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Elysio Carvalho* * Publicado no Almanaque do Garnir. Rio de Janeiro, ano de 1907, p. 295-296.

Elysio Carvalho

Resumo:

Texto publicado em 1907, no anuário carioca Almanaque Garnier. Nele, o autor apresenta Elysio de Carvalho como o divulgador das obras de Nietzsche no Brasil. Em seguida, reage contra a iniciativa de Elysio, acusando a propaganda feita pelo vulgarizador dos símbolos nietzschianos e seus novos valores morais de ser inútil e perniciosa aos jovens.

Palavras-Chave:
Nietzsche; Elysio de Carvalho; super-homem

Abstract:

ext published in 1907, at Rio de Janeiro, in yearbook Almanaque Garnier. In it, the author boasts Elysio de Carvalho as the publisher of the works of Nietzsche in Brazil. Then reacts against the initiative to Elysio, accusing the propaganda made by the popularizer of Nietzschean symbols and their new moral values to be useless and harmful to young people.

Keywords:
Nietzsche; Elysio de Carvalho; superman

Dá-se fatalmente em um daqueles estados d'alma humilde de que fala Nietzsche, sempre que se enfrenta com assunto difícil, como este de darem traços rápidos e poucas palavras o perfil moral de um ser complicado como é Elysio de Carvalho, de uma psicologia digna de estudo acurado, com suas virtudes, seus talentos, seus ódios que o fazem, na sua própria frase, um homem de ideias extremas e conclusões radicais, uma natureza impulsiva e espontânea, um rebelde NATO, que não é um escritor brasileiro e sim um supranacional e pertence ao movimento intelectual europeu.

Ora, em se tratando de um ser à parte, inconfundível, único, superhomem, supranacional, não me podia furtar à obsessão de começar falando de Nietzsche, de me lembrar de Stirner e de me deixar levar na corrente de ideias que tanto preocupam Elysio, mais como coisas exóticas, como novidades literárias do que como condições filosóficas, pois que ele lê mais para satisfazer a vaidade de homem lido do que para encontrar alimento necessário para o cérebro.

Poucos no Brasil conhecem o autor de Zaratustra; ninguém entendia as complicações do Único e sua Propriedade de Stirner. As nebulosidades de Nietzsche, a sua filosofia egoística e dionisíaca, os símbolos e infinitos parágrafos da Aurora, a Origem da Tragédia e o Anticristo precisavam, como livros santos, como alcorões de novos credos, da interpretação dos textos, e Elysio de Carvalho atirou-se a esse trabalho insano de vulgarizar e popularizar as obras dos dois alemães, que a pedantearia nacional dos novos agora compreende e aprecia, deliciando-se com textos os mais complicados em que as palavras parecem terem sido colocadas a esmo. Se por um lado a propaganda feita pelo vulgarizador do naturismo em favor dos símbolos nietzschianos e dos novos valores morais, foi inútil aos estudiosos e ávidos de saber e perniciosa a uns tantos mocinhos muito eruditos que espantam o burguês com os seus monóculos e os conhecimentos profundos de coisas da Extranja, por outro lado o individualismo de Stirner não conseguiu fazer carreira apesar dos artigos, biografias e ensaios com que o fundador da primeira Universidade Popular no Brasil, enche e continua a encher colunas e colunas de revistas e jornais, artigos que colocados tem já quilômetros de extensão, e de um me lembro que media cinco metros e trinta e três centímetros conscienciosamente medidos.

Irritado com a afirmativa de que os mais notáveis individualistas têm aparecido em manicômios, tendo seu ídolo - Nietzsche - terminado os seus dias fora do uso da razão, atirou-se ao estudo da Psiquiatria e enfrentou o grande problema do - gênio. Um dia quando pregava as suas ideias individualistas combatendo Vitor Basch e Marx Nordau, um amigo o encarou como quem procura os estigmas de um degenerado, e de tal modo o fixou que o Elysio compreendeu que havia ali uma alusão, e, cortando uma frase em começo, perguntou:

- Já me julgas louco também?

E não são raros nele esses disparos, que um conhecido costuma provocar, contraindo-o, para afirmar depois que ele é eloquente, inspirado, convincente e admirável quando se queima. E ele se queima frequentemente, ao menor sinal de desatenção às suas palavras, à menor distração do ouvinte aos seus artigos que não primam pela síntese, e muito pelo contrário são sempre extensos, cortados de §§, à moda do mestre.

É entretanto um fraco tipo do superhomem, com sua adiposidade, e apesar ou por causa dela tem saúde fraca, nefralgias frequentes, irritabilidade neurastênica, enxaquecas que o tornam intratável quando o acometem. Será um representante mandas teorias exóticas do individualismo, do egoísmo sublimado do anarquismo transviado, mas não é um superhomem psiquicamente superior, capaz de vencer e esmagar.

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    Publicado no Almanaque do Garnir. Rio de Janeiro, ano de 1907, p. 295-296.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jun 2015
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