Open-access Os sentidos dos diagramas nas estratégias empresariais do capitalismo extrativista

The meanings of diagrams in the business strategies of extractive capitalism

Resumo

O objetivo do trabalho é compreender a “geometria política” da representação imagética presente nas estratégias de produção e divulgação de diagramas veiculados por empresas do capitalismo extrativista. Para tanto, discute-se o papel da visualidade diagramática na difusão de uma representação mitológica e não conflituosa do espaço social, analisando, em particular,as estratégias empresariais que operam na construção imagética dos espaços extramuros como socialmente harmônicos e ambientalmente sustentáveis. O artigo está ancorado na coleta e análise de diagramas veiculados nos relatórios de sustentabilidade e responsabilidade social empresarial de quatro grandes corporações do setor extrativo mineral cuja publicação foi realizada no intervalo de cinco anos, compreendidos entre 2015 e 2020. Ademais, nutre-se da análise de documentos produzidos pelo ICMM – International Council on Mining and Metals, procurando esmiuçar o papel desempenhado pelos diagramas na formatação de ambientes favoráveis à neutralização da dissidência e da contestação aos empreendimentos minerários. Com base na pesquisa, pode-se indicar que os diagramas têm sido utilizados como mecanismos de captura de adesão, neutralização dos inconformismos e sedução das comunidades afetadas.

Palavras-chave diagramas; estratégias empresariais; capitalismo extrativista; responsabilidade social empresarial

Abstract

The objective of the work is to understand the “political geometry” of the imagery representation present in the production and dissemination strategies of diagrams conveyed by companies of neo-extractivist capitalism. Therefore, the role of diagrammatic visuality in the dissemination of a mythological and non-conflicting representation of the social space will be discussed, analyzing, in particular, the corporate strategies for building consent in extramural spaces where the discourse of corporate social responsibility and sustainability is inserted. The article is based on the collection and analysis of diagrams published in the Sustainability and Corporate Social Responsibility Reports of four large corporations in the mineral extraction sector whose publication was carried out in a five-year period, between 2015 and 2020. Furthermore, it draws on the analysis of documents produced by the ICMM - International Council on Mining and Metals, seeking to scrutinize the role played by diagrams in formatting favorable environments to neutralize dissent and contestation of mining ventures. Based on the research, it can be indicated that the diagrams have been used as mechanisms to capture adherence, neutralize nonconformities and seduce affected communities.

Keywords Diagrams; business strategies; extractivist capitalism; corporate social responsibility

Introdução

Com o fim de armar-nos para a luta, os entendidos em assuntos sociais e os artistas comprometidos devem nos ensinar a ler as imagens e descobrir o jogo da máquina que as produz e se dissimula por trás delas.

(Rancière, 2008, p. 69)

Toda análise de uma imagem tem uma dimensão política, e toda imagem tem uma dimensão política.

(Didi-Huberman, 2014, p. 01)

Enquanto a retórica neoliberal tem, desde sua difusão a partir dos anos 1980, insistido nas virtudes do livre-mercado, as grandes empresas, em sentido aparentemente inverso, têm se preocupado crescentemente com o que se passa na esfera política. Por meio dos chamados “mapeamentos de riscos sociais” ou de “stakeholders” ou “partes interessadas”, as corporações empresariais procuram identificar os atores sociais tidos como capazes de ser afetados e de afetar os interesses e negócios das empresas. Por meio desses levantamentos, as corporações procuram identificar os graus de organização e mobilização da sociedade, antecipando conflitos e delineando políticas que operem como seguro contra os riscos à sua reputação. Estes indivíduos ou grupos, vistos como capazes de afetar negativamente os projetos empresariais, tendem a merecer uma atenção particular das grandes corporações, notadamente quando os mesmos se veem como “detentores de algum tipo de direito” (Bourne; Walker, 2005). O espaço social em que se situam esses sujeitos vistos como perigosos é, com frequência, representado pelas empresas através de diagramas. É, com efeito, cada vez mais frequente a apropriação da linguagem pictográfica pelos chamados “relatórios de sustentabilidade e responsabilidade social empresarial” e pela literatura do management com o objetivo de melhorar a comunicação com seus acionistas e o público em geral, assim como para indiretamente definir ações capazes de esvaziar tensões e conflitos resultantes das atividades empresariais potencialmente degradadoras do ambiente.

Os sentidos normativos no uso de diagramas são mais frequentes do que reconhecem aqueles que pensam que as regras sociais são definidas pelo simples emprego de palavras (Moroni; Lorini, 2017). Uma objeção clássica à possibilidade de comunicação visual residiria no fato de as imagens serem consideradas intrinsecamente ambíguas e poderem ser usadas para transmitir um número indeterminado de conteúdos e sentidos: as imagens estariam subordinadas à linguagem e a comunicação pictórica seria, por conseguinte, parasitária da comunicação verbal (Frixione; Lombardi, 2015).

Entre esses dois domínios, entretanto, os diagramas representam a interseção de aspectos linguísticos e imagéticos, ao mesmo tempo que expressam um jogo de relações que extrapola a dimensão gráfica e figurativa neles diretamente expressas, espraiando-se para universos significativos correlatos que, embora não compareçam explicitamente na representação, orientam e interferem em sua decodificação. Os diagramas são caracterizados como uma representação gráfica usada com o propósito de explicar uma ação, força, processo ou proposição, além de expressarem as figurações de um objeto com o intuito de explicá-lo (Garland, 1979) ou de expor suas relações constitutivas (Richards, 2002).

