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Tratamento cirúrgico do megaesôfago recidivado

RESUMO

Objetivo:

analisar o tratamento cirúrgico dos pacientes com megaesôfago recidivado acompanhados no ambulatório de cirurgia de esôfago-estômago-duodeno do Hospital de Clínicas da UNICAMP.

Métodos:

estudo restrospectivo no período de 2011 a 2017, com 26 pacientes portadores de megaesôfago chagásico ou idiopático, tratados cirurgicamente e que evoluíram com recidiva da disfagia. Foram avaliados aspectos clínicos, endoscópicos e radiográficos, sendo correlacionados com os procedimentos cirúrgicos realizados.

Resultados:

50% apresentava disfagia para líquidos, 69% regurgitação, 65,3% pirose, 69,2% perda de peso e 69,2% era chagásico. Além disso, 38,4% apresentavam megaesôfago estágio 1 e 2 e 61,5% estágio 3 e 4. Quanto às reoperações, em 53% foi realizada a cirurgia de Heller-Pinotti videolaparoscópica, seguida de Serra-Dória em 30,7% e mucosectomia esofágica em 7,9%. Em 72% das reoperações não houve complicações pós-operatórias e 80% tiveram evolução satisfatória com redução ou ausência da disfagia. Dentre os pacientes reoperados pela técnica de Heller-Pinotti videolaparoscópica, três referiram pouca melhora da disfagia no pós-operatório. Dentre os pacientes submetidos à cirurgia de Serra-Dória, 100% tiveram evolução satisfatória da disfagia. Foi observado nos pacientes com o tempo entre a primeira cirurgia e a reoperação mais longo, um melhor resultado cirúrgico com diminuição da disfagia, com relevância estatística (p=0,0013, p<0,05).

Conclusão:

houve preferência nas reoperações de megaesôfago pela realização de re-miotomia por videolaparoscopia e, como segunda opção, a cirurgia de Serra-Dória. A esofagectomia ou mucosectomia esofágica foram reservadas para os casos mais avançados.

Palavras chave:
Acalasia Esofágica; Miotomia de Heller; Reoperação

ABSTRACT

Objective:

to analyze the surgical treatment of patients with recurrent megaesophagus followed at the esophageal-stomach-duodenal outpatient clinic of the Hospital de Clínicas - UNICAMP.

Methods:

a retrospective study, from 2011 to 2017, with 26 patients with Chagas or idiopathic megaesophagus, surgically treated, and who recurred with dysphagia. Clinical, endoscopic and radiographic aspects were assessed and correlated with the performed surgical procedures.

Results:

50% had dysphagia for liquids, 69% regurgitation, 65.3% heartburn, 69.2% weight loss and 69.2% had Chagas disease. In addition, 38.4% had megaesophagus stage 1 and 2 and 61.5% stage 3 and 4. Regarding the reoperations, 53% of them underwent Heller-Pinotti surgery by laparoscopy, Serra-Dória in 30.7% and esophageal mucosectomy in 7.9%. In 72% of the reoperations there were no postoperative complications, and 80% of the patients had a good outcome, with reduction or elimination of dysphagia. Among the reoperated patients undergoing the laparoscopic Heller-Pinotti technique, three reported little improvement of dysphagia in the postoperative period and among those who underwent Serra-Dória surgery, 100% had no dysphagia. It was observed that, when the time between the first procedure and the reoperation was longer, the better the surgical result was, with statistical significant decreased dysphagia (p=0.0013, p<0.05).

Conclusions:

there was a preference to perform laparoscopic re-miotomy and, as a second option, Serra-Dória surgery, for patients with recurrent megaesophagus. Esophagectomy or esophageal mucosectomy were reserved for more severe patients.

