe-se que estes estudos evidenciavam somente a concepção de verticalidade dos fenômenos de alteração entre substrato rochoso e perfil de solo que segundo Barros (1985)BARROS, O.N.F. Análise estrutural e cartografia detalhada de solos em Marília, Estado de São Paulo: ensaio metodológico. 1985.146f. Dissertação (Mestrado em Geografia Física) – Programa de Pós-Graduação em Geografia Física, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, São Paulo, 1985. fora observado por Milne (1936)MILNE, G. (1936) Normal erosion as a factor in soil profile development. Nature, n. 26, p.548-549. e por Queiroz Neto (1976)QUEIROZ NETO, J. P. Tendências Atuais das Pesquisas de Solos No Estado de São Paulo. BOLETIM PAULISTA DE GEOGRAFIA, n. 50, p. 37-56, 1976..

Na década de 70 – no Brasil – há uma preocupação com a interpretação dos perfis de solos em ações de erosão e deposição, variadas no tempo e no espaço (QUEIROZ NETO et al, 1973QUEIROZ NETO, J.P.: CARVALHO, A.; JOURNAUX, A. & PELLERIN, J. – –1973 – Cronologia da alteração dos solos da região de Man1ia, SP – USP/ IGEOG, Sedimentologia e Pedologia 5,52 p.; PENTEADO & RANZANI, 1973PENTEADO, M.M. & RANZANI, G. Relatório de viagem do médio vale do Rio São Francisco. Geomorfologia, São Paulo, 40:1-44, 1973.; QUEIROZ NETO, 1976QUEIROZ NETO, J. P. Tendências Atuais das Pesquisas de Solos No Estado de São Paulo. BOLETIM PAULISTA DE GEOGRAFIA, n. 50, p. 37-56, 1976.; CARVALHO, 1976CARVALHO, A. Solos da região de Marilia: relações entre a pedogênese e a evolução do relevo. USP, Dep. Geogr., tese de doutoramento, 163 p.1976.). Começa-se a perceber também a preocupação na interpretação do solo como processos geomorfológicos.

No exterior, na década de 60 observam-se enfoques diferenciados: Pedólogos da ORSTOM em estudos sobre as transformações pedogenéticas de forma contínua no espaço e no tempo que tiveram como ponto de partida o trabalho de Milne (1935 e 1936) em sua concepção de catena; Delvigne (1965)DELVIGNE, J. (1965) Pédogenèse en zone tropicale: la formation des minéraux secondaires en milieu ferralitique. Mém. ORSTOM, v. 13, 117 p.: estudo do solo para entender a redistribuição de elementos ao longo das vertentes. Em 70, seguem os seguintes estudos: Ruellan (1970)RUELLAN, A. Contribution à la Connaissance des Sols des Régions Mediterranéennes: les sols a profil calcarie différencié des Plaines de la Basse Moulouya (Maroc Oriental), n'enregistrement au CNRS -A. 04086. 1970. 428 p.: descrição das características pedológicas e dados laboratoriais, movimentos laterais de partículas e de soluções na superfície do solo e, ainda, o movimento lateral do próprio solo; Bocquier (1973)BOCQUIER, G. Genése et évolution de deux toposéquences de sols tropicaux du Tchad. [S. l.]: ORSTOM, 1973. 325 p. (Mem. ORSTOM, 62).: migração lateral e diferencial dos elementos químicos, Boulet (1978)BOULET, R. Existence de systèmes à forte différentiation laterale en milieu ferralitique guyanais: un nouvel exemple de couverture pédologique en déséquilibre. Science du Sol, n. 2, p. 75-82, 1978.: valorização às variações laterais ao longo da cobertura pedológica – toposequência; Boulet (1978bBOULET, R. Toposéquences de sols tropicaux en Haute Volta: équilibres et deséquilibres pédobioclimatiques. Mém. ORSTOM, v.85, 1978.; 1979BOULET, R. Méthode d´analyse et représentation des couvertures pédológiques des bassins versants. ECEREX. Bull.de Liaision n° 1 du Groupe de Travail “Ecosystème forestier guyanais; ètude et mise em valeur”, p. 11 a 19. 1979.): distribuição espacial dos solos e “gestação” da “Análise Estrutural da Cobertura Pedológica”.

Em linhas gerais, o trabalho é constituído de uma caracterização preliminar da área onde se insere a depressão, da apresentação dos materiais e métodos utilizados na pesquisa e, finalmente, da análise e interpretação dos dados adquiridos ao longo da pesquisa. As considerações finais representam reflexões sobre as dificuldades encontradas durante a pesquisa e, principalmente de reflexões sobre a complexidade de se estudar evolução de paisagem.

ÁREA ESTUDADA

Localização Geográfica

A área estudada corresponde a uma feição geomorfológica: depressão em uma colina presente em um maciço cristalino no estado do Espírito Santo (sudeste do Brasil) (Figura 1), localizada na borda do maciço costeiro “Mestre Álvaro” – montanha com amplitude topográfica superior a 800 metros – localizada no município de Serra-ES, que corresponde à cúpula de um batólito gnaissificado nas bordas, cujo relevo possui acentuado controle tectônico (GATTO et. al., 1983GATTO, L.C.S; RAMOS, V.L.S; NUNES, B.T.A; MAMEDE, L; GÓES, M.H; MAURO, C.A; ALVARENGA, S.M; FRANCO, E.M.S; QUIRICO, A.F; NEVES, L.B. Geomorfologia. Projeto Radam Brasil. Folhas 23/24 Rio de Janeiro/Vitória. V 32. Rio de Janeiro, 1983. Fóton Imagens. Fotografias aéreas. Escala 1:9.000 1998.).

