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Trabalho e trabalhadores livres: os índios no Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro, século XIX

Labour and free labourers: the Indians in the Rio de Janeiro Navy Arsenal, 19th century

Trabajo y trabajadores libres: los indios en el Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro, siglo XIX

RESUMO

Este texto se propõe a recuperar o processo de incorporação dos índios ao universo de trabalhadores urbanos no Rio de Janeiro no primeiro quartel do século XIX, analisando, de modo particular, sua presença no Arsenal da Marinha. A proposta é recolocar os índios na cena do mundo do trabalho buscando abrir novos campos de debate com uma historiografia ancorada na experiência da escravidão africana. Ao iluminar a presença das populações nativas no mundo do trabalho carioca, espera-se contribuir para uma ampliação da complexidade do conceito de “trabalhadores livres” no século XIX.

Palavras-chave:
trabalho; índios; Arsenal da Marinha, Rio de Janeiro; trabalho livre

ABSTRACT

The present text proposes to recover the process of incorporating the Indians into the universe of urban labourers in Rio de Janeiro in the 19th century, analyzing their presence in the Navy Arsenal. The proposal is to reintroduce the Indians on the world of labour and seeking to open new fields of debate with a historiography of African slavery. By addressing the presence of native populations in the world of Rio’s labour, it is expected to contribute to an expansion of the complexity of the concept of “free labourers” in the 19th century.

Keywords:
labour; indians; Navy Arsenal; Rio de Janeiro; free labour

RESUMEN

Este texto se propone recuperar el proceso de incorporación de los indígenas al universo de los trabajadores urbanos en Río de Janeiro en el primer cuarto del siglo XIX, analizando, en particular, su presencia en el Arsenal da Marinha. La propuesta es volver a poner a los indios en el escenario del mundo del trabajo, buscando abrir nuevos campos de debate con una historiografía anclada en la experiencia de la esclavitud africana. Al iluminar la presencia de las poblaciones nativas en el mundo del trabajo en Río, se espera contribuir a una expansión de la complejidad del concepto de “trabajadores libres” en el siglo XIX.

Palabras clave:
trabajo; indios; Arsenal de la Armada, Río de Janeiro; trabajo libre

De acordo com relatório da polícia carioca de 1845, existiam na Corte cerca de 50 índios, entre homens e mulheres, prestando serviços em casas particulares, “[...] uns a título de agregados, outros a título de se educarem, outros, porém mui poucos, vencendo algum salário, mas todos sem ajuste por escrito, [...]”. Aparentemente, as autoridades policiais cariocas restringiram-se a identificar um grupo muito limitado de trabalhadores indígenas porque os dados demográficos disponíveis indicam que a presença dos trabalhadores índios na Corte nesta primeira metade do século XIX merecia maior apuro porque havia ali bem mais que meia centena (BRASIL, 1846BRASIL. Relatório da Repartição dos Negócios do Império apresentado à Assembleia Geral Legislativa na 3ª sessão da 6ª legislatura pelo Ministro e Secretário de Estado e Negócios do Império, Joaquim Marcelino de Brito. Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1846., p. 25).

Viajantes no século XIX registraram a presença dos índios no espaço urbano carioca ultrapassando o registro pitoresco das “populações selvagens”. Um exemplo foi o olhar de Jean B. Debret na sua famosa prancha das lavadeiras na Corte onde apresentava: “[...] algumas famílias de lavadeiras caboclas, residentes no Rio de Janeiro há muitos anos. Reúnem-se diariamente de manhã para ir lavar roupa à beira do pequeno rio que passa sob a ponte do Catete, um dos arrabaldes da cidade. Aí ficam o dia inteiro, só voltando ao cair da noite”. Em poucas linhas, o pintor ofereceu informações ricas a respeito do cotidiano das mulheres índias, a longevidade de sua presença na cidade, a existência de redes familiares, as atividades e os locais costumeiros de trabalho - o rio Carioca, também conhecido na cidade como “rio das Caboclas” (DEBRET, 2008DEBRET, Jean B. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil. Belo Horizonte: Itatiaia, 2008.).

Não foi o único. Antes dele, o oficial da artilharia britânica e pintor Henry Chamberlain (1943CHAMBERLAIN, Henry. Vistas e costumes da cidade do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Kosmos, 1943.) havia flagrado os índios vendedores de cestos durante sua permanência na Corte entre 1819-1820. Alguns anos depois, os naturalistas J. Spix e C. Martius (1981SPIX, Johann B. Viagem pelo Brasil: 1817-1820. V. 1. Belo Horizonte: Itatiaia/ São Paulo: Edusp, 1981.) registrariam que os índios de São Lourenço (aldeamento localizado em Niterói) atravessavam a baía para oferecer suas louças de barro, embora suspeitassem eles que a maioria dos índios evitava ir com frequência à Corte porque o “tumulto para eles era estranho” (1981, p. 52). Era índio o barqueiro que recebeu Robert Walsh (1985WALSH, Robert. Notícias do Brasil, Belo Horizonte: Itatiaia/ São Paulo: Edusp, 1985.), médico e capelão da colônia britânica no Rio de Janeiro em 1828. Em 1850, foi Thomas Ewbank (1976EWBANK, Thomas. Vida no Brasil. Belo Horizonte: Itatiaia , 1976.) a notar que “os índios aparecem para serem escravizados tanto quanto os negros; no Rio muitos deles têm sido negociados”. Talvez parecessem mesmo “aves de arribação”, como os chamou Spix, mas fato é que os índios foram vistos e registrados pelos viajantes e naturalistas. Contudo, chama-nos atenção hoje o fato de terem passado praticamente despercebidos por boa parte da historiografia.

Na década de 1980, José Freire (1998FREIRE, José R. Bessa. Os viajantes e os índios do Norte Fluminense no século XIX. II Jornada de Trabalho - Anais. Campos: Universidade Estadual do Norte Fluminense, 1998.) já destacava a volumosa documentação disponível nos acervos locais que indicava a longeva presença dos índios na província e na cidade do Rio de Janeiro. Duas décadas depois, ainda que reconhecesse avanços na pesquisa sobre o tema, o autor insistia que o espaço dedicado às populações indígenas na historiografia carioca ainda era modesto. Conforme Freire, são muitas as evidências de que os índios também eram parte do cenário do Rio oitocentista, moravam em cortiços, serviam nas casas, nas obras públicas, vagavam pelas tabernas e vendas, entravam em conflitos com a polícia, estavam empenhados na defesa de suas terras nos mais diversos pontos da província. Existiam ainda índios empregados no Arsenal da Marinha convivendo estreitamente com escravos e africanos livres, na pesca de baleia, como remeiros de canoas do Serviço da Galeota Real ou no Escaler da Ribeira. Aparentemente, o tumulto da cidade não lhes era tão estranho assim.