O que pretendemos no presente texto é discutir as relações que a comunicação empresarial tem buscado representar como constitutivas do espaço social de suas intervenções. Objetivamos, em particular, compreender os sentidos da representação imagética presente nas estratégias de produção e divulgação de diagramas veiculados por empresas do capitalismo extrativista.1 Para tanto, discute-se o papel da visualidade diagramática na difusão de uma representação mitológica e não conflituosa do espaço social, analisando, em particular, as estratégias empresariais de construção imagética dos espaços extramuros como socialmente harmônicos e ambientalmente sustentáveis.

O artigo está ancorado na coleta e análise de diagramas veiculados nos relatórios de sustentabilidade e responsabilidade social empresarial de quatro grandes corporações do setor extrativo mineral, cuja publicação foi realizada no intervalo recente de cinco anos, compreendidos entre 2015 e 2020. O trabalho nutre-se, ainda, da análise de documentos produzidos pelo ICMM – International Council on Mining and Metals,2 que são esclarecedores no que diz respeito ao papel desempenhado pelos diagramas na representação de ambientes favoráveis ao obscurecimento da dissidência e da contestação à mineração.

As empresas selecionadas para compor nosso material empírico têm em comum a utilização do modelo de divulgação do Global Reporting Initiative – GRI. O GRI é uma organização internacional, dita multi-stakeholder e independente, sem fins lucrativos, criada em 1997 em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), que atua na criação e aperfeiçoamento de diretrizes para relatórios de sustentabilidade, objetivando aumentar a transparência e a capacidade de resposta das corporações empresariais (GRI, 2020). Além desse material, recorremos à análise de diagramas utilizados por consultorias empresariais e autores da literatura do management, procurando balizar nossas observações em uma maior amplitude de referenciais.

Ao lidarmos com os diagramas utilizados pelas corporações e pela literatura do management, procuramos extrair da forma de um objeto as forças que o fizeram ser o que é: “eis a definição mais elegante de todas as que jamais foram dadas à sociologia da literatura” (Moretti, 2008, p. 97). A proposta analítica adotada no trabalho inspira-se naquela avançada por Didi-Huberman (2013) que sugere, a partir da obra de Warburg, a existência de um modelo sintomal de análise no qual o devir das formas pode ser analisado como um conjunto de processos tensivos, tensionados, por exemplo, entre a vontade de identificação e a imposição de alteração. Na visão do filosofo francês, não há morfologia, ou análise das formas, sem uma dinâmica, ou análise das forças. Omitir isso é reduzir os atributos morfológicos de uma representação ao estabelecimento de tipologias estéreis, impedindo, assim, a detecção das forças, que tende a ser vista como tarefa árdua e escorregadia; seja porque é difícil constatar tais forças quando são violentas e onipresentes ou enxergá-las, quando se apresentam em potência virtual e dissimulada.

Os diagramas como esquemas de relações

Para o filósofo pragmático C. S. Peirce (1906), o diagrama é um tipo de ícone, assim como o são as imagens e as metáforas. Na condição de ícone, e ao contrário do que se entende por símbolo – este último sendo inseparável de uma convenção –, o diagrama é caracterizado pela pretensão de similaridade com relação a seu objeto. O diagrama representa o objeto através de um esquema de relações. Procurando escapar ao aspecto vago da noção de similaridade, Peirce avança na caracterização do ícone a partir do fato de este conter informações implícitas que, para aparecerem, precisam ser tornadas explícitas por algum processo de observação de relações que seriam, em princípio, não evidentes. Assim, na epistemologia adotada por este autor, o diagrama é pensado em sua capacidade de, por relações de semelhança, fazer convergir entendimentos em direção a uma explicação do que seriam processos significativos (Stjernfelt, 2000).

Se há credibilidade na ideia de que um diagrama (ou qualquer outra representação imagética) vale mais que 10.000 palavras (Larkin; Simon, 1987), isso passa pela capacidade de se reconhecer as informações relevantes e de se produzir inferências a partir dos dados que, porventura, venham a ser capturados na e pelas imagens-grafias. Para Gurr (1999) um argumento primário para justificar a afirmação de que os sistemas de representação diagramática são mais eficazes do que os textuais é que certas inferências são neles, de alguma forma, mais imediatas ou mesmo automáticas. Em tais sistemas representacionais, as conclusões aparecem quase que “gratuitamente”, em comparação com os sistemas textuais nos quais uma inferência lógica deve ser feita para se produzir a conclusão. Não seria exagero sugerir que os diagramas são exemplos paradigmáticos da complementaridade inacabada entre ver e escrever. Como argumenta Didi-Huberman (2004), a linguagem e a imagem são absolutamente solidárias e não se privam de continuamente intercambiar suas carências recíprocas: a imagem vai acudir onde parece falhar a palavra; a palavra, por sua vez, presta socorro onde parece faltar a imaginação.

Há uma tendência difundida em círculos acadêmicos e de senso comum, segundo a qual seria mais fácil lidar com informação visual, por esta cumprir uma importante função na comunicação e na aprendizagem (mais que os sistemas de representação sentenciais e algébricos). Schnotz et al. (1993), por exemplo, sustentam que as representações diagramáticas têm um papel importante na construção de um modelo mental apropriado e ajustado aos parâmetros que se pretende instituir. Nesse sentido, os diagramas representariam importantes ferramentas no exercício de práticas que modelam as lutas pelo poder de fazer ver, crer, conhecer e reconhecer, assim, contribuindo para impor a definição legítima das divisões do mundo social e, por essa via, fazendo, desfazendo e refazendo os grupos sociais (Bourdieu, 1996). Em uma formulação mais ortodoxa e por considerar que os diagramas são figurações espaciais de relações, Zhang (1997) afirma que a forma de uma representação determina quais informações podem ser percebidas, quais processos podem ser ativados e quais estruturas podem ser descobertas. É por essas e outras razões que Garland (1979), analisando a construção e recepção do diagrama do metrô de Londres, sustenta que o uso deste instrumento nas linhas do transporte subterrâneo afetou as representações acerca da cidade, repercutindo no mapa mental dos londrinos e na percepção das distâncias concretas da cidade.

