Acessibilidade / Reportar erro

Síndrome do entrelaçamento da artéria poplítea: um diagnóstico diferencial de claudicação de membros inferiores: contribuição da ressonância magnética para diagnóstico e avaliação

Popliteal artery entrapment syndrome: a differential diagnosis in lower limbs claudication: contribution of magnetic resonance imaging for diagnosis and evaluation

VINHETA IMAGENOLÓGICA IMAGENOLOGIC VIGNETTE

Síndrome do entrelaçamento da artéria poplítea: um diagnóstico diferencial de claudicação de membros inferiores: contribuição da ressonância magnética para diagnóstico e avaliação

Popliteal artery entrapment syndrome: a differential diagnosis in lower limbs claudication: contribution of magnetic resonance imaging for diagnosis and evaluation

Marcos Hiroyuki IkawaI; Jamil NatourII; Marcelo Guedes JanniniI; Leonardo Massamaru SugawaraI; Rogério Diniz TakahashiI; Artur da Rocha Correa FernandesI

IDepartamento de Diagnóstico por Imagem da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp)

IIDisciplina de Reumatologia da Unifesp

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Artur da Rocha Correa Fernandes DDI/Unifesp, Rua Botucatu, 740 CEP 04023-900, São Paulo, SP.

INTRODUÇÃO

A síndrome do entrelaçamento da artéria poplítea é uma entidade pouco comum, mais prevalente em pacientes jovens e atletas, que passam a apresentar claudicação na perna resultante da compressão arterial extrínseca na região da fossa poplítea, por um ventre ou inserção anômala do músculo gastrocnêmio(1,2).

ASPECTOS CLÍNICOS

A doença arterial poplítea crônica ocorre mais comumente devido à aterosclerose, mas também por outras doenças como embolismo, aneurisma trombosado, compressão extrínseca por cisto poplíteo e doença cística adventícia. Uma causa menos comum, mas que também pode levar a sintomas de insuficiência arterial crônica, é a síndrome do entrelaçamento da artéria poplítea.

Ocorre devido a uma relação anatômica anormal que se desenvolve durante a embriogênese, entre a artéria poplítea e o músculo gastrocnêmio. Diversos tipos de alterações podem levar à síndrome, como trajeto aberrante da artéria poplítea, inserção anômala da cabeça medial do músculo gastrocnêmio, presença de ventre acessório do gastrocnêmio ou de uma banda fibrosa comprimindo a artéria poplítea na fossa poplítea.

A síndrome do entrelaçamento da artéria poplítea usualmente é vista em pacientes jovens, atletas e do sexo masculino, com claudicação progressiva da perna, sendo bilateral em até um terço dos casos. Classicamente há ausência de pulso distal no pé durante a dorsiflexão passiva ou flexão plantar ativa.

Por vezes, indivíduos sem qualquer das anomalias acima citadas, porém com musculatura bem desenvolvida e hipertrofiada que comprime os vasos poplíteos, podem cursar com os mesmos sintomas, desenvolvendo uma síndrome do entrelaçamento funcional(3).

ACHADOS DE IMAGEM

O ultra-som, especialmente o estudo por Doppler, pode evidenciar alterações hemodinâmicas resultantes da compressão e tem a vantagem de permitir a realização de manobras dinâmicas que simulam a clínica ou potencializem as alterações estenóticas. Entretanto, esse método pode mostrar oclusão arterial em até 59% de pessoas assintomáticas, ou mesmo nenhuma alteração em pacientes com a síndrome, apresentando, portanto, baixa sensibilidade e especificidade(4).

A angiografia convencional pode caracterizar diversas alterações na artéria poplítea. Rosset et al. demonstraram oclusão em 36% dos casos, desvios em 24%, ectasia ou aneurisma em 9% e estenose dinâmica em 32%(5). Porém não foi possível a diferenciação da estenose por alguma compressão extrínseca daquela causada por fatores ateroscleróticos ou degenerativos (Figura 2).


A ressonância magnética permite melhor estudo da anatomia da fossa poplítea sem uso de radiação ionizante ou contraste iodado endovenoso, com alto contraste entre estruturas musculares, ósseas, vasculares e planos gordurosos. É a modalidade de imagem que permite, com maior facilidade, identificar o fator causal dessa síndrome. Seqüên-cias spin-eco ou fast spin-eco podem mostrar a perda do "flow-void" no interior da artéria poplítea devido à trombose ou fluxo lentificado (Figuras 1, 2, 3 e 4). Técnicas angiográficas permitem avaliar o comprometimento vascular durante a flexão dorsal e plantar do pé. E por fim, a utilização da angioressonância com gadolínio endovenoso melhora a detecção de trajetos vasculares na eventual presença de aneurismas ou estenoses distais(1, 2, 3,4).




Nesta paciente do sexo feminino, 10 anos, com queixa de claudicação na perna direita de longa data, o ultra-som prévio evidenciou deslocamento medial e trombose parcial da artéria poplítea. As imagens de ressonância magnética de 1,5 Tesla, multiplanares com técnica fast spin-eco ponderadas em T1, T2, e gradiente eco com saturação de gordura, evidenciaram inserção femoral anormalmente alta e discretamente lateralizada da cabeça medial do músculo gastrocnêmio. Os vasos poplíteos apresentam trajetos levemente deslocados medialmente, apresentando-se comprimidos contra a região metaepifisária distal do fêmur pouco acima da interlinha articular femorotibial. Nessa região, a artéria poplítea mostrou redução significativa do calibre, alteração da forma e perda do "flow-void", um indicativo de trombose e/ou fluxo lentificado, sendo até mesmo difícil de visualizar em alguns trechos.

TRATAMENTO

Devido à sua natureza progressiva, a síndrome do entrelaçamento da artéria poplítea deve ser diagnosticada e tratada precocemente. O procedimento cirúrgico com retirada do fator compressivo e eventual reconstrução arterial ou endarterectomia nos casos mais graves é o tratamento de escolha. Para isso, um planejamento cirúrgico baseado em imagens multiplanares e com a definição mais precisa sobre a etiologia da síndrome do entrelaçamento é aconselhável(7).

CONCLUSÇÃO

A claudicação na perna pode ter várias etiologias, destacando-se a aterosclerose. Uma causa menos comum é a síndrome do entrelaçamento da artéria poplítea. Seu diagnóstico deve ser suspeitado na presença de sinais e sintomas de insuficiência arterial crônica progressiva em pacientes jovens, com massa muscular proeminente, e sem fatores de risco para aterosclerose. Diante dessa possibilidade, ultra-som Doppler pode caracterizar algumas alterações vasculares e anatômicas que corroborem com tal suspeita. Entretanto, na persistência da dúvida clínica, a ressonância magnética dirigida para o estudo da fossa poplítea a suas estruturas vasculares pode fornecer dados mais precisos sobre a etiologia da queixa clínica, além de facilitar o planejamento cirúrgico terapêutico.

Declaramos a inexistência de conflitos de interesse.

  • 1
    Macedo TA, Johnson CM, Hallet Jr JW, Breen JF: Popliteal artery entrapment syndrome: role of imaging in the diagnosis. AJR 181: 1259-65, 2003.
  • 2
    Elias DA, White LM, Rubenstein JD, Christakis M, Merchant N: Clinical Evaluation and MR imaging features of popliteal artery entrapment and cystic adventitial disease. AJR 180: 627-32, 2003.
  • 3
    Sperryn CW, Beningfield SJ, Immelman EJ: Functional entrapment of the popliteal artery. Australas Radiol 44: 121-4, 2000.
  • 4
    Erdoes LS, Devine JJ, Bernhard VM, Baker MR, Berman SS, Hunter GC: Popliteal vascular compression in a normal population. J Vasc Surg 20: 978-86, 1994.
  • 5
    Rosset E, Hartung O, Brunet C, et al.: Popliteal artery entrapment syndrome: anatomic and embryologic bases, diagnostic and therapeutic considerations following a series of 15 cases with a review of the literature. Surg Radiol Anat 17: 161-9, 1995.
  • 6
    Atila S, Akpek ET, Yucel C, Tali ET, Isik S: MR imaging and MR angiography in popliteal artery entrapment syndrome. Eur Radiol 8: 1025-9, 1998.
  • 7
    Levie LJ, Veller MG. Popliteal artery entrapment sybdrome: more comum tha previously recognized. J Vasc Surg 30: 587-98, 1990.
  • 8
    Foster BB, Houston JG, Machan LS, Doyle L: Comparison of two-dimensional time –of-flight dynamic magnetic resonance angiography with digital subtraction angiography in popliteal artery entrapment syndrome. Can Assoc Radiol J 48: 11-8, 1997.
  • 9
    Thomas NP, Jackson AM, Aichroth PM: Congenital abcense of the anterior cruciate ligament. A commom component of knee dysplasia. J Bone Joint Surg Br 67: 572-5, 1985.
  • 10
    Kaelin A, Hulin PH, Carlioz H: Congenital aplasia of the cruciate ligaments. A report of six cases. J Bone Joint Surg Br 68: 827-8, 1986.
  • 11
    Manner HM, Radler C, Ganger R, Grill F: Dysplasia of the cruciate ligaments: radiographic assessment and classification. J Bone Joint Surg 88: 130-7, 2006.
  • Endereço para correspondência:
    Artur da Rocha Correa Fernandes
    DDI/Unifesp,
    Rua Botucatu, 740
    CEP 04023-900, São Paulo, SP.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      31 Jan 2008
    • Data do Fascículo
      Dez 2007
    Sociedade Brasileira de Reumatologia Av Brigadeiro Luiz Antonio, 2466 - Cj 93., 01402-000 São Paulo - SP, Tel./Fax: 55 11 3289 7165 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: sbre@terra.com.br