Diante destes e de outros indícios, este texto apresenta resultados preliminares do projeto de pesquisa que se propôs a recuperar a presença dos índios no universo de trabalhadores urbanos do Rio de Janeiro no primeiro quartel do século XIX, analisando particularmente suas experiências no Arsenal da Marinha, com a expectativa de recolocá-los na cena do mundo do trabalho para tentar abrir novos campos de debate com uma historiografia densa e volumosa ancorada na experiência da escravidão africana. Ao iluminar a presença das populações nativas no mundo do trabalho carioca, esperamos contribuir para uma ampliação da complexidade do conceito de “trabalhadores livres” no século XIX.

Dos números dos índios e do trabalho indígena na Corte

“Na província do Rio de Janeiro, dá-se o nome genérico de caboclo a todo índio civilizado, isto é, batizado”.

J. B. Debret

Em 1840, existiam na província do Rio de Janeiro 5.615 indígenas incluídos nos mapas de população, o que correspondia a 1,3% de seus habitantes. Pouco mais de 30 anos depois, os dados censitários de 1872 registraram 7.852 caboclos , equivalendo a 1% da população da província. Como se pode observar no quadro 1, pela amostra disponível, a população indígena correspondia a uma média de 1% da população da província. Por outro lado, na década de 1840, período que analisamos neste artigo, é importante notar o peso da presença de cativos respondendo por mais da metade da população (SILVA, 2018SILVA, Ana Paula. Demografia e povos indígenas no Rio de Janeiro oitocentista. Revista Brasileira de História & Ciências Sociais, v. 10, n. 20, p. 81-106, 2018.).

Quadro 1:
População da Província do Rio de Janeiro por Cor/Condição Jurídica

Enquanto isso, na Corte, ainda que suas 923 almas não alcançassem mais que 0,4% da população total em 1872, os índios estavam lá estabelecidos, majoritariamente, nas freguesias de Santa Rita, Santana, Espírito Santo, São José e Glória, uma área de extrema importância no Rio oitocentista, onde se localizava o Cais do Valongo, o Cemitério dos Pretos Novos e suas adjacências (BRASIL, 1872BRASIL. Diretoria Geral de Estatística. Recenseamento Geral do Império de 1872. Rio de Janeiro: Typographia de G. Leuzinger, 1872.).

Conforme as categorias definidas por José Freire e Márcia Malheiros (2009FREIRE, José R. Bessa; MALHEIROS, Marcia. Aldeamentos indígenas do Rio de Janeiro. 2. ed. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2009.), existiam, no século XIX, três categorias de índios na província do Rio de Janeiro: os catequizados (caboclos), os bravos e os destribalizados. Na primeira, os autores incluíram etnias pertencentes ao grupo linguístico Tupi, Guarulho e Goitacá aldeadas há várias gerações em núcleos criados nos séculos XVI e XVII. Essas eram populações com longa história de contato, identificadas como “índios” ou “caboclos”, que viviam em terras coletivas reconhecidas pela Coroa. Já os índios bravos eram populações não aldeadas com relativa autonomia que estavam sofrendo os efeitos do processo de expansão da cafeicultura sobre seus territórios, sendo, afinal, alvos dos “aldeamentos tardios”. Por fim, os índios destribalizados referiam-se àqueles indivíduos afastados de suas comunidades étnicas que acabavam migrando para os núcleos urbanos, incluindo-se a Corte. Colocando essas categorias em campo, significa dizer que esses 923 índios da Corte poderiam enquadrar-se no último grupo indicado (FREIRE; MALHEIROS, 2009FREIRE, José R. Bessa; MALHEIROS, Marcia. Aldeamentos indígenas do Rio de Janeiro. 2. ed. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2009., p. 43-45).

Na primeira metade do século XIX, Charles Ribeyrolles (1980RIBEYROLLES, Charles. Brasil pitoresco. Belo Horizonte: Itatiaia/São Paulo: Editora da USP, 1980., p. 207) se empenhava em descrever a diversidade da população carioca, mas registrava uma ausência: “O que não se encontra como outrora no Rio de Janeiro são os indígenas, os verdadeiros filhos da terra, os selvagens de Villegagnon e de Jean de Léry”. Os olhos do viajante não encontravam “verdadeiros filhos da terra”, porém estavam atentos: “Veem-se, às vezes, alguns mestiços - índios, filhos de negros ou de brancos, e as mulheres dessa mistura não são destituídas de graça [...]”.

Há duas questões a destacar aqui: a primeira refere-se à necessidade de desnaturalizar as classificações étnico-raciais dos levantamentos populacionais e das descrições feitas acerca do “estado” das populações do século XIX. Falas como a de Ribeyrolles não podem ser tomadas como expressões unívocas de realidades étnico-raciais complexas. Ao contrário, devem ser tomadas como leituras de classificações possíveis de serem aceitas e compartilhadas por determinados grupos sociais. Em segundo lugar, ainda que óbvia possa parecer, essa observação ganha relevância na medida em que não é incomum que aquelas classificações tenham recebido status explicativo em alguns trabalhos sobre a cidade do Rio de Janeiro. Dito de outro modo, as falas (ou impressões) sobre a inexistência dos índios “verdadeiros” no Rio foram tomadas como evidência cabal da ausência dos índios na cidade (SILVA, 2018SILVA, Ana Paula. Demografia e povos indígenas no Rio de Janeiro oitocentista. Revista Brasileira de História & Ciências Sociais, v. 10, n. 20, p. 81-106, 2018.).

É necessário considerar diferentes dimensões para contextualizar essa relativa invisibilidade dos índios na Corte oitocentista. Para começar, eles eram poucos em termos demográficos. Desse modo, podiam mesmo passar despercebidos em uma cidade marcada pela forte presença de homens e mulheres escravizados de origem africana. Porém, a baixa densidade demográfica não pode ser justificativa para seu desaparecimento historiográfico, considerando que, ainda que fossem poucos, lá estavam e não apenas contados/incluídos nos números de “Livres”. Chama atenção o fato de que os levantamentos populacionais realizados no XIX levavam em consideração a categoria “Índios” e “Caboclos” e isso sinaliza a necessidade de manter o registro separado de um determinado grupo populacional. No caso dos índios, razões para isso não faltavam.1 1 Note-se que, no século XIX, o termo “caboclo” não era sinônimo de mestiço como alguns deduziram apressadamente. Menos que uma categoria étnico-racial exclusiva, o uso do termo também sugere a indicação de lugares/categorias sociais ainda que com recorte étnico-racial. Esclarece-nos João Pacheco de Oliveira (1999) que, na edição do Censo de 1872 traduzida para o francês, a palavra utilizada em lugar de Caboclos é Indiens e, em lugar de Pardos, Mètis.