A relação entre os diagramas e a produção de verdades nos permite considerá-los como um mecanismo que, embora se construa como reflexo análogo do real, traz consigo a capacidade de criar novas figurações esquemáticas, conduzindo-nos de uma premissa originária para o surgimento de novas afirmações que, por sua vez, têm o poder de produzir sentidos novos acerca da realidade. Para Deleuze (2008), assim como para Peirce (1906), a função do diagrama é “determinar” ou modelar uma realidade futura. Contudo, existem aqui, e não inesperadamente, duas noções distintas de futuro: um futuro especulativo (concebido, mas não real) no caso de Peirce, e um futuro construído, no caso de Deleuze, como realidade intensiva e diferencial do presente (Vellodi, 2014). A potencialidade dos diagramas de dotarem as relações de significados e direções antes não previstas se destaca na caracterização avançada por Deleuze (2008), para quem

[o] diagrama é intersocial e em devir. Ele nunca age para representar um mundo pré-existente, ele produz um novo tipo de realidade, um novo modelo de verdade. Não é sujeito da história nem a supera. Faz história desfazendo as realidades e as significações anteriores

(Deleuze, 2008, p. 45).

Os diagramas rompem os dualismos divergentes entre visível e enunciável, forma e conteúdo, palavra e imagem, promovendo uma representação efetiva e prospectiva das relações de poder, que se ancoram no uso inteligente e interessado das distintas linguagens, tendo, inclusive, a faculdade eventual de dissolver conflitos e tensões. Não obstante seja o resultado de um feixe de códigos, cabe realçar que o aspecto especificamente visual dos diagramas permite dar destaque às feições cruciais que definem uma dificuldade específica favorecendo a sugestão de soluções (De Landa, 2000). Tais atributos explicam por que diagramas fazem parte das estratégias comunicacionais de instituições como o GRI - Global Reporting Initiative sendo recomendados como eficientes ferramentas para o mapeamento dos sujeitos e mensuração de possíveis tensões.

Visualizar graficamente os stakeholders e os critérios adotados para sua identificação pode ajudar a impedir que algum aspecto seja esquecido no mapeamento. [...] Uma consequência evidente é a mitigação de potenciais conflitos e, em alguns casos, a antecipação de movimentos estratégicos

(GT GRI G3, 2008, p. 40-43).

Do mesmo modo, o ICMM recomenda, imperativamente e em distintos documentos, que as empresas associadas devem recorrer ao uso de mapas, diagramas e imagens, procurando modelar a aceitação dos projetos e obter condições mais favoráveis para o estabelecimento de consensos sobre os processos de implantação, operação e desativação de complexos mineradores.

As empresas devem evitar o uso de textos e linguagens técnicas e legalistas durante as deliberações e o processo de construção de consenso. Em vez disso, as empresas devem manter as explicações simples e podem optar por usar mídia visual para destacar os impactos potenciais do projeto

(ICMM, 2015b, p. 91).

Deve garantir que as informações sobre o projeto sejam divulgadas de uma forma que os Povos Indígenas e as comunidades locais entendam – isso pode envolver a tradução de materiais para os idiomas locais, o uso de brochuras, mapas, diagramas e estações de rádio locais para transmissão verbal de informações; evite usar textos e linguagens técnicas e legalistas

(ICMM, 2015a, p. 63).

Os diagramas teriam a faculdade de incitar uma nova compreensão, com potencial para mudanças, no que concerne aos sentidos que julgamos já cristalizados na nossa existência. Van den Belt e Dietz (2004), em estudo que procura criar modelagens computacionais dedicadas à construção de consensos no que tange aos usos do meio ambiente, atentam para o fato de que os chamados stakeholders3 geralmente têm um “modelo mental da realidade” e utilizam um conjunto de dados para sustentá-lo. No entanto, quando esses dados se tornam visíveis em representações gráficas e diagramáticas externas, frequentemente acontece que os dados não sustentam o modelo mental original. Em tal situação, as crenças e fatos originais [agora visíveis] são confrontados, oferecendo, assim, uma oportunidade de “aprendizagem” e de mudança. Hoffmann (2005) propõe o emprego dos diagramas em situações nas quais os stakeholders em conflito com as corporações empresariais simplesmente não partilham de experiências culturais e sociais comuns, não manejando, portanto, códigos e entendimentos que os habilitariam a compreender o que o outro lado diz. Na proposição do autor, que enxerga o problema como sendo de ordem comunicacional, a questão decisiva se resume a como erigir novas condições de entendimento capazes de facilitar o intercambio e a partilha de ideias, que, por sua vez, teriam potencial para minar o conflito. Para a consecução dessa tarefa, sugere o autor, os diagramas ocupam um lugar ímpar, tendo em vista que congregam a possibilidade de construção de um novo entendimento a partir da confrontação daquilo que se julga saber, com a representação diagramática da relação de conflito que se pretende superar.