Keywords:
Esophageal Achalasia; Heller Myotomy; Reoperation

INTRODUÇÃO

A acalasia é um distúrbio primário do esôfago motor relativamente raro e tem a forma idiopática como a mais prevalente em todos os continentes, porém atualmente estima-se que oito milhões de pessoas estejam infectadas com Trypanosoma cruzi em todo o mundo, sendo a maioria nos países da América Latina, onde o parasita é endêmico. Contudo, casos de doença de Chagas têm sido cada vez mais detectados nos Estados Unidos, no Canadá e em muitos países europeus, devido ao aumento de movimentos migratórios entre a América Latina e outros continentes. Esta doença é potencialmente fatal e caracteriza-se por uma fase aguda de aproximadamente dois meses de duração com o paciente oligossintomático ou assintomático e uma fase crônica, que tem duração vitalícia se o tratamento antiparasitário não for administrado ou não for bem-sucedido. Este quadro crônico é assintomático na maioria dos casos, porém dentre os casos sintomáticos predominam os de origem gastrointestinal que geram grande impacto na qualidade de vida11 Zaninotto G, Bennett C, Boeckxstaens G, Costantini M, Ferguson MK, Pandolfino JE, Patti MG, Ribeiro U Jr, et al. The 2018 ISDE achalasia guidelines. Diseases of the Esophagus. 2018;31(9):1-29.

2 Albajar-Viñas P, Dias JCP. Advancing the treatment for Chagas' disease. N Engl J Med. 2014;370(20):1942-3.
-33 Souza DH, Vaz Mda G, Fonseca CR, Luquetti A, Rezende Filho J, Oliveira EC. Current epidemiological profile of Chagasic megaesophagus in Central Brazil. Rev Soc Bras de Med Trop. 2013;46(3):316-21..

Os sintomas da acalasia esofágica são decorrentes da falta de peristaltismo esofágico e da obstrução funcional na junção gastroesofágica (JEG) secundária a falha na função fisiológica do esfíncter esofagiano inferior. Uma forma objetiva de avaliar a gravidade dos sintomas da acalasia esofágica, assim como a eficácia do tratamento é por meio do escore de Eckardt, que varia entre 0 e 12 pontos, e classifica a doença em estágios. O escore gradua de 0 a 3 os quesitos perda de peso, disfagia, dor torácica e regurgitação e o valor final consiste na somatória destes itens: estágio 0 (0-1 pontos), estágio I (2-3 pontos), estágio II (4-6 pontos) e estágio III (>6 pontos). O objetivo do tratamento é restaurar a capacidade de alimentação via oral e aliviar todos esses sintomas, podendo ser alcançado por várias modalidades de tratamento, como dilatação endoscópica, miotomia endoscópica perioral e a cardiomiotomia a Heller-Pinotti videolaparoscópica, a qual atualmente é a primeira escolha para tratamento do megaesôfago não avançado. Estas modalidades eliminam a resistência de saída do alimento da JEG, melhorando o esvaziamento esofágico. A esofagectomia é a opção de escolha quando se tem recidiva dos sintomas ou no megaesôfago avançado, porém agrega maior morbimortalidade associada à dissecção torácica do esôfago. Uma boa alternativa à esofagectomia é a mucosectomia esofágica proposta por Aquino et al. e com menor morbidade devido a preservação da túnica muscular do esôfago e realização de uma dissecção intra-luminal da mucosa esofágica com posterior transposição do tubo gástrico sem violação do mediastino44 Schlottmann F, Andolfi C, Kavitt RT, Konda VJA, Patti MG. Multidisciplinary approach to esophageal achalasia: a single center experience. J Laparoendosc Adv Surg Tech A. 2017;27(4):358-362.

5 Laurino Neto RM, Herbella F, Schlottmann F, Patti M. Avaliação diagnóstica da acalasia do esôfago: dos sintomas à classificação de chicago. ABCD Arq Bras Cir Dig. 2018;31(2):e1376.
-66 Aquino JLB, Leandro-Merhi VA, Mendonça JA, Mendes EDT, Clairet CMAV, Reis LO. Comparative analysis of late results of cervical esophagogastric anastomosis by manual and mechanical suture in patients submitted to esophageal mucosectomy through advanced megaesophagus. Arq Bras Cir Dig. 2019;32(4):e1462..

A recidiva da disfagia após cardiomiotomia tem como causas o refluxo gastroesofágico com esofagite, a miotomia incompleta, a fibrose no local da junção esofagogástrica, a indicação inadequada da técnica para pacientes com megaesôfago avançado e a migração intratorácica do fundo gástrico. A reoperação, em geral, não tem grande sucesso em relação ao primeiro procedimento, e nos pacientes que mantêm disfagia importante, comprometendo a qualidade de vida e a sua condição nutricional, requerem ressecção esofágica com as possíveis complicações associadas. A escolha adequada da técnica cirúrgica para a acalasia recidivada depende também do mecanismo fisiopatológico da recidiva. Portanto, para pacientes com miotomia incompleta ou fibrose na junção esofagogástrica ainda é indicado nova miotomia com fundoplicatura parcial, desde que a parede esofágica não tenha sido danificada durante a dissecção. Para pacientes com dolicomegaesôfago a indicação é a esofagectomia, ou mucosectomia, com a transposição de tubo gástrico. Outra opção na reoperação do megaesôfago tem sido a cirurgia de Serra-Dória que consiste em longa anastomose látero-lateral entre esôfago distal e fundo gástrico associada a gastrectomia parcial em Y de Roux, para facilitar o esvaziamento esofágico e prevenir o refluxo biliar. O presente estudo visa avaliar, retrospectivamente, o tratamento cirúrgico e a evolução de portadores de megaesôfago recidivado em um hospital universitário66 Aquino JLB, Leandro-Merhi VA, Mendonça JA, Mendes EDT, Clairet CMAV, Reis LO. Comparative analysis of late results of cervical esophagogastric anastomosis by manual and mechanical suture in patients submitted to esophageal mucosectomy through advanced megaesophagus. Arq Bras Cir Dig. 2019;32(4):e1462.

7 Ponciano H, Cecconello I, Alves L, Ferreira BD, Gama-Rodrigues J. Cardioplasty and Roux-en-Y partial gastrectomy (Serra-Dória procedure) for reoperation of achalasia. Arq Gastroenterol. 2004;41(3):155-61.
-88 Patti MG, Allaix ME. Recurrent symptoms after Heller myotomy for achalasia: evaluation and treatment. World J Surg. 2015;39(7):1625-30..

MÉTODOS

Revisão de prontuários médicos foi realizada no Hospital de Clínicas da UNICAMP, no período de 2011 a 2017. Foram identificados 26 (N) pacientes com o diagnóstico de megaesôfago que necessitaram de reoperação devido ao retorno dos sintomas de acalásia, principalmente disfagia.

As variáveis coletadas para o estudo referentes a cada paciente foram idade, sexo, comorbidades, classificação do megaesôfago, número de calibrações esofágicas, tempo entre procedimentos cirúrgicos, tempo de seguimento pós-operatório, sintomas esofágicos, perda de peso, número de cirurgias, complicações pós-operatórias e evolução da disfagia. Todas essas variáveis foram correlacionadas com a evolução pós-operatória do paciente. Foram considerados com evolução satisfatória ou sucesso terapêutico, os pacientes que melhoraram o grau de disfagia ou tiveram o sintoma completamente resolvido, sem impacto na qualidade de vida. Evolução insatisfatória foi considerada quando houve piora do grau de disfagia.

A análise estatística contemplou o coeficiente de correlação de Spearman e os testes de Mann-Whitney e Kruskal-Wallis para as variáveis numéricas. Adotou-se o teste exato de Fisher para as variáveis categóricas. O nível de significância foi de 5%.

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Unicamp (parecer nº 2.532.542).

RESULTADOS

Dos 26 (N) pacientes estudados, houve predominância do sexo masculino (57,69%). A média da idade dos pacientes no momento da reoperação foi de 65,65 anos.

A Figura 1 representa o grau de disfagia, além de duração entre a primeira abordagem cirúrgica do megaesôfago e a reabordagem. A disfagia para líquidos foi mais prevalente, com 50% dos casos. A duração da disfagia, a qual corresponde ao tempo entre as duas abordagens cirúrgicas, foi em média de 9 anos. Foi observado que os pacientes que tiveram recidiva dos sintomas com indicação de reoperação, apresentaram média de 7,36 dilatações endoscópicas.

Figura 1
Box-plot da duração da disfagia (em anos) e do número de dilatações e distribuição percentual da intensidade da disfagia.

Os sinais e sintomas mais prevalentes foram perda de peso (69,23%), regurgitação (69,00%) e pirose (65,38%), como indicado na Figura 2. Foram identificados 38,46% dos pacientes com cardiopatia e 30,77% com megacólon.

Figura 2
Distribuição percentual da presença dos sintomas e doenças digestivas associadas.

A Figura 3 mostra que a doença de Chagas foi predominante (69,23%) dentre as comorbidades apresentadas pelos pacientes.

Figura 3
Distribuição percentual da presença de comorbidades e da etiologia do megaesôfago.

Tradicionalmente o megaesôfago é graduado segundo o maior diâmetro observado no estudo contrastado do esôfago. A Figura 4 e a Tabela 1 têm o registro de que 38,46% dos casos corresponderam ao megaesôfago estágio 1 e 2 e 61,54% aos 3 e 4. A técnica de Heller-Pinotti videolaparoscópica foi realizada em 53% das reoperações, seguida de Serra-Dória em 30,77% e Mucosectomia em 7,69%. Além disso, um paciente foi submetido à esofagectomia subtotal na terceira reoperação e outro paciente com 99 anos foi submetido à gastrostomia endoscópica (7,69%). O tratamento cirúrgico do megaesôfago recidivado foi mais satisfatório entre os casos com doença mais avançada (61,50%), contra 38,50% nos casos não avançados. 100% dos pacientes submetidos à cirurgia de Serra-Dória e 78,57% dos pacientes submetidos à cirurgia de Heller-Pinotti tiveram desfecho satisfatório, com melhora da disfagia, porém sem diferença estatística.

Tabela 1
Correlação entre grau do megaesôfago, tipo de cirurgia, número de procedimentos cirúrgicos em um paciente e evolução da disfagia no pós operatório

Figura 4
Caracterização do estágio do megaesôfago, tipo de reoperação, presença de complicação no pós-operatório e evolução da disfagia.

Entre as complicações do tratamento cirúrgico, identificamos dois casos de pneumonia, duas fístulas cervicais, uma perfuração esofágica, um caso de tromboembolismo pulmonar e uma evisceração. Dentre os pacientes que evoluíram com recidiva precoce da disfagia (5 casos), dois pacientes que haviam sido submetidos à mucosectomia esofágica, evoluíram com fístula e disfagia, além de três pacientes que realizaram Heller-Pinotti, tendo um deles evoluído com disfagia para líquidos no pós operatório imediato.

A Figura 5 tem demonstrada a correlação entre idade, duração da disfagia, número de dilatações e tempo entre cirurgias com a evolução da disfagia. O único dado com significância estatística foi a associação entre maior duração da disfagia e melhores resultados pós-operatórios (p=0,0013). Esse gráfico demonstra que os 5 casos com evolução insatisfatória tiveram o tempo entre a primeira e segunda abordagem cirúrgica inferior a cinco anos, o que pode ter impactado no resultado desfavorável.

Figura 5
Dispersão da idade (A), duração da disfagia (B), número de dilatações (C) e tempo entre cirurgias (D) entre as categorias da evolução da disfagia. As linhas horizontais representam a mediana e o intervalo interquartil. Foi observada diferença significativa em (B), p-valor=0.0013 teste de Mann-Whitney. Sem significância estatística para as demais, p=1.0000 (A), p=0.1419 (C) e p=0.4539 (D).

A Figura 6 tem registrada a correlação entre os principais sintomas e comorbidades com a evolução da disfagia no pós-operatório. Foi observada tendência de predomínio da pirose e regurgitação nos casos de evolução insatisfatória, porém sem significância estatística.

Figura 6
Caracterização da evolução da disfagia em relação aos sintomas e doenças associadas. Não houve diferença significativa para as variáveis, p=1.0000 (regurgitação), p=0.6279 (Pirose/Azia), p=0.6279 (Perda de peso), p=0.1399 (Colelitíase) e p=0.6169 (Cardiopatia). Teste Exato de Fisher.

A Figura 7 tem registrado o escore de Eckardt pré-operatório e o tempo de seguimento pós-operatório com a resposta ao tratamento do megaesôfago recidivado. O tempo de seguimento no pós-operatório foi calculado pela diferença entre a data da coleta dos dados (15/06/2018) e a data da última cirurgia.

Figura 7
Dispersão do escore Eckardt (A) e tempo de seguimento em anos (B) entre as categorias da evolução da disfagia. As linhas horizontais representam a mediana e o intervalo interquartil. Sem significância estatística, valor-p=0.6607 (A) e 0.1037 (B), teste de Mann-Whitney.

DISCUSSÃO

A análise do grau de disfagia dos pacientes com recidiva de megaesôfago, no tocante à avaliação da recidiva dos sintomas, merece destaque pois define a incapacidade de transferência do bolo alimentar, impactando na qualidade de vida do paciente e levando a complicações como a desnutrição grave. Os pacientes foram avaliados em um intervalo de tempo de pós-operatório que variou de 1 a 6 anos após a reoperação e houve dispersão homogênea entre os que evoluíram satisfatoriamente. O que chamou a atenção foi que os pacientes considerados com evolução insatisfatória, se mantiveram no seguimento clínico com dilatações endoscópicas no período de 5 anos de pós-operatório sem que tivessem tido outra reabordagem cirúrgica. Todos esses pacientes são acompanhados no Serviço de Endoscopia Digestiva e dilatação endoscópica do Gastrocentro/UNICAMP com a finalidade de calibração esofágica para alívio dos sintomas no acompanhamento pós-operatório. Além disso, é sabido que o alívio da disfagia com as dilatações periódicas do cárdia, permite retardar as reoperações em jovens e isso não causa impacto negativo no resultado cirúrgico, visto que foram estes os pacientes que tiveram melhores resultados44 Schlottmann F, Andolfi C, Kavitt RT, Konda VJA, Patti MG. Multidisciplinary approach to esophageal achalasia: a single center experience. J Laparoendosc Adv Surg Tech A. 2017;27(4):358-362.,99 Herbella FA, Moura EG, Patti MG. Achalasia 2016: Treatment Alternatives. J Laparoendoscopic Adv Surg Tech A. 2017;27(1):6-11.,1010 Sawas T, Ravi K, Geno DM, Enders F, Pierce K, Wigle D, Katzka DA. The course of achalasia one to four decades after initial treatment. Aliment Pharmacol Ther. 2017;45(4):553-560..

Os sinais e sintomas mais prevalentes entre os nossos pacientes, quando comparados ao que se descreve na literatura, mostram pequena divergência, pois em outros estudos predomina a dor torácica em detrimento da perda de peso. Além disso, foi visto que os sintomas mais prevalentes no megaesôfago compõem o escore de Eckardt. Para os pacientes que evoluíram satisfatoriamente no pós-operatório, houve predomínio do estágio 1 e 2 de Eckardt no nosso estudo, porém sem significância estatística.

O predomínio da etiologia chagásica neste estudo é compatível com toda a literatura brasileira e com a epidemiologia da América Latina. Quando se analisam os casos de acalasia em outros continentes, a etiologia ainda permanece incerta. Contudo, casos de doença de Chagas têm sido cada vez mais detectados nos Estados Unidos, no Canadá e em muitos países europeus, devido aos movimentos migratórios entre a América Latina e outros continentes. O Trypanosoma cruzi tem tropismo pelo coração e trato gastrointestinal, ocasionando doenças como megacólon e cardiopatias11 Zaninotto G, Bennett C, Boeckxstaens G, Costantini M, Ferguson MK, Pandolfino JE, Patti MG, Ribeiro U Jr, et al. The 2018 ISDE achalasia guidelines. Diseases of the Esophagus. 2018;31(9):1-29.