Figura 1
Localização geográfica da área estudada

Geomorfologia

Segundo Gatto et. al. (1983)GATTO, L.C.S; RAMOS, V.L.S; NUNES, B.T.A; MAMEDE, L; GÓES, M.H; MAURO, C.A; ALVARENGA, S.M; FRANCO, E.M.S; QUIRICO, A.F; NEVES, L.B. Geomorfologia. Projeto Radam Brasil. Folhas 23/24 Rio de Janeiro/Vitória. V 32. Rio de Janeiro, 1983. Fóton Imagens. Fotografias aéreas. Escala 1:9.000 1998. a área encontra-se na Unidade Geomorfológica Colinas e Maciços Costeiros, Região Colina e Maciços Costeiros e Domínio de Faixa de Dobramentos Remobilizados. A Unidade Geomorfológica é caracterizada por colinas côncavo-convexas e um conjunto morfológico mais elevado, integrado pelas serras e maciços litorâneos, com diferentes tipos de modelados de dissecação. As colinas desta unidade englobam fácies de dissecação de densidade de drenagem fina e média com incisões entre 23 e 62m. Há colinas de forma convexas e/ou convexo-côncavas que são separadas por depressões alveolares colmatadas e planícies aluviais que são semelhantes em toda a sua continuidade espacial (GATTO et. al. 1983GATTO, L.C.S; RAMOS, V.L.S; NUNES, B.T.A; MAMEDE, L; GÓES, M.H; MAURO, C.A; ALVARENGA, S.M; FRANCO, E.M.S; QUIRICO, A.F; NEVES, L.B. Geomorfologia. Projeto Radam Brasil. Folhas 23/24 Rio de Janeiro/Vitória. V 32. Rio de Janeiro, 1983. Fóton Imagens. Fotografias aéreas. Escala 1:9.000 1998.).

As colinas dessa unidade, incluindo a colina estudada, apresentam geralmente colúvio no topo separando este material superior da alteração da rocha sã. Os colúvios estariam geralmente relacionados a fluxos de massas oriundos de encostas dos maciços e serras circundantes (GATTO et. al. 1983GATTO, L.C.S; RAMOS, V.L.S; NUNES, B.T.A; MAMEDE, L; GÓES, M.H; MAURO, C.A; ALVARENGA, S.M; FRANCO, E.M.S; QUIRICO, A.F; NEVES, L.B. Geomorfologia. Projeto Radam Brasil. Folhas 23/24 Rio de Janeiro/Vitória. V 32. Rio de Janeiro, 1983. Fóton Imagens. Fotografias aéreas. Escala 1:9.000 1998.). O domínio que abrange a unidade em estudo é caracterizado por evidências de movimentos crustais, com marcas de falhas, deslocamentos de blocos e falhamentos transversos, mostrando o controle estrutural sobre a morfologia. Isto pode ser observado pela presença de extensas linhas de falhas, escarpas, relevos alinhados (GATTO et. al. 1983GATTO, L.C.S; RAMOS, V.L.S; NUNES, B.T.A; MAMEDE, L; GÓES, M.H; MAURO, C.A; ALVARENGA, S.M; FRANCO, E.M.S; QUIRICO, A.F; NEVES, L.B. Geomorfologia. Projeto Radam Brasil. Folhas 23/24 Rio de Janeiro/Vitória. V 32. Rio de Janeiro, 1983. Fóton Imagens. Fotografias aéreas. Escala 1:9.000 1998.).

Geologia

A depressão está inserida na Unidade Geológica Suíte Intrusiva Espírito Santo (MACHADO FILHO et. al., 1983MACHADO FILHO, L.M; RIBEIRO, M.W; GONZALEZ, S.R; SCHENINI, C.A; NETO, A.S; PALMEIRA, R.C.B; PIRES, J.L; TEIXEIRA, W; CASTRO, H.E.F. Geologia. Projeto Radam Brasil. Folhas 23/24 Rio de Janeiro/Vitória. V 32. Rio de Janeiro, 1983.), que apresenta litologia de rochas graníticas pós-tectônicas, normalmente cinza de granulação média a fina e granitos sintectônicos com domínios restritos migmáticos. O caráter sin e pós-tectônico é, em relação ao Ciclo Brasiliano. Apresentam coloração entre cinza médio e rosa-claro, granulação média a grosseira, com tipos porfiroblásticos abundantes. A composição mineralógica não varia muito, podendo-se identificar feldspatos brancos e róseos, quartzo e subordinamente biotita e/ou anfibólio e, em algumas fases migmatíticas granada rósea. Geralmente as texturas exibem efeitos de deformação cataclástica, com fraturamento, trituramento e recristalização (MACHADO FILHO et. al., 1983MACHADO FILHO, L.M; RIBEIRO, M.W; GONZALEZ, S.R; SCHENINI, C.A; NETO, A.S; PALMEIRA, R.C.B; PIRES, J.L; TEIXEIRA, W; CASTRO, H.E.F. Geologia. Projeto Radam Brasil. Folhas 23/24 Rio de Janeiro/Vitória. V 32. Rio de Janeiro, 1983.).

