Resumo
Objetivo caracterizar como o processo de enfermagem é aplicado na Casa de Saúde Indígena, identificando os desafios, as adaptações e as estratégias necessárias para integrar as especificidades culturais e étnicas dos povos indígenas.
Método pesquisa qualitativa, descritiva e exploratória, realizada entre janeiro e março de 2022 em uma Casa de Saúde Indígena do Distrito Sanitário de Saúde Indígena Guamá-Tocantins, Brasil. Utilizaram-se entrevista semiestruturada e análise de conteúdo.
Resultados participaram 13 profissionais, sendo quatro enfermeiros assistenciais e nove técnicos de enfermagem. Oito se autodeclaram pardos, sendo quatro indígenas pertencentes a quatro etnias distintas (Wai-Wai, Gavião, Munduruku e Amanayé) e um negro. Surgiram temas emergentes sobre a organização e os desafios do processo de enfermagem que resultaram em três categorias: O processo de enfermagem na saúde indígena: organização e desafios; Cuidado intercultural na atuação da enfermagem; e Singularidades dos cuidados da equipe de enfermagem.
Considerações finais e implicações para a prática há um alinhamento superficial entre o cuidado intercultural e o modelo biomédico como déficit da relação direta entre elementos sinalizados nas conferências de saúde indígena, processos de enfermagem e diretrizes curriculares, destacando a importância de estratégias que integrem as especificidades culturais e étnicas dos povos indígenas efetivamente na prática.
Palavras-chave:
Diversidade Cultural; Enfermagem; Povos Indígenas; Processo de Enfermagem; Serviços de Saúde
Abstract
Objective to characterize how the nursing process is applied in the Indigenous Health House, identifying the challenges, adaptations, and strategies necessary to integrate indigenous peoples’ cultural and ethnic specificities.
Method a qualitative, descriptive, and exploratory study conducted between January and March 2022 in an Indigenous Health House within the Guamá-Tocantins Special Indigenous Health District, Brazil. Semi-structured interviews and content analysis were used.
Results thirteen professionals participated, including four clinical nurses and nine nursing technicians. Eight self-identified as mixed race, four as indigenous, belonging to four distinct ethnicities (Wai-Wai, Gavião, Munduruku, and Amanayé), and one as black. Emerging topics emerged regarding the nursing process organization and challenges, resulting in three categories: The nursing process in indigenous health: organization and challenges; Intercultural care in nursing practice; and Nursing team care singularities.
Final considerations and implications for practice there is a superficial alignment between intercultural care and the biomedical model, revealing a gap in the direct relationship among elements highlighted in indigenous health conferences, nursing processes, and curricular guidelines. This underscores the importance of strategies that effectively integrate the cultural and ethnic specificities of indigenous peoples into practice.
Keywords:
Cultural Diversity; Health Services; Indigenous Peoples; Nursing; Nursing Process
Resumen
Objetivo caracterizar cómo se aplica el proceso de enfermería en la Casa de Salud Indígena, identificando desafíos, adaptaciones y estrategias para integrar las especificidades culturales y étnicas de los pueblos indígenas.
Método investigación cualitativa, descriptiva y exploratoria, realizada entre enero y marzo de 2022 en una Casa de Salud Indígena del Distrito Sanitario Especial Indígena Guamá-Tocantins, Brasil. Se realizaron entrevistas semiestructuradas y análisis de contenido.
Resultados participaron trece profesionales, entre ellos cuatro enfermeros clínicos y nueve técnicos de enfermería. Ocho se autoidentificaron como mestizos, cuatro como indígenas pertenecientes a cuatro etnias distintas (Wai-Wai, Gavião, Munduruku y Amanayé), y uno como negro. Surgieron temas emergentes sobre la organización y los desafíos del proceso de enfermería, que dieron lugar a tres categorías: El proceso de enfermería en la salud indígena: organización y desafíos; Atención intercultural en la práctica enfermera; y Singularidades de la atención del equipo de enfermería.
Consideraciones finales e implicaciones para la práctica existe una alineación superficial entre el cuidado intercultural y el modelo biomédico, con déficit en la relación directa entre elementos señalados en conferencias de salud indígena, procesos de enfermería y directrices curriculares. Se destaca la importancia de estrategias que integren efectivamente las especificidades culturales y étnicas de los pueblos indígenas en la práctica profesional.