No século XIX, existiam quinze aldeamentos indígenas no Rio de Janeiro e vários deles carregavam uma história de três séculos. Eram espaços complexos nos quais índios de diferentes etnias reinventaram estratégias políticas e identidades. Assim, longe de se configurarem apenas como locais de subordinação e aculturação, os aldeamentos também foram um “espaço de ressocialização para diversos grupos indígenas que chegaram ao Oitocentos misturados e em grupos reduzidos, porém vendo-se e sendo vistos como índios aldeados e ainda compartilhando vida comunitária e terra coletiva que lhe haviam sido garantidas séculos antes pela Coroa portuguesa” (ALMEIDA, 2007ALMEIDA, Maria Regina Celestino. Política indigenista e etnicidade. Estratégias indígenas no processo de extinção das aldeias do Rio de Janeiro, século XIX. Anuario IEHS, v. sup 1, p. 219-233, 2007., p. 219-220).

A expansão socioeconômica da Capitania do Rio de Janeiro, já configurada no século XVIII, ganharia novo impulso no XIX com a chegada da Corte. As consequências dessa conjuntura seriam bastante severas para os índios, fazendo recrudescer a pressão sobre suas terras, aumentando os litígios, obrigando-os a fazer diferentes arranjos que passavam pela formação de novas aldeias e podiam chegar mesmo ao abandono de seus territórios ocupados por novos proprietários (LEMOS, 2016LEMOS, Marcelo Sant’Ana. O índio virou pó de café? Resistência indígena frente à expansão cafeeira no Vale do Paraíba. Jundiaí: Paco Editorial, 2016.). Não é demasiado sublinhar o fato de que os índios, em condições muito adversas, se empenharam na garantia de suas terras e, por extensão, na luta pela manutenção de suas identidades, como apontou Maria Regina Celestino de Almeida. (ALMEIDA, 2008ALMEIDA, Maria Regina Celestino. Os índios no tempo da Corte: reflexões sobre política indigenista e cultura política indígena no Rio de Janeiro oitocentista. Revista USP, v. 79, 2008, p. 94-105.; 2014ALMEIDA, Maria Regina Celestino. Escravidão indígena e trabalho compulsório no Rio de Janeiro colonial. Mundos do Trabalho, v. 6, n. 12, p. 11-25, 2014.).

O processo de expropriação de terras se somava (e, às vezes, se sobrepunha) aos processos de recrutamento para o trabalho. Considerado como mão-de-obra essencial para a montagem da empresa colonial no Rio de Janeiro, o trabalho indígena no XIX não tinha o mesmo peso, mas ainda era um campo cercado de disputas em função das especificidades de cada região. De modo geral, o Estado continuava a ser o maior interessado no uso dos trabalhadores indígenas (CUNHA, 1992CUNHA, Manuela Carneiro(org.) Legislação indigenista no século XIX. São Paulo: EDUSP/Comissão Pró-Índio de São Paulo, 1992.).

E onde eles estavam? Nas fazendas, nos serviços domésticos, na construção civil, obras públicas, na pesca de baleia, vendendo água nas ruas, cerâmica, esteiras e cestos, no Arsenal da Marinha, servindo como marinheiros e remeiros, conforme se lê nos relatórios de seus inspetores, dos presidentes da Província do Rio e dos ministérios do Império, só para mencionar alguns (SILVA, 2016SILVA, Ana Paula. O Rio de Janeiro continua índio. Tese (Doutorado em Memória Social), Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2016.).

O Arsenal imperial e os índios

Em 1821, João Severiano Maciel da Costa, Marquês de Queluz, publicou sua Memória sobre a necessidade de abolir a introdução de escravos africanos no Brasil. Para ele, quatro medidas seriam capazes de garantir a prosperidade do país findo o tráfico. Era preciso “poupar os escravos existentes”; “inspirar o amor do trabalho nos homens livres de todas as cores”; “empregar os povos indígenas tanto os que já estão avilados como os que se puderem atrair”; e, por fim, era preciso “procurar trabalhadores europeus” (COSTA, 1988COSTA, João Severiano Maciel. Memória sobre a necessidade de abolir a introdução de escravos africanos no Brasil. In: COSTA, J; ANDRADA E SILVA, J.; MUNIZ BARRETO, D.; BURLAMAQUE, F. Memórias sobre a escravidão. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1988. p. 9-60., p. 35).

Com relação aos índios, Costa ponderava que não era possível assegurar, nem mesmo a esses avilados, “a plenitude dos direitos e prerrogativas da liberdade social como os mais cidadãos” (COSTA, 1988COSTA, João Severiano Maciel. Memória sobre a necessidade de abolir a introdução de escravos africanos no Brasil. In: COSTA, J; ANDRADA E SILVA, J.; MUNIZ BARRETO, D.; BURLAMAQUE, F. Memórias sobre a escravidão. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1988. p. 9-60., p. 41). Afinal, continuava o autor: “Nós, que os conhecemos e tratamos e governamos, somos de opinião contrária. Não tendo sido educados como convinha, pois que não foram habituados ao trabalho regular [...] se os deixarem a si sós, com a preguiça natural e hereditária [...], nada farão”. A solução parecia simples: para usar o trabalho indígena era preciso instituir um tipo de acompanhamento, de forma “mais policial que tutelar” para cuidar dos costumes, dirigir os trabalhos e evitar a vagabundagem (COSTA, 1988COSTA, João Severiano Maciel. Memória sobre a necessidade de abolir a introdução de escravos africanos no Brasil. In: COSTA, J; ANDRADA E SILVA, J.; MUNIZ BARRETO, D.; BURLAMAQUE, F. Memórias sobre a escravidão. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1988. p. 9-60., p. 41-42).

A outra recomendação era exemplar: se os homens livres “de todas as cores” não se animassem com as novas perspectivas do trabalho deveriam ser forçados a isso e a vadiagem e a ociosidade severamente punidas: “Desta sorte, o interesse dos benefícios da cultura e recompensas, de um lado, a severidade da polícia em perseguir ociosos, do outro, produzirão bons efeitos. O serviço militar de mar e terra e o primeiro com preferência serão um castigo eficacíssimo para quem foge do trabalho” (COSTA, 1988COSTA, João Severiano Maciel. Memória sobre a necessidade de abolir a introdução de escravos africanos no Brasil. In: COSTA, J; ANDRADA E SILVA, J.; MUNIZ BARRETO, D.; BURLAMAQUE, F. Memórias sobre a escravidão. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1988. p. 9-60., p. 38). As sugestões de Maciel da Costa dialogavam com algumas experiências acumuladas até então: reduzir a mobilidade dos trabalhadores, restringir acesso a outras modalidades de trabalho, ampliar formas de engajamento forçado e coibir a vadiagem não eram, exatamente, soluções novas mesmo neste início de século XIX.