Estruturalmente mostram-se foliadas ou maciças, com cataclase constante. Os corpos graníticos da fase pós-tectônica apresentam-se estruturalmente homogêneos, com orientação apenas nas bordas, por efeito da intrusão, ou ao longo de zonas de falhas (MACHADO FILHO et. al., 1983MACHADO FILHO, L.M; RIBEIRO, M.W; GONZALEZ, S.R; SCHENINI, C.A; NETO, A.S; PALMEIRA, R.C.B; PIRES, J.L; TEIXEIRA, W; CASTRO, H.E.F. Geologia. Projeto Radam Brasil. Folhas 23/24 Rio de Janeiro/Vitória. V 32. Rio de Janeiro, 1983.). Ao longo da área observa-se presença de falhas normais e/ou fratura na direção SE-NW (MACHADO FILHO et. al., 1983MACHADO FILHO, L.M; RIBEIRO, M.W; GONZALEZ, S.R; SCHENINI, C.A; NETO, A.S; PALMEIRA, R.C.B; PIRES, J.L; TEIXEIRA, W; CASTRO, H.E.F. Geologia. Projeto Radam Brasil. Folhas 23/24 Rio de Janeiro/Vitória. V 32. Rio de Janeiro, 1983.). São datadas do Proterozóico Superiores, revelando idade de 600 a 450 MA, caracterizando sua formação no Ciclo Brasiliano.

Pedologia

O mapa de Levantamento de Reconhecimento dos Solos do Estado do Espírito Santo escala 1:400.000 mostra que a área apresenta Latossolo Vermelho Amarelo distrófico coeso, A moderado, textura argilosa, fase floresta subperenifólia, relevo plano e suave a ondulado (Platôs litorâneos). O mesmo tipo de solo consta no mapa presente no site da EMBRAPA (2004)EMBRAPA, Clima. 2004. Disponível em: < www.bdclima.cnpm.embrapa.br>. Acesso em dezembro de 2004.
www.bdclima.cnpm.embrapa.br...
– Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, Escala 1:400. 000 e Lepsch (2002)LEPSCH, I. F. Formação e Conservação de Solos. São Paulo: Oficina de textos, 2002..

Toda essa caracterização preliminar torna-se importante, pois contextualiza regionalmente a área estudada e está sintetizada no Quadro 1.

Quadro 1
Características fisiográficas da área onde se insere a depressão

MATERIAIS E MÉTODOS

Operacionalmente, seguindo a proposta metodológica de Ab’ Saber (1969)AB’ SABER, A. N. Um conceito de geomorfologia a serviço das pesquisas sobre o Quaternário. Geomorfologia, São Paulo, n. 18, p.1-23, 1969. para pesquisa em Geomorfologia, procurou-se enquadrar as etapas da pesquisa em cada nível considerado por esse autor. Essas etapas estão presentes no Quadro 2.

Quadro 2
Os três níveis de tratamento da pesquisa geomorfológica segundo Ab'saber (1969)AB’ SABER, A. N. Um conceito de geomorfologia a serviço das pesquisas sobre o Quaternário. Geomorfologia, São Paulo, n. 18, p.1-23, 1969.

Em seguida, foram realizadas 2 (duas) etapas metodológicas: i) mapeamento de formas de relevo e; ii) estudo da cobertura pedológica através da Análise Estrutural da Cobertura Pedológica.

Mapa de Formas de Relevo

O mapa de formas de relevo foi elaborado a partir de técnicas de fotointerpretação sobre fotografia aérea da Fóton Imagens (1998), escala 1:9.000.

Foram utilizados overlays para mapear a morfologia do relevo e, em seguida, foram digitalizados no CorelDraw10. Os elementos da fotografia aérea que foram observados foram tonalidade e textura principalmente, baseando-se no estudo de Sabins (1986)SABINS, F.F. Jr. Remote sensing: principles and interpretation. 2. ed. New York: W. h. Freeman and company, 1986. DOI: 10.1080/01431168008948242
https://doi.org/10.1080/0143116800894824...
.

A área de abrangência do mapeamento foi escolhida com o intuito de abranger a colina onde se insere a depressão para tentar mapear, com auxílio dos trabalhos de campo as características geomorfológicas mais relevantes para este trabalho.

Foram mapeados, primeiramente, a hidrografia – cursos temporários e perenes – planícies de várzeas e as formas dos vales. Em seguida, foram mapeados todos os topos e suas formas, juntamente com as rupturas de declive. Na parte onde não havia topos a serem mapeados foi delimitado o divisor d’água. Por último, foram mapeadas outras formas de relevo: as depressões.

Análise Estrutural da Cobertura Pedológica

Os trabalhos de campo foram realizados de acordo com a metodologia da Análise Estrutural da Cobertura Pedológica proposta por Boulet (1988)BOULET, R. Análise estrutural da cobertura pedológica e cartografia. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIA DO SOLO, 21, 1988 Campinas. A responsabilidade social da ciência do solo. Campinas: SBPC, 1988, p.79-90., que será descrita nas linhas abaixo.

Levantamento topográfico

A topografia foi feita de acordo com a técnica encontrada em Boulet (1988)BOULET, R. Análise estrutural da cobertura pedológica e cartografia. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIA DO SOLO, 21, 1988 Campinas. A responsabilidade social da ciência do solo. Campinas: SBPC, 1988, p.79-90., com utilização de clinômetro, trena e metro. O observador mede anteriormente a altura dos seus olhos (altura H). Depois, segurando o clinômetro ele visa a horizontal, mirando o metro a sua frente, com o clinômetro graduado a zero grau, e a pessoa que segura o metro desloca seu dedo até a altura enxergada pelo observador, obtendo a assim a altura h, como mostra a Figura 2.

Figura 2
Procedimento de altimetria

Tradagens

O estudo iniciou-se no topo da vertente (adjacente à depressão) até o fundo da depressão, onde foram realizadas 12 tradagens. Segundo Boulet (1988)BOULET, R. Análise estrutural da cobertura pedológica e cartografia. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIA DO SOLO, 21, 1988 Campinas. A responsabilidade social da ciência do solo. Campinas: SBPC, 1988, p.79-90., primeiramente faz-se a primeira tradagem no topo da vertente e em seguida no sopé. Depois deve-se tradar exatamente no meio da vertente. A etapa seguinte é tradar entre duas tradagens e exatamente no meio delas, se houver diferenciação de horizontes, e assim se faz sucessivamente, até que não haja mais esta diferença, como exemplificado na Figura 3.

Figura 3
Implantação de tradagens. Os números dentro dos círculos correspondem aos números das tradagens.

As amostras foram coletadas a cada 10 cm com utilização do Trado Holandês. Em cada amostra de solo coletada foi observado cor – com utilização da Carta de croma de solos (Tabela de Munsel); textura; tamanho e morfologia dos grãos de quartzo; presença de outros minerais e grau de alteração; consistência (pegajosidade, plasticidade) e presença de volumes. Estas operações de campo foram registradas em pedocomparadores, (maleta de madeira, contendo dez fileiras de doze caixinhas de tamanho 4×4×4cm construídas com papel cartão) (Figura 4).

Figura 4
Pedocomparador utilizado para amostras coletadas nas tradagens

As tradagens foram finalizadas ao atingir o lençol d’água ou quando o trado não perfurava mais, isso devido à existência de uma camada bastante dura que provavelmente correspondia à rocha sã ou uma camada dura de laterita (muito comum nessa região de transição entre o embasamento pré-cambriano e as rochas sedimentares da Formação Barreiras).

Representação bidimensional da cobertura pedológica

Toposequência

Os dados das tradagens (profundidades e espessura dos horizontes) foram plotados no perfil e os limites contínuos foram ligados. O aparecimento ou desaparecimento de horizontes demandava tradagens adicionais, até conseguir estabelecer com o máximo de precisão aquele aparecimento ou desaparecimento, para assim constituir a toposequência. Os horizontes foram identificados em cada ponto e a eles denominados números e letras minúsculas para sua identificação e representação.

A toposequência foi realizada na direção N270, que acompanhava o fundo da depressão e possuía, aproximadamente, 75 m de extensão. Foram feitas 12 (doze) tradagens, abrangendo a vertente voltada para SW e o início da depressão, as quais atravessa as faces voltadas para NE e SW da trincheira.

Trincheira

A abertura da trincheira foi feita durante o curso Análise Estrutural da Cobertura Pedológica, ministrada pelos professores René Boulet e Heloíza Filizola. A abertura da mesma foi necessária para visualização e caracterização da morfologia dos horizontes, no sentido vertical e lateral, principalmente nas observações das transições laterais. Nas paredes da trincheira foram delimitados os horizontes, descritas suas principais características pedológicas e anotadas em caderneta de campo. Foi aberta uma trincheira no sopé da vertente orientada para SW, devido à diferença de material encontrado na vertente e no início da depressão.

É importante ressaltar que a verificação da cobertura pedológica nesta depressão chega somente até a segunda dimensão, a terceira dimensão não é atingida neste trabalho. A primeira dimensão refere-se ao perfil vertical do solo; a segunda ao perfil lateral e a terceira a espacialidade atingida com as curvas de isodiferenciação.

RESULTADOS

Mapa de Formas de Relevo

Observou-se que a morfologia dos vales que circundam a colina que se insere a depressão é geralmente de fundo chato, vertentes íngremes, típico de morfologias dos Tabuleiros Costeiros, uma vez que a colina encontra-se na transição entre os Tabuleiros Costeiros a leste e o relevo do embasamento pré-cambriano, a oeste. Alguns possuem entalhamento côncavo. Há destaque para uma planície de inundação à norte da colina e uma rede de drenagem de curso intermitente, circundando toda a colina (Figura 5).

Figura 5
Mapa de formas de relevo, com destaque para as depressões alinhadas no fundo da depressão.