2 Albajar-Viñas P, Dias JCP. Advancing the treatment for Chagas' disease. N Engl J Med. 2014;370(20):1942-3.
-33 Souza DH, Vaz Mda G, Fonseca CR, Luquetti A, Rezende Filho J, Oliveira EC. Current epidemiological profile of Chagasic megaesophagus in Central Brazil. Rev Soc Bras de Med Trop. 2013;46(3):316-21.,77 Ponciano H, Cecconello I, Alves L, Ferreira BD, Gama-Rodrigues J. Cardioplasty and Roux-en-Y partial gastrectomy (Serra-Dória procedure) for reoperation of achalasia. Arq Gastroenterol. 2004;41(3):155-61.,1111 Oliveira GC, Lopes LR, Andreollo NA, Braga Nda S, Coelho Neto JS. Tratamento cirúrgico do megaesôfago no Hospital de Clínicas da UNICAMP - fatores associados a melhores ou piores resultados. Rev Col Bras Cir. 2009;36(4):300-6.,1212 Trevenzol HP. Operação de Serra-Dória no tratamento do megaesôfago operado com recidiva dos sintomas. [Dissertação]. São Paulo (SP): Universidade de São Paulo; 2003..

Ponciano et al. reportaram taxa semelhante de sucesso pós-operatório ao presente estudo entre pacientes com megaesôfago recidivado, quando se escolheu a cirurgia de Serra-Dória como primeira alternativa, demonstrando inclusive regressão no diâmetro do esôfago em exames contrastados pós-operatórios. A esofagectomia e a mucosectomia são indicadas para megaesôfago avançado em pacientes com boas condições clínicas e quando não há bons resultados com re-miotomia77 Ponciano H, Cecconello I, Alves L, Ferreira BD, Gama-Rodrigues J. Cardioplasty and Roux-en-Y partial gastrectomy (Serra-Dória procedure) for reoperation of achalasia. Arq Gastroenterol. 2004;41(3):155-61.,1313 Veenstra BR, Goldberg FR, Bowers SP, Thomas M, Hinder RA, Smith CD. Revisional surgery after failed esophagogastric myotomy for achalasia: successful esophageal preservation. Surg Endosc. 2016;30(5):1754-61..

Alguns autores descrevem o motivo das recidivas de sintomas de disfagia após procedimento cirúrgico, destacando a doença do refluxo associada, a presença de fibrose no local da cardiomiotomia, a cardiomiotomia curta ou a indicação inadequada da técnica. No presente estudo, dos três pacientes que evoluíram insatisfatoriamente após a cirurgia de Heller-Pinotti, um paciente apresentava diagnóstico prévio de megaesôfago estágio 3, reforçando a importância da indicação correta da técnica cirúrgica conforme o estágio do megaesôfago. Não foi possível estabelecer o motivo das outras duas evoluções insatisfatórias77 Ponciano H, Cecconello I, Alves L, Ferreira BD, Gama-Rodrigues J. Cardioplasty and Roux-en-Y partial gastrectomy (Serra-Dória procedure) for reoperation of achalasia. Arq Gastroenterol. 2004;41(3):155-61.,1414 Andreollo NA, Lopes LR, Malafaia O. Cardiomiotomia à Heller: 100 anos de sucesso. ABCD Arq. Bras. Cir. Dig. 2014;27(1):1-1..

CONCLUSÃO

O presente estudo foi capaz de determinar o perfil de conduta do Serviço quanto ao tratamento do megaesôfago recidivado, com preferência para nova cardiomiotomia videolaparoscópica à Heller-Pinotti e cirurgia de Serra-Dória. Esta última mostrou-se como boa opção tanto para megaesôfago não avançado como para avançado. O maior tempo de disfagia entre a primeira cirurgia e a reoperação foi correlacionado com maior sucesso terapêutico no pós-operatório, o que aponta para o benefício das dilatações esofágicas periódicas no seguimento desses pacientes. Além disso, a importância do detalhamento do grau da doença, os sintomas, as comorbidades associadas e as intercorrências cirúrgicas devem ser consideradas com a finalidade de identificar a causa determinante do megaesôfago recidivado, pois isso impacta na melhor escolha do tratamento. É importante, contudo, ressaltar que este estudo teve amostra pequena, o que dificulta o achado de resultados significativos.

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  • Fonte de financiamento:

    nenhuma.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Jun 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    28 Dez 2019
  • Aceito
    29 Mar 2020
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