Com relação ao “serviço de mar” que ele menciona, lembremos que, desde 1808, os Botocudo já estavam na mira do recrutamento para servir no Arsenal da Marinha, reiterando o que parecia ser procedimento longevo e contumaz como se lê em ofício datado de 18 de agosto daquele ano de guerra: “[...] Vmc. faça remeter para o Arsenal da Marinha desta Capital, o número de índios que era costume serem mandados no tempo dos Vice reis deste estado, homens capazes para o serviço dos escaleres, lanchas e mais trabalhos do mencionado Arsenal” [grifo nosso]. Pouco tempo depois, já se anunciava o recrutamento dos índios de Pernambuco, Bahia e Ceará para servir no Arsenal por um ou dois anos. Em 1827, por meio da Decisão n. 82, de 5 de setembro, o recrutamento alcançaria todas as províncias do Império. A ampliação se justificava porque as demandas eram crescentes. Afinal, a reorganização do Arsenal da Marinha estava em pleno curso nesse momento, processo que havia se iniciado com a chegada da Família Real em 1808 (CUNHA, 1992CUNHA, Manuela Carneiro(org.) Legislação indigenista no século XIX. São Paulo: EDUSP/Comissão Pró-Índio de São Paulo, 1992., p. 61; 65; 127; 130).

Havia uma noção corrente de que os índios possuíam uma aptidão natural para a navegação e tal argumento estava presente em muitos documentos oficiais. Assim, considerando que o Arsenal e a Armada acabavam sendo seus destinos preferenciais, o recrutamento de índios atingiu as populações que habitavam o Rio de Janeiro, alcançando o Espírito Santo, Bahia, Sergipe, Pernambuco, Ceará, Maranhão, Pará e Amazonas. A duração desta verdadeira drenagem de homens e crianças parece ter se estendido por todo o século XIX. Silvana Cassab Jeha chama atenção, em trabalho recente, que, entre 1833 e 1894, os índios chegaram a cerca de 20% da tripulação de navios da Armada e eram 20% dos registros de recrutas nas províncias, além de representarem mais de 15% dos réus em processos criminais da Marinha (JEHA, 2011JEHA, Silvana Cassab. A galera heterogênea: naturalidade, trajetória e cultura dos recrutas e marinheiros da Armada Nacional e Imperial do Brasil, c. 1822-c.1854. Tese (Doutorado em História) - Programa de Pós-Graduação em História Social da Cultura, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2011.).

Nesse início de século, o Arsenal se expandia e passava por ajustes administrativos, com criação de novos cargos como o de Inspetor do Arsenal, responsável pelos trabalhos de construção e reparos das esquadras, dos navios em obras, pelo embarque dos artífices que compunham as guarnições dos navios (calafates, carpinteiros etc.), pelo recrutamento de marinheiros para a esquadra e de operários para o Arsenal, entre outras obrigações que incluíam até a extinção de incêndios na cidade e a prerrogativa de conceder em aforamento os terrenos de marinha (GREENHALGH, 1951GREENHALGH, Juvenal. O Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro na história: (1763-1822). Rio de Janeiro, A Noite, 1951, p. 58-59., p. 58-59).

Como bem definiram Carlos Eugenio Soares e Flávio Gomes, “o Arsenal de Marinha representava, na primeira metade do século XIX, um sistema prisional com dimensões internacionais, com a utilização de trabalho compulsório e reunindo escravos, libertos, livres, soldados e marinheiros de várias procedências” (SOARES; GOMES, 2006SOARES, Carlos Eugênio Líbano; GOMES, Flávio. Revoltas, marinheiros e sistema prisional no Arsenal de Marinha. História Social, Campinas - SP, n. 12, p. 11-33, 2006., p. 12). O Arsenal era, efetivamente, um espaço caleidoscópico e multifacetado. Havia índios de diferentes grupos étnicos, preferencialmente engajados como remadores, africanos livres que dividiram o espaço das oficinas e de todo o pesado trabalho cotidiano que lhe era característico. Além deles, existiam operários especializados como os carpinteiros de machado, escravos de origem africana que eram levados pelos seus senhores para o ganho, “escravos da Nação” e um sem número de prisioneiros, condenados ou não. Quando não se tratava de prisioneiros ou condenados, o recrutamento era forçado e realizado por vários órgãos do Império, incluindo a Chefatura de Polícia. As patrulhas eram implacáveis e agiam após o “toque de recolher” dado pelos sinos da igreja de S. Francisco de Paula: “Nas redes lançadas, então, por essas patrulhas de recrutamento, vinham indivíduos de toda a espécie, que eram sequestrados sem distinção - gente pertencente a diferentes atividades e profissões” (GREENHALGH, 1951GREENHALGH, Juvenal. O Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro na história: (1763-1822). Rio de Janeiro, A Noite, 1951, p. 58-59., p. 84).

Entre 1830-1840, iniciou-se um processo de reestruturação da Marinha imperial que se efetivaria com a criação dos Corpos de Marinheiros Imperiais. Os componentes destes corpos constituíram a base da marinhagem da Armada do Império. Em 1836, foram formadas quatro companhias fixas de Marinheiros2 2 Decreto de 22 out. 1836. nas quais eram alistados jovens de 14 a 16 anos. Em 1837, essas Companhias foram elevadas à categoria de Corpos, chamados de Corpos de Companhias Fixas de Marinheiros e, em 1840, esses Corpos passaram a se chamar de Corpo de Imperiais Marinheiros, designação que manteve até o fim do Império, compondo a Armada Imperial3 3 Decreto de 2 jun. 1843. . Uma parte importante desses índios vinha da Província do Pará. Em 1848, o capitão Joaquim Manuel de Oliveira, responsável pela condução do recrutamento, afirmou “que o Pará tenha dado, talvez, mais recrutas do que devia dar comparativamente às outras províncias” (MEDEIROS, 2006MEDEIROS, Vera Alarcón. Incompreensível colosso: a Amazônia no início do Segundo Reinado (1840-1850). Tese (Doutorado em Antropologia Cultural e História das Américas e da África), Universidade de Barcelona: Barcelona, 2006., p. 220; 223-225). Em 1840, por meio de um decreto de 26 de outubro, os trabalhadores do Arsenal foram incorporados à força militar e completariam a formação do Corpo de Marinheiros Imperiais.

As fontes relativas ao Arsenal de Marinha revelam uma surpreendente população residente, livre e escrava, formando uma “comunidade de trabalho” que se socializava frequente e inevitavelmente, como apontaram Carlos Eugênio Soares e Flávio Gomes, que sublinharam ainda a diversidade de contatos, conexões, circulação de ideias e relações forjadas entre cativos, libertos, homens livres pobres e a marinhagem estrangeira que aportava o Rio de Janeiro (SOARES; GOMES, 2006SOARES, Carlos Eugênio Líbano; GOMES, Flávio. Revoltas, marinheiros e sistema prisional no Arsenal de Marinha. História Social, Campinas - SP, n. 12, p. 11-33, 2006., p. 23).

