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Entre cultura e política: a distinção na produção de opinião na mídia

Between culture and politics: the distinction in the production of opinion in the media

Resumo

Este artigo tem como proposta analisar os diferentes mecanismos de produção de opinião política entre um grupo de colunistas, comentaristas e analistas políticos da mídia no Brasil contemporâneo, relacionando tais mecanismos com as posições dos agentes no espaço social. Tomando como base as análises de Pierre Bourdieu em A distinção - crítica social do julgamento, especialmente do capítulo “Cultura e política”, este artigo propõe correlacionar esses mecanismos com um conjunto de práticas e disposições relacionadas ao habitus - incluindo, portanto, expressões de gosto e estilo de vida - bem como com o campo em que esses agentes se inserem. O estudo foi elaborado a partir da análise de 51 indivíduos, com a realização de entrevistas e prosopografia.

Palavras-chaves:
Opinião política; Gosto; Habitus; Mídia; Intelectuais

Abstract

This paper aims to analyze the different mechanisms of political opinion production among a group of columnists, commentators and political analysts of the media in contemporary Brazil, relating these mechanisms to the positions of agents in the social space. Based on Pierre Bourdieu’s analyzes in Distinction: A social critique of the judgement of taste, especially in the “Culture and politics” chapter, this article proposes to correlate these mechanisms with a set of practices and dispositions related to the habitus - therefore including expressions of taste and style of life - as well as with the field in which these agents are inserted. The study was developed from the analysis of 51 individuals, with interviews and prosopography.

Keywords:
Political opinion; Taste; Habitus; Media; Intellectuals

Este artigo tem como objetivo analisar os diferentes mecanismos de produção de opinião política e de classificações como “esquerda” e “direita”1 1 Neste trabalho, a proposta é pensar como os agentes estudados mobilizam as categorias de “esquerda” e “direita”, a partir da forma como se classificam e são classificados, como classificam os outros e como elas se correlacionam com as tomadas de posição que tiveram em dois períodos de crise recentes: o impeachment de Dilma Rousseff e a eleição de Jair Bolsonaro. Nesse sentido, não se tem o objetivo de definir o que seja esquerda e direita nem enquadrar os agentes nessas categorias, mas sim colocar em evidência justamente essas lutas em torno dessas classificações no espaço da produção de opinião midiática, relacionando essas classificações com os dados de posição social. por parte de um conjunto de comentaristas e colunistas de política e economia do Brasil contemporâneo. Considerando, tal como Bourdieu, “o campo político como um campo da produção cultural, e a relação dos indivíduos com a política como um conjunto de disposições que refletem e são estruturadas por sua posição social” (Laurison, 2013Laurison, Daniel. (2013), “La production des opinions aux États-Unis, trente ans après La Distinction”. In: Coulangeon, Philippe et al. (org.). Trente ans après La Distinction, de Pierre Bourdieu . Paris, La Découverte “Recherches”, pp. 307-326., tradução nossa), o trabalho pretende relacionar dados de origem e posição social, expressões de gosto e preferências culturais, estilos de vida, públicos presumidos e formas de justificativa das tomadas de posição e das identificações mais à esquerda ou mais à direita, considerando o encontro entre habitus e campo para pensar esses diferentes mecanismos.

Tendo como objeto os indivíduos2 2 Fazem parte desse conjunto: Alexandre Schwartsman, André Singer, Antonio Prata, Arnaldo Jabor, Augusto Nunes, Bernardo Mello Franco, Bob Fernandes, Bolívar Lamounier, Carlos Alberto Sardenberg, Cynara Menezes, Demétrio Magnoli, Denis Rosenfield, Diogo Mainardi, Djamila Ribeiro, Dora Kramer, Eduardo Moreira, Eliane Cantanhêde, Emir Sader, Fabio Giambiagi, Fernando Gabeira, Fernando Morais, Fernando Schüler, Florestan Fernandes Jr., Guilherme Fiuza, Gustavo Franco, Jessé Souza, Joice Hasselmann, Laura Carvalho, Leandro Narloch, Leonardo Sakamoto, Luís Nassif, Luiz Felipe Pondé, Luiz Gonzaga Belluzzo, Marcelo Rubens Paiva, Marcia Tiburi, Marco Antonio Villa, Marilena Chaui, Mario Sergio Conti, Merval Pereira, Míriam Leitão, Monica de Bolle, Murillo de Aragão, Paulo Henrique Amorim, Paulo Moreira Leite, Rachel Sheherazade, Reinaldo Azevedo, Ricardo Amorim, Rodrigo Constantino, Samuel Pessôa, Olavo de Carvalho, Vladimir Safatle. Esse conjunto, apesar de amplo, não se pretendeu exaustivo. que concentram a “capacidade de produção do discurso sobre o mundo social” (Bourdieu, 2015aBourdieu, Pierre. (2015a), A distinção: crítica social do julgamento. São Paulo, Porto Alegre, Edusc; Zouk. , p. 371), o trabalho considera as estratégias e critérios de distinção e hierarquização no interior de um microcosmo, qual seja, o de produção e reprodução de opiniões políticas na mídia - ou, nas palavras de Bourdieu, o “mercado dos discursos produzidos e oferecidos pelos detentores dos instrumentos de produção de problemas e de opiniões legítimas” (Idem, ibidem).

Para tal análise, algumas tendências gerais sobre esse espaço no Brasil são levadas em consideração: o domínio da indústria do entretenimento (Mira e Bertoncelo, 2019Mira, Maria Celeste & Bertoncelo, Edison. (2019), “Apresentação. Para além da distinção? Desafios à abordagem bourdieusiana da formação social do gosto”. Estudos de Sociologia, Araraquara, 24 (46): 19-43, janeiro a junho. ) e a relevância das redes sociais3 3 Apesar das transformações ligadas às redes sociais, observa-se a manutenção de uma divisão entre os que detêm legitimidade enquanto produtores de opinião e os que não detêm: iniciados e não iniciados (Bourdieu, 2015a; Bourdieu, 2015b), “influenciadores” ou “formadores de opinião” e “simples cidadãos” (Bourdieu, 2015a, pp. 372-373). Ademais, ainda que formadores de opinião socializados nas redes sociais passem a disputar um lugar no mercado de produção de discursos, os grandes meios de comunicação, jornais e universidades ainda detêm uma estrutura institucional e profissional de produção, reprodução e consagração que mantém seus agentes em posições relativamente legitimadas e privilegiadas nesse jogo. associadas ao fato de as celebridades passarem a disputar lugares no campo político e intelectual4 4 Para uma discussão sobre as celebridades como modelo a ser imitado, ver Mira e Bertoncelo, 2019, p. 31. Sobre os “intelectuais pop”, “intelectuais midiáticos”, “fast thinkers”, ver Pinto, 2009; Bourdieu, 1998; Meirelles, 2021 ; a ampliação do acesso ao ensino superior nas últimas décadas relacionada à segmentação dos produtos (inclusive, os informativos) dos meios de comunicação, que se ligam à diversificação em alguma medida das origens sociais dos produtores de opinião na mídia e seus consumidores5 5 Com a ampliação do acesso ao ensino superior no Brasil, houve um incremento na inserção de mulheres, não brancos e pobres nas universidades (Ridenti, 2018; Singer, 2018) - um contingente de pessoas aptas a ocuparem lugares nesse espaço da produção ideológica bem como a consumirem seus produtos. . Com essa ampliação e segmentação da produção cultural e ideológica, evidencia-se uma divisão do trabalho intelectual midiático (Meirelles, 2021Meirelles, Allana. (2021), Opiniões à venda: oposições políticas e divisão do trabalho intelectual na mídia. 465 f. São Paulo, tese de doutorado, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, 2021.), que estrutura e, ao mesmo tempo, é estruturada por diferentes mecanismos de produção de opinião política, a depender da posição dos agentes no espaço social, das origens sociais e dos públicos a que se direcionam.

Nesse sentido, busca-se também demonstrar como o arcabouço teórico, metodológico e analítico bourdieusiano, sobretudo o oferecido na obra A distinção - crítica social do julgamento, em particular o capítulo “Cultura e política” (Bourdieu, 2015aBourdieu, Pierre. (2015a), A distinção: crítica social do julgamento. São Paulo, Porto Alegre, Edusc; Zouk. ), pode contribuir para interpretações sobre a produção de discursos e opiniões políticas no Brasil contemporâneo. Para tanto, é preciso, é claro, levar em consideração as distâncias temporais e geográficas que impõem mediações ao estudo desenvolvido no contexto francês da década de 1970 - seja pelas diferenças em termos de desenvolvimento do capitalismo e da estrutura de classes no Brasil (Singer, 2012Singer, André. (2012), Os sentidos do lulismo: reforma gradual e pacto conservador. São Paulo, Companhia das Letras.; Braga, 2016Braga, Ruy. (2016), “Terra em transe: o fim do lulismo e o retorno da luta de classes”. In: Singer, André & Loureiro, Isabel. As contradições do lulismo: a que ponto chegamos? São Paulo, Boitempo.; Bertoncelo, 2016a Bertoncelo, Edison . (2016a), “O espaço das classes sociais no Brasil”. Tempo Social, São Paulo, 28 (2): 73-104, setembro.), seja pelas diferenças em termos de acesso à educação formal no país (ainda que com avanços significativos nas últimas décadas) e pelas mudanças tecnológicas contemporâneas (com o desenvolvimento da internet, a ampliação do acesso às tecnologias digitais e a segmentação do mercado) (Ridenti, 2018Ridenti, Marcelo. (2018), “Mudanças culturais e simbólicas que abalam o Brasil”. Revista Plural. São Paulo, 25 (1): 45-62, agosto.).

Embora as análises do capítulo “Cultura e política” ainda sejam pouco mobilizadas (Gaxie, 2013Gaxie, Daniel. (2013), “Retour sur les modes de production des opinions politiques”. In: Coulangeon, Philippe et al. Trente ans après La Distinction, de Pierre Bourdieu . Paris, La Découverte “Recherches”, pp. 293-306.) e a hipótese sobre a homologia estrutural entre posições sociais e escolha de voto, por exemplo, seja nuançada ou contestada (Cautrès et al., 2013Cautrès, Bruno et al. (2013), “Retour sur l’hypothèse de ‘l’homologie structurale’: les déplacements des catégories sociales dans l’espace politique français depuis La Distinction”. In: Coulangeon, Philippe et al. Trente ans après La Distinction, de Pierre Bourdieu. Paris, La Découverte “Recherches”, pp. 327-337.), a importância das análises de Bourdieu sobre os efeitos do peso do capital cultural nas orientações políticas na França (Cautrès et al., 2013Cautrès, Bruno et al. (2013), “Retour sur l’hypothèse de ‘l’homologie structurale’: les déplacements des catégories sociales dans l’espace politique français depuis La Distinction”. In: Coulangeon, Philippe et al. Trente ans après La Distinction, de Pierre Bourdieu. Paris, La Découverte “Recherches”, pp. 327-337.) bem como seu foco sobre as disposições propícias ou não à formulação de discursos políticos e opiniões sobre questões sociais (Laurison, 2013Laurison, Daniel. (2013), “La production des opinions aux États-Unis, trente ans après La Distinction”. In: Coulangeon, Philippe et al. (org.). Trente ans après La Distinction, de Pierre Bourdieu . Paris, La Découverte “Recherches”, pp. 307-326.; Gaxie, 2013Gaxie, Daniel. (2013), “Retour sur les modes de production des opinions politiques”. In: Coulangeon, Philippe et al. Trente ans après La Distinction, de Pierre Bourdieu . Paris, La Découverte “Recherches”, pp. 293-306.) permanecem tendo validade empírica. Assim, pensar a relação entre posição social e política a partir dessa perspectiva pode trazer contribuições para além das análises que se restringem à escolha do voto, localizando o modo de produção das opiniões e posições políticas dentro de um conjunto de práticas e disposições relacionadas ao habitus.

O espaço da produção de opiniões políticas

Este estudo foi elaborado a partir da análise de 51 indivíduos, de diferentes características sociais, que se assemelham por ocuparem um lugar em canais de televisão e rádio, jornais impressos e blogs na internet, em que produzem e reproduzem diária ou semanalmente opiniões sobre economia, política e sociedade relativamente legitimadas e profissionalizadas (já que ancoradas no presente ou no passado recente em instituições como universidades, meios de comunicação, think tanks e movimentos sociais), tomando posições em momentos recentes chaves da política brasileira, tais como o impeachment da presidenta Dilma Rousseff, em 2016, e a eleição de Jair Bolsonaro, em 2018 - dois momentos de crise, aliás, que foram tomados como pontos de referência para a pesquisa. Esses agentes são também autores de livros com soluções políticas, econômicas e sociais para o país6 6 Foram considerados como critérios de seleção para a composição do corpus de análise: 1) A posse de coluna nos principais jornais e revistas do país, de espaço opinativo em programas de rádio e televisão ou ainda em blogs e sites de grande repercussão; 2) A publicação de livros sobre política, diferenças entre esquerda e direita, com propostas de soluções políticas, econômicas e sociais para o país; 3) O fato de terem tomado posição em torno do impeachment da presidenta Dilma Rousseff em 2016. A partir desses critérios, foram levantados os nomes nos principais jornais, revistas, canais de rádio e televisão, blogs e redes sociais de grande repercussão. .

Os dados dessas figuras foram coletados a partir de entrevistas realizadas ao longo de 2019 e 2020 com 31 dos nomes estudados, associadas a um levantamento das informações em currículos on-line, minibiografias em sites de instituições e redes sociais, entrevistas em jornais e revistas, programas de televisão e rádio, posts e textos na internet, livros escritos pelos autores, assim como livros, artigos, dissertações e teses sobre jornalistas, filósofos, economistas, que trouxessem elementos de suas trajetórias.

A maior parte desses agentes é de homens brancos, com mais de 50 anos, e apenas uma mulher negra, a mais jovem, tendo pouco mais de 35 anos. Concentram-se sobretudo no eixo São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília. Oriundos em sua maioria de classes médias ou altas, poucos vêm de classes populares, assim como hoje são dotados de relativo capital econômico e cultural, como parte das classes médias ou altas do país. Apesar dessas predominâncias em termos de dados macrossociais, há diferenças substanciais em termos de posição entre esses sujeitos no mercado de produção de opiniões, assim como de origens sociais, o que os leva a mobilizarem diferentes mecanismos de produção de opinião e discurso.

O mapeamento dessas posições foi realizado com auxílio da Análise de Correspondências Múltiplas (ACM)7 7 Para explicações sobre a Análise de Correspondências Múltiplas (ACM), ver Le Roux e Rouanet (2010), Duval (2015), Bertoncelo (2016b), Klüger (2018) e da Análise de Classificação Hierárquica (Análise de Cluster)8 8 Para explicações sobre a Análise de Classificação Hierárquica (ou Análise de Cluster), ver Bertoncelo (2016b); Klüger (2018) , a partir de dados sobre as relações que os agentes estabelecem com o poder político e econômico, o campo acadêmico, a imprensa, a mídia eletrônica e digital, e o mercado editorial9 9 Para aplicação dessas análises, foram seguidas as convenções estatísticas estabelecidas (Le Roux e Rouanet, 2010). Foram aplicadas treze variáveis ativas, com trinta modalidades ativas. As modalidades são seguidas pelo símbolo de “+” quando indicam a posse de uma propriedade e pelo símbolo de “-” quando indicam a ausência. Foram considerados então: o trabalho no sistema financeiro (Sistema financeiro+; Sistema financeiro-); a ocupação de cargos políticos (Cargos políticos+; Cargos políticos-); a atuação como consultor (Consultoria política e econômica+; Consultoria em outras áreas; Consultoria-); a ocupação de posições de destaque na imprensa (Posições importantes na imprensa+; Posições importantes na imprensa-); o alcance de prestígio jornalístico (Prestígio jornalístico+; Prestígio jornalístico-); a atuação no jornalismo mainstream versus a atuação no jornalismo blogueiro (Jornalistas mainstream; Jornalistas blogueiros; Jornalistas-); a atuação como comentarista ou apresentador em programas de rádio e televisão (Rádio e TV+; Rádio e TV-); a posse de canais no YouTube (YouTube+; YouTube-); a caracterização como best-seller (Bestseller+; Bestseller-); o fato de ter escrito ou não ficções (Ficção+; Ficção-); o nível de escolaridade (Doutorado+; Mestrado+ - projetada como suplementar por sua baixa ocorrência; Graduação+; Graduação-); a atividade de docência (Docência pública; Docência privada; Docência-); e a dedicação acadêmica (Dedicação acadêmica+; Dedicação acadêmica-). Foram considerados os dois primeiros eixos de análise, que apresentaram 92,9% de explicação (84% no eixo 1 e 8,9% no eixo 2), sendo também os mais sociologicamente significativos. . Também foram considerados os dados de origem social, inseridos como variáveis suplementares. Optei por ocultar os nomes dos indivíduos no gráfico, já que a proposta do artigo não é traçar um perfil dos analisados, nem identificar exatamente as tomadas de posição de cada um deles, mas sim investigar os diferentes mecanismos de produção de opinião em cada um dos polos que estruturam esse espaço (Tabelas 1 e 2).

Tabela 1
Categorias ativas com maior contribuição para a formação do Eixo 1*
Tabela 2
Categorias ativas com maior contribuição para a formação do Eixo 2

Os gráficos 1 e 2 demonstram uma oposição principal entre os agentes com mais capital acadêmico - materializado nos diplomas de doutorado e nas experiências como professores universitários - e aqueles com mais capital jornalístico - evidenciado pelas trajetórias em grandes jornais, prêmios recebidos e altos cargos na profissão. Na região central, situam-se aqueles com menor volume de capitais acadêmicos e jornalísticos; são os que ocupam posições mais dependentes de seus públicos. A partir dessas oposições e da aplicação da análise de cluster, foi possível identificar alguns polos10 10 Os nomes dos clusters foram definidos na pesquisa macro (Meirelles, 2021), da qual este artigo faz parte, a partir tanto das propriedades sociais prevalecentes em cada um deles quanto dos jogos de classificação em que os agentes estão inseridos, levando em consideração a forma como se classificam e como são classificados pelos pares e opositores. Há que se ressaltar que a pesquisa macro se valeu de dados para além daqueles presentes na acm, fortalecendo a justificativa em relação aos nomes de cada um dos polos. dentro desse espaço social:

Gráfico 1
Nuvem de indivíduos

Gráfico 2
Nuvem de variáveis

O polo dos mais acadêmicos (cluster 3) é caracterizado pela posse de mais capital acadêmico, com doutorados em universidades de prestígio, exercício da docência em universidades públicas, dedicação acadêmica - evidenciada pelo título de livre-docência e por bolsas de produtividade do CNPq. Esses agentes também mantêm uma interlocução com o poder político, tendo ocupado cargos em governos e prestado assessorias a partidos e políticos (Tabela 3).

Tabela 3
Modalidades ativas sobrerrepresentadas no Cluster 3 (Acadêmicos)

O polo dos mais especialistas (cluster 1) também possui relativo capital acadêmico, com diplomas de doutorado, mas nele se concentram os professores de universidades privadas, que mesclam docência e vida empresarial, como consultores de famílias endinheiradas, empresas, bancos e outros agentes do sistema financeiro e políticos. Assim, também são os que mais detêm capital político, atuando em altos cargos da burocracia estatal, em governos e partidos (Tabela 4).

Tabela 4
Modalidades ativas sobrerrepresentadas no Cluster 1 (Especialistas)

O polo dos jornalistas mainstream (cluster 5) caracteriza-se por trajetórias consagradas na profissão, com postos de prestígio nos grandes jornais, prêmios e citações em livros memorialísticos da área. São os funcionários das principais empresas de comunicação do país, com destaque para as Organizações Globo (Tabela 5).

Tabela 5
Modalidades ativas sobrerrepresentadas no Cluster 5 (Jornalistas Mainstream)

O polo dos jornalistas blogueiros (cluster 6), assim como os dos mainstream, são de repórteres consagrados. A diferença entre eles se dá, sobretudo, pelo fato de que esses escrevem hoje para blogs na internet, tendo deixado ou perdido os postos na chamada “grande mídia” em que também traçaram suas trajetórias (Tabela 6).

Tabela 6
Modalidades ativas sobrerrepresentadas no Cluster 6 (Jornalistas blogueiros)

O polo dos mais polemistas e mais militantes mais próximos ao jornalismo (cluster 4)11 11 Dois clusters são compostos pelos agentes classificados na pesquisa como “polemistas” e “militantes”. Isso ocorre porque as propriedades sociais com maior contribuição para o gráfico são aquelas mais ligadas ao capital acadêmico e ao capital jornalístico, de modo que o cluster 2 inclui os polemistas e militantes mais próximos da academia enquanto o cluster 4 inclui os polemistas e militantes mais próximos do jornalismo. Nesse sentido, as características prevalecentes entre esses agentes - tal como o fato de serem best-sellers e influentes em redes sociais - não são definidoras do espaço social nem distintivas, o que demonstra suas posições mais dominadas. Ademais, o fato de militantes (mais à esquerda) e polemistas (mais à direita) ocuparem os mesmos clusters demonstra a proximidade em termos das propriedades sociais consideradas como ativas na ACM. são os que não detêm capitais acadêmicos, têm uma trajetória na mídia, mas (ainda) não conquistaram o mesmo prestígio dos mais jornalistas. Como escritores - inclusive de ficções - e ativistas, suas posições são mais dependentes das reações dos públicos, estando entre eles os principais best-sellers e os mais seguidos nas redes sociais. Alguns dos que se reconhecem como mais à esquerda situados nesse polo são ligados a ongs e movimentos sociais; e alguns dos que se veem como mais à direita a think thanks.(Tabela 7)

Tabela 7
Modalidades ativas sobrerrepresentadas no Cluster 4 (Polemistas e militantes mais próximos do jornalismo)

Assim como os integrantes do cluster 4, os mais polemistas e militantes mais próximos da academia (cluster 2) são best-sellers, com números expressivos de seguidores na internet. Com algum capital acadêmico, eles já tentaram disputar lugares de prestígio na academia (sobretudo, os mais polemistas) ou ainda disputam (sobretudo, os mais militantes e mais jovens), sem terem alcançado a consagração no campo específico. Prestam consultorias em áreas como questões de gênero, raça, trabalho, comunicação e publicidade. Assim como no cluster 4, os considerados como mais à esquerda são ligados a ongs e movimentos sociais; os mais à direita a think thanks (Tabela 8).

Tabela 8
Modalidades ativas sobrerrepresentadas no Cluster 2 (Polemistas e militantes mais professores)

Como é possível observar pelo gráfico, nos quadrantes em que os capitais acadêmicos predominam (à direita do gráfico), há distinções mais explícitas entre os grupos, enquanto entre os mais jornalistas e midiáticos, as posições são mais próximas (à esquerda do gráfico). Enquanto há uma distinção nítida entre acadêmicos e especialistas, uma diferenciação objetiva entre jornalistas mainstream e jornalistas blogueiros, os polemistas e militantes se distribuem em dois polos, a partir da aproximação ou não com os capitais acadêmicos. Esse dado aponta para o fato de que o jornalismo e a mídia se caracterizam por um menor grau de diferenciação, concorrendo nesse espaço diferentes princípios de hierarquização, com pouco grau de autonomia. Já no polo mais acadêmico, existe um nítido distanciamento entre aqueles com trajetórias mais autônomas em relação à economia e aqueles com maior dependência dos jogos do chamado “mercado”.

Acadêmicos e especialistas são os agentes que menos dependem da mídia nesse conjunto. Suas trajetórias foram traçadas ao largo dela, tendo os espaços de comentário e análise política na imprensa um peso simbólico em suas atividades na universidade, na consultoria, nos cargos políticos ocupados, mas não sendo a origem de seus ganhos materiais nem de suas consagrações. Eles falam sobretudo para pares da universidade e tomadores de decisão.

Os jornalistas, tanto mainstream quanto blogueiros, ainda que tenham se deslocado posteriormente para canais de rádio, televisão e internet, formaram-se no jornalismo impresso, como repórteres, detentores de certas normas e valores profissionais, respondendo a essa posição acima de outros critérios midiáticos. São os que alcançaram reconhecimento na área. Seus discursos tentam equilibrar suas posições de mediação entre diferentes poderes: as fontes, os chefes, os valores organizacionais das empresas e seus leitores.

Já os mais polemistas e militantes têm suas posições fortemente dependentes das reações dos públicos, sendo o número de seguidores ou suas audiências moedas de troca para a conquista de novos empregos. São os que mais dependem das lógicas midiáticas mais heterônomas, tais como o uso da polêmica, os altos níveis de venda, a fronteira com o entretenimento. Seja pelos ganhos econômicos e individuais, seja com a justificativa de dar visibilidade a uma causa, esses agentes falam sobretudo para públicos de “não iniciados”.

Nos próximos tópicos, serão traçadas as relações entre essas posições, as origens sociais, expressões de gosto e posicionamentos políticos. Como forma de ilustrar os argumentos, trarei alguns trechos das entrevistas realizadas com esses agentes.

“Eu diria que eu sou de esquerda, sempre fui, desde antes de nascer, meu pai quis marcar o nome dos filhos dessa forma”

O polo dos mais acadêmicos dos intelectuais midiáticos se caracteriza por agentes, em sua maioria, vindos de famílias com relativamente mais capital cultural e político do conjunto estudado. Como filhos de intelectuais, professores universitários, militantes políticos - tendo os pais e mães de alguns sido exilados na ditadura militar brasileira e havendo participado da formação do Partido dos Trabalhadores (pt), por exemplo -, a maioria vivenciou um ambiente de esquerda desde a infância. Formaram-se em colégios de elite, viveram em outros países, aprenderam diversos idiomas, tiveram uma formação artística e intelectual, que se expressa nos gostos e práticas culturais anunciadas:

Eu me interesso muito pela música contemporânea, pela música que seria clássica contemporânea. A música erudita do século xix, xviii, xvii me interessa bastante. […] Eu não gosto da produção industrial, eu acho realmente que é uma coleção de mercadorias muito tipificadas, isso eu acho impossível de ouvir. […]

Eu fui educado em música erudita quando eu estava no seminário. […] De todos, eu gosto mais de Beethoven, mas gosto de Mozart também, Brahms, Stravinsky, que é de outra geração, Weber. Gosto muito de ópera, sobretudo Turandot.