O topo da colina é plano e dos outros compartimentos também são planos, típico das morfologias de topos dos Tabuleiros Costeiros, com exceção de um topo convexo. Existe ainda uma morfologia côncava no topo da colina que é a depressão em estudo.

Foi possível mapear nessas fotografias alguns níveis topográficos – também observados em campo – que não puderam ser observados na carta topográfica do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) existente para área, na escala 1:50.000, em função da escala de abrangência. Esses níveis topográficos correspondem às pequenas áreas deprimidas dentro da depressão estudada. Essas pequenas depressões apresentam-se alinhadas no fundo da depressão, na orientação E-W, aproximadamente (Figura 5). Esse alinhamento pode estar relacionado a lineamentos e/ou padrões de faturamento da crosta.

Análise Estrutural da Cobertura Pedológica

Observações gerais

Os trabalhos de campo e o mapa de formas de relevo mostraram a existência de pequenas áreas deprimidas (Figura 5) no fundo da depressão alinhadas na direção N270 e outras deslocadas, mas na mesma direção, podendo estar relacionadas a algum fraturamento da crosta. Havia a abertura de um canal na depressão.

A toposequência elaborada mostrou que a cobertura pedológica apresenta oito (8) horizontes (Figura 6) e um desnível de aproximadamente 9 m do topo da vertente até o início da depressão (Figura 6). Há presença de pequenas áreas deprimidas: entre D2 e D4 (depois do cotovelo em D2) no sopé da vertente, onde há limites abruptos entre horizontes e mudança de material.

Figura 6
Toposequência elaborada mostrando os 8 (oito) horizontes encontrados na depressão e um desnível de aproximadamente 9 m do topo da vertente até o início da depressão.

O horizonte 1, de cor 10YR 3/6 (Bruno amarelo escuro) com textura argilosa, que se inicia no topo da vertente em D2 e apresenta uma profundidade média de 35 cm. Este horizonte é bem extenso, recobrindo quase toda a vertente, passando por D4 até D10 (Figura 6).

Em D3 este horizonte se transforma lateralmente (Figura 6) no horizonte 1a com profundidade média de 35 cm também, de cor 10 YR 4/3 (Bruno) com manchas 5 YR 5/8 (vermelho-amarelada), de textura também argilosa. Este horizonte está compreendido entre D3 e D12, no sopé da vertente.

Em D12 o horizonte 1 a transforma-se lateralmente no horizonte 2 de cor 10YR 5/1 a 4/1 (cinza a cinza escuro), de textura argilosa, espessura média de 15 cm, prolongando-se desde o sopé da vertente até o início do fundo da depressão (finalizando em D 1).

O horizonte 3 é subjacente ao horizonte 1, acompanhando a cobertura pedológica do horizonte 1 até praticamente o seu final. Inicia-se em D4 até a altura de D3, onde se transforma lateralmente no horizonte 4. Possui cor 10YR 4/6 (Bruno amarelado escuro) com alguns volumes vermelhos amarelados de cor 5YR 5/8 e presença de nódulos ferruginosos. Tem espessura média de 30 cm (Figura 6).

O horizonte 4 inicia-se já no sopé da vertente em D3 até D12, praticamente inteiramente subjacente ao horizonte 1a. Possui cor 10 YR 4/4 (Bruno amarelado escuro) com manchas 7,5 YR 5/4, textura argilosa e espessura média de 50 cm (Figura 6).

Em D12, o horizonte 4 transforma-se lateralmente no horizonte 5 gley,de espessura média de 50 cm. Possui cor gley 10 YR 6/1 com manchas Bruno amareladas 5YR 5/6 ocasionais e textura argilosa.

O horizonte 6 foi identificado somente em D8 e D10 e está localizado subjacente ao horizonte 3, sendo um horizonte rico em blocos de couraças impenetrável com o trado.

O horizonte 7 apresenta-se sob o horizonte 4. Sua cor é 10YR 5/4 (Bruno amarelado) com volumes 10 R 4/6 (vermelho) e auréolas 7,5 YR 5/6 (bruno vivo), textura argilosa. Estes volumes têm uma orientação vertical. É um horizonte bastante curto (iniciando em D10 até D3) com espessura média de 50 cm.

Abaixo do horizonte 7 e 5 temos a alterita (8),iniciando já no sopé da vertente a partir de D11 até D1. Sua cor de fundo é branca (5Y 8/1), apresentando ou não manchas amarelas 10YR 6/8 a 5/8 (amarelo claro escuro) e algumas vermelhas 10 R 4/6 ocasionais, de textura argilo-arenosa a arenosa.

Foi encontrado o horizonte 5 (gley) e a alterita somente na depressão.

Há uma mudança significativa do sopé da vertente em direção ao início da depressão, mostrando uma mudança abrupta significativa das transições laterais entre os horizontes.