Vida e trabalho no Arsenal

O Arsenal, como se pode perceber, não se resumia a um “complexo prisional”, mas se configurava como um espaço coletivo que reunia possibilidades de punição/prisão, trabalho e, também, de vida cotidiana. Nessa última direção, note-se que a presença de famílias inteiras não era estranha ao Arsenal. Debret registrou que alguns dos índios de São Lourenço, além de viverem de sua indústria, da venda de sua cerâmica e esteiras, dedicavam-se à navegação e “alguns mesmo habitam com suas famílias o Arsenal de Marinha, empregando-se especialmente no serviço das canoas particulares do imperador do Brasil” (DEBRET, 2008DEBRET, Jean B. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil. Belo Horizonte: Itatiaia, 2008., p. 41). Em 1837, um decreto, datado de 14 de agosto, reconheceu a presença das famílias indígenas ali ao mesmo tempo em que recomendava designar um edifício para residência exclusiva dos índios, concedendo-lhes utensílios, mantimentos e fardamento compatível com a expectativa de “animar não só os que aí existem, mas também os que devem vir das províncias” (CUNHA, 1992CUNHA, Manuela Carneiro(org.) Legislação indigenista no século XIX. São Paulo: EDUSP/Comissão Pró-Índio de São Paulo, 1992., p. 173).

O recrutamento, forçado ou voluntário, marcava o começo dessa trajetória no Arsenal. Há muitas indicações sobre as possibilidades que levavam os indivíduos ao complexo carioca. A experiência dos jovens índios da Comarca de Macapá, recrutados diretamente pelo Capitão de Fragata Francisco de Paula Osorio, encarregado oficial do engajamento de índios para o serviço da Armada Nacional e Imperial, revelam a participação dos juízos municipais no processo. O pequeno Ludovico Pinheiro, de 12 anos de idade, órfão de pai e mãe, foi entregue mediante pagamento de 10$000 ao seu Curador com a promessa de ser retornado à sua província de origem quando terminado o tempo de praça de oito anos ali acordado. A sorte de José Lino, índio de 18 anos, entregue por seu pai Carlos ao recrutamento, cumprindo eles também o que pareciam ser as fórmulas da praxe do termo de engajamento que reiteravam a “livre vontade” manifesta por todos os envolvidos. Há outros casos de meninos índios e mamelucos entregues por seus familiares (pai, mãe e avó), mas chama atenção o caso de Vitorino José, índio de 17 anos, entregue ao capitão-recrutador por seu patrão Manoel Mendes da Silva Neves que, como os outros responsáveis, fez jus ao pagamento da gratificação de 13$640 réis a título de ressarcimento de dívida de “seu fâmulo” com a aquiescência do juiz de paz daquela Comarca.4 4 ARQUIVO NACIONAL, IM 483, 1846.

A ação de recrutadores oficiais era um caminho, mas, eventualmente, os índios podiam chegar ao Arsenal como punição. Esse parece ter sido o caso dos índios Elias Jacques e Luís da Costa, que chegaram ao Arsenal sob a acusação de terem causado “desordens na sua aldeia “e, como correção, foi-lhes determinado que ficassem nos trabalhos do Arsenal.5 5 DPHCM, OR149, 1815. Por outra via, os 14 índios Guaranis, do Rio Grande, conforme asseguram os ofícios, vieram por vontade própria, em diferentes embarcações para o Arsenal e, recolhidos ao Depósito, também voluntariamente, ofereceram-se para sentar praça na Imperial Brigada de Artilharia da Marinha.6 6 ARQUIVO NACIONAL, XM 793, 1826.

Já sabemos que o Arsenal recebia índios de todas as regiões do país. Os tentáculos do recrutamento podiam alcançar as fronteiras do Império, como o que aconteceu com os povos indígenas do Rio Branco (fronteira com as possessões inglesas àquela altura). No final da década de 1830, os recrutadores chegaram às comunidades indígenas daquela região e “agarraram às tribos índias alguns indivíduos para virem servir na Marinha e os índios enraivecidos desampararam suas povoações...” (MEDEIROS, 2006MEDEIROS, Vera Alarcón. Incompreensível colosso: a Amazônia no início do Segundo Reinado (1840-1850). Tese (Doutorado em Antropologia Cultural e História das Américas e da África), Universidade de Barcelona: Barcelona, 2006., p. 229). Por outro lado, há indicações importantes quanto às populações que viviam nos aldeamentos no Rio de Janeiro como se vê no ofício de janeiro de 1817. Lastimando a falta de índios no Arsenal, pede seu administrador que sejam acionados os comandantes dos Distritos para que se recrutem índios de Mangaratiba, Itaguaí, Cabo Frio, São Gonçalo, São Lourenço e Vila Nova.7 7 DPHCM, OR149, 1817.

As deserções eram constantes e causavam grandes transtornos à vida do Arsenal. O mesmo ofício de 1817, mencionado a pouco, reclamava da ausência dos índios “[...] sem que, contudo, se tenha permitido licença a um só”. Não era de se estranhar: um cotidiano marcado pela imobilidade, pelo recrutamento forçado, pelo atraso no pagamento dos jornais, pelos castigos físicos e pelo trabalho duro teria sua contrapartida e as fugas/deserções eram parte dessa resposta. Importante lembrar que os índios recrutados no Rio de Janeiro sempre podiam voltar às suas comunidades e, várias vezes, tal estratégia foi frustrada com a recaptura e recondução ao Arsenal. Foi esse o caso de Manoel, morador de Cabo Frio, em 1823.8 8 ARQUIVO NACIONAL, XM 726, 1823a.

Evidentemente, não eram apenas os índios que desertavam do Arsenal e, aqui, a documentação é copiosa em registrar fugas espetaculares, como foi o caso da protagonizada pelos sentenciados às galés Antônio e João Congo que conseguiram prender no porão o cabo do Batalhão de Caçadores, Manoel Antônio, comandante da sua escolta9 9 ARQUIVO NACIONAL, XM 726,1823b. .

Como bem nos lembra Silene Ribeiro (2018RIBEIRO, Silene Orlando. “Exímios remadores do Arsenal da Marinha”: recrutamento e trabalho indígena no Rio de Janeiro (1763-1820). Tese (Doutorado em História) - Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2019., p. 145), o atraso nos pagamentos atingia todo o pessoal do Arsenal o que gerava situação de grande penúria para os operários e suas famílias. Como bem aponta a autora, os índios desenvolveram diferentes estratégias para lidar com um sem número de dificuldades naquele espaço e as revoltas também fizeram parte de suas práticas reivindicatórias. Foi assim que Leonardo Dias e Félix Rodrigues foram parar na prisão da Ilha das Cobras quando, aparentemente, encabeçaram uma recusa coletiva para receber os pagamentos atrasados em outubro de 1809.

Mas o que faziam os índios no Arsenal? Além de serem considerados “exímios remeiros” (RIBEIRO, 2018RIBEIRO, Silene Orlando. “Exímios remadores do Arsenal da Marinha”: recrutamento e trabalho indígena no Rio de Janeiro (1763-1820). Tese (Doutorado em História) - Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2019.), os índios eram também destinados ao serviço das diversas oficinas, ao trabalho na barca d’água e mais serviços miúdos (reparos, limpeza etc.) nas embarcações e no complexo do Arsenal. Cabia aos índios da Barca d’Água a tarefa de encher as pipas e tonéis dos saveiros e outras embarcações10 10 DPHCM, OR149, 1808. .