Socializados em meio a discussões políticas, convivendo com artistas e intelectuais amigos de seus pais e tios, esses sujeitos adquiriram desde muito cedo as disposições propícias para a naturalidade na expressão de suas posições e ideias. Disposições essas que encontraram um terreno fértil na carreira acadêmica que seguiram, em faculdades de prestígio, convivendo com professores e colegas com quem mantiveram relações de proximidade e trocas múltiplas. Com títulos de doutorado, extensa produção acadêmica e editorial, reconhecimento dos pares, as disposições herdadas nos seios das famílias encontraram a legitimação necessária para esses agentes investirem no chamado “debate público”.

[…] a minha posição agora é de um intelectual público. […] É sempre um processo de aprendizado, mas que, para mim, é o mais importante, porque é o que me importa efetivamente: é ter uma influência sobre a esfera pública política, lideranças populares.

A participação no debate público acabou transformando a linguagem que eu uso, ensina muito em termos de comunicação com um público de leigos, e mesmo a inter-relação com outras áreas, interdisciplinaridade que a nossa pesquisa científica, acadêmica, ela não estimula.

Assim a relativa naturalidade com que assumem a posição de “intelectuais públicos” encontra barreira na adaptação que tiveram que fazer ao chamado “grande público”. O processo de ajustamento necessário para esses agentes demonstra, em alguma medida, a distância em relação a uma linguagem não acadêmica, não especializada, ou seja, uma linguagem dos “não iniciados”.

A naturalidade de suas disposições para expressar suas opiniões e formular análises sobre o mundo também se evidencia no modo como se afirmam de esquerda: esses agentes não apenas tomam posições consideradas assim, como também se reconhecem e são reconhecidos pelos pares dessa maneira. Ou seja, não parece haver uma forte contradição entre a forma como se veem e a maneira como são classificados, ou com o enquadramento social de suas tomadas de posição políticas.

Dominantes em termos de capitais propriamente intelectuais, os mais acadêmicos dos intelectuais midiáticos mantêm afinidades com os parâmetros dominantes do campo, tais como as próprias definições de esquerda e direita, de modo que suas avaliações sobre o que é ser de esquerda se encontra, em grande medida, com os critérios explícitos e implícitos do próprio campo intelectual. Nesse sentido, ao pedirem para se classificarem entre uma extrema direita e uma extrema esquerda, movem-se entre se reconhecerem como de esquerda - qualificada, por eles, como “convicta”, “radical” - e serem taxados como “extrema-esquerda”.

Eu sou alguém de esquerda, com viés comunista assumido, ainda mais quando as pessoas saem xingando “comunismo” […]. Acho que foi o Adorno que falou isto: “Eu sou judeu, mas só no sentido que o Hitler fala dos judeus”. Eu sou comunista só no sentido que a extrema-direita fala dos comunistas. […] É difícil, porque… nem todos imaginam que a extrema-esquerda é da mesma maneira…

Na esquerda. Não sei o que você chama de extrema-esquerda. Eu tenho grande admiração pela experiência do pós-guerra, com a construção do Estado de Bem-estar. Como dizia o Keynes, se me perguntarem, eu estou na extrema esquerda do firmamento intelectual - eu também estou nesse sentido. Não no sentido… eu sempre tive uma crítica muito forte ao marxismo da União Soviética, isso muito antigo, né? Como disse o Stédile, ele disse uma vez, que eu era um keynesiano marxista cristão. É isso. Mistura. Cristo era um radical também, se você olhar desse ponto de vista.

É difícil isso. Porque o ciclo do Brasil hoje, eu sou extrema esquerda, digamos assim, mas eu não sou um… se você achar que extrema esquerda é um comunista no sentido… mas eu não sou isso e tal. Mas, eu diria que a minha posição seria de uma reorganização radical do capitalismo e um controle político do capitalismo econômico.

A dificuldade em se localizarem em um ponto do espectro político foi anunciada por vários entrevistados, de todos os polos. Mas é interessante notar em que sentido essa dificuldade se observou. No caso dos mais acadêmicos, em geral, o dilema estava em torno dos sentidos de “extrema esquerda”. Por um lado, o adjetivo “extrema” implica uma certa conotação negativa, que os impede de se assumirem assim. Por outro lado, eles frisaram aspectos como o fato de serem assim reconhecidos, de estarem mais à esquerda do que imaginavam no contexto brasileiro, de adotarem certa radicalidade. Nesse sentido, parecem construir uma descrição que se afasta do imaginário comum sobre serem “extremos”, mas ao mesmo tempo disputam esse lugar de uma certa “radicalidade”, ou seja, o lugar das transformações reais do mundo - cada qual entendendo essas transformações e as possibilidades de sua realização de um modo. Somam-se a isso os complementos tais como “viés comunista”, “socialista democrático”, “militante socialista”, “keynesiano marxista cristão”, além de menções a partidos conhecidos como mais à esquerda no campo político brasileiro, tais como PSOL, PCdoB e PT.

“Nos termos do debate, em matérias de costumes, mais para esquerda, e em matéria econômica, mais para direita, com as categorias usuais”

Assim como os mais acadêmicos, alguns dos mais especialistas também são filhos de pais ou mães professores universitários, tendo tido acesso a discussões intelectuais e políticas desde cedo, bem como tendo passado por escolas e instituições universitárias de elite, com formação acadêmica extensa, diplomas de doutorado e publicações em suas áreas específicas. Relativamente, o volume de capital econômico herdado das famílias dos mais especialistas parece superior ao dos mais acadêmicos, o que se expressa, em alguma medida, nas práticas culturais e de lazer, bem como nas manifestações de gosto.

O senhor pratica algum esporte?

Pratico, sim. Tênis e caça submarina já não mais, a idade já não me permite. Esses foram os esportes que, em algum momento da vida, eu competi. […]

O senhor costuma acompanhar partidas de futebol?

Sim. Meu pai foi sempre muito ligado ao Botafogo. Eu herdei esse problema. […]

Acompanha em casa ou no estádio?

Em casa. Já não vou mais ao estádio.

Mas costumava ir?

Quando criança, sim. Meu pai era um entusiasta, ele tinha essas cadeiras perpétuas no Maracanã e, então, nós íamos sempre ao Maracanã, nessas cadeiras. Quer dizer, as cadeiras perpétuas foram vendidas no momento da construção do Maracanã, ele comprou um monte. Então, toda minha juventude eu fui ao Maracanã nessas cadeiras.

Meu pai tem uma casa de praia em São Sebastião. Eu sempre velejei muito. Eu adoro velejar.

Meu pai, um homem comerciante, que não conhecia nada de filosofia, mas adorava o filho dele - e eu também adorava o meu pai - ele disse: “Então, eu vou te ajudar”. Então, ele me mandou para França, e lá eu consegui uma bolsa.

Assim, por um lado, certos especialistas tiveram heranças familiares intelectuais e políticas; por outro, a maioria contou com o acúmulo de capitais econômicos adquiridos pelos pais para convertê-los em capitais acadêmicos, intelectuais e culturais. Também as posições que esses especialistas possuem no espaço social mantêm uma dualidade: por um lado, com trajetórias acadêmicas extensas, presença em debates intelectuais, convivência com pares da universidade, eles têm que responder minimamente aos princípios e critérios do universo mais acadêmico; por outro lado, como sócios de agências de consultoria, ligações com o sistema financeiro, donos de empresas, esses sujeitos respondem também aos princípios do chamado “mercado”. Essa dicotomia se expressa na forma como alguns especialistas se identificam politicamente, associando posições mais “liberais” em relação à economia (e, portanto, reconhecidas como mais à direita) a posicionamentos progressistas no campo dos costumes (mais à esquerda).

Com resquícios de uma espécie de “vergonha” em se assumirem como de “direita”, esses agentes tentam encontrar desvios para essa definição, seja afirmando que ela não é suficiente, seja aplicando a ideia de dois parâmetros, seja colocando-se ao centro: “Eu gostei de uma definição do Fernando Henrique: um radical moderado, um radical de centro”; “Politicamente, ainda que seja um oximoro, eu sou um radical de centro, cada vez mais comprometido com o centro político. […] Sou um extremista do centro”. Nesse sentido, esses especialistas se veem e são reconhecidos, nos espaços com lógicas distintas em que circulam, de maneiras contraditórias:

Meus amigos de direita acham que, porque eu trabalhei no governo Fernando Henrique e tal, eu sou comunista, e o pessoal de esquerda que eu conheço me enxerga à direita do governo Fernando Henrique, portanto, um neoliberal. Então, eu não estou em lugar nenhum, se é assim eu estou no centro.

É interessante ressaltar como também nesse conjunto o adjetivo “radical” se aplica com conotações positivadas - o que parece coadunar-se com posições mais próximas à trajetória acadêmica e mais dominantes, as quais se apresentam como as que, dentro desse espaço, sofreriam menos pressões para negociarem suas tomadas de posição. Ademais, a menção aos governos de Fernando Henrique Cardoso e ao psdb como réguas de medida também é mais comum nesse polo, servindo inclusive de justificativa para certos agentes localizarem-se como de centro-esquerda, ainda que com tomadas de posição e afinidades eletivas mais associadas à (centro-)direita.

Centro-esquerda, apesar de no Brasil eu ser taxado de direita. Acho super esquisito isso. Certamente, no Chile, votaria na Bachelet. Certamente, o governo FHC é à esquerda da Bachelet. Por que no Chile a Bachelet é de esquerda e no Brasil o FHC é de direita, eu não sei.

Além disso, há nesse grupo agentes que se qualificam diretamente como de direita ou centro-direita. Nesse sentido, o que se percebe é que quanto mais as origens sociais são próximas a uma intelectualidade ou militância, mais eles tentam se aproximar da esquerda (por meio das estratégias citadas acima) e, quanto menos tributários, em suas origens sociais, do estilo de vida e das defesas de esquerda, menos barreiras eles demonstram em se assumirem abertamente como de direita. De um modo ou de outro, esses agentes tomaram posições a favor do impeachment de Dilma Rousseff, e a maioria apoiou Jair Bolsonaro no segundo turno das eleições de 2018, envergonhadamente ou não, ou optaram pelo voto nulo, com o argumento de que se tratava de polos equivalentes em disputa.

“Qual é a minha ideologia? É o jornalismo”

Os mais jornalistas, tanto os mais mainstream quanto os mais blogueiros, os mais à esquerda ou os mais à direita, apresentam características comuns em relação aos mecanismos que acionam para se classificarem. Com exceção de apenas um jornalista mais jovem, eles se inseriram na profissão nos anos 1960 e 1970, tendo vivenciado a efervescência cultural e política dessas décadas, enfrentando as censuras e perseguições da ditadura civil-militar. Nesse sentido, os ambientes familiares de infância e as cidades com características mais conservadoras em que cresceram (sendo boa parte dos jornalistas oriundos do interior de Minas Gerais e São Paulo) chocaram-se com as mudanças que esses agentes passaram nos anos da faculdade ou dos primeiros anos de redação.

Em seus relatos, é comum a referência à Música Popular Brasileira (MPB) e a alguns de seus representantes mais emblemáticos - tais como Caetano Veloso, Chico Buarque, Gilberto Gil, Gal Costa, Milton Nascimento -, como formadores não apenas de gostos musicais, mas também de um modo de vida, de um pensamento político.

J&Cia - Você chegou aqui num caldeirão político. Tinha já alguma formação de esquerda?

Fernando - Não. Meu irmão mais velho era um cara de esquerda. Meu pai não tinha convicções visíveis, mas nunca apoiou o golpe, por exemplo. Nunca, em nenhum momento, na minha casa, alguém foi para a oposição. Mas a minha cabeça política foi feita aqui. Antes de ser feita pela política foi feita pela música, porque fui durante um período repórter e depois editor de Variedades do Jornal da Tarde e isso me aproximou dos Baianos… o [Gilberto] Gil e o Caetano [Veloso]. […] Acabei me convencendo que uma das maneiras de lutar contra a ditadura era lutar contra os valores da cultura burguesa. Eu era contra a família e a favor de todas as drogas… (Morais apudRibeiro e Baroncelli, 2010Ribeiro, Eduardo & Baroncelli, Wilson. (2010), “Fernando Morais: um olhar no jornalismo e o outro na literatura. E os dois na grande reportagem”. Protagonistas da Imprensa Brasileira - Jornalistas&Cia, setembro., p. 5).

Soma-se a essa troca cultural o fato de terem vivenciado um período considerado mítico no jornalismo brasileiro, cujas resistências à ditadura serviram para a construção de uma memória heroica da profissão no país, bem como de seus jornalistas. Tributários, portanto, de valores de esquerda, esses jornalistas também encontram mais dificuldades para se assumirem como de “direita”, mesmo quando se aproximam dela em termos de tomada de posição. Quanto mais identificados como à direita do espectro político, mais adotam o “centro” como estratégia de escape dessa posição. Apenas dois dos mais jornalistas entrevistados afirmaram-se como de centro-direita, adotando como critério, mais uma vez, a justificativa econômica.

Em posições de mediação, muitas vezes dependentes das interpretações do mundo social oferecidas por especialistas e acadêmicos, localizados em uma rede de interdependências, esses jornalistas precisam dosar suas tomadas de posição, sob o risco de abalarem suas credibilidades. Assim, reproduzem em certa medida os argumentos adotados pelos mais especialistas e acadêmicos, sem no entanto a adição da “radicalidade”, que, dentro dos princípios que seguem, poderia ameaçar suas posições. Ademais, em suas autoclassificações e visões políticas, expressam as próprias noções que perpassam suas práticas profissionais, tais como equilíbrio, pluralidade, moderação, imparcialidade, apartidarismo, o que fica explícito nas entrevistas com jornalistas mainstream:

Eu sempre me descrevi como de centro, porque, como jornalista, eu obrigatoriamente tinha que conversar sem preconceito com a direita, com a esquerda, com o centro, e consegui isso. É uma das vitórias da minha carreira, que eu consegui não ser tragada pela ideologia. Então, eu sou de centro, mas eu sou a favor da liberdade, da democracia, dos direitos…

Quando você trabalha no jornalismo político, se você trabalha nisso com honestidade de propósitos e sem esse engajamento partidário e tal, você nota muito rapidamente que está diante de um grande teatro. […] E você nota, se tiver um olhar sem preconceito, sem condicionamento, sem ser engajado e tal, que não tem mocinho que é 100% mocinho, nem bandido que é 100% bandido. E que em todos os partidos, todas as áreas […] quase todos né, hoje em dia tem uns aí que é mais difícil… você encontra gente boa, gente ruim, gente correta, gente sacana, gente que está ali pela política, gente que está para fazer negócio.

Mesmo no caso dos jornalistas mais blogueiros, que assumem tomadas de posição mais evidentemente de esquerda, essa afirmação encontra riscos: “Qualquer vinculação… já é complicado de qualquer jeito, porque você já tem subjetivamente as suas preferências. Então, você tem que estar o tempo todo duelando contigo mesmo”. Se, por um lado, dependem de seus públicos de nicho, por outro, precisam também manter abertas as fronteiras para públicos mais amplos, assim como para outros empregos:

Eu não acho que o meu site ser declaradamente de esquerda, ou seja, tem um viés assumido, eu não acho que isso me prejudique jornalisticamente […]. Eu acredito que, ao longo desses anos, tenho mais de trinta anos como jornalista, eu conquistei uma credibilidade, tanto é que meus colegas da mídia comercial divulgam os meus textos normalmente quando eles gostam de alguma coisa que eu escrevi. Também acho que essa história do jornalismo imparcial é uma balela, que a imprensa comercial inventou para dizer que eles não têm lado, sendo que o lado deles sempre foi explícito, basta a gente ver a perseguição que eles fizeram ao PT todos esses anos. O que eu defendo é que o jornalismo não precisa ser imparcial, o que ele precisa ser é honesto, e o que eu faço é jornalismo honesto. O que eu acho que pode me prejudicar ou me prejudica é certamente se eu fosse procurar emprego na mídia comercial, eu teria dificuldades, porque, como eles passam essa imagem falsa de que são imparciais, não costumam ver repórteres que têm uma posição política declarada.

Nesse sentido, ao contrário dos mais acadêmicos, a afirmação dos jornalistas como sendo de esquerda vem sempre carregada de riscos a suas próprias posições nesse mercado de produção de opinião, já que pode levá-los a dificuldades em empregos e a restrições a certos nichos de público. Para aqueles com tomadas de posição mais próximas à direita (como apoio ao impeachment de Dilma Rousseff, apoio ou construção dos argumentos dos polos equivalentes entre Jair Bolsonaro e Fernando Haddad nas eleições de 2018), o comportamento assemelha-se em alguma medida ao dos mais especialistas, no sentido de que também expressam certa “vergonha” em se assumirem como de “direita” e de que utilizam como parâmetro para tais definições a figura e o governo de fhc. Nas expressões de preferência política, também fica evidente a posição dominada dos mais jornalistas, com uma boa vontade cultural e intelectual e uma posição de admiração em relação a fhc, no caso de vários dos mais mainstream:

Eu sou… como é que eu vou me definir? Está tudo tão maluco… era mais fácil negócio de PSDB, tal, eu sempre fui simpatizante de uma coisa assim com o psdb, não sei como a gente pode chamar isso… por exemplo, acho Fernando Henrique bárbaro, quer dizer, bárbaro assim… pô, foi ótimo aquele governo, de uma gente estudada, bem-intencionada… nem todo mundo, claro, bandidagem tem em todo canto… mas, assim, no geral era bom, ambiente legal, entendeu?! Ambiente legal. E eu gosto daquela gente, né? Assim, é o mais próximo de explicação que eu possa te dar… Então, é difícil dizer, seria facílimo eu te falar assim: “centro-esquerda”, todo mundo que é tucano, não sei o quê, diz isso [risos], centro esquerda… mas acho tão… não sei se define, sabe?! […] Gosto de tucano. Agora, gosto de todos os tucanos? Claro que não, né? […] Então, eu gosto dessa gente assim… eu gosto de Fernando Henrique. Ai, eu gosto dessa gente inteligente, sabida, sabe?!

Já aqueles com tomadas de posição associadas mais à esquerda e estando no polo dos mais blogueiros, essa afinidade eletiva se expressa, em geral, em relação à figura de Luiz Inácio Lula da Silva. De um modo ou de outro, a despeito do discurso de neutralidade que perpassa as narrativas dos jornalistas, o mecanismo de produção de suas opiniões parece mais dependente dos vínculos estabelecidos com determinadas fontes, com os jornais em que trabalham, mas também com as figuras políticas com quem mantêm afinidades. Ademais, há um componente moral forte nas falas e produções desses jornalistas em torno da questão da corrupção, por exemplo, o qual se relaciona tanto com as disposições desses agentes - ligadas às suas origens sociais, com componentes mais conservadores, como a religião, as famílias e as cidades com tal característica - quanto com a illusio em torno do jornalismo como quarto poder, responsável por fiscalizar os outros.

“Eu prefiro nunca esconder que eu venho de uma visão de mundo de direita, eu sou um cara que atua na causa liberal há anos, eu não escondo isso de ninguém”

Entre os mais polemistas e mais militantes dos agentes estudados, estão aqueles com origens e posições sociais mais instáveis. É nesses polos que aparecem mais indivíduos de origens populares, filhos de empregadas domésticas e trabalhadores manuais, por exemplo. Mas também há nesses dois polos filhos de famílias abastadas, que vivenciaram falências e instabilidades financeiras. Entre esses agentes, os discursos de mobilidade social são mais comuns e os gostos expressam práticas não acionadas pelos outros polos, como pode ser observado nos trechos das entrevistas de alguns dos mais polemistas:

Aí, na 8ª [série], meu pai faliu, sumiu de casa, sabe “foi comprar cigarros e não voltou mais”?!

Atualmente, meu consumo cultural é mais caseiro. Gosto muito de programas de humor; séries, eventualmente; vejo filmes, em geral em casa. Gosto preferido em cultura e arte é musical. E aí, música é permanente, no carro, em casa… não trabalhando, nos deslocamentos, de lazer. Música é o principal consumo cultural. Sou músico amador também.

Pergunta: Quais atividades culturais você prefere?

Entrevistado: Cinema. Gosto de debates assim, não sei se isso é… palestras, debates sobre economia e tal. E tv, né… televisão, séries, videogame. Videogame é atividade cultural? […]

Pergunta: Qual seu estilo musical favorito?

Entrevistado: Chato falar eclético, né!? Pera aí, deixa eu pensar. Eu gosto de rock britânico dos anos 1980, assim. […] Ah, bota o Karaokê lá em cima, porque eu vou muito ao Karaokê.

Mesmo aqueles com origens sociais mais privilegiadas diferenciam-se dos mais acadêmicos e mais especialistas por não terem traçado uma trajetória acadêmica. Ou seja, são em geral os herdeiros despossuídos de títulos acadêmicos, os despossuídos de herança com títulos acadêmicos ou ainda os dois. Ainda assim, dentro do volume de capital desses agentes, é possível perceber relações, por um lado, entre aqueles cujos capitais escolar, cultural e político tiveram mais peso e valorização na origem social e os posicionamentos mais à esquerda; e, por outro, aqueles cujo capital econômico tem maior peso e os posicionamentos mais à direita.

Entre os mais polemistas, estão os que se assumem mais abertamente como de “direita” e os que são reconhecidos de forma mais enfática dessa maneira. Embora haja jornalistas mainstream e especialistas que assim se afirmem e que assim são identificados, é no polo dos mais polemistas que estão aqueles que se colocam também como “militantes” de direita. Socializados em think tanks e com contato com partidos, como o Partido Novo, os mais jovens desses polemistas associam um certo liberalismo econômico com o apreço pelo conservadorismo:

Aos poucos, eu fui percebendo que o que tirava as pessoas da pobreza, por exemplo, não era nada que… não é lei do salário-mínimo que vai aumentar de fato o salário dos trabalhadores. E fui entendendo um pouco mais de economia e vendo que a maior parte das medidas de esquerda, elas são tiros no pé, elas pioram o problema que elas tentam ajudar, que elas tentam resolver. E, além disso, eu conheci pelo Pondé o pensamento conservador e achei muito legal, muito interessante. Não que hoje eu seja um conservador, mas achei bem elegante.

Depois que eu escrevi os livros, muitos think tanks liberais me procuraram para dar palestras ou para conversar e tal. A partir deles, eu comecei a ler muita coisa. […] eu vim de uma faculdade muito ruim, então não conhecia Milton Friedman, não conhecia os economistas básicos, os mais básicos… e fui conhecendo tudo por esses movimentos de divulgação de ideias, que foram muito importantes.

Nesses casos, ao contrário de acadêmicos e especialistas, cujas socializações se deram sobretudo nos departamentos universitários em que estudaram, ou dos mais jornalistas, que se formaram nas redações dos grandes jornais, os mais polemistas e militantes atribuem suas formações a outros espaços, tais como think tanks, para os mais à direita, e movimentos sociais, para os mais à esquerda. Assim, se aqueles que se identificam ou tomam posição mais próxima à direita nos outros polos assumiram uma certa aproximação ou admiração com o psdb, aqui, o apoio a Jair Bolsonaro se tornou mais evidente (entre os mais especialistas, esse apoio apareceu também em alguns agentes; e apenas um dos mais jornalistas mainstream também o expressou):

Eu acho que uma coisa, talvez, importante só de frisar é exatamente a influência do fato de a “direita” ter chegado ao poder, como que isso impacta na nossa luta e nos movimentos. E isso é uma coisa que a gente está vendo agora, esse grande dilema, porque tem muitos dos movimentos que entendem que Bolsonaro está longe de ser perfeito, mas mal ou bem representa muito das ideias que a gente pensa e, inclusive, com o ministério na área econômica muito alinhado […].

Como regra no conjunto dos agentes estudados, mesmo os polemistas que apoiam Bolsonaro e que têm tomadas de posição mais associadas à extrema-direita tentam fugir da caricatura do “extremo”: “Eu acho que nesse caso os extremos são que nem ferradura, se encostam […] eu não sou nem um socialista, nem um reacionário, eu sou um liberal clássico à direita”. Da mesma forma o fazem os militantes mais à esquerda, mas é importante ressaltar que esses não se ligam a partidos ou figuras políticas que acionam a violência como estratégia política recorrente, nem adotam posicionamentos com o conteúdo e a forma de violência dos mais à direita:

Eu venho de uma classe social explorada e desfavorecida, eu não venho das classes abastadas que produzem determinado tipo de intelectual, digamos, muitas vezes decorativo. Eu não queria ser essa intelectual decorativa da Zona Sul do Rio de Janeiro. Então, eu fui procurar também… eu, digamos, fui para o pt procurar a minha turma.

Eu sou uma pessoa feminista (risos), eu sou feminista, ou seja, eu sou uma pessoa de esquerda, é uma esquerda feminista, é uma esquerda bastante radical, mas não é uma extrema-esquerda. É a esquerda da democracia radical.

Enquanto os militantes mais à esquerda têm suas posições políticas mediadas pela participação em certos movimentos sociais, tais como o movimento negro, o movimento feminista, o mst, os posicionamentos dos polemistas mais à direita associam-se à causa liberal ou ao combate a esses movimentos de esquerda e a ideias como do “politicamente correto”. O trecho seguinte ilustra tanto a posição desses polemistas nesse mercado como esse mecanismo de produção de opinião:

Eu acho que as minhas crônicas sempre tiveram entretenimento […] o meu leitor é o leitor que curte isto, aquela aparição literária sem pretender ser literária, mas sendo, né?, com humor, com pensamento, essa mistureba aí. E, dentro da política, para simplificar, eu acho que a questão da minha reação é sempre muito clara à falsa virtude, ao falso progressivo, né?, ao que supostamente se associa à esquerda sem ser, não uso essa terminologia porque acho que ela está errada, ao politicamente correto. Eu acho que uma coisa que atravessa de fato toda… talvez, que unifique de alguma maneira o meu público, se isso é preciso dizer, é esse tipo de crítica, que é… que custa caro para mim, digamos, porque contraria, né?, muita gente de uma elite cultural, onde eu convivo também, né…

De todo modo, à esquerda ou à direita, esses agentes buscam, consciente ou inconscientemente, transformar as narrativas de suas trajetórias como uma espécie de capital que não apenas sustenta suas posições no espaço da produção e reprodução de opinião política, bem como justifica e embasa suas tomadas de posição. Criados com menos estímulos e reconhecimentos sobre seus lugares enquanto pessoas aptas a expressarem suas opiniões, eles forjaram essas habilidades em espaços como militância política e redes sociais.

