Acessibilidade / Reportar erro

Trilhas de uma história pública: uma conversa com Michael Frisch

Resumo:

Esta é uma entrevista feita com Michael Frisch, historiador estadunidense especialista em história oral, história pública e, mais recentemente, história digital. Formulador do influente conceito de “autoridade compartilhada”, Frisch apresenta, nesta entrevista, momentos de sua formação, inserção em diferentes culturas institucionais e as relações entre história pública e multiculturalismo. Discute, também, o papel da tecnologia na pesquisa histórica sobre a história oral e pública - em meio ao contexto atual, sob os efeitos da pandemia da Covid-19.

Palavras-chave:
História oral; História pública; História digital

Abstract:

This is an interview with Michael Frisch, an American historian specializing in oral history, public history and, more recently, digital history. Formulator of the influential concept of “shared authority”, Frisch presents, in this interview, moments of his formation, insertion in different institutional cultures and the relations between public history and multiculturalism. He discusses the role of technology in historical research on oral and public history - amid the current context, under the effects of the Covid-19 pandemic.

Keywords:
Oral history; Public history; Digital history

O trabalho de Michael Frisch, há pelo menos trinta anos, não é estranho a historiadores que trabalham com fontes orais, com a comunicação pública de seus trabalhos de pesquisa e com os dilemas da história do presente. Seu importante livro A Shared Authority: Essays on the Craft and Meaning of Oral and Public History [Uma autoridade compartilhada: ensaios sobre o ofício e o significado da história oral e pública] foi lançado em 1990, em um momento no qual o próprio cânone dessas práticas estava sendo plasmado. O conceito por ele engendrado - de autoridade compartilhada - tornou-se central para o entendimento da natureza da história oral e, de modo mais amplo, da dimensão participativa da pesquisa e da atuação do profissional de história.

Desde então, Frisch tem refletido criticamente sobre os aspectos práticos, políticos e poéticos na construção de saberes sobre o passado. A memória social, a escrita histórica como produção cultural e o papel da diferença na pesquisa e no tratamento de fontes são alguns de seus temas clássicos. Mais recentemente, seu olhar arguto tem sido dirigido às implicações da revolução digital sobre o saber histórico, à vasta produção de imagens na contemporaneidade, ao potencial da cartografia informacional e de outras ferramentas informáticas como aliadas do historiador. São reflexões que acompanham práticas comprometidas, que vão do desenvolvimento de softwares e aplicativos à ocupação da cena artística: com a The 198 String Band, por exemplo, Frisch desenvolve concertos musicais baseados em documentação histórica.

A conversação aqui apresentada reflete essa multiplicidade de olhares e criações - e reflete também a generosidade e a curiosidade genuína de Frisch no acompanhamento da história pública praticada no Brasil. A primeira parte da conversação, oral, foi gravada em 2012, em diálogo com Ricardo Santhiago, ocasião em que esteve em São Paulo como conferencista do primeiro Simpósio Internacional da Rede Brasileira de História Pública. A segunda parte, escrita, foi preparada em 2023, em diálogo com Juniele Rabêlo de Almeida, depois de outras visitas (inclusive no 4º Simpósio Internacional da Rede Brasileira de História Pública, em 2018, realizado em São Paulo simultaneamente ao 5º Encontro Anual da Federação Internacional de História Pública) e muitos diálogos cultivados no campo comum de interesses de seus interlocutores.

Em conjunto, as duas partes da conversação, que temos o prazer de compartilhar, exibem um historiador verdadeiramente afeito ao diálogo, à inventividade e à busca por garantir fórum público à reflexão histórica, dando consequência à sua relevância.

Ricardo Santhiago & Juniele Rabêlo de Almeida: Para começar, gostaríamos de entender como você se tornou o historiador não ortodoxo que é. Pode nos falar sobre a sua formação e influências?

Michael Frisch: De certo modo, é a história de como me tornei menos ortodoxo do que quando comecei. A origem foi relativamente convencional. Quando cheguei à universidade, tinha ideias vagas sobre o que queria fazer. Na verdade, fiz um ano preparatório para medicina pensando em me tornar médico, o que abandonei rapidamente. Vagueei por um tempo na universidade, tentando definir uma área de concentração, e por fim terminei na história, onde me senti bem. Teria trocado por música, mas não estava muito claro o que poderia fazer com isso. Nessa época a graduação costumava durar quatro anos, e a ideia de prolongar os estudos soava estranha, de modo que fiquei com a concentração em história, sem uma direção muito definida. Foi quase por acidente que ingressei na pós-graduação.

Candidatei-me a pós-graduações nos Estados Unidos e só fui aceito em uma, muito boa, Princeton, mas que na época não era assim tão conceituada em American history [história norte-americana]. Era uma área frágil do programa. Contudo, era um momento em que essa universidade estava bastante preocupada em conseguir mais professores e com o fato de muitos alunos não terminarem a pós-graduação. A solução, já que se tratava de uma rica universidade da Ivy League, era dar dinheiro para as pessoas. Todos os que eram aceitos recebiam uma bolsa de quatro anos, e assim acabei por ingressar em um programa de pós-graduação.

A essa altura, minha única outra influência tinha sido, na adolescência, um tipo muito interessante de colônia de férias, uma espécie de projeto social para adolescentes. No século XIX houve nos Estados Unidos um movimento utópico chamado shakers. Era uma sociedade religiosa comunitária, e uma religião bem estranha. Eram cristãos, mas não admitiam a propriedade privada, viviam em comunidade, tinham vinte ou trinta pequenas comunidades, que chegaram a ser mais de seis mil em determinado momento, um movimento muito bem sucedido e duradouro - e que, de certa maneira, ainda existe. Eles tiveram grande influência nos trabalhos artesanais nos Estados Unidos. O projeto de que participei era basicamente restaurar um dos vilarejos e tentar extrair lições dessa história - não lições religiosas, mas lições sobre compromisso social, sobre a dignidade do trabalho e sobre como isso era importante numa sociedade onde os jovens não têm oportunidade de realizar trabalho com significado. Era como uma versão secular progressista da ética religiosa shaker. Participei desse projeto e me influenciou muito. Na universidade, o meu trabalho de conclusão de curso - tive acesso a uma enorme quantidade de documentos - foi sobre a história dessa comunidade e como negociaram o fato de estarem perdendo atratividade e de terem que lidar com decisões políticas complicadas entre ampliar o seu poder de atração ou tornar-se mais puros. Foi a minha primeira pesquisa efetiva com fontes primárias. Quando entrei na pós-graduação pensei que faria isso, que lidaria com coisas que tivessem a ver com trabalho artesanal, artesãos, trabalho, mas gradualmente isso se modificou e acabei por lidar com o que era denominado “história urbana”, campo em que desenvolvi o projeto para a minha tese de doutorado. O que me movia de fato era o desejo de sair da universidade. Estava cansado de ficar trancado numa biblioteca. Assim, envolvi-me com estudos de comunidade e escolhi uma cidade na Nova Inglaterra - havia grande interesse em entender como as cidades cresciam e se desenvolviam -, um lugar chamado Springfield, em Massachusetts, onde fiz minha tese, e me levou para o mundo.