Além de experimentarem um cotidiano de enormes restrições quanto à disponibilidade de alimentação, inexistência de alojamentos, havia ainda o mundo dos castigos físicos aplicados de modo indistinto, fazendo aumentar a pressão e as condições para inúmeras queixas formalizadas às autoridades e à explosão de levantes (SOUSA; SAMPAIO, 2018SOUSA, Nadinny Alves; SAMPAIO, Patrícia Melo. Fronteiras cruzadas: índios e africanos no Arsenal da Marinha do Rio de Janeiro, século XIX. Relatório final (Programa de Iniciação Científica - PIBIC). Universidade Federal do Amazonas - UFAM/CNPq, Manaus , 2018.) Mais uma vez, Soares e Gomes (2006SOARES, Carlos Eugênio Líbano; GOMES, Flávio. Revoltas, marinheiros e sistema prisional no Arsenal de Marinha. História Social, Campinas - SP, n. 12, p. 11-33, 2006.) ajudam a pensar nos significados mais profundos desses levantes, insistindo que tanto o contexto político dessas revoltas e motins quanto as experiências que articulavam esses diferentes sujeitos no Arsenal merecem mais investigações.

“Um grupo pequeno, mas distinto”: a historiografia do trabalho e o lugar dos índios

Mesmo dispondo de muitas evidências sobre o tema, ainda são raros os trabalhos que se debruçaram sobre este tipo particular de “trabalhador livre” no Rio oitocentista. Os índios aparecem de modo fugaz na maioria dos casos. Sidney Chalhoub (1996CHALHOUB, Sidney. Cidade febril: cortiços e epidemias na Corte imperial. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.; 2012CHALHOUB, Sidney. Trabalho, lar e botequim: o cotidiano dos trabalhadores no Rio de Janeiro da Belle Époque. 3. ed. Campinas: Editora da UNICAMP, 2012.), em suas diferentes incursões nos mundos do trabalho urbano carioca, não identificou sua presença. Thomas Holloway (1997HOLLOWAY, Thomas. Polícia no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: FGV, 1997.), que vasculhou prisões e cadeias cariocas interessado em acompanhar a trajetória da Polícia no Rio, não menciona a presença dos índios nelas. Holloway reconhece sua existência na cidade incluindo-os entre os “pobres livres” e, dentre eles, estavam alguns descendentes “de parte dos nativos que habitavam o Brasil quando da chegada dos europeus”. Carlos Eugênio Soares (2013SOARES, Carlos Eugênio L. Valongo, cais dos escravos. Relatório de Estágio de Pós-Doutoramento em Arqueologia do Museu Nacional. Rio de Janeiro: UFRJ, 2013.) não conseguiu fazê-los visíveis no seu detalhado estudo sobre o Cais do Valongo a despeito do fato de que esta era uma área reconhecida de moradia dos índios estabelecidos na Corte. Trabalhos mais recentes que buscam dar conta das experiências comuns que conectaram escravizados e livres na formação da classe trabalhadora carioca, como é o caso do excelente estudo de Marcelo Badaró Mattos (2008MATTOS, Marcelo Badaró. Escravizados e livres. Rio de Janeiro: Bom Texto, 2008.), em que pese sua grande contribuição ao debate, também passou ao largo da presença dos índios.

No já clássico estudo de Mary Karash (2000KARASH, Mary. A vida dos escravos no Rio de Janeiro. São Paulo: Companhia das Letras , 2000.) sobre a vida dos escravos no Rio oitocentista, os índios são, na maioria das vezes, mencionados de passagem, tratando de suas atividades na caça de escravos fugitivos ou como remadores. Ainda assim, a autora faz observações relevantes para nossa discussão quando registra a escravização ilegal dos índios na Corte, o fluxo de povos indígenas de outras províncias deslocados para o serviço no Rio de Janeiro, como é o caso dos Botocudo (Espírito Santo) e Kinikinau (Mato Grosso) que se somavam às populações nativas do Rio.

Como soldados recrutados, criados públicos ou privados e escravos ilegais, indígenas das proximidades do Rio e de províncias distantes formavam um grupo pequeno, mas distinto, que parecia ter sofrido alguns dos piores maus-tratos devido a sua baixa condição social e posição legal frágil (KARASH, 2000KARASH, Mary. A vida dos escravos no Rio de Janeiro. São Paulo: Companhia das Letras , 2000., p. 40).

Mas qual seria a importância de estudar a presença e o trabalho dos índios no Rio do Oitocentos? Longe de propor uma resposta exaustiva, limitamo-nos a destacar alguns pontos: Para começar, John Manuel Monteiro (2001MONTEIRO, John M. Tupis, tapuias e historiadores: estudos de história indígena e do indigenismo. Tese (Livre Docência), UNICAMP: Campinas, 2001.) destacou agudamente que, no debate político que marcou a criação da nova nação no início do século XIX, havia duas ordens de questões em jogo com relação ao destino das populações nativas: uma, de caráter antropológico, que confrontava os princípios iluministas com os pressupostos científicos em voga pautados pelas noções de raça e degenerescência. A outra, de natureza política, colocava em xeque a necessidade de dar relevo ao passado indígena da nova nação diante das imagens negativas que circulavam sobre os índios. O embate entre tal pensamento científico e a política indigenista “produziu, ao longo do século XIX e, de certo modo, do XX, imagens e opiniões conflitantes, ora promovendo a inclusão das populações indígenas no projeto de nação, ora sancionando a sua exclusão” (MONTEIRO, 2001MONTEIRO, John M. Tupis, tapuias e historiadores: estudos de história indígena e do indigenismo. Tese (Livre Docência), UNICAMP: Campinas, 2001., p. 131). Tais embates também implicavam no recurso a categorias classificatórias que passavam por conceitos como “barbárie” e “civilização”.

Em segundo lugar, acreditamos que um problema importante a considerar seja o recurso à categoria Livre para contar os índios e, analiticamente, passar a tratá-la como sendo um espaço homogêneo (ou homogeneizador) que, ao fim e ao cabo, acaba por desconsiderar dimensões da desigualdade com que eram percebidas as populações nativas (livres) de outros grupos de imigrantes europeus ou ainda dos homens e mulheres, escravizados ou não.

Com relação à primeira questão, trabalhos recentes vêm esclarecendo o alcance e a importância das categorias Barbárie e Civilização. Estudos de Vânia Losada Moreira e Maria Regina Celestino de Almeida (2012) revelam que diversos agentes do estado imperial, interessados na desocupação das terras dos aldeamentos, vão passar a desconsiderar como índios, aqueles que já estivessem “civilizados” e “confundidos com a massa da população”. Em termos práticos, um diagnóstico como este se desdobrava na disponibilidade das terras dos antigos aldeamentos e sua liberação para apossamento do Estado ou de particulares. O processo de expropriação das terras indígenas não é nosso tema, ainda que guarde relações que consideramos cruciais para entender a disponibilidade de trabalhadores índios na cidade do Rio de Janeiro no XIX.

Nessa perspectiva, parece-nos um problema historiográfico relevante a considerar que as populações nativas não só continuavam a ter lugar no mundo do trabalho carioca, mas que as modalidades de sua incorporação acionavam outras dimensões importantes para a compreensão da diversidade deste universo de trabalhadores. A rigor, se não fossem evidentemente “escravizados de modo ilegal”, os índios eram considerados e contados entre os “trabalhadores livres” e isso talvez justifique, em parte, sua invisibilidade em vários estudos como já indicamos. Assim, interessa sobremaneira, investigar este “grupo pequeno, mas distinto” de trabalhadores porque, antes de tudo, é imprescindível lembrar que, no século XIX, estava em curso um processo de redimensionamento do lugar dos índios na história e na vida do país. Aqui, estamos tentando propor uma revisitação a um conhecido e poderoso debate na história social do trabalho que, por conveniência de escrita, retomamos a partir do “paradigma da ausência”, nos termos propostos por Sidney Chalhoub e Fernando Teixeira (2009), para indicar que os índios - e seu trabalho - ainda estão fora deste debate.

Desse modo, interessa-nos destacar a viabilidade da investigação do ponto de vista documental e chamar a atenção para um tema (e por via de consequência para grupos socioétnicos determinados) ainda pouco visível na historiografia do trabalho em espaços urbanos. Nosso empenho aqui é alargar nossas possibilidades de olhar a diversidade do mundo do trabalho em um espaço tão frequentado quanto é o Rio de Janeiro no XIX e, ao mesmo tempo, pensar em aproximações analíticas com outras regiões do Império.

É oportuno, contudo, ressaltar iniciativas importantes que têm se empenhado em abrir esse debate no âmbito da historiografia do trabalho como é o caso do dossiê “Trabalho, políticas e experiências indígenas”, publicado pela revista Mundos do Trabalho (MOREIRA; JONG; POPINIGIS, 2014MOREIRA, Vânia Maria Losada; JONG, Ingrid; POPINIGIS, Fabiane. Introdução. Trabalho, política e experiências indígenas. Mundos do Trabalho, v. 6, n. 12, p. 5-8, 2014.). O dossiê disponibilizou um rico conjunto de reflexões sobre as experiências das populações nativas no mundo latino-americano, sendo considerado um marco pelo seu pioneirismo. Como bem indicaram as organizadoras, destacando ponto relevante para a discussão que se faz neste texto, “além de evidenciar que o trabalho indígena nas sociedades coloniais e pós-coloniais constitui um campo temático com espessura histórica” também é preciso lembrar que a “valorização dos índios como sujeitos históricos” se constitui em um princípio essencial para pensá-los como “sujeitos de suas experiências, como possuidores de uma história própria e como coparticipantes de histórias e experiências compartilhadas com outros setores sociais” (MOREIRA; JONG; POPINIGIS, 2014MOREIRA, Vânia Maria Losada; JONG, Ingrid; POPINIGIS, Fabiane. Introdução. Trabalho, política e experiências indígenas. Mundos do Trabalho, v. 6, n. 12, p. 5-8, 2014., p. 8).

Além do mais, inspirando-nos no debate proposto também por Fabiane Popinigis e Paulo Terra (2019), é fundamental considerar que, nesse caso, estamos lidando com populações culturalmente diferenciadas e, assim sendo, há que se refletir quanto à possibilidade de que o modo como eles definiam o trabalho e suas experiências é tema relevante e que não pode ser minimizado em se tratando dos índios também do mesmo modo que tais dimensões analíticas vêm sendo exploradas na História Social do Trabalho hoje. Este “grupo pequeno, mas distinto” pode fazer uma enorme diferença no modo como estamos tratando essas questões hoje.

Para terminar, por enquanto

Beatriz Mamigonian (2005), ao debruçar-se sobre a experiência dos africanos livres, fez observações que são bem relevantes para a discussão que aqui se empreende. Criticando a historiografia da “transição do trabalho escravo ao livre”, a autora chama nossa atenção, em primeiro lugar, para o fato de que o fim da escravidão não foi seguido de relações de trabalho assalariado. Ou seja, na contramão da “gradualidade” da passagem do trabalho escravo para o livre, o que o Brasil experimentou foi uma notável expansão das formas de trabalho não livre. Em segundo lugar, a mão de obra predominante nessa “transição” não era estrangeira, mas nacional. Essa conclusão dificilmente é apresentada, afirma a autora, porque tal historiografia “ignora o papel dos negros livres, índios, brancos pobres e mestiços no contingente da mão-de-obra brasileira” (MAMIGONIAN, 2005MAMIGONIAN, Beatriz. Revisitando a “transição para o trabalho livre”: a experiência dos africanos livres. In: FLORENTINO, Manolo (org.). Tráfico, cativeiro e liberdade: Rio de Janeiro, séculos XVII-XIX. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005. p. 389-417., p. 393). A ênfase sobre a escravidão e as relações senhor/escravo permite jogar pouca luz nas outras relações de trabalho que lhes eram contemporâneas, ou seja, sobre trabalhadores juridicamente livres que não participavam do mercado de trabalho assalariado.

Outro elemento importante levantado por Mamigonian diz respeito às razões pelas quais esses grupos socioétnicos eram, de modo geral, excluídos do debate acerca do futuro do trabalho no Brasil. Eles não estavam incluídos no perfil desejado de “trabalhadores livres” se comparados com imigrantes europeus. Não é demais lembrar que os índios, a seu modo, também não cumpriam esses requisitos. Por isso mesmo que o esforço de recolocá-los nas ruas da Corte e nos seus locais de trabalho parece-nos um movimento analítico necessário para ampliar esse campo de discussão. Ainda há poucos estudos que tenham se debruçado sobre as categorias e modalidades nas quais as populações indígenas foram inseridas no mundo do trabalho no século XIX. O recrutamento de populações nativas para a Armada, para o Arsenal de Guerra e de Marinha ainda reclamam maior reflexão pela historiografia. Trabalhos como os que utilizamos aqui iluminam temas e problemas que ajudam a reposicionar questões cruciais no debate historiográfico como é o caso da multiplicidade das formas de trabalho compulsório existentes no Brasil do XIX além das ambiguidades, limitações e “zonas de sombra” da condição jurídica de “livres”.

Como já chamaram atenção Patrícia Sampaio e Márcio Henrique (2019), transformar os índios em “trabalhadores úteis” ainda se constituía em um debate importante no século XIX, a despeito do peso do trabalho escravizado de origem africana. De toda sorte, essa não era tarefa simples porque é importante lembrar que existiam diferenças entre a vasta população indígena que vivia no Brasil. De um lado, havia um número expressivo de populações aldeadas, isto é, vivendo nos espaços urbanos desde o período colonial em várias províncias do Império. Alguns desses grupos possuíam mais de 300 anos de estabelecimento regular, como no caso do Rio de Janeiro. Outros, no entanto, experimentavam o aldeamento recente no século XIX e, no limite, em muitas gradações de contato mais ou menos sistemático, estavam as populações ainda não aldeadas que, obviamente, não se restringiam aos “grotões” do vasto Império. Não foram poucos os projetos oitocentistas que buscaram estratégias eficazes de incorporação desse contingente populacional e, de modo recorrente, as propostas passavam por reduzir a mobilidade dos trabalhadores, restringir acesso a outras formas de trabalho, ampliar as modalidades de engajamento forçado e coibir a vadiagem, questões que, como se vê em vasta historiografia, não eram, exatamente, soluções novas mesmo neste início de século XIX.

A grande questão com relação aos índios, contudo, permanecia em aberto: como esta incorporação pode ser conduzida? Uma resposta foi o Regulamento das Missões, a legislação aprovada em 1845 e que funcionaria até o final do século XIX com muitas críticas à sua eficácia (SAMPAIO, 2009SAMPAIO, Patrícia Melo. Política indigenista no Brasil Imperial. In: GRINBERG, Keila; SALLES, Ricardo (orgs.). O Brasil imperial (1808-1889). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, v. 1, 2009. p. 175-206.). Outra possibilidade vinha da expansão das práticas ilegais de apresamento, recrutamento forçado e de imobilização de trabalhadores indígenas em vários lugares do Império, reiterando longevas experiências coloniais. Some-se a isso, o fato de que o processo de expropriação de terras se somava (e, às vezes, se sobrepunha) aos processos de recrutamento para o trabalho. Isso, no caso do Rio, parece-nos muito evidente. Não é demasiado insistir na ideia de que os índios de todas as regiões do país foram essenciais na montagem da Armada imperial, de modo especial, na primeira metade do século XIX. Na segunda metade, há um importante silêncio a respeito da continuidade de sua presença no Arsenal da Marinha, por exemplo (LACERDA, 2016LACERDA, David P. Trabalho, política e solidariedade operária: uma história social do Arsenal da Marinha do Rio de Janeiro (c.1860 - c.1890). Tese (Doutorado em História) - Programa de Pós-Graduação em História, Universidade de Campinas, Campinas, 2016.).

Pensando o país de modo mais abrangente, é importante não esquecer que o uso do trabalho dos índios foi mais longevo do que se imagina, muito mais frequente do que se supõe e que permeou o cotidiano de todas as províncias do Império e não apenas as ditas mais remotas. (SAMPAIO; HENRIQUE, 2019SAMPAIO, Patrícia Melo; HENRIQUE, Márcio Couto. História, memória e escravização ilegal dos índios no Brasil, século XIX. In: IVO, Isnara Pereira; GUEDES, Roberto. Memórias da escravidão em mundos ibero-americanos: séculos XVI-XXI. São Paulo: Alameda, 2019., p. 228). É preciso reconhecer que a historiografia ainda tem uma grande tarefa a realizar para assegurar a inclusão de novos atores neste cenário dos mundos do trabalho e isso não se resume a “resgatar mais esses esquecidos da história” (MONTEIRO, 1995MONTEIRO, John M. O desafio da história indígena no Brasil. In: SILVA, Aracy Lopes da; GRUPIONI, Luís D. Benzi(org.). A temática indígena na escola. Novos subsídios para professores de 1º e 2º graus. Brasília, MEC/MARI/UNESCO, 1995. p. 221-236., p. 227). De certo modo, a chamada à ordem de John Monteiro permanece válida e atualizada: parece ser ainda preciso “redimir a própria historiografia de seu papel conivente na tentativa - fracassada - de erradicar os índios” da tentativa envergonhada de fazer desaparecer os índios da História do Brasil” (MONTEIRO, 1995MONTEIRO, John M. O desafio da história indígena no Brasil. In: SILVA, Aracy Lopes da; GRUPIONI, Luís D. Benzi(org.). A temática indígena na escola. Novos subsídios para professores de 1º e 2º graus. Brasília, MEC/MARI/UNESCO, 1995. p. 221-236., p. 227).

Fontes documentais - ARQUIVO NACIONAL

  • IM 483, Série Marinha - Contadoria, 1846- Termo de Engajamento do Índio que abaixo se declara para o Serviço da Armada Nacional e Imperial, 6 de julho de 1846 (Ludovico Pinheiro)
  • IM 483, Série Marinha - Contadoria, 1846- Termo de Engajamento do Índio que abaixo se declara para o Serviço da Armada Nacional e Imperial, 13 de julho de 1846 (Vitorino José)
  • IM 483, Série Marinha - Contadoria, 1846- Termo de Engajamento do Índio que abaixo se declara para o Serviço da Armada Nacional e Imperial, 15 de julho de 1846 (José Lino)
  • XM 726, Série Marinha- Inspeção do Arsenal da Corte, 1823. Ofício de Francisco Antônio da Silva Pacheco, Inspetor do Arsenal a Luís da Cunha Moreira, datado de 16 de março de 1823a.
  • XM 726, Série Marinha- Inspeção do Arsenal da Corte, 1823. Ofício de Francisco Antônio da Silva Pacheco, Inspetor do Arsenal a Luís da Cunha Moreira, datado de 23 de março de 1823b.
  • M 793, Série Marinha - Inspeção do Arsenal da Corte, 1826. Ofício de Francisco Antônio da Silva Pacheco, Inspetor do Arsenal ao Visconde de Paranaguá datado de 20 de abril de 1826.

DIRETORIA DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E CULTURAL DA MARINHA (DPHCM) - Serviço de Documentação da Marinha.

  • OR - 149 - Correspondência da Inspetoria do Arsenal de Marinha, Ofício de José Maria de Almeida de 12 de dezembro de 1808.
  • OR - 149 - Correspondência da Inspetoria do Arsenal de Marinha, Ofício de Veríssimo Máximo de Almeida a Inácio da Costa Quintela de 21 de novembro de 1815.
  • OR - 149 - Correspondência da Inspetoria do Arsenal de Marinha, Ofício de Veríssimo Máximo de Almeida a Inácio da Costa Quintela de 27 de dezembro de 1817.

Referências

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  • 1
    Note-se que, no século XIX, o termo “caboclo” não era sinônimo de mestiço como alguns deduziram apressadamente. Menos que uma categoria étnico-racial exclusiva, o uso do termo também sugere a indicação de lugares/categorias sociais ainda que com recorte étnico-racial. Esclarece-nos João Pacheco de Oliveira (1999) que, na edição do Censo de 1872 traduzida para o francês, a palavra utilizada em lugar de Caboclos é Indiens e, em lugar de Pardos, Mètis.
  • 2
    Decreto de 22 out. 1836.
  • 3
    Decreto de 2 jun. 1843.
  • 4
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  • 5
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  • 6
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  • 7
    DPHCM, OR149, 1817.
  • 8
    ARQUIVO NACIONAL, XM 726, 1823a.
  • 9
    ARQUIVO NACIONAL, XM 726,1823b.
  • 10
    DPHCM, OR149, 1808.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Ago 2022
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2022

Histórico

  • Recebido
    11 Jan 2021
  • Aceito
    05 Maio 2021
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