Como capturar adesão: para que servem os diagramas empresariais da “responsabilidade social”

A tentativa de formação de consensos tem sido tática fundamental da chamada “gestão do risco social”, o que tem justificado o investimento das corporações em aproximar-se dos agentes de contestação social, buscando tanto adaptar as próprias estratégias discursivas à forma mais condizente com o contexto de disputa, quanto incidir nos discursos dos outros a fim de moldar sua percepção sobre os conflitos (Veloso, 2019, p. 86). Nesse ambiente de confrontação, o emprego de diagramas reflete os esforços de fazer valer uma representação do campo que o pretende esvaziado da variável força. Assim sendo, o recurso à representação diagramática é não apenas uma proposta de classificação e ordenação, mas de disputa por uma descrição formal do espaço de relações. Por conseguinte, a forma diagramática que descreve as relações entre empresas e comunidades, por exemplo, torna-se um exercício de poder, no mínimo de disseminar esquemas de percepção, mesmo pretendendo não ser manifestação de força. Como ensina D’Arcy Thompson (1980), a forma de um objeto (por nossa conta poderíamos dizer o mesmo das relações sociais) é um diagrama de forças, no sentido de que, a partir dele, podemos julgar ou deduzir as forças que estão atuando ou já atuaram em sua conformação.4

A literatura do management e os operadores do ideário da chamada responsabilidade social empresarial” parecem confirmar a proposição de Bourdieu (1996) de que a subversão política pressupõe uma subversão cognitiva, uma conversão da visão de mundo. Do mesmo modo, dão sinais de que reconhecem o fato de que a adequação, a capacidade de aprendizado e a usabilidade das representações diagramáticas (e, portanto, sua eficácia) são profundamente influenciadas por questões que dizem respeito à reação humana às representações (Gurr, 1999) Nesse âmbito, a conjugação entre grafia e imagem reúne a capacidade de fazer emergirem novas significações que, consequentemente, são utilizadas para obscurecer ou mesmo suavizar a magnitude do conflito. Gabriel (2005), em artigo que discute o modo como as corporações estão transitando de um modelo de jaula de ferro (centrado na hierarquia burocrática) para um de jaula de vidro (marcado pelo uso da imagem e da ideia de transparência), observa que a gestão dos negócios se encontra cada vez mais preocupada com a orquestração de fantasias coletivas e a liberação de emoções. Para tanto, ela tem se valido do poder das imagens. A nova ordem gestionária vem dando origem, portanto, a uma situação na qual os tradicionais controles racional-burocráticos são substituídos por uma série de comandos mediados pela linguagem, por emoção, espaço, exposição e imagem.

Os diagramas compõem esse rol de novas ferramentas, sobretudo, por possuírem uma dimensão verbo-visual que sinergicamente mobiliza a força das letras e das imagens. Catellani (2011) considera que o texto visual e as imagens são componentes essenciais na produção de sentidos nos relatórios de responsabilidade social empresarial. Se considerarmos que o discurso e as práticas da chamada responsabilidade social empresarial são parte de uma estratégia destinada a obter resignação por parte de comunidades afetadas por projetos empresariais, podemos supor que diagramas estão sendo pensados também para disseminar impressões de que há adesão e aceitabilidade aos propósitos das empresas. Nessa linha, Benson e Kirsch (2010) argumentam que existe uma ligação direta entre as táticas e estratégias das grandes corporações e o sentimento geral de “desempoderamento” que caracteriza a vida política contemporânea, sugerindo a ideia de que as corporações cultivam ativamente essa sensibilidade do desamparo. Na visão dos autores, a política de resignação é, em parte, um sintoma do processo através do qual o poder corporativo normaliza e naturaliza os riscos e danos como condições inevitáveis da modernidade, ao invés de serem vistos como fruto das relações assimétricas travadas entre corporações, órgãos do poder público e comunidades.

Parece não soar estranho que a literatura do management se direcione a criar condições de possibilidade para a naturalização dos riscos e danos, sugerindo, inclusive, que mesmo os relacionamentos com stakeholders podem ser criados e influenciados, não devendo ser tomados como dados (Freeman; McVea, 2001). A esse respeito, não é de hoje que as grandes corporações vêm direcionando esforços na tentativa de naturalizar um modus operandi que se desenvolve degradando homem e natureza. Bowen (1957), em livro seminal para o management empresarial, alerta que não são os problemas de administração interna que devem reter a atenção dos gestores; ao contrário, para orientar o destino das companhias, os homens de empresa precisariam compreender e estar alertas para as múltiplas forças sociais que cada vez mais afetam ou controlam suas atividades. É de olho no controle e domesticação dessas forças sociais que o uso dos diagramas vem ganhando força nos relatórios de responsabilidade social empresarial. Os homens de negócios, igualmente, parecem confirmar Rancière (2009), para quem a cultura tipográfica e iconográfica expressa o entrelaçamento dos poderes das letras e da imagem. Assim, o mundo dos negócios incorpora a noção de que seu poder se entrelaça com o poder das letras e da imagem.

Mudando a imagem do jogo: reações empresariais à contestação social

Waizbort (2015), em diálogo com a obra de Warburg, indica que o uso de imagens serve para promover um domínio sobre a natureza e sugere que recorrendo ao universo imagético se pode, ao menos, começar a explicar o enigmático, o misterioso e o perigoso. Para as grandes corporações extrativas, as tentativas de equacionamento daquilo que identificam como origem do perigo expresso na ação de populações atingidas pelos empreendimentos, vêm passando cada vez mais pela utilização de imagens e diagramas. O recurso a esses mecanismos visuais ocupa papel central na publicação de relatórios de “sustentabilidade” e “responsabilidade social”, que, por sua vez, têm sido alçados, no transcorrer das recentes décadas, à condição de importantes dispositivos de gestão. Em todo o mundo, do total de empresas que aderiram, voluntariamente, a esse tipo de divulgação, 24,9% pertencem somente a quatro setores, quais sejam: energia, mineração, construção e químico (Campos et al., 2013). A preponderância desses segmentos indica que a publicação dos relatórios é parte de uma tática empresarial que visa suavizar e minimizar os efeitos da crítica endereçada ao caráter ambientalmente degradante das atividades que desenvolvem. A questão central aqui seria a de estancar as possibilidades de contestação social.

A própria literatura do management nos auxilia a compreender as razões que explicam o destaque desses quatro setores na produção de relatórios voltados à legitimação de suas atividades, bem como nos permite afirmar que o nível de exposição de uma empresa à contestação social correlaciona-se com seu grau de flexibilidade estratégica. Se os ativos de uma companhia são específicos, pesados e localizados, o risco de sofrer perdas econômicas, em caso de disputa social, é muito maior se comparado com empresas que possuem outras características econômicas passíveis de deslocalização (Dupuis, 2007). Em resposta a esse risco, que vem sendo caracterizado como “risco social”, tanto pelas corporações como pela literatura do management (Acselrad; Pinto, 2010), as empresas dedicam-se a construir e difundir imagens que associem suas atividades à benignidade social e ambiental.

Isso se traduz, por exemplo, na publicação de relatórios de “sustentabilidade ambiental” e “responsabilidade social corporativa”, prática crescentemente adotada por empresas preocupadas com sua imagem pública. Como se pode notar no gráfico disposto a seguir, após 2006, houve no Brasil um substancial incremento desse tipo de publicação, que cresceu 13.000% no intervalo de quinze anos. Tal crescimento não deixa de estar associado ao peso das atividades extrativas no modelo de desenvolvimento que tem vigorado no Brasil desde a passagem do século XX ao XXI.

Gráfico 1
Publicação de relatórios de sustentabilidade no Brasil – 2000-2015

A publicação dos relatórios, construídos para serem vistos e lidos como expressão da verdade, desempenharia importante papel no esforço de desarmamento da crítica. No processo de antecipação da contestação social, não raro, as empresas alegam que o debate sobre os impactos de seus projetos está marcado por “informações científicas incompletas” e, por vezes, contraditórias quanto à realidade objetiva dos riscos potenciais. Nestas situações, caracterizadas pela existência de incertezas e controvérsias científicas, as empresas tendem a antecipar os movimentos da contestação e forjar uma interpretação que lhes seja favorável e, ao mesmo tempo, partilhada por uma franja de atores, stakeholders e opinião pública (Adant et al., 2005). Pode-se mesmo apontar a prevalência de um uso interessado da incerteza científica a partir do qual a existência de controvérsias opera diminuindo a responsabilização das corporações frente aos sujeitos afetados (Zyglidopoulos; Fleming, 2011).

Em reposta à contestação crítica que advém de movimentos sociais e populações atingidas, as empresas buscam a formulação de uma nova visualidade empresarial que, por meio de gráficos, diagramas e imagens, procura representar o modo como esperam ser vistas e percebidas pelo público. Estes aparatos visuais podem servir tanto para formação interna dos empregados das corporações, como para construir uma legitimação externa frente aos agentes do Estado e da opinião pública ou, mesmo que indiretamente, na sedução e captura da adesão de comunidades que habitam áreas de interesse estratégico para as empresas.

O processo de gerenciamento da inconformidade popular, sobretudo aquela expressa por populações atingidas pelos empreendimentos extrativos, tem suscitado reações no campo do management, inclusive com a formulação de um modelo de gestão que se destina a medir os efeitos de uma ameaça de protesto social sobre a operação das empresas (Hommel, 2001; Hommel; Godard, 2002). O inconformismo e a revolta, vistos pelas empresas como ameaças, suscitam, de forma mais geral, o problema da articulação entre os processos sociais e os mecanismos econômicos, desembocando em possíveis desafios à legitimidade pública das empresas (Adant et al., 2005). A possibilidade de perda de legitimidade, associada a uma potencial erosão na imagem corporativa, tem impulsionado as empresas do capitalismo extrativo a elaborarem estratégias de mapeamento dos conflitos e dos sujeitos da contestação. Sobre esse aspecto, o trecho disposto a seguir, extraído de um guia de melhores práticas do ICMM e utilizado para monitorar as relações com stakeholders, apresenta-se bastante elucidativo.

As empresas devem considerar a realização de uma avaliação dos potenciais conflitos visando auxiliar no planejamento e na minimização dos riscos associados ao conflito. Uma avaliação do conflito envolve mensurar o potencial de um projeto para contribuir para o conflito em nível local e, além disso, identificar estratégias preventivas para reduzir o risco de escalada e confronto violento. Em um contexto indígena, as empresas devem considerar não apenas a possibilidade de ocorrência de conflitos entre grupos indígenas e a empresa, mas também as tensões geradas entre e dentro dos grupos indígenas, a empresa e a população não indígena

(ICMM, 2015a, p. 75).

Se, por um lado, há um aumento da crítica que provoca uma reação empresarial, por outro, tudo parece indicar que a maior profusão da contestação não tem resultado em um aumento no poder da crítica. Na visão de Boltanski (2013), torna-se forçoso analisar as mudanças que ocorreram nos dispositivos de “governança” – sejam eles públicos ou privados, – isto é, nos dispositivos que permitem aos dominantes conterem a crítica e manterem inalteradas as assimetrias sociais ou mesmo ampliá-las. Do mesmo modo, Frank e Weiland (1997) argumentam que, na lógica do capitalismo, pelo menos como ele é imaginado pelos manuais de administração mais difundidos, não se trata mais de fazer cumprir a ordem, mas de destruí-la. Assim sendo, a ideia de “revolução”, que já foi o bordão totêmico da contracultura, tornou-se parte da ideologia corporativa. Em um cenário de absenteísmo estatal relativo e planejado, as estratégias das corporações extrativistas têm procurado transformar o inconformismo e a revolta em commodities, mercantilizando a dissidência, ao mesmo tempo que promovem a operação empresarial do desenvolvimento como única saída possível.

Nesse contexto, a atuação de instituições como o ICMM repercute não somente na incorporação desse modelo na gestão das empresas, chegando mesmo à condição de interferir nos modos de organização da resistência. Os trechos transcritos a seguir, extraídos de documentos do ICMM destinados a orientar as práticas de empresas mineradoras na relação com comunidades atingidas, exemplificam as estratégias de produção de consenso e neutralização do conflito pela oferta eventual de benefícios em troca de consentimento.

Trabalhar para obter consentimento é, antes de tudo, e principalmente, um processo incorporado na negociação de boa fé. Realize entrevistas, pesquisas e/ou grupos focais com líderes comunitários e outros stakeholders importantes dentro da comunidade; procure aconselhamento profissional, como de especialistas em posse de terra, advogados, antropólogos e agências especializadas onde eles existirem [...]. Identifique os stakeholders importantes, porque promover um processo de consenso exige que as empresas realizem um mapeamento inicial com entrevistas, que podem ser realizadas em conjunto com uma “avaliação do potencial de conflito”

(ICMM, 2015b, p. 86-91).

O melhor desempenho social geralmente leva a melhores retornos financeiros [...]. Se as comunidades se beneficiam muito com a operação da mineração, então elas terão um interesse significativo em ver a mina operar com sucesso e ajudarão a superar obstáculos que podem afetar adversamente a operação da mineração e, por sua vez, reduzir os riscos para a empresa

(ICMM, 2012, p. 16).

Nessa nova aritmética política, a captura de adesão e a sedução das comunidades parecem ser a pedra filosofal da alquimia empresarial. Esse modus vivendi que integra grupos atingidos e grandes corporações, logra dar dimensões práticas às reflexões de Milton Friedman, economista e ganhador do Nobel, que nos anos 1970 afirmava que a “única responsabilidade social das empresas” é “aumentar seus lucros desde que permanecendo dentro das regras do jogo”. Como os regulamentos foram continuamente escapando da orbita estatal,5 o jogo reconfigura-se com a aposta das empresas recaindo sobre a autorregulação e o fortalecimento da imagem corporativa de respeito às regras, que são, em última instância, criadas direta ou indiretamente por seus próprios departamentos jurídicos. No reino da desregulamentação e da autorregulação, o sucesso na estabilização do controle territorial pelas grandes corporações tende a ser derivado, em parte, do fato de elas serem menos responsabilizadas e fiscalizadas pelo Estado, quando comparadas com empreendimentos de menor porte (Herman, 1981).6

Capital reputacional e captura da crítica; como funcionam os diagramas?

Na literatura do management, a reputação de uma corporação empresarial é produzida pela interação com os seus stakeholders e pela veiculação midiática de informações sobre as atitudes da empresa (Deephouse, 2000). Barnett et al. (2005) reservam o termo reputação corporativa para os ajuizamentos realizados por observadores acerca das ações de uma empresa. Os julgamentos podem estar enraizados nas percepções da identidade da firma e nas impressões de sua imagem, mas, muitas vezes, ocorrem como consequência de eventos desencadeadores específicos. Esses eventos podem surgir de ações e erros mais visíveis de uma empresa, como, por exemplo, os que provocam danos ambientais ou violações dos direitos humanos. É por essas e outras razões que há todo um esforço por parte das corporações do capitalismo extrativista, que tem por fim neutralizar os efeitos negativos que a contestação social possa produzir. A esse respeito, é ilustrativo o trecho transcrito a seguir, extraído de uma publicação do ICMM intitulada kit de ferramentas de pesquisa sobre stakeholders.

Os dados sobre reputação podem ajudar a neutralizar as informações que são difundidas no domínio público por grupos de interesse que buscam excluir ou interromper totalmente a mineração. Por meio da seleção cuidadosa do parceiro de pesquisa e do estabelecimento de arranjos de governança robustos para executar programas mais abrangentes de pesquisa de reputação, é possível equilibrar essas discussões públicas acessando os pontos de vista dos cidadãos comuns, por exemplo, em relação à mineração ou a uma determinada empresa para demonstrar que esses grupos de interesse representam segmentos específicos dentro de uma população, ao invés das visões de todos os stakeholders

(ICMM, 2015a, p. 50).

Do mesmo modo, é instrutivo o papel da comunicação diagramática na forja e delineamento dos sentidos e efeitos que as corporações pretendem difundir para toda sociedade e, em alguns casos, diretamente, enquanto em outros, indiretamente, para a própria população atingida. O diagrama disposto na sequência, que compõe o material de divulgação de um projeto da BHP Billiton, apresenta o que seria um processo de reciclagem das vozes comunitárias. A aplicação de surveys, a coleta de dados e a produção de análises são representadas como ferramentas que possibilitam à empresa aprender com a população, para, sentindo e ouvindo de perto as demandas da comunidade lograr construir relações de confiança. A escuta das vozes locais funciona como um meio de municiar a empresa com informações sobre a melhor forma de se relacionar com a comunidade. A apresentação diagramática deste circuito revela, sob forma de engrenagem, a engenharia social que se pretende capaz de transformar a voz crítica em consentimento.7 Por outro lado, o diagrama fabrica novos sentidos sobre o que se pretende angariar com a realização dos levantamentos de terreno e, igualmente, oculta qualquer possibilidade de enunciação das vozes dissonantes ou de manifestação de inconformismo conflitivo advindo das populações atingidas. Como a figuração diagramática extrapola as fronteiras do diretamente representado, bem como se relaciona com aspectos não presentes na imagem-grafia, pode-se afirmar que, na acepção diagramaticamente difundida pela empresa, não há espaço para as vozes locais que se insurgem tanto contra os mapeamentos e pesquisas quanto contra a presença da empresa no território.

Figura 1
Diagrama divulgado em relatório de responsabilidade social empresarial da mineradora BHP

Ao ressignificar a direção e o modo como as vozes comunitárias operam, o diagrama funda e alimenta uma nova verdade, que rivalizará com os sentidos partilhados pela população atingida, mas que na representação diagramática são uma ausência, um não dito ou visto, simplesmente, silenciado e invisibilizado. O caráter didático da representação, elencando e dispondo etapas de um ciclo que se fecha no acordo, aqui simbolizado pelo aperto de mãos, procura difundir uma crença na competência empresarial em minar a capacidade das populações atingidas de afetarem negativamente os negócios da empresa. Isso fica ainda mais nítido quando relacionado com o trecho a seguir, que compõe um documento do ICMM destinado a orientar as práticas das empresas mineradoras.

O método usado deve buscar identificar os stakeholders que são relevantes para sua operação agora e aqueles que serão importantes para sua reputação no futuro. Identificar esses grupos no início do processo é fundamental para permitir que a estrutura de amostragem desenvolvida e o próprio instrumento de pesquisa capturem o nível de associação de tais grupos: é vital analisar esses dados para permitir uma compreensão diferenciada do que os distintos grupos pensam de sua operação, sobre a empresa e a indústria

(ICMM, 2015b, p. 13).

Para além dos diagramas que procuram produzir efeitos de crença na capacidade de captura e domesticação da resistência, há aqueles que se destinam a mapear mais concretamente os riscos de o protesto social afetar a operação das empresas. Ambos funcionam como estratégias ora de obscurecimento, ora de contenção da crítica. Neste segundo caso, na lógica do management, a contestação social não apaziguada se transmuta em um “risco social” que necessita ser mapeado e gerido. Nessa direção, o diagrama apresentado a seguir, da corporação mineradora Rio Tinto, é exemplo do modo como as empresas representam, diagramaticamente, as potenciais ameaças à operação industrial.

Figura 2
Diagrama sobre mapeamento de “risco social” da mineradora Rio Tinto S/A

Os riscos resultantes da insurgência de populações atingidas ganham centralidade na representação das corporações, ao ponto que, dos quatro elementos caracterizados no diagrama da Rio Tinto (figura 2) como sendo de muito alto impacto, dois têm relação com o universo social – “risco com comunidades e outros stakeholders” e “risco operacional e com pessoas”. Para Acselrad (2020), esses mapeamentos de riscos sociais podem ser lidos como descritores de uma espécie de topologia das relações de força, expressando, simultaneamente, um momento de reação à crítica e uma tentativa de reconstrução da implicação positiva e do consentimento da sociedade. Nessa perspectiva, nos projetos empresariais fortemente dependentes de recursos do território, como são os casos em questão, busca-se “gerenciar” grupos sociais com os quais as corporações não possuem necessariamente qualquer relação contratual.

Nessa mesma direção, o diagrama de uma grande companhia petroleira apresentado a seguir (figura 3) expressa as preocupações em conter demandas que potencialmente possam afetar a operação dos negócios. Assim, representa como sendo de elevado poder e interesse o quadrante ocupado por comunidades locais, organizações não governamentais e organismo de imprensa. O manejo atento e interessado dos stakeholders tidos como perigosos ou em condições de produzir afetações danosas adquire particular importância, demandando, na linguagem corporativa, a necessidade de gerenciá-los de perto. Há indicações, igualmente, no sentido de que se mantenham satisfeitos os governantes, reguladores, acionistas e analistas, sem, contudo, especificar o que isso possa ou venha a significar.

Figura 3
Diagrama de mapeamento de stakeholders da British Petroleum

Por outro lado, as diferentes combinações possíveis entre o ato de afetar e de ser afetado não são devidamente apresentadas e avaliadas. Há, pode-se conjecturar, aqueles que apenas afetam, os que apenas são afetados e, ainda, os que, ao mesmo tempo, afetam e são afetados, sendo que, dentre estes últimos, há os que afetam porque são ou acreditam estar sendo afetados. Estes indivíduos ou grupos, que são vistos como capazes de afetar negativamente os projetos empresariais porque se percebem como afetados por eles, tenderão, por certo, a merecer uma atenção particular (Acselrad, 2018). Interessante notar que os empregados são representados como de baixo poder e grande interesse corporativo, bastando, no entanto, mantê-los informados dos planos da empresa que, porventura, possam afetá-los.

O processo de gerenciamento, que ganha, com os diagramas, mais um elemento de força e forma, tem objetivado metamorfosear o “risco social” em ativo social, drenando o poder da contestação e produzindo sua captura por meio da sedução e cooptação de lideranças. Sobre esse aspecto, o diagrama da BHP Billiton, disposto na sequência (figura 4), contribui para elucidar a alquimia que transmuta o risco em ativo econômico mantendo, no entanto, a adjetivação social.