A partir dessa trajetória, embora houvesse várias influências, era uma época de grandes oportunidades acadêmicas. Não era problema conseguir emprego e acabei por ir para [a Universidade de] Buffalo, na época muito excitante, em expansão, e nova. Tinha sido uma universidade privada e fora encampada pelo Estado, sendo parte do sistema crescente de Nova York. Era experimental, tinha muita energia, e parecia um ótimo lugar para se estar. Se tivesse ficado apenas nisso, teria me tornado um acadêmico interessante, mas bem convencional, nesse excitante campo novo da história urbana. O trabalho era bom e a minha tese tornou-se um livro que foi bem recebido. Parecia ser um caminho satisfatório.

Mas o que também aconteceu em Buffalo foi que passei a fazer parte de um programa de American studies, que tentava ser diferente dos programas acadêmicos convencionais. Eram pessoas vindas de Yale que buscavam uma oportunidade de fazer coisas originais, e sugerimos a ideia de um programa mais internacional. Estar no “American” studies significava que era preciso saber algo sobre o resto do mundo, ir a outros lugares e vivenciar um conjunto bem diferente de realidades culturais. Rapidamente transformou-se no lugar da nossa universidade que agregava as mais diversas heterodoxias, um guarda-chuva sob o qual se desenvolveu um dos primeiros programas de women’s studies [estudos sobre mulheres], um que começou como um Puerto Rican Program [Programa de Porto Rico], e que logo virou um programa sobre o Caribe e o hemisfério. O que provavelmente foi mais significativo era estarmos em uma região com várias reservas de indígenas iroqueses. Desse modo, tornou-se o ponto de partida para um programa indígena, desenvolvido inicialmente por estudantes indígenas, um dos quais veio a ser um dos principais intelectuais indígenas no mundo, John Mohawk. Ele recrutou um homem bastante famoso, Oren Lyons, um chefe da nação Onondaga, que era parte da Confederação Iroquesa. Oren virou de fato uma das vozes mais respeitadas de representação dos povos indígenas americanos na comunidade global de povos indígenas, que ganhou grande expressão nas Nações Unidas e em outros fóruns, estando sempre muito envolvido. Fez uma apresentação importante na Conferência do Rio [1992] sobre ecologia global. Ou seja, tínhamos uma constelação extraordinária de pessoas no nosso pequeno programa em Bufallo.

Havia mais: por causa da atmosfera política da época, era um programa que estava bastante comprometido e cada vez mais envolvido em fazer com que os estudantes fossem para as comunidades, desenvolver trabalho ativista. Quando se junta isso tudo, ao cabo de vários anos - porque eram dois departamentos diferentes -, parecia que eu tinha uma identidade acadêmica esquizofrênica: uma parte de mim estava num departamento de história ortodoxo e convencional, onde eu era respeitado embora fosse visto como um tanto excêntrico, e a outra parte estava no programa de American studies, cheio de pessoas muito mais radicais do que eu e fazendo essas coisas bem heterodoxas na universidade, pensando pela primeira vez sobre povos nativos, ou women’s studies, ou complexidade bilinguística, todo o tipo de coisas. Durante um bom tempo senti-me de fato dividido. Demorei a dar-me conta que talvez não houvesse tanta cisão assim. Eu era uma única pessoa.

Por volta dessa época, lidei com o que se tornou o livro Portraits in Steel [Retratos em aço] [publicado em 1993], que é sobre metalúrgicos, juntamente com o fotógrafo Milton Rogovin (Frisch, Rogovin, 1993FRISCH, Michael; ROGOVIN, Milton. Portraits in Steel. Ithaca, NY: Cornell University Press, 1993.). Era história oral, mas fundada em história urbana. Penso que nessa altura comecei a sentir-me bem mais confortável com o fato de a minha história estar se tornando um pouco mais heterodoxa - a gente passa por uma série de encruzilhadas e nem sequer tem noção de estar fazendo escolhas. À medida que me envolvia mais profundamente com história oral, e o que estava escrevendo repercutiu bastante, essa tornou-se cada vez mais o centro [do meu trabalho]. Todavia, às vezes há uma tendência, na história oral, de sermos tão românticos em relação à voz do sujeito que nos esquecemos de que é realmente útil saber o que mais sabemos sobre a história, para além do que as pessoas podem dizer sobre ela, para que possamos medir a diferença entre a memória e o que é conhecido de forma mais objetiva em alguns casos. É dessa maneira, penso, que [história formal e história oral] tendem a se aproximar um pouco mais.

RS & JRA: O conceito de “autoridade compartilhada” que você desenvolveu para a história oral é diferente da visão romantizada de “dar voz aos sem voz”. Como chegou ao estabelecimento desse conceito?

MF: Diria que por acidente. Ou, dizendo de outra forma, porque se liga àquilo de que falamos, parece-me engraçado que com frequência as pessoas o coloquem sob o rótulo de “teoria” quando tentam me enquadrar. Muitas vezes não tenho clareza sobre o que isso significa e vejo que a teoria é empregada de várias maneiras estranhas no discurso intelectual atual, mas, para mim, o interessante sobre essa reinvindicação é o grau em que tudo o que eu tinha a dizer nesse livro e cada resposta que eu poderia dar à sua pergunta vem mais da prática e menos do intelecto. Ou seja, se eu tivesse sido capaz de pensar sobre isso de maneiras que fossem úteis, teria sido bacana - mas o começo foi fazer alguma coisa. Ou alguma coisa acontecendo - e posteriormente demandando reflexão -, ao invés de se iniciar como uma abstração.

Para ir mais diretamente ao ponto, há alguns marcos - alguns dos quais estão no livro,1 1 O livro que congrega os aspectos mencionados nesta resposta e onde Frisch inicialmente conceitua a ideia de “autoridade compartilhada” é: A Shared Authority: Essays on the Craft and Meaning of Oral and Public History (Frisch, 1990a). mas podem ser sintetizados numa história, na verdade, numa história engraçada. Temos estudantes de pós-graduação muito mobilizados, e havia um grupo em que eram todos trostkistas. Nessa época, isso [significava] estar envolvido num tipo de organização de alto nível - e eles eram muito disciplinados. Um pouco malucos, mas muito disciplinados: tinha-se que fazer as coisas acontecerem. Então decidiram criar uma revista, saíram à procura e conseguiram algum financiamento. Encontraram alguém para fazer a impressão e para angariar assinaturas. Venderam assinaturas pelo mundo todo, antes mesmo do primeiro número. Cada número teria um foco específico. O primeiro era essencialmente sobre esse trabalho pioneiro com coisas nativas - sobre indígenas. Decidiram chamar a revista Red Buffalo [Búfalo Vermelho] - significando, é claro, que estávamos em Buffalo e eles eram Vermelhos, Comunistas, mas eles também estavam lidando com indígenas, “peles-vermelhas”.

Eram tão organizados que bibliotecas em todo lugar do mundo tinham uma assinatura da Red Buffalo, mas eles só produziram dois números. O segundo foi sobre história oral. Eles não sabiam nada sobre a Oral History Association [Associação de História Oral], mas sabiam que havia interesse em algo chamado história oral - e tentaram fazer com que todo mundo contribuísse. Eu era um dos professores do programa, nunca tinha tido qualquer ligação com história oral, e pediram-me que escrevesse alguma coisa para a revista. Eu disse: “Bem, não tenho nada a escrever sobre isso.” Foi então que me dei conta de que estava, nesse momento, lendo o livro de Studs Terkel sobre a Grande Depressão para minhas outras aulas. [Esse livro] tinha saído há pouco tempo. Eu disse, “Bem, eu estou lendo Hard Times [Tempos Difíceis], é uma história oral da Grande Depressão, eu poderia escrever uma resenha-ensaio.” Foi assim que acabei por escrever esse artigo, que chamou bastante atenção. Ron Grele meio que me levou para o circuito dos historiadores orais, [o livro] chamou a atenção de [Alessandro] Portelli - e essa foi a entrada: “Aqui está esse cara, e ele está dizendo coisas interessantes.” Sempre brinco com amigos que a maneira de se tornar realmente famoso é escrever um artigo bem bom em algum lugar que ninguém consegue encontrar. Foi o primeiro trabalho sobre autoridade compartilhada e meio o que me conectou com o campo da história oral. Em determinado momento você se diz “Bem, se as pessoas estão achando o que eu digo tão proveitoso, provavelmente é um lugar interessante onde produzir mais coisas”.

Para voltar à pergunta sobre a ideia de autoridade compartilhada - então, eles estão produzindo esta revista sobre história oral e encarregam uma pessoa, acho que em Wisconsin, de escrever uma introdução. Era amigo deles, mas não trotskista. Quando estavam fechando o número, leram essa introdução e acharam-na péssima. Era o tipo acabado de visão ingênua e romantizada - “a sabedoria das pessoas”, “história oral é sobre deixá-los guiar-nos” etc., nessa linha. Eles a consideraram muito problemática e escreveram uma introdução de refutação. A revista saiu com duas introduções - a outra era a crítica deles da falsa consciência, recorrendo muito a Althusser para falar sobre os problemas de aceitar o que quer que as pessoas - se oriundas de um sistema de dominação e opressão - digam, como tendo, de certa forma, um valor de “verdade”. A tensão era realmente interessante. Pensei muito sobre isso. Também, no ensaio sobre Terkel - lembro-me literalmente onde estava sentado, olhando para a contracapa [de Hard Times] e para os “blurbs”, os pequenos comentários na contracapa. Tinha acabado de ler o livro e todos meio que diziam “oh, esta é a voz do povo; escutem essas vozes, foi assim que as coisas aconteceram realmente”. E eu disse: “Isso é um disparate [uma besteira]. Não foi isso que eu li nesse livro”. Pensei na posição assumida pelo próprio Terkel, extremamente atento a como as pessoas foram arrasadas pela Grande Depressão e como, no enunciado das suas memórias, havia toda essa dor, essa sensação de ter perdido a juventude, raiva, diferenças geracionais, e pessoas que trabalharam muito duro para que seus filhos tivessem as oportunidades que lhes faltaram, mas foram profundamente marcadas por essa realidade. Pensei muito em lições políticas sobre como fracassos sociais são internalizados como fracassos individuais, e as pessoas que sentiram que de certo modo tinham falhado, e não que a sociedade tinha falhado com elas. A minha perspectiva política na época era sintonizada com isso, mas pensei “Uau, coisas muito pesadas emergem por meio dessas memórias”. Aí olho a contracapa e simplesmente não se demonstra nenhum interesse por isso! Tudo o que dizem é “esta é a voz do povo”, quão “fantástico,” “inspirador,” “nobre...” Para mim, o livro soou bem deprimente. Essa é realmente a mesma tensão entre a visão romântica e a visão crítica. Ou seja, de certa maneira tudo se originou da experiência com esses trotskistas, nesse pequeno ensaio sobre Studs Terkel.2 2 Republicado como “Oral History and ‘Hard Times’: A Review Essay” (Frisch, 1990b, p. 5-14). Um artigo mais recente, onde Frisch analisa o trabalho de Studs Terkel, defendendo que seja reconsiderado no âmbito da história enquanto disciplina, é “Studs Terkel, historian” (Frisch, 2010). Ainda não era bem “autoridade compartilhada”, mas era sobre como a história oral não é apenas uma janela para a experiência efetiva de uma outra época - é uma janela bem complicada.

Provavelmente a peça seguinte nessa história foi um artigo para o The New York Times Magazine sobre desemprego em Buffalo. Tinham pedido a Studs Terkel para escrevê-lo, mas ele não se interessou. Então pediram-nos, ao American Studies Program, para produzir o artigo. Era bem interessante. Acontece que, como relato no artigo, acabamos por ter uma briga enorme em torno da edição dos textos com o New York Times. Enviamos para publicação e precisava ser reduzido em, sei lá, 30%. Produziram a versão deles e alguma coisa parecia errada com essa versão, por isso insistimos no direito de produzir a nossa versão, porque tudo o que tínhamos feito era editá-la, não escrevêramos mais nada. Não entenderam por que tanto barulho, mas acabaram por concordar. Aí, dois anos mais tarde, um de meus estudantes e eu encontramos a versão e produzimos uma espécie de análise da edição deles. O que ajudou a condensar várias dessas ideias. A questão é que a diferença entre as edições estava longe do que esperáramos: não era de ordem política (que nós fossemos mais “de esquerda” e eles mais “de direita” - na verdade era uma espécie de “radical chique,” eles queriam trabalhadores mais “zangados”). A diferença efetiva é que, enquanto jornalistas, eles eram muito impacientes, diziam o tempo todo “Isto é somente jornalismo. Nós não estamos fazendo julgamento de valor, só nos interessa que seja um bom artigo”. Em última análise, quase todas as decisões que queriam tomar sobre o que cortar do artigo incidiam sobre trechos onde as pessoas estavam sendo reflexivas ou analíticas. Onde estavam sendo historiadoras. Onde diziam “Eis o que penso que está acontecendo”. Eles [os editores da revista] repetiam, “Nós estamos interessados no que aconteceu com eles”. A conclusão a que chegamos foi que, na abordagem deles, o objetivo da história oral era apenas prover esta experiência em bruto que eles - e, por extensão, seus leitores cosmopolitas - fixariam. Serve-se como se fosse um tipo de pornografia. Queriam dor, queriam um rompante de emoção autêntica, com a postura implícita de que “então nossos leitores compreenderão”. Passamos a pensar sobre isso como “problema do brunch de domingo”: queriam servir essas histórias de Buffalo como canapés de bagels com salmão. E as pessoas, quando as entrevistamos e conversamos com elas depois, sentiam como se estivessem sendo convidadas para o brunch: havia coisas que queriam dizer, sentiam que podiam com os leitores, e não estavam nem um pouco perturbados com isso. Tinha tudo a ver com a alocação da autoridade interpretativa e se história oral é apenas material bruto [matéria-prima]. Foi uma experiência muito marcante.3 3 Republicado como “Oral History and the Presentation of Class Consciousness: The ‘New York Times’ v. The Buffalo Unemployed”, em Frisch (1990c, p. 59-80).

Entre o artigo sobre Studs Terkel e isso, emergiram várias outras coisas que estão no livro, ligadas ao meu trabalho de história, no qual eu começava a trabalhar mais com exposições museográficas, e gradualmente todas essas coisas começaram a se juntar. Mas foi só quando tive ocasião de reunir tudo para o livro que me dei conta de que havia bastante consistência. Então foi bem excitante quando tive que decidir o que entraria na coletânea, e tive que escrever uma introdução, e a teoria emergiu. É daqui que proveio toda a ideia de autoridade compartilhada. Os intelectuais ainda têm um papel. É realmente importante continuar a fazer pesquisa historiográfica efetiva. Mas pode haver esse diálogo com pessoas que trazem para a discussão um nível diferente de experiência.

RS & JRA: Alguns indivíduos podem não querer que a autoridade seja partilhada nesse nível mais profundo - entrevistados que se dispõem a contar suas histórias, mas não querem participar do processo de pesquisa. Quando se traz pessoas demais para a cozinha, como na metáfora que usou ainda há pouco, acontece acabar-se sem pratos suficientes para servir. Assim, quão bagunçada pode ser a cozinha da história pública?

MF: Provavelmente é aqui que meu desejo entra - pensar que sempre haverá um diálogo claro, construtivo. Portanto: algumas vezes está implícito, em outras vai depender de como lemos os documentos. Por exemplo, quando produzia o meu livro sobre metalúrgicos, estava muito na moda dizer que se queria que todos os sujeitos se envolvessem na edição. Então envidei um esforço grande nesse sentido. De um modo geral, percebi que essas pessoas eram trabalhadoras e sua atitude era “Esse é o seu trabalho; não é o nosso trabalho. Você edita e a gente olha o que você fez”. Às vezes corrigiam termos técnicos, mas de fato não tinham qualquer problema com a ideia de que, de certa forma, era eu quem estava fazendo julgamentos sobre o que era mais relevante ou não. Não é que não tivessem oportunidade de fazer isso. Entreguei-lhes tanto as entrevistas completas como as versões editadas. Na maioria dos casos, isso não lhes interessava. Leram e ficaram satisfeitos com o que leram e como isso os representava.

Há uma história famosa que talvez esteja relacionada a algumas das políticas de que estamos falando. Havia um pesquisador chamado Jeremy Brecker, um dos criadores de uma espécie de “história pública de esquerda”. Trabalhou muito com comunidades industriais e criou projetos, sobretudo em Connecticut, envolvido com os trabalhadores deslocados da região, e organizava exposições. Ele então produziu um livro muito bom chamado Brass Valley, que tem história oral e um desenvolvimento colaborativo das exposições da comunidade, para tentar processar a experiência de fechamento das fábricas (Brecher, Lombardi, Stackhouse, 1982BRECHER, Jeremy; LOMBARDI, Jerry; STACK­HOUSE, Jan. Brass Valley: The Story of Working People’s Lives and Struggles in an American Industrial Region. Philadelphia: Temple University Press, 1982.). Tinha uma história, que eu o ouvi contar: ao modo típico de um historiador oral progressista de esquerda, preocupava-se muito com não explorar as pessoas, então enfatizava constantemente o quanto queria restituir à comunidade. E contava como um desses trabalhadores em determinado momento se virou para ele e disse “Dá para você parar com essa história de ‘restituir?” Porque parece que você está tentando me pagar. Eu lhe dei a entrevista de presente. Não quero ser pago por isso. Sinto-me feliz de dá-la para você. Cada vez que tenta devolver alguma coisa, me faz sentir que você está pagando. Isso desvaloriza meu presente. Não estou pedindo nada”. Foi uma pequena discussão bem tocante. James disse: “Então aqui estou eu, o grande cara de esquerda, e ele mostra que eu estava caindo na armadilha capitalista do valor de troca. Eu pensava que estava transcendendo a economia de mercado, quando na verdade a estava recriando; foi preciso esse trabalhador dizer ‘Dá para você calar a boca? Eu só quero lhe dar um presente’”. Pensei muito nisso quando estava produzindo o meu livro sobre metalúrgicos. Esforcei-me ao máximo para garantir o respeito por eles e seu envolvimento no processo, mas ao fim e ao cabo eles estavam dando um presente: “A minha habilidade é na usina siderúrgica, a sua é no trabalho com essas entrevistas”.

RS & JRA: Os jornalistas podem partilhar muitas das ferramentas dos historiadores que trabalham com história oral e pública. O público consegue se dar conta das diferenças entre o que é produzido por esses profissionais?

MF: Não sei se é algo absoluto, porque existem muitos tipos de jornalistas e muitos tipos de historiadores que lidam com história pública, de modo que pode haver muita sobreposição. Mas, de um modo geral, penso, no nível mais básico, que o jornalista, por definição, tem um foco mais imediato. Podem lidar com alguns antecedentes, mas eles não têm muito interesse em detalhar o contexto mais amplo. Quando estava produzindo o livro sobre metalúrgicos, tivemos muita dificuldade para conseguir uma editora. Em parte porque era muito caro reproduzir as fotografias; e o fotógrafo insistia bastante em que tinha que ser uma boa reprodução. Mas outras coisas assustaram vários editores, e uma delas diz respeito a esse ponto.

Eu estava trabalhando com as fotografias, algumas das quais tinham sido tiradas antes, que mostravam as pessoas no trabalho. A ideia central do livro era acompanhar pessoas desde o tempo inicial das fotografias, a década de 1970, quando trabalhavam nas usinas siderúrgicas, até quando não trabalhavam mais nas usinas. Assim, cada entrevista começava com a fotografia deles no trabalho. Parecia natural que eles descrevessem o que era seu trabalho, o que estava acontecendo, de modo que só chegávamos às perguntas jornalísticas, sobre a reação ao fechamento da usina, o que faziam no presente, como encaravam isso, depois de uma ou duas horas de entrevista. Na proposta do livro, enfatizamos que seriam entrevistas relativamente longas, de modo a apresentar essa dimensão integral do contexto da passagem das fotografias para a realidade. Para vários editores isso não fazia sentido nenhum. Um deles me disse - foi um momento muito revelador - “Eles não estão mais nesses empregos, então quem se interessa por detalhes sobre o que faziam na indústria siderúrgica? Não tem nada a ver com a reação deles a perderem seus empregos”. Eu disse, “Bem, penso que tem tudo a ver com quem eles são”. [Outro editor] disse, “Ficaremos contentes em publicar se cortarem todos aqueles trechos e nos passarem apenas a parte que trata da perda do emprego”. E nisso nós não estávamos interessados.

Ou seja, em termos da natureza do jornalismo, a pressão é por ser muito mais objetivo e apresentar a história de maneira direta. Mas também há vários jornalistas que, quando se dedicam a uma história, decidem escrever um livro. Basta pensar em alguém como Robert Caro, o biógrafo de Lyndon Johnson, que está no quarto volume sobre Lyndon Johnson. Então parece-me que as diferenças não estão aí [na profissão], mas na ênfase no imediatismo do trabalho jornalístico.

RS & JRA: Você afirmou que toda a sua teoria decorreu da prática. O seu livro A Shared Authority tornou-se um cânone no campo da história oral. Algumas pessoas diriam que o cânone ainda é o mesmo da década de 1990. É possível falar em “novidade” quando se trata de história oral?

MF: Penso que isso está começando a acontecer. Quero voltar um pouco e dizer que não é que toda a teoria foi produzida, tornou-se inteiramente dominante e ninguém está mais produzindo teoria. Parece-me que uma coisa que aconteceu é que muita teoria passou para outras áreas, de modo que parte dessa energia deslocou-se da história oral como um campo restrito para o tema mais geral de como textos culturais são produzidos. Na minha perspectiva, o que acontece agora é que boa parte dessa teoria está de certa forma descorporificada. Uma das coisas realmente interessantes, um lugar onde buscaria o tipo novo de produção de síntese, seria retraçar o melhor de parte dessa energia teórica. Walter Benjamin, por exemplo. Encontram-se muitas citações de pessoas como ele - parte disso é mais antigo, mas muito está sendo produzido agora: teoria transnacional, assuntos ligados ao fluxo cultural… Muita coisa está acontecendo nessas áreas e a história oral ainda não se beneficiou muito disso. E, de certa maneira, isso é necessário.

Penso que as pessoas prestam um desserviço à história oral quando refletem sobre a teoria em termos formais: ou não tem nada aí ou [a coisa] apenas é colocada para disfarçar/dissimular. Se tudo o que fazemos é escrever “como diz Pierre Nora, les lieux de mèmoire” para depois falar sobre um lugar em South Carolina, não é claro que isso seja necessário. Podemos perfeitamente falar sobre South Carolina por nós mesmos. Mas isso é o que, com frequência, acontece com a teoria. Penso que precisamos situar a história oral um pouco mais no contexto de outros tipos de teorização. A história oral, na sua complexidade, é sobre cultura. É sobre como as pessoas habitam e representam o seu mundo. Com certeza há bem mais o que dizer sobre isso e a história oral oferece esta base fundada na experiência real.

No meu seminário, por exemplo, com frequência tenho alunos vindos do departamento de inglês, ou de literatura comparada, onde são cheios dessa teoria. Muitos desses mesmos assuntos andaram pela história oral por um tempo, normalmente numa linguagem menos elaborada, sem serem apresentados de forma teórica, e essa interface poderia ser muito produtiva: a relevância da abordagem da história oral é que as questões não apenas derivam da prática, mas são encontradas na sua prática. Fazer uma entrevista requer um entendimento bastante sofisticado sobre como o sentido está sendo construído, como é trocado e como suas fronteiras estão sendo definidas. Tudo isto está presente em boa parte da teoria cultural sobre como textos são criados, sobre memória coletiva, mas penso que ainda não encontramos as melhores maneiras de agregar essas coisas.

RS & JRA: Passando da história oral para a história pública: como a definiria? Encara-a como um impulso, uma área, uma prática? Ou é melhor não buscar uma definição?

MF: Não tenho muita clareza - um pouco como [acontece] com a história oral. Sempre começo o meu curso dizendo que não deveríamos oferecer cursos como esses porque há a tendência a transformá-los em áreas de especialização, e quando menos se dá por isso requer-se um “diploma” ou um “certificado”. Costumo contar a história de uma pessoa que veio à minha sala implorando participar do meu seminário em dado semestre. Por quê? “Então, é porque o meu avô está com 97 anos, doente, e eu realmente preciso entrevistá-lo. Preciso fazer o curso agora, para estar preparado.” Eu disse-lhe algo como: “Posso lhe passar uns textos para ler, mas vá entrevistar seu avô, provavelmente dará tudo certo.” Existe esse perigo com boa parte da história pública - a ideia que é preciso ter tido treino e feito a disciplina, e isso conduz a um caminho que sugere profissionalização, diplomas, controles. Então, em parte, sou resistente a isso.

História pública é complicada nos Estados Unidos e tenho certeza que aqui [no Brasil] também pode significar muitas coisas diferentes: desde pessoas que trabalham para grandes corporações a pessoas que trabalham em agências governamentais, de qualquer pessoa que trabalha num museu a professores de escolas públicas. Ou seja, pode haver um limite para o que se ganha simplesmente incluindo tudo sob esse “guarda-chuva”. Mas, dito isto, há algo mais amplo: para mim, o eixo central é a ampliação da discussão sobre história. Ligado a isso, a visão que o trabalho intelectual pode se tornar um recurso público por meio do qual a experiência comum pode ser trazida para uma conversa mais ampla que beneficia a todos. Aqui entra meu lado romântico: que as pessoas são de fato capazes de se comunicar. Essa é a minha orientação central e acho que, em si, permanece. Não é que tenha sempre que ser um diálogo entre um historiador progressista e uma comunidade de classe operária. Pode ser no âmbito de empresas! Conheço algumas pessoas que se estabeleceram confortavelmente como historiadoras ou historiadoras em história pública no seio de indústrias ou agências governamentais, já que [não fosse por elas] não haveria uma memória. A memória institucional com certeza não está nas atas das reuniões. As pessoas são transferidas para outra filial, e ninguém minimamente se lembra por que decidiram construir uma fábrica em Belize e se isso foi ou não uma boa decisão. Há um sentimento geral que ter um panorama mais amplo, em vez de estar preso no presente, é algo importante, e que a história pública pode ser bem valiosa em relação a isso, em vários níveis e sentidos. Para mim, se a questão central permanece - ter certa consciência histórica que é uma parte mais ampla da experiência social -, então é uma boa fundamentação, e pode justificar qualquer teorização e mesmo formas organizacionais que estejam em jogo.

A outra coisa sobre a qual gostaria de comentar é que isso emerge em um período de intensa fermentação política. Creio ser amplamente reconhecido que, apesar do trabalho universitário e acadêmico em grande medida permanecer - com certeza no nosso contexto -, mais progressista e de esquerda do que nunca, ainda assim há grande consciência de que tem se tornado mais isolado, autocentrado e desconectado, as pessoas falando para si próprias e reforçando a sua visão de mundo, o que é surpreendente, após um período de envolvimento bem maior. Esta é uma das razões por que precisamos hoje desse tipo de sensibilidade geral da história pública. Boas exposições museais, filmes documentais, todos os tipos de coisas, têm a capacidade de chegar até as pessoas. Há um potencial na história pública para que o diálogo se torne efetivamente interessante.

RS & JRA: Um pesquisador deveria interessar-se em perseguir algum tipo de “história pública internacional”? Um cidadão estadunidense se interessa, por exemplo, por história do Brasil ou história de qualquer país estrangeiro?

MF: O que diria, de imediato, é que há elementos partilhados em qualquer situação de história pública: questões de tradição, questões de quem tem interesses, e o que ocorre a partir daí. Isso ofereceria um ponto de conexão. Ou seja, mesmo se o contexto é completamente diferente, pode-se reconhecer tipos de constelação de forças e ter meios de conexão. Caso contrário, se apenas pego um livro sobre história do Brasil, tudo - a menos que seja um tópico particular sobre o qual estou muito interessado - é um pouco mais difícil. Um amigo meu em Nova York, chamado Daniel Walkowitz, coeditou dois grandes volumes especificamente sobre os problemas da história pública no tocante a nações em transição (Walkowitz, Knauer, 2004). Penso que funciona porque qualquer pessoa pode lê-los! Não sei absolutamente nada sobre a Escócia ou a Bolívia, mas se determinado problema já foi abordado nesses lugares, passa a ser interessante observar como isso se deu. Como é que narramos a história das guerras sujas na Argentina? E Ruanda? E Brasil? Para mim, esse é o fundamento para uma história pública transnacional: aspectos que se podem abstrair com facilidade, com relação a tradição, mudança, poder, participação. Escrevi em algum lugar “teoria é como usar a embreagem quando se está dirigindo”. A teoria é o que permite passar de uma marcha para a outra. Quando se aciona a embreagem, pode-se cambiar - ou seja, quando se tem a teoria pode-se ir do Brasil aos Estados Unidos, dos Estados Unidos à África do Sul, da África do Sul ao Vietnã. Portanto, a teoria é essencial para não se ficar aprisionado em qualquer contexto em que se esteja. Mas talvez uma maneira de expressar isso seja que boa parte do trabalho acadêmico é como quando se pressiona a embreagem e nunca mais se solta. Acho que é uma metáfora bem útil. Essa é a direção que sugeriria para alguém trabalhando com história pública internacional: procurar pelos elementos passíveis de tradução. Estou só pensando alto a respeito, mas a pergunta sobre história pública e assuntos internacionais e a outra pergunta sobre qual é a geração seguinte de teoria em história oral podem estar de certa forma ligadas.

*

RS & JRA: Agora, em 2023, após 11 anos dessa primeira entrevista concedida, quais são seus principais interesses de pesquisa nos últimos anos? Você pode falar um pouco sobre sua pesquisa atual em busca de novas formas de software digital para documentação em áudio e vídeo? Como está o processo de desenvolvimento deste software? E o que pode significar este software para o discurso historiográfico, tanto acadêmico como público - em meio aos impactos da “pandemia de Covid-19” nas práticas de história oral e história pública?

MF: É interessante para mim ler hoje esta entrevista coloquial com Ricardo Santhiago, gravada na minha primeira visita a São Paulo, nos idos de 2012. Estava lá como orador principal de um congresso, no lançamento do que acabou por se tornar uma importante comunidade de história pública no Brasil.4 4 Essa conferência, revista, está publicada como: “A história pública não é uma via de mão única, ou, De ‘A Shared Authority’ à cozinha digital, e vice-versa” (Frisch, 2016, p. 57-71.). Não só a entrevista ocorreu há mais de dez anos como o foco ia ainda mais para atrás: Ricardo e eu conversamos sobre como um historiador com formação tradicional, num departamento tradicional de história, tinha, quase por acidente, vindo a se transformar através da prática progressiva na história oral e na história pública. Tratamos de uma gama de projetos e envolvimentos, e de como as reflexões sobre essa prática resultaram na coletânea de ensaios de 1990, A Shared Authority: Essays on the Craft and Meaning of Oral and Public History. De algum modo esse livro sobreviveu como um marco na área - pelo menos o título (não tenho tanto certeza sobre o quanto é de fato lido e, embora ainda esteja disponível para compra, sei que nunca chegou perto de ser um best seller!)

É claro que é gratificante que A Shared Authority pareça ter ajudado a condensar um discurso útil que tem continuidade, donde o foco da entrevista com Ricardo. Também é gratificante que uma conversa sobre isso, há mais de uma década, ainda valha a pena ser publicada nos dias que correm. Mais gratificante ainda, embora também desafiador, é que eu tenha sido convidado agora a escrever um posfácio, atualizando minha trajetória de trabalho desde essa conversa e congresso em 2012.

Talvez não seja surpreendente que os contextos de então e agora estejam estreitamente ligados. Temos sorte quando topamos com algumas ideias realmente boas no centro da nossa carreira profissional, e comigo esse com certeza foi o caso. Ou seja, quanto aos pontos mencionados, a questão é simples: o que tenho feito desde então é bem, bem diferente, em novas formas e modos, do ponto de vista tecnológico e não só. Mas, em termos de impulsionar sensibilidades e ideias, têm sido variações, algumas mais dramáticas, dos temas que estavam no âmago de A Shared Authority.

Isso já ocorria na época do congresso de 2012. Enquanto Ricardo e eu conversávamos sobre como eu tinha chegado lá, a minha conferência centrava-se no trabalho então presente e apontava caminhos futuros - o seu implícito então e agora.

Estava então profundamente envolvido, através da Randforce Associates, um escritório de consultoria que criara, em um trabalho aplicado empregando novas ferramentas digitais para indexar e tornar acessível a fonte essencial de história oral - as gravações em si. A nossa prática baseava-se numa ferramenta de software, Interclipper, inicialmente desenvolvida em pesquisa de mercado para identificação rápida de trechos de gravações com grupos focais. Expandimos o uso dessa vasta plataforma para desenvolver e aplicar quadros codificados multidimensionais para referências cruzadas precisas, acesso instantâneo e exportação de conteúdo de áudio/vídeo, atravessando horas e horas de entrevistas.

Na minha conferência em São Paulo em 2012, discuti esse trabalho digital então emergente recorrendo a expressões - de brincadeira, mas também sérias - que meu colega Douglas Lambert e eu apresentamos para estabelecer o nosso serviço de consultoria: as escolhas convencionais em história oral e, por extensão, em história pública, resumem-se a “cruas” ou “cozidas” - ou recolhas de dados, com frequência não transcritos e dificilmente utilizáveis em termos de mídia ou texto, ou, alternativamente, material selecionado para um fim específico - um filme, exposição, website e por aí. Em contraste, situamos nosso trabalho no espaço do meio da “cozinha” -, um lugar onde o cru pode ser cozido em qualquer coisa, sendo o único limite o que está na despensa, na prateleira de temperos, na geladeira e no congelador (Frisch, Lambert, 2010FRISCH, Michael; LAMBERT, Douglas. Between the Raw and the Cooked in Oral History: Notes from the Kitchen. In: RITCHIE, Donald (ed.). The Oxford Oral History Handbook. New York: Oxford University Press, 2010. p. 333-348., p. 333-348). Propúnhamos, de novo um ponto central da conferência, que, se organizado de forma clara, e com sugestão de receitas caso necessário, ou não, isso podia ser imaginado como uma cozinha de restaurante aberta, onde qualquer pessoa da comunidade podia ir cozinhar, junto com outros ou sozinha. “A shared cookery” [“Uma culinária compartilhada”], por assim dizer. Nas referências ao final desses comentários, há uns dois ensaios sobre os temas do período em torno da conferência de 2012 em São Paulo.

Voltando, se isso era o “então e agora” de 2012, ligando a entrevista sobre autoridade compartilhada com a conferência em São Paulo, qual foi a trajetória desde aí? Bem, tem sido essencialmente mais da mesma história - um compromisso de fundo que assumiu formas drasticamente novas, diferentes... mas nem tanto. Isso emergiu basicamente em dois desenvolvimentos principais, um a partir de 2016 e o outro de apenas um ou dois anos atrás. Nenhum foi programado, mas quase acidental; cada um gradualmente revelou uma consistência subjacente em termos de valor e compromisso na história oral e na história pública.

O primeiro, no início, parecia tangencial: com Mike Haller, o criador do Interclipper, codesenvolvi uma nova modalidade que chamamos “PixStori” - um aplicativo local para smartphone, para adicionar pequenas histórias em áudio ou comentários a fotografias e partilhá-los por e-mail ou inseri-los em galerias web dedicadas.5 5 Ver os três breves “miniartigos” sobre PixStori, postados na página de perfil do LinkedIn de Michael Frisch: “Room Beyond Zoom: value and uses of a-synchronous social media modes”; “‘Grounded but not Bounded’: Photo-Prompted Story Gathering”; and “Community Building with Talking Intro-Directories”. Disponíveis em: https://www.linkedin.com/in/michael-frisch-2477288/. O PixStori original era um aplicativo IOS para Iphones; ainda é útil e está disponível para baixar de graça na Apple App Store. Mas desenvolvemos uma nova versão de aplicativo web, www.pixstoriplus.com, integralmente na nuvem, acessível de graça a partir de qualquer dispositivo móvel ou computador. PixStories pode ser feito e postado em grupos públicos ou privados, de qualquer família, organização, ou objetivo. PixStoriplus é um recurso de mídia social mais controlável e “seguro” - só membros do grupo podem postar, dar like e comentar, sob forma de texto ou especialmente de voz, o que induz fios reais de conversa ao longo do tempo. Ao mesmo tempo, Pixstories específicas e partes delas podem ser facilmente exportadas em formatos genéricos para compartilhamento, como para convidados que não precisam estar inscritos no PixStori, mas sem a possibilidade de postar ou comentar.

Uma surpresa instrutiva foi ver que projetos de história oral e história pública têm se destacado entre os que são atraídos para o novo aplicativo web, e temos ajudado museus e outras entidades a empregá-lo como um tipo de formato curto para recolher relatos de história oral, com fotos como prompt em vez de perguntas de um entrevistador. Onde é que está escrito que a história oral DEVE assumir a forma de uma longa conversa gravada?

Até aqui eu fizera a apresentação para uma audiência inicialmente cética, passando uma série de slides vazios de Power Point, e convidando-a a responder através de um desenho mental imaginado: 1) imagine um arquivo de história oral. Em seguida, 2) imagine um arquivo de história oral que possui 10 mil entrevistas. Depois, 3) imagine um arquivo de história oral que possui 10 mil entrevistas, nenhuma com mais de dois minutos. A isto, praticamente inimaginável, seguia-se um quarto slide, uma foto sem qualquer texto: um imenso mosaico bizantino de Ravena, Itália, cobrindo a parede de uma catedral, composto inteiramente, como os mosaicos são, de azulejos mínimos, com poucos centímetros quadrados. Q.E.D.

Isto abriu caminho para imaginar, e construir, um tipo de história oral em “mosaico”, composto por respostas curtas a fotos e outros tipos de imagem que, considerados no conjunto, podem contar a história de uma comunidade, uma família, uma organização, ou uma instituição. Isto, por seu turno, realçou uma série de possibilidades inteiramente afins à noção de Autoridade Compartilhada:

PixStori é especialmente conveniente para crowdsourcing de reações em torno de qualquer assunto, quer envolvendo pessoas “historiando” [“story-ing”] suas próprias fotos em resposta a um prompt genérico, ou a imagens “semente” colocadas com respostas pessoais, anedotas, testemunhos. Estas podem depois ser mosaicamente objeto de “curadoria” para exposições, apresentações web online e afins. Entre os usos mais produtivos dessa abordagem tem estado a coleta em formato curto de experiências de Covid-19, bem como as de comunidades LGBTQ pós-Stonewall.

À medida que trabalhamos de forma colaborativa nesses projetos, temos ficado impressionados com o grau de abertura e indeterminação que o método de formato curto permite, com implicações significativas para a prática da história oral e pública. Numa PixStori de um ou dois minutos, vários respondentes usam apenas 15 ou 20 segundos para descrever literalmente e contextualizar a fotografia em si. Aí, ainda com maior frequência, “decolam” para uma história mais geral ou reflexões desencadeadas pela foto - o que resulta em anedotas ou comentários que são “ligados mas não limitados” pela imagem de prompt. Equivale dizer, um tipo de associação livre direcionada, que desdobra sentidos pessoais de modo concentrado e imediato, longe do que um entrevistador poderia ter antecipado ou colocado em uma pergunta. O que é o mesmo que dizer uma autoridade compartilhada quanto ao conteúdo e interpretação do ente histórico que está sendo produzido. A forma curta, em módulos, tem levado vários museus a fazer de forma coletiva não apenas as coletas, mas também a colaboração na própria curadoria, a comunidade ajudando a selecionar PixStories para serem adicionadas a uma exposição importante da comunidade, online e/ou in situ.

Há um segundo eixo principal no trabalho que venho desenvolvendo desde 2012 - a partir dos dois últimos anos, e com sua própria conexão mais literal com a Autoridade Compartilhada:

O indexador digital Interclipper apresentado naquela conferência em São Paulo em 2012 era sobre gravações - não exigia transcrições prévias, nenhuma transcrição. O nosso trabalho tendia a recair numa postura implícita de ou/ou quanto à transcrição: encarava a gravação como fonte primária em vários sentidos - e suscetível de uma indexação mais rica do que a mera transcrição em texto, raramente indexada, em especial quando se considera a tentação de pesquisa instantânea de texto. Mapear e explorar, mais do que a pesquisa específica que requer saber o que se está procurando, pareciam importantes para promover um acesso ampliado - para partilhar a capacidade de se envolver e interagir com a história oral e para o diálogo que a história pública suscita. Era o que ofereciam as interfaces de indexação baseadas em mídia, como o Interclipper.

Isso mudou radicalmente nos últimos anos. Na nossa prática específica, o Interclipper, com todas as suas maravilhosas possibilidades de referências cruzadas de mídia, nunca migrou para a nuvem, se tornando cada vez mais obsoleto no que se refere a projetos substanciais, que exigem dimensões tanto locais quanto de nuvem. Nesse meio-tempo, novas possibilidades incríveis praticamente extinguiram o divisor ou transcrição/ou gravação tornando as entrevistas mais amplamente acessíveis e de uso mais flexível em projetos de história pública.

Dois aspectos foram centrais para essa extinção. Primeiro, a transcrição automática instantânea tem-se desenvolvido e está cada vez mais disponível para a produção da versão inicial de um texto. Ainda está longe de ser ótima, mas, de início, 80 a 90% do trabalho está feito, formando uma base para verificação, correção e formatação do que acabamos chamando “transcrição de gravação”, que é tanto acurada quanto fácil de ler e navegar. Mas isso conduz a um paradoxo: quanto mais abrangente e acurada a autotranscrição se torna, mais ela exige uma formatação agressiva, já que vem cheia das variantes de cada falante em torno de cada enunciado, e repleta de códigos temporais. É necessária intervenção para que os resultados tenham leitura fácil e sejam navegáveis.

A segunda dimensão é que a autotranscrição pode oferecer códigos temporais embutidos que associam a transcrição e a gravação em pontos precisos - ler, clicar e ouvir/ver aquele momento exato da entrevista. Isso abre todo um novo mundo de acesso baseado em texto de indexação de código de tempo à gravação de origem - para análise, extração e uso multimídia. Essas ferramentas tornaram-se padrão na história oral on-line e nas plataformas multimídia de e-publicação, como as bem conhecidas OHMS e AVIARY, que estão para se fundir até o final de 2023.

Há não mais que um ano ou dois começamos a mergulhar numa nova abordagem integrada de registro e indexação, partindo da transcrição automática em direção a uma série de iterações mais refinadas. Encontramos uma plataforma de intermediação ideal oferecida por uma startup, TheirStory, que tem sido excepcional em termos de oferecer uma plataforma otimizada para realização remota e recolha de entrevistas em vídeo.

Para o nosso trabalho, a atração de TheirStory reside na oferta de uma capacidade alargada de mark-up, em parte baseada no exclusivo Timecode Indexing Module (TIM) [Módulo de Indexação de Código de Tempo], parcialmente desenvolvido por Doug Lambert, que foi meu diretor de tecnologia na Randforce. Temos colaborado na aplicação dessas competências para o que acabei chamando de “indexing for use [indexação para uso],” ou, talvez melhor, “indexing for use(s) [indexação para uso(s)].” Trata-se de um arco que se percorre com uma facilidade surpreendente - desde a descarga em bruto até a transcrição de registro, passando por sumários que transformam vocalizações em texto legível sem perda de conteúdo, a passagens indexadas específicas disponíveis para exportação em mídia ou para citação literal. Cada uma dessas iterações tem usos diversos; cada uma é salva e está permanentemente acessível - nada é “deixado no chão da sala de corte”. Estão todas ligadas umas às outras e aos registros por códigos temporais, e cada uma pode ser codificada ou associada a palavras-chave via uma taxonomia de uso compartilhada ou um dicionário de controle vocabular.

Uma grande satisfação para mim foi redescobrir a utilidade, nesse processo, dos resumos de transcrição, quando comparados com os sumários externos nos quais outros sistemas se baseiam. Esses resumos acabam por constituir 25 a 40% da transcrição integral do registro sem que haja absolutamente nenhuma perda de conteúdo ou temática - trata-se apenas de “enxugar bem” de modo a produzir uma destilação precisa, de fácil leitura, navegável -, integralmente nas próprias palavras do falante. Os resumos são particularmente úteis para publicação, com o original integral sempre disponível para verificação ou para um olhar mais detalhado para, digamos, a dinâmica efetiva da conversa. Não por coincidência, desenvolver esse aspecto levou-me de volta a um dos capítulos mais incomuns de A Shared Authority - uma discussão sobre edição para publicação baseada na apresentação de versões “antes e depois” de uma das entrevistas muito longas para publicação de Portraits in Steel (1993), minha historiografia oral, em colaboração com o fotógrafo de renome internacional Milton Rogovin, com metalúrgicos de Buffalo, após o fechamento da maior parte das usinas siderúrgicas da comunidade.

Atualmente estamos colaborando com uma gama de parceiros - quase todos orientados para história pública - no recurso à abordagem “indexing for use(s)” [“indexar para uso(s)”] em coleções de entrevistas centradas em história oral.

Tenho a satisfação de poder oferecer aos leitores um meio de explorar esses temas por conta própria. Precavidos por mais de dois anos de conferências virtuais forçadas, preparamos, para o encontro da Associação de História Oral de 2022 (EUA), ao vivo em Los Angeles, uma série de exemplos on-line, documentos de posicionamento e modelos de demonstração tanto para o formato curto PixStories como para o “indexing for use(s)” para histórias orais de formato longo: todos estão acessíveis via o portal URL: www.rebrand.ly/OHA2022.

Aqui está - “então e agora”, trabalho novo completamente diferente, mas no fundo movido pela mesma sensibilidade profunda para o que, e por que, importa na prática da história oral e da história pública.

Minha gratidão a Ricardo Santhiago, Juniele Rabêlo de Almeida e todos os que ajudaram a tornar possível esta publicação da entrevista original com Ricardo em 2012 e os meus próprios comentários atualizados!

References

  • BRECHER, Jeremy; LOMBARDI, Jerry; STACK­HOUSE, Jan. Brass Valley: The Story of Working People’s Lives and Struggles in an American Industrial Region Philadelphia: Temple University Press, 1982.
  • FRISCH, Michael. A Shared Authority: Essays on the Craft and Meaning of Oral and Public History Albany, NY: State University of the New York Press, 1990a.
  • FRISCH, Michael. Oral History and ‘Hard Times’: A Review Essay. In: FRISCH, Michael. A Shared Authority: Essays on the Craft and Meaning of Oral and Public History Albany, NY: State University of the New York Press, 1990b. p. 5-14.
  • FRISCH, Michael. Oral History and the Presentation of Class Consciousness: The New York Times v. The Buffalo Unemployed. In: FRISCH, Michael. A Shared Authority: Essays on the Craft and Meaning of Oral and Public History Albany, NY: State University of the New York Press, 1990c. p. 59-80.
  • FRISCH, Michael. Studs Terkel, historian. History Workshop Journal, v. 69, n. 1, p. 189-198, 2010.
  • FRISCH, Michael. A história pública não é uma via de mão única, ou, De ‘A Shared Authority’ à cozinha digital, e vice-versa. In: MAUAD, Ana Maria; ALMEIDA, Juniele Rabêlo de; SANTHIAGO, Ricardo (org.) História pública no Brasil: sentidos e itinerários São Paulo: Letra e Voz, 2016. p. 57-71.
  • FRISCH, Michael; LAMBERT, Douglas. Between the Raw and the Cooked in Oral History: Notes from the Kitchen. In: RITCHIE, Donald (ed.). The Oxford Oral History Handbook New York: Oxford University Press, 2010. p. 333-348.
  • FRISCH, Michael; ROGOVIN, Milton. Portraits in Steel Ithaca, NY: Cornell University Press, 1993.
  • WALKOWITZ, Daniel; KNAUER, Lisa(ed.). Memory and the Impact of Political Transformations in Public Spaces Durham, NC: Duke University Press, 2004.
  • 1
    O livro que congrega os aspectos mencionados nesta resposta e onde Frisch inicialmente conceitua a ideia de “autoridade compartilhada” é: A Shared Authority: Essays on the Craft and Meaning of Oral and Public History (Frisch, 1990a).
  • 2
    Republicado como “Oral History and ‘Hard Times’: A Review Essay” (Frisch, 1990b, p. 5-14). Um artigo mais recente, onde Frisch analisa o trabalho de Studs Terkel, defendendo que seja reconsiderado no âmbito da história enquanto disciplina, é “Studs Terkel, historian” (Frisch, 2010).
  • 3
    Republicado como “Oral History and the Presentation of Class Consciousness: The ‘New York Times’ v. The Buffalo Unemployed”, em Frisch (1990c, p. 59-80).
  • 4
    Essa conferência, revista, está publicada como: “A história pública não é uma via de mão única, ou, De ‘A Shared Authority’ à cozinha digital, e vice-versa” (Frisch, 2016, p. 57-71.).
  • 5
    Ver os três breves “miniartigos” sobre PixStori, postados na página de perfil do LinkedIn de Michael Frisch: “Room Beyond Zoom: value and uses of a-synchronous social media modes”; “‘Grounded but not Bounded’: Photo-Prompted Story Gathering”; and “Community Building with Talking Intro-Directories”. Disponíveis em: https://www.linkedin.com/in/michael-frisch-2477288/.
  • 11
    Traduzido por Irene Portela

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Jul 2023
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2023

Histórico

  • Recebido
    06 Mar 2023
  • Aceito
    28 Abr 2023
EdUFF - Editora da UFF Instituto de História/Universidade Federal Fluminense, Rua Prof. Marcos Waldemar de Freitas Reis, Bloco O, sala 503, 24210-201, Niterói, Rio de Janeiro, Brasil, tel:(21)2629-2920, (21)2629-2920 - Niterói - RJ - Brazil
E-mail: tempouff2013@gmail.com