Palabras clave:
Diversidad Cultural; Enfermería; Proceso de Enfermería; Pueblos Indígenas; Servicios de Salud
INTRODUÇÃO
O direito dos povos indígenas à saúde é previsto na Constituição Federal de 1988, ratificado na Lei n.º 9.836/1999 (Lei Arouca), pela criação do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena (SASISUS) e da Política Nacional de Atenção da Saúde dos Povos Indígenas (PNASPI).1 A PNASPI aponta a necessidade de atenção à saúde diferenciada às especificidades culturais, epidemiológicas e operacionais observadas nos territórios indígenas, subsidiando os demais marcos legais.1,2 O controle social indígena brasileiro3 oportuniza debates, para que seja garantida atenção ampla, integral e autônoma que respeite os aspectos específicos e que supra as demandas étnico-geográficas de cada povo e território.3,4
Os povos indígenas estão inseridos no Sistema Único de Saúde (SUS) por meio da Atenção Primária à Saúde (APS), realizada nas aldeias, organizada pelos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI).1,2 Nos DSEI, há serviços de saúde e de apoio exclusivos ao indígena em deslocamento: as Casas de Apoio à Saúde Indígena (CASAI), que desempenham funções de apoio e acolhimento para acompanhamento de cuidados hospitalares e policlínicos nos centros urbanos. Para execução deste fluxo, há o suporte de uma equipe multidisciplinar de saúde indígena (EMSI), com participação de diferentes profissionais, entre eles enfermeiros indígenas e não indígenas e o agente de indígenas de saúde (AIS).5,6
Na EMSI, há a expressiva presença de profissionais de enfermagem.5,7 Na CASAI, essa presença é fundamental, sendo o processo de trabalho desses direcionado aos cuidados prestados, observando as particularidades das etnias, em diálogo com o modelo biomédico5 , conforme preconizado na PNAISPI.2,3 Todavia, há desafios identificados nos diferentes cenários das CASAI que atravessam a atuação desses, como déficits de infraestrutura, de formação intercultural, de medicina indígena,3,5,6 além de limitações nas Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Enfermagem (DCN/Enf).8
As DCN/Enf pouco avançaram nas especificidades regionais, diferentemente das diretrizes definidas na PNASPI,7,8 fundamental para que o processo de trabalho vá ao encontro da formação intercultural.1,2 Há limitações nas sistemáticas que os profissionais de enfermagem vivenciam5,6 que apontam necessidades de ajustes na formação7,9 para um trabalho culturalmente seguro10,11 por meio da educação permanente na área supracitada.9
É fundamental que esta discussão vá ao encontro do processo de enfermagem (PE). O PE é a sistemática utilizada pelos profissionais de enfermagem para garantir uma assistência de qualidade e centrada nas necessidades do paciente. O PE deve ser estudado neste contexto específico, pois oportuniza nova visão sobre as Necessidades Humanas Básicas (NHB),12 e consiste em cinco etapas inter-relacionadas: avaliação de enfermagem; diagnóstico de enfermagem; planejamento de enfermagem; implementação de enfermagem; e evolução de enfermagem.12,13
Na literatura, o tema PE e saúde indígena possui uma lacuna significante, considerando as diferentes realidades observadas, as etnias que são atendidas nas CASAI e a adaptação de fluxos e de instrumentos.14 Os estudos sobre este cenário se concentram nas realidades observadas, na atuação de enfermeiros e nos desafios das práticas interculturais. Por outro lado, é necessário avançar em estudos sobre o PE adaptado, para respeitar e integrar as especificidades culturais, sociais e regionais das populações atendidas em serviços de saúde.4-7
Essa integração cultural é percebida no cenário internacional, que apresenta desafios semelhantes. Pesquisas demonstram avanços significativos na integração de práticas culturalmente seguras na educação e atuação com povos indígenas. Experiências com povos indígenas no Canadá identificaram que barreiras sistêmicas persistem na atenção primária.15 Em outro estudo, realizado na Austrália, Canadá, Nova Zelândia e Estados Unidos, evidencia-se que intervenções de segurança cultural para profissionais de saúde demonstram limitações sistêmicas, necessidades de mudanças de políticas16 e intervenções para tomada de decisão em saúde compartilhada.17
Nesse sentido, considerando as especificidades e as dinâmicas assistenciais agregadoras, o cuidado intercultural1,2 e a pertinente atuação da enfermagem na área,7 questiona-se como as diversidades étnicas e as atribuições da enfermagem estão sendo conduzidas nos processos de enfermagem. Nessa perspectiva, apesar dos avanços normativos da PNASPI, há uma grande dificuldade de fortalecer a forma diferenciada de cuidar dos povos indígenas sob a ótica cultural e étnica.5 É necessário identificar como os profissionais de enfermagem atuam mediante sua ciência12 e muitas realidades culturais.5-7
No contexto atual, em que a diversidade cultural deve ser reconhecida e valorizada nos serviços de saúde, este estudo se torna particularmente relevante, trazendo subsídios para as diretrizes de enfermagem.8 Conforme a Resolução n.º 736/2024 do Conselho Federal de Enfermagem (COFEN), a implementação do PE em ambientes socioambientais diversos exige uma reflexão crítica sobre a capacitação dos profissionais de saúde para atuar de formas culturalmente seguras.11
Nesses termos, indaga-se: de que forma as especificidades culturais e étnicas dos povos indígenas são incorporadas pelas equipes de enfermagem no PE desenvolvido na CASAI? E quais os principais desafios e estratégias para uma prática intercultural efetiva? Portanto, este trabalho busca contribuir para a melhoria das práticas de enfermagem, promovendo cuidados mais inclusivos e mais eficazes nas CASAI, com discussão de apontamento junto às DCN/Enf e indo ao encontro da PNASPI, com oportunidade para formação inclusiva e adaptada de enfermeiros indígenas e não indígenas.15
Embora a saúde indígena5-7,9 e o PE12 sejam temas amplamente abordados na literatura, a proposta deste estudo apresenta uma perspectiva inovadora ao articular esses dois campos. Apesar dos esforços na incorporação de práticas culturalmente adaptadas na assistência a povos indígena15-17 , sobre os papeis da enfermagem,18 não se verificam as adaptações na aplicação do PE nesses contextos. Ao focar nas adaptações e estratégias aplicadas no PE nesse contexto, o estudo contribui para o enfrentamento das lacunas ainda existentes na qualificação do cuidado diferenciado particularmente crítica no Brasil, em que as CASAI representam um modelo único de atenção.