Figura 4
Diagrama sobre engajamento de stakeholders da mineradora BHP

Na retórica empresarial expressa no diagrama, o diálogo com as comunidades é significado como um patrimônio. Dito de outro modo, representa um componente do capital reputacional, tendo em vista que as considerações sobre o “social” passam a ser incorporadas ao ciclo de planejamento econômico-financeiro, integrando-se aos ativos simbólicos e materiais da empresa. Assim, procura-se drenar qualquer possibilidade de contestação que possa vir a afetar a operação dos empreendimentos extrativos. Esse tipo de estratégia é igualmente identificado nos documentos do ICMM, nos quais se lê que é

cada vez mais evidente que a falha em gerenciar com eficácia as questões de direitos humanos e sociais – como parte de um compromisso corporativo mais amplo em relação ao engajamento respeitoso com as comunidades, funcionários e outras partes interessadas – acarreta riscos financeiros, jurídicos e de reputação.

(ICMM, 2012, p. 6)

Breve conclusão

Em um ambiente marcado pela confluência entre a retirada relativa do Estado, a autorregulação empresarial e a contestação das populações atingidas pelo capitalismo extrativista, o recurso à representação diagramática surge como importante ferramenta na promoção dos deslocamentos que impulsionam a continuidade do processo de acumulação e contribuem para a legitimação empresarial. As investidas das corporações extrativistas no campo da representação diagramática visam, portanto, ora obscurecer os conflitos, ora minar o inconformismo das populações atingidas. Embora a crítica represente uma força capaz de produzir ameaça e causar danos simbólicos às corporações, algumas empresas já começaram a fazer da crítica parte de seu próprio vocabulário, apresentando-se, figurativa e esquematicamente, como sendo entes progressistas e socialmente conscientes (Cederström; Marinetto, 2013).

As alterações na configuração e atuação do Estado, em paralelo ao crescimento do tamanho e influência das grandes corporações, têm implicado novas estratégias de legitimação das empresas, sobretudo no campo da exploração extrativista de riquezas naturais em economias periféricas do capitalismo global. A própria literatura do management reconhece como a exposição pública de práticas empresariais socialmente e ambientalmente danosas termina por gerar pressões no sentido de que as grandes corporações ajustem suas atividades às expectativas da sociedade (Brin, 1998). O uso interessado de imagens e diagramas, ao integrar o discurso da “responsabilidade social empresarial” e as estratégias comunicativas das grandes corporações, reflete a configuração de novas geometrias de poder e ideologia, novas realidades do que Ulrich Beck (2002) chamou de “irresponsabilidade organizada” aplicada em particular ao capitalismo extrativo.

  • 1
    Entendemos por capitalismo extrativista o modo de inserção internacional subordinado de economias da periferia do capitalismo global, que têm por base a especialização exportadora em bens intensivos em recursos naturais, a apropriação de rendas extraordinárias por grandes corporações extrativas e financeiras e a submissão ecológica de sociedades periféricas ao capitalismo globalizado (Acselrad, 2023). No caso brasileiro, o processo de reprimarização da economia configurou o modelo de desenvolvimento não só pela ampliação da participação de bens primários na estrutura de comércio exterior, mas também pela crescente subordinação de seus resultados às dinâmicas dos mercados financeiros. As decisões de investimento passaram, assim, a ter em conta não apenas a demanda por bens, mas o rendimento fixado pelo mercado financeiro, submetendo-se, portanto, à instabilidade dos movimentos especulativos e da criação de expectativas fictícias.
  • 2
    O ICMM se descreve como sendo uma organização internacional dedicada a construir uma indústria de mineração e metais segura, justa e sustentável. Reúne 27 empresas de mineração e metais e mais de 35 associações nacionais, regionais. O grande mote norteador da associação empresarial é: “fortalecemos o desempenho ambiental e social e servimos como um catalisador para mudanças, aumentando a contribuição da mineração para a sociedade” (ICMM, 2020).
  • 3
    Stakeholders ou “partes interessadas” são atores sociais tidos como capazes de ser afetados e de afetar os interesses empresariais.
  • 4
    Nas palavras de D’Arcy Thompson (1980, p. 277), a beleza de um frasco de Florença ou de qualquer objeto de vidraria artesanal é sempre deslumbrante, porque seus contornos graduais são, como nos análogos viventes, uma imagem das forças que lhe deram forma.
  • 5
    É essencial reconhecer, como ponto de partida, que a maioria das regulamentações públicas existe porque o comportamento das organizações privadas tem historicamente consequências negativas para o público. Quase todos os grandes acidentes industriais nos últimos tempos envolveram falha regulatória ou a desregulamentação exigida pelos negócios e pela indústria (Perrow, 2015, p. 204).
  • 6
    King e Lenox (2000) indicam, por exemplo, que as fábricas de produtos químicos que aderem aos programas de “Responsible Care” da indústria química estadunidense são menos inspecionadas e poluem mais; portanto, seria correto afirmar que um dos benefícios da regulação privada, neste caso, é realmente possuir mais liberdade para poluir.
  • 7
    O jornal A Sirene - a voz dos atingidos pela barragem – seria um claro exemplo de luta pela preservação do caráter dissonante da enunciação. A publicação é produzida pelos próprios atingidos pelo rompimento da Barragem de Fundão, pertencente à mineradora Samarco, que tem a BHP Billiton no controle de 50% das ações. No dia 5 de cada mês, data que rememora a ocorrência do crime-desastre, a publicação circula com relatos de dificuldades, denúncias de descumprimento de acordos e espaços para troca de experiências entre a população atingida.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Mar 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    05 Nov 2021
  • Aceito
    18 Dez 2023
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