Um dos mecanismos que mobilizam é o da “representação social”, tanto à esquerda quanto à direita. Esses últimos, por exemplo, com frequência, argumentam sobre uma dissociação entre as classes artísticas e intelectuais, que seriam mais à esquerda, e a população brasileira (incluindo pobres e classe média), tida como mais conservadora - ou seja, associam-se também a um certo anti-intelectualismo ou antiacademicismo. Colocam-se, nesse sentido, como representantes dessa sociedade, que não teria voz nos meios de comunicação e nas universidades. Ao mesmo tempo, são esses que reproduzem com veemência os discursos sobre “vitimismo”, “populismo”, “socialismo”, defendendo interesses dos dominantes economicamente no país.

Aqueles que se situam mais à esquerda também acionam os dados de exclusão de mulheres, negros, jovens, trabalhadores nos meios de comunicação e nas universidades como meio de legitimarem suas presenças nesse mercado de opiniões, bem como seus discursos. Ao mesmo tempo, estão fortemente inseridos nas lógicas da indústria do entretenimento e do mercado editorial, reproduzindo as heteronomias desses espaços. Dominados no mercado da produção de discursos, com menor volume de capital específico e distintivo (sobretudo em relação ao polo dos mais acadêmicos e especialistas), militantes e polemistas buscam de certa forma transformar suas desvantagens nesse mercado em trunfo, ao tornarem os elementos sociais que justamente excluem desse mercado os agentes com origens sociais semelhantes em formas de legitimarem suas posições e discursos.

Entre os que se situam mais próximos a esses dois polos, parece haver menor mediação entre os dados de origens sociais e os discursos promovidos. Assim, encontram-se dependentes de determinados públicos e temas, performances e características pessoais, para se inserirem e permanecerem no jogo. São assim, com frequência, chamados a falar sobre suas vidas pessoais, mesclando suas opiniões sobre o Brasil com suas experiências vividas; ou convidados a entrevistas pelas suas performances tidas como “polêmicas”, “corajosas”, “inconformistas”, “iconoclastas”; mas, por outro lado, também classificadas como “pop” - ou seja, fortemente vinculadas à indústria do entretenimento.

Considerações finais

Como um espaço de interseção entre diversos poderes e campos, o mercado da produção de opinião, centrado na mídia, é regido por critérios e lógicas concorrentes entre si. Nesse sentido, agentes com diferentes capitais, que respondem a princípios, regras explícitas e implícitas, critérios de hierarquização e classificação distintos, disputam os lugares mais dominantes desse espaço, com os recursos e trunfos que conseguem acionar. Há, entre eles, os que têm forte legitimidade no campo intelectual e acadêmico específico; os que têm poder econômico e influência política mais direta; os que se ancoram em valores e reconhecimentos profissionais e institucionais do jornalismo; os que se valem sobretudo de suas performances e polêmicas; os que conseguiram obter uma eficácia simbólica na narrativa acerca de suas trajetórias; os que se associam a causas e movimentos sociais.

Nesse espaço, a naturalidade com que alguns se colocam enquanto formuladores de ideias e análises sobre o mundo social, associada ao reconhecimento dos pares e outros tomadores de decisão, se contrapõe à lacuna que há entre as disposições de origem e aquelas adquiridas em outros agentes, os quais mantêm afinidades menos mediadas com seus públicos, leitores, seguidores e fãs. Ao disputarem os sentidos e as referências do que seja esquerda e direita, mas também as valorações dessas classificações, esses agentes também disputam os seus lugares no mercado de opiniões e a legitimidade de seus capitais.

A partir do encontro entre habitus e espaço social, foi possível estabelecer correlações entre as origens sociais, as posições que os agentes ocupam nesse mercado e os mecanismos de seus discursos e posicionamentos políticos, os quais se relacionam com as diferentes ancoragens de suas legitimidades. Nesse sentido, este artigo buscou demonstrar como essas tomadas de posição política não estão descoladas das origens e posições de classe, mas também das posições que eles ocupam nesse mercado, tentando traçar as formas como esses elementos interagem entre si. Ademais, procurou ilustrar, ainda que brevemente, como tais distinções se associam a diferentes expressões de gosto cultural.

Entre a Cultura e a Política, este trabalho tentou demonstrar como a perspectiva da sociologia da cultura, especificamente a de Pierre Bourdieu, contribui para se pensar a relação entre classe social e política, ao inserir as visões de mundo e os mecanismos de produção de opinião em um conjunto de práticas, preferências culturais, estilo de vida e posição no espaço social. Assim como os trabalhos citados na introdução (Laurison, 2013Laurison, Daniel. (2013), “La production des opinions aux États-Unis, trente ans après La Distinction”. In: Coulangeon, Philippe et al. (org.). Trente ans après La Distinction, de Pierre Bourdieu . Paris, La Découverte “Recherches”, pp. 307-326.; Cautrés et al., 2013Cautrès, Bruno et al. (2013), “Retour sur l’hypothèse de ‘l’homologie structurale’: les déplacements des catégories sociales dans l’espace politique français depuis La Distinction”. In: Coulangeon, Philippe et al. Trente ans après La Distinction, de Pierre Bourdieu. Paris, La Découverte “Recherches”, pp. 327-337.; Gaxie, 2013Gaxie, Daniel. (2013), “Retour sur les modes de production des opinions politiques”. In: Coulangeon, Philippe et al. Trente ans après La Distinction, de Pierre Bourdieu . Paris, La Découverte “Recherches”, pp. 293-306.), este artigo buscou mostrar a importância do capital cultural para a análise da relação entre classe e posicionamento político. Mas, além disso, ao centralizar a análise no espaço da produção cultural e ideológica, este artigo também estabeleceu a mediação dessa relação a partir dos jogos do campo em que os agentes estão inseridos.

Por outro lado, ao correlacionar as visões políticas com o gosto, o artigo também intentou demonstrar os ganhos analíticos para a compreensão da relação entre classes sociais e cultura de uma abordagem que leve em conta a produção de opinião e visões de mundo como integrada a esse universo simbólico. Ou seja, também para o estudo das práticas culturais e da dinâmica do campo da produção e do consumo cultural, os posicionamentos e capitais políticos parecem relevantes, especialmente no Brasil, em que os campos intelectual, artístico e político mantêm relações estreitas e relativamente pouco autônomas (Miceli, 2001Miceli, Sergio. (2001), Intelectuais à brasileira. São Paulo, Companhia das Letras.; Meirelles, 2021Meirelles, Allana. (2021), Opiniões à venda: oposições políticas e divisão do trabalho intelectual na mídia. 465 f. São Paulo, tese de doutorado, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, 2021.).

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    » https://www.anpocs.com/index.php/papers-40-encontro/st-10/st16-7/10296-o-uso-da-analise-de-correspondencias-multiplas-nas-ciencias-sociais-possibilidades-de-aplicacao-e-exemplos-empiricos/file
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  • Singer, André. (2012), Os sentidos do lulismo: reforma gradual e pacto conservador São Paulo, Companhia das Letras.
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    Neste trabalho, a proposta é pensar como os agentes estudados mobilizam as categorias de “esquerda” e “direita”, a partir da forma como se classificam e são classificados, como classificam os outros e como elas se correlacionam com as tomadas de posição que tiveram em dois períodos de crise recentes: o impeachment de Dilma Rousseff e a eleição de Jair Bolsonaro. Nesse sentido, não se tem o objetivo de definir o que seja esquerda e direita nem enquadrar os agentes nessas categorias, mas sim colocar em evidência justamente essas lutas em torno dessas classificações no espaço da produção de opinião midiática, relacionando essas classificações com os dados de posição social.
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    Fazem parte desse conjunto: Alexandre Schwartsman, André Singer, Antonio Prata, Arnaldo Jabor, Augusto Nunes, Bernardo Mello Franco, Bob Fernandes, Bolívar Lamounier, Carlos Alberto Sardenberg, Cynara Menezes, Demétrio Magnoli, Denis Rosenfield, Diogo Mainardi, Djamila Ribeiro, Dora Kramer, Eduardo Moreira, Eliane Cantanhêde, Emir Sader, Fabio Giambiagi, Fernando Gabeira, Fernando Morais, Fernando Schüler, Florestan Fernandes Jr., Guilherme Fiuza, Gustavo Franco, Jessé Souza, Joice Hasselmann, Laura Carvalho, Leandro Narloch, Leonardo Sakamoto, Luís Nassif, Luiz Felipe Pondé, Luiz Gonzaga Belluzzo, Marcelo Rubens Paiva, Marcia Tiburi, Marco Antonio Villa, Marilena Chaui, Mario Sergio Conti, Merval Pereira, Míriam Leitão, Monica de Bolle, Murillo de Aragão, Paulo Henrique Amorim, Paulo Moreira Leite, Rachel Sheherazade, Reinaldo Azevedo, Ricardo Amorim, Rodrigo Constantino, Samuel Pessôa, Olavo de Carvalho, Vladimir Safatle. Esse conjunto, apesar de amplo, não se pretendeu exaustivo.
  • 3
    Apesar das transformações ligadas às redes sociais, observa-se a manutenção de uma divisão entre os que detêm legitimidade enquanto produtores de opinião e os que não detêm: iniciados e não iniciados (Bourdieu, 2015aBourdieu, Pierre. (2015a), A distinção: crítica social do julgamento. São Paulo, Porto Alegre, Edusc; Zouk. ; Bourdieu, 2015bBourdieu, Pierre. (2015b), A economia das trocas simbólicas. São Paulo, Perspectiva.), “influenciadores” ou “formadores de opinião” e “simples cidadãos” (Bourdieu, 2015aBourdieu, Pierre. (2015a), A distinção: crítica social do julgamento. São Paulo, Porto Alegre, Edusc; Zouk. , pp. 372-373). Ademais, ainda que formadores de opinião socializados nas redes sociais passem a disputar um lugar no mercado de produção de discursos, os grandes meios de comunicação, jornais e universidades ainda detêm uma estrutura institucional e profissional de produção, reprodução e consagração que mantém seus agentes em posições relativamente legitimadas e privilegiadas nesse jogo.
  • 4
    Para uma discussão sobre as celebridades como modelo a ser imitado, ver Mira e Bertoncelo, 2019Mira, Maria Celeste & Bertoncelo, Edison. (2019), “Apresentação. Para além da distinção? Desafios à abordagem bourdieusiana da formação social do gosto”. Estudos de Sociologia, Araraquara, 24 (46): 19-43, janeiro a junho. , p. 31. Sobre os “intelectuais pop”, “intelectuais midiáticos”, “fast thinkers”, ver Pinto, 2009Pinto, Louis. (2009), Le café du commerce des penseurs: à propos de la doxa intellectuelle. Broissieux, Éditions du Croquant.; Bourdieu, 1998Bourdieu, Pierre. (1998), On television. Nova York, The News Press.; Meirelles, 2021Meirelles, Allana. (2021), Opiniões à venda: oposições políticas e divisão do trabalho intelectual na mídia. 465 f. São Paulo, tese de doutorado, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, 2021.
  • 5
    Com a ampliação do acesso ao ensino superior no Brasil, houve um incremento na inserção de mulheres, não brancos e pobres nas universidades (Ridenti, 2018Ridenti, Marcelo. (2018), “Mudanças culturais e simbólicas que abalam o Brasil”. Revista Plural. São Paulo, 25 (1): 45-62, agosto.; Singer, 2018Singer, André. (2018), O lulismo em crise: um quebra-cabeça do período Dilma (2011-2016). São Paulo, Companhia das Letras.) - um contingente de pessoas aptas a ocuparem lugares nesse espaço da produção ideológica bem como a consumirem seus produtos.
  • 6
    Foram considerados como critérios de seleção para a composição do corpus de análise: 1) A posse de coluna nos principais jornais e revistas do país, de espaço opinativo em programas de rádio e televisão ou ainda em blogs e sites de grande repercussão; 2) A publicação de livros sobre política, diferenças entre esquerda e direita, com propostas de soluções políticas, econômicas e sociais para o país; 3) O fato de terem tomado posição em torno do impeachment da presidenta Dilma Rousseff em 2016. A partir desses critérios, foram levantados os nomes nos principais jornais, revistas, canais de rádio e televisão, blogs e redes sociais de grande repercussão.
  • 7
    Para explicações sobre a Análise de Correspondências Múltiplas (ACM), ver Le Roux e Rouanet (2010)Le Roux, Brigitte & Rouanet, Henry. (2010), Multiple correspondence analysis. Londres, Sage., Duval (2015)Duval, Julien. (2015), “Analisar um espaço social”. In: Paugam, Serge (org.). A pesquisa sociológica. Tradução de Francisco Morás. Petrópolis, Vozes, pp. 218-237. , Bertoncelo (2016b) Bertoncelo, Edison . (2016b), “O uso da Análise de Correspondências Múltiplas nas Ciências Sociais: possibilidades de aplicação e exemplos empíricos”. Anpocs, 40. 2016. Caxambu, Anpocs . Anais Eletrônicos… Disponível em: https://www.anpocs.com/index.php/papers-40-encontro/st-10/st16-7/10296-o-uso-da-analise-de-correspondencias-multiplas-nas-ciencias-sociais-possibilidades-de-aplicacao-e-exemplos-empiricos/file, consultado em 23/01/2020.
    https://www.anpocs.com/index.php/papers-...
    , Klüger (2018)Klüger, Elisa. (2018), “Análise de correspondências múltiplas: fundamentos, elaboração e interpretação”. Bib, 86: 68-97, outubro.
  • 8
    Para explicações sobre a Análise de Classificação Hierárquica (ou Análise de Cluster), ver Bertoncelo (2016b) Bertoncelo, Edison . (2016b), “O uso da Análise de Correspondências Múltiplas nas Ciências Sociais: possibilidades de aplicação e exemplos empíricos”. Anpocs, 40. 2016. Caxambu, Anpocs . Anais Eletrônicos… Disponível em: https://www.anpocs.com/index.php/papers-40-encontro/st-10/st16-7/10296-o-uso-da-analise-de-correspondencias-multiplas-nas-ciencias-sociais-possibilidades-de-aplicacao-e-exemplos-empiricos/file, consultado em 23/01/2020.
    https://www.anpocs.com/index.php/papers-...
    ; Klüger (2018)Klüger, Elisa. (2018), “Análise de correspondências múltiplas: fundamentos, elaboração e interpretação”. Bib, 86: 68-97, outubro.
  • 9
    Para aplicação dessas análises, foram seguidas as convenções estatísticas estabelecidas (Le Roux e Rouanet, 2010Le Roux, Brigitte & Rouanet, Henry. (2010), Multiple correspondence analysis. Londres, Sage.). Foram aplicadas treze variáveis ativas, com trinta modalidades ativas. As modalidades são seguidas pelo símbolo de “+” quando indicam a posse de uma propriedade e pelo símbolo de “-” quando indicam a ausência. Foram considerados então: o trabalho no sistema financeiro (Sistema financeiro+; Sistema financeiro-); a ocupação de cargos políticos (Cargos políticos+; Cargos políticos-); a atuação como consultor (Consultoria política e econômica+; Consultoria em outras áreas; Consultoria-); a ocupação de posições de destaque na imprensa (Posições importantes na imprensa+; Posições importantes na imprensa-); o alcance de prestígio jornalístico (Prestígio jornalístico+; Prestígio jornalístico-); a atuação no jornalismo mainstream versus a atuação no jornalismo blogueiro (Jornalistas mainstream; Jornalistas blogueiros; Jornalistas-); a atuação como comentarista ou apresentador em programas de rádio e televisão (Rádio e TV+; Rádio e TV-); a posse de canais no YouTube (YouTube+; YouTube-); a caracterização como best-seller (Bestseller+; Bestseller-); o fato de ter escrito ou não ficções (Ficção+; Ficção-); o nível de escolaridade (Doutorado+; Mestrado+ - projetada como suplementar por sua baixa ocorrência; Graduação+; Graduação-); a atividade de docência (Docência pública; Docência privada; Docência-); e a dedicação acadêmica (Dedicação acadêmica+; Dedicação acadêmica-). Foram considerados os dois primeiros eixos de análise, que apresentaram 92,9% de explicação (84% no eixo 1 e 8,9% no eixo 2), sendo também os mais sociologicamente significativos.
  • 10
    Os nomes dos clusters foram definidos na pesquisa macro (Meirelles, 2021Meirelles, Allana. (2021), Opiniões à venda: oposições políticas e divisão do trabalho intelectual na mídia. 465 f. São Paulo, tese de doutorado, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, 2021.), da qual este artigo faz parte, a partir tanto das propriedades sociais prevalecentes em cada um deles quanto dos jogos de classificação em que os agentes estão inseridos, levando em consideração a forma como se classificam e como são classificados pelos pares e opositores. Há que se ressaltar que a pesquisa macro se valeu de dados para além daqueles presentes na acm, fortalecendo a justificativa em relação aos nomes de cada um dos polos.
  • 11
    Dois clusters são compostos pelos agentes classificados na pesquisa como “polemistas” e “militantes”. Isso ocorre porque as propriedades sociais com maior contribuição para o gráfico são aquelas mais ligadas ao capital acadêmico e ao capital jornalístico, de modo que o cluster 2 inclui os polemistas e militantes mais próximos da academia enquanto o cluster 4 inclui os polemistas e militantes mais próximos do jornalismo. Nesse sentido, as características prevalecentes entre esses agentes - tal como o fato de serem best-sellers e influentes em redes sociais - não são definidoras do espaço social nem distintivas, o que demonstra suas posições mais dominadas. Ademais, o fato de militantes (mais à esquerda) e polemistas (mais à direita) ocuparem os mesmos clusters demonstra a proximidade em termos das propriedades sociais consideradas como ativas na ACM.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Set 2022
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2022

Histórico

  • Recebido
    26 Out 2021
  • Aceito
    04 Fev 2022
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