Trincheira

A trincheira apresentou 13 horizontes (Figuras 7 e 8). O Horizonte a com cor 10 YR 4/2 (Bruno acinzentado escuro) e estrutura grumosa inferior a 1 cm extremamente coerente de textura argilo-arenosa e espessura em torno de 12 cm. Subjacente ocorre horizonte b com 10 YR 4/4 bruno amarelado escuro que sofre variação lateral progressiva da esquerda para a direita, originando o horizonte c com cor 10 YR 4/3 (bruno) e manchas ao longo dos poros de cor 5 YR 5/8 (amarelo avermelhado). A textura de ambos os horizontes é argilosa. A espessura desse horizonte é de pouco mais de 50 cm do lado esquerdo da trincheira, estreitando-se para a direita até a espessura de aproximadamente 20 cm (Figura 7).

Figura 7
Trincheira aberta no sopé da vertente voltada para SW
Figura 8
Trincheira interpretada, mostrando a disposição e transições de cada volume encontrado

O horizonte d tem cor 10 YR 5/6 (bruno amarelado) com domínio 5 YR 5/8 (vermelho) difuso, possuindo estrutura poliédrica com 1 a 2 cm e subestruturas microagregada nítida. A estrutura é argilosa com cerosidade tubular mais forte e intermicroagregada forte com coesão média a fraca. O horizonte e possui fundo 10 YR 5/4 com manchas ao redor dos poros cor 5 YR 5/8 e domínios brunos mais vivos 10 YR 5/4 (bruno amarelado), sendo as demais características texturais e estruturais idem ao horizonte anterior. No horizonte f a cor é 10 YR 6/3 (bruno claro) com manchas ao redor dos poros com cor 5 YR 5/8 (vermelho amarelado), com textura argilosa, estrutura poliédrica de 1 a 2 cm, e coesão média a fraca, subestrutura microagregada, porosidade bem desenvolvida. No horizonte g reconhece-se transição com fundo 10 YR 5/6 (bruno amarelado) com volumes vermelhos 2,5 YR 5/8 e auréola ocre 10 YR 5/8. A textura é argilosa. Os volumes vermelhos aumentam para a base. A Estrutura apresenta-se em blocos de 1 a 2 cm que se desfazem em microgranulares com coesão fraca. Porosidade tubular mais desenvolvida no fundo bruno amarelado (Figura 8).

O Horizonte h ocorre o surgimento de numerosas manchas em redor dos poros com cor vermelha amarelado, sendo as demais características similares ao horizonte anterior. No horizonte i a cor é 10 YR 5,5/4 com numerosos volumes 10 YR 4/6. Os volumes têm até 7 cm e, uma orientação vertical. A textura dele é argilosa e a estrutura, microagregada. O fundo tem coesão fraca (daí a porosidade biológica forte) e os volumes são muito duros, conferindo uma porosidade biológica baixa ou nula. Porosidade forte no fundo e pouco ou nada nos volumes vermelhos (Figura 8).

No horizonte j a cor é 10 YR 6/1 (cinza) úmido com característica plástica. Ele possui volumes similares ao horizonte anterior, diferindo apenas pela não orientação vertical descrita anteriormente.

O horizonte k possui cor 10 YR 6/1 com algumas manchas vermelhas em redor dos poros 2,5 YR 5/8 é plástico e com estrutura maciça. A porosidade tubular é bem desenvolvida facilitada pela coesão fraca (Figura 8).

No horizonte l o fundo é branco com rede 7,5 YR 6/8 (amarelo avermelhado) e 10 YR 6/8 (amarelo brunado). Os domínios coloridos são mais freqüentes que os brancos e têm manchas 2,5 YR 5/8 ao longo dos poros, no branco e no amarelo brunado. Para jusante, as manchas diminuem muito e o branco domina, também com algumas manchas no branco e no amarelo brunado. A textura aí é argilo-siltosa (Figura 8).

Nos horizontes b e c ocorrem fragmentos de couraças duras com cor 10 YR 3/6 (vermelho escuro). A estrutura deles é poliédrica muito coerente, de 1 a 2 cm, e a porosidade tubular é, por essa razão, pouco desenvolvida.

DISCUSSÕES

O desnível de aproximadamente 9 m do topo da colina onde se insere a depressão na direção N270, abrangendo a vertente voltada para SW até o início da depressão mostra a quantidade de material que foi retirado da área que contribui para a forma atual da depressão.

A origem da depressão pode estar relacionada à perda de material por dissolução – geoquímica; abatimento em áreas mais suscetíveis ao intemperismo e erosão e por aprofundamento de canais de drenagem. Essas três hipóteses podem ser consideradas juntas, como a origem pode estar relacionada a uma dessas.

O alinhamento das depressões podem estar relacionados à padrões de lineamentos presentes na crosta, necessitando uma análise mais aprofundada dos mesmo com os dados de neotectônica na área.

Na toposequência podemos observar pequenas áreas deprimidas (Figuras 5 e 6) entre D2 e D4 (depois do cotovelo em D2) no sopé da vertente (onde há limites abruptos entre horizontes e mudança de material) que continuam na depressão (observação de campo). Há locais (no fundo da depressão) em que há pequenas áreas mais deprimidas que outras. Essas áreas deprimidas podem estar relacionadas à perda de material por dissolução de elementos químicos presentes no solo por meio de algum condicionante estrutural (falha ou fratura), uma vez que as áreas deprimidas seguem um alinhamento, existindo ainda outras áreas deprimidas adjacentes com mesma direção, mas deslocadas, associadas a algum condicionante estrutural.

As áreas mais deprimidas correspondem aos locais com presença de materiais mais suscetíveis ao intemperismo e erosão que outros locais.

A presença de um canal na depressão pode indicar o aprofundamento deste, procurando atingir seu nível de base e, pelo estágio que se encontra a depressão, este nível ainda não teria sido atingido.

O horizonte gley indica hidromorfia (Figura 6) e aparece nas áreas mais deprimidas, parecendo avançar remontantemente em locais onde a morfologia contribui para retenção da água, como pode ser observado na mudança da morfologia do sopé da vertente com o início da depressão.

O avanço do horizonte gley e a intercalação de áreas deprimidas e altas desde a depressão seguindo a montante na vertente, pode ser indício de uma evolução remontante (de jusante para montante).

Assim, pode-se falar da evolução da depressão, seguindo os seguintes estágios:

  1. a drenagem entalhou num local com suscetibilidade de formação de canal;

  2. o canal foi entalhando e está entalhando ainda, procurando atingir seu nível de base local, uma vez que a colina é uma superfície pré-Barreiras;

  3. concomitantemente, ocorre a dissolução geoquímica que se deu desigualmente na paisagem, aprofundando os locais mais suscetíveis à erosão e intemperismo e a perda ocorre por meio de falhas e/ou fraturas;

  4. as áreas mais deprimidas proporcionaram que a água parasse por mais tempo, formando o horizonte gley de hidromorfia;

  5. há uma evolução remontante em direção ao topo, devido ao entalhamento do canal ser remontante, e por dissolução geoquímica maior em áreas mais deprimidas. Provavelmente as áreas deprimidas do fundo da depressão se iniciaram como acontece na vertente.

  6. a paisagem está ainda em processo de evolução.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Dessa forma, observam-se claramente os acontecimentos simultâneos e/ou seqüenciais dos materiais e formas do relevo, revelando a importância do estudo dos materiais em geomorfologia, desprezada por muito tempo ao longo de sua história, mostrando incongruência do querer entender a forma apenas pela forma e esquecendo sua sobreposição a uma matéria física (solos e rocha).

O avanço do horizonte gley e a intercalação de áreas deprimidas e altas desde a depressão seguindo a montante na vertente pode ser indício de uma evolução remontante (de jusante para montante). Concomitantemente, ocorre à dissolução geoquímica que se deu desigualmente na paisagem, aprofundando os locais mais suscetíveis à erosão e intemperismo e a perda ocorre por meio de falhas e/ou fraturas;

Há uma evolução remontante em direção ao topo, devido ao entalhamento do canal ser remontante, e por dissolução geoquímica maior em áreas mais deprimidas. Provavelmente as áreas deprimidas do fundo da depressão se iniciaram como acontece na vertente.

A importância de saber se o material de recobrimento da depressão e da colina é autóctone ou alóctone é uma questão que ajudaria entender melhor toda essa evolução proposta acima.

REFERÊNCIAS

  • AB’ SABER, A. N. Um conceito de geomorfologia a serviço das pesquisas sobre o Quaternário. Geomorfologia, São Paulo, n. 18, p.1-23, 1969.
  • AUBERT, G; BOULAINE, J. La Pédologie Paris: Presses Universitaires de France e Boulevard Saint-Germain, 1967.
  • BARROS, O.N.F. Análise estrutural e cartografia detalhada de solos em Marília, Estado de São Paulo: ensaio metodológico. 1985.146f. Dissertação (Mestrado em Geografia Física) – Programa de Pós-Graduação em Geografia Física, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, São Paulo, 1985.
  • BOCQUIER, G. Genése et évolution de deux toposéquences de sols tropicaux du Tchad. [S. l.]: ORSTOM, 1973. 325 p. (Mem. ORSTOM, 62).
  • BOULET, R. Existence de systèmes à forte différentiation laterale en milieu ferralitique guyanais: un nouvel exemple de couverture pédologique en déséquilibre. Science du Sol, n. 2, p. 75-82, 1978.
  • BOULET, R. Toposéquences de sols tropicaux en Haute Volta: équilibres et deséquilibres pédobioclimatiques. Mém. ORSTOM, v.85, 1978.
  • BOULET, R. Méthode d´analyse et représentation des couvertures pédológiques des bassins versants. ECEREX. Bull.de Liaision n° 1 du Groupe de Travail “Ecosystème forestier guyanais; ètude et mise em valeur”, p. 11 a 19. 1979.
  • BOULET, R.; BRUGIÈRE, J.M. & HUMBEL, F.X. Relations entre organization des sols et dynamique de l'eau en Guyane Française Septentrionale. Sci. Sol, 1:3-18, 1979. Campinas: SBCS/SNLCS, 1984. 45p.
  • BOULET, R. Análise estrutural da cobertura pedológica e cartografia. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIA DO SOLO, 21, 1988 Campinas. A responsabilidade social da ciência do solo Campinas: SBPC, 1988, p.79-90.
  • BRICALLI, L. L. Evolução de uma depressão em embasamento cristalino e sua relação com os aspectos geológico-geomorfológicos regionais (Serra-ES).2006. 142f. Dissertação (Mestrado em Geografia Física) – Programa de Pós-Graduação em Geografia Física, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2006.
  • CARVALHO, A. Solos da região de Marilia: relações entre a pedogênese e a evolução do relevo USP, Dep. Geogr., tese de doutoramento, 163 p.1976.
  • CASSETI, V. Elementos de Geomorfologia Goiânia: Editora da UFG, 2001.
  • DAVIS, W. M. The Geographical Cycle. Geogr. Journ London, v. 14, n. 5, p. 481-504, 1899.
  • DELVIGNE, J. (1965) Pédogenèse en zone tropicale: la formation des minéraux secondaires en milieu ferralitique. Mém. ORSTOM, v. 13, 117 p.
  • EMBRAPA, Clima. 2004. Disponível em: < www.bdclima.cnpm.embrapa.br>. Acesso em dezembro de 2004.
    » www.bdclima.cnpm.embrapa.br
  • FILIZOLA, H. O papel da erosão geoquímica na evolução do modelado da bacia de Taubaté-SP 1993. 114f. Vol I. Tese (Doutorado em Geografia Física) – Programa de Pós-Graduação em Geografia Física, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, São Paulo, 1993.
  • GATTO, L.C.S; RAMOS, V.L.S; NUNES, B.T.A; MAMEDE, L; GÓES, M.H; MAURO, C.A; ALVARENGA, S.M; FRANCO, E.M.S; QUIRICO, A.F; NEVES, L.B. Geomorfologia. Projeto Radam Brasil Folhas 23/24 Rio de Janeiro/Vitória. V 32. Rio de Janeiro, 1983. Fóton Imagens. Fotografias aéreas. Escala 1:9.000 1998.
  • GILBERT, G. K. The Geology of the Henri Mountains. Washington: United States Geographical and Geological Survey 1877.
  • GUERRA, A. T. Dicionário Geológico-Geomorfológico Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001.
  • HACK, J.T. Interpretation of Erosional Topography in Humid-Temperate Regions. Amer. Journ. Sci, New Haven, Conn. v. 258-A, p. 80-97, 1960.
  • KING, L. C. Canons of Landscape Evolution. Bull. Geolog. Society of America, Washington, v. 64, n. 7, p. 721-732, 1953.
  • LEPSCH, I. F. Formação e Conservação de Solos São Paulo: Oficina de textos, 2002.
  • MACHADO FILHO, L.M; RIBEIRO, M.W; GONZALEZ, S.R; SCHENINI, C.A; NETO, A.S; PALMEIRA, R.C.B; PIRES, J.L; TEIXEIRA, W; CASTRO, H.E.F. Geologia. Projeto Radam Brasil Folhas 23/24 Rio de Janeiro/Vitória. V 32. Rio de Janeiro, 1983.
  • MILNE, G. (1936) Normal erosion as a factor in soil profile development. Nature, n. 26, p.548-549.
  • PENCK, W. Die morphologische analyse. Ein kapitel der physikalischen geologie. J. Engelhorn's Nachf Stuttgart, 1924.
  • PENTEADO, M.M. & RANZANI, G. Relatório de viagem do médio vale do Rio São Francisco. Geomorfologia, São Paulo, 40:1-44, 1973.
  • QUEIROZ NETO, J.P.: CARVALHO, A.; JOURNAUX, A. & PELLERIN, J. – –1973 – Cronologia da alteração dos solos da região de Man1ia, SP – USP/ IGEOG, Sedimentologia e Pedologia 5,52 p.
  • QUEIROZ NETO, J. P. Tendências Atuais das Pesquisas de Solos No Estado de São Paulo. BOLETIM PAULISTA DE GEOGRAFIA, n. 50, p. 37-56, 1976.
  • QUEIROZ NETO, J. P. Pedologia: conceito, método e aplicações. REVISTA DO DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA, São Paulo, n. 3, p. 95-102, 1984.
  • QUEIROZ NETO, José Pereira de. O estudo de formações superficiais no Brasil. Revista do Instituto Geológico, São Paulo, v. 22, n. 1/2 p. 65-78, 2001. DOI: http:dx.doi. org/10.7154/RDG.1984.0003.0006
    » http:dx.doi. org/10.7154/RDG.1984.0003.0006
  • RUELLAN, A. Contribution à la Connaissance des Sols des Régions Mediterranéennes: les sols a profil calcarie différencié des Plaines de la Basse Moulouya (Maroc Oriental), n'enregistrement au CNRS -A 04086. 1970. 428 p.
  • SABINS, F.F. Jr. Remote sensing: principles and interpretation. 2. ed. New York: W. h. Freeman and company, 1986. DOI: 10.1080/01431168008948242
    » https://doi.org/10.1080/01431168008948242

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Aug 2015

Histórico

  • Recebido
    20 Abr 2014
  • Aceito
    25 Jun 2015
Editora da Universidade Federal de Uberlândia - EDUFU Av. João Naves de Ávila, 2121 - Bloco 5M – Sala 302B, 38400902 - Uberlândia - Minas Gerais - Brasil, +55 (34) 3239- 4549 - Uberlândia - MG - Brazil
E-mail: sociedade.natureza@ig.ufu.br