O objetivo do estudo é caracterizar como o PE é aplicado na CASAI, identificando os desafios, as adaptações e as estratégias necessárias para integrar as especificidades culturais e étnicas dos povos indígenas.
MÉTODO
Trata-se de pesquisa qualitativa, descritiva e exploratória. A construção do percurso metodológico seguiu o Consolidated for REporting Qualitative research.19 O cenário do estudo foi na Casa de Saúde Indígena de Icoaraci, do DSEI Guamá-Tocantins (GUATOC), localizada no município de Belém, no estado do Pará, Brasil. A CASAI é um substabelecimento da saúde indígena que dá suporte ao tratamento e ao acompanhamento do indígena-usuário, atendendo às necessidades de média e alta complexidade.
A população do estudo foi composta por 13 profissionais da equipe de saúde, incluindo enfermeiros e técnicos de enfermagem, todos com no mínimo 18 meses de experiência na área da saúde indígena, e demonstrando abertura para o diálogo. A seleção dos participantes foi realizada por conveniência e por disponibilidade. Foram incluídos profissionais de enfermagem que exercem atividades técnicas ou assistenciais na CASAI Icoaraci. Foram excluídos profissionais sem vínculo formal com a instituição ou que apresentassem alterações cognitivas significativas que pudessem comprometer a compreensão das questões e a clareza das respostas, de modo a assegurar a fidedignidade das informações coletadas.
A coleta de dados foi desenvolvida in loco, entre janeiro e março de 2022, por um enfermeiro indígena da etnia Tembé, sob orientação de uma pesquisadora enfermeira, doutora e com expertise na área. No período das entrevistas, o pesquisador compunha o grupo de pesquisa, coordenado pela professora doutora orientadora, que desenvolve pesquisas e estudos com povos indígenas. Houve contato prévio com os participantes pessoalmente, por meio de visitas técnicas, para apresentação do projeto e agendamento da coleta de dados. Os participantes conheciam o entrevistador e sua razão em realizar a pesquisa, e uma entrevista não foi concluída por falta de tempo disponível do entrevistado no dia agendado pelos participantes abordados.
As entrevistas semiestruturadas foram realizadas presencialmente na CASAI, conforme agendamento, em local reservado, sem participação de terceiros, com emprego de instrumento-guia. Teve uma duração média de 30 minutos e foi gravada simultaneamente por dois dispositivos de áudio. Todas as informações foram coletadas e aproveitadas, não sendo utilizada a técnica de saturação de dados, pois optou-se por trabalhar com a totalidade dos profissionais disponíveis no período de coleta, considerando a população restrita e a abordagem censitária dentro do contexto da CASAI.
O guia estava organizado em três unidades (identificação; perfil profissional; e atuação profissional) com as seguintes perguntas: você conhece e a sua importância do PE? Você sabe distinguir as etapas? Quais os cuidados prestados na aplicação do PE? Quais as dificuldades enfrentadas no aspecto intercultural na aplicação do PE na CASAI? Como você implementa o conhecimento científico com o intercultural? E quais os principais desafios da CASAI? Não houve necessidade de repetição, e as notas de campo foram realizadas durante a coleta de campo.
Para a transcrição, utilizou-se o editor de texto Google Docs® , por meio da ferramenta “digitador por voz”. A transcrição foi seguida de codificação, de acordo com a categoria profissional, com identificação com a letra “E”, seguida de numeração, especificando os locais de atuação: CASAI, com a letra “c”; e DSEI, com a letra “d”. Não houve devolução aos participantes, em virtude do período pandêmico e restrição de acesso ao local, e houve teste piloto.
Baseou-se na análise de conteúdo de Bardin.20 Como recursos, utilizaram-se os programas Microsoft Excel® e Microsoft Word® . Após a fase de exame dos dados, emergiram três categorias temáticas a partir da identificação e agrupamento de unidades temáticas emergentes das entrevistas, possibilitando uma compreensão das inter-relações entre as práticas assistenciais e as especificidades culturais.
Como aporte teórico, além dos documentos normativos, como a Resolução n.º 736/2024 do COFEN, as DCN/Enf e a Teoria das Necessidades Humanas Básicas de Wanda Horta, adotou-se o conceito de segurança cultural,21,22 que representa uma evolução enquanto autodeterminação dos povos indígenas no contexto da enfermagem.
A esse referencial, somam-se as contribuições de Gersem Baniwa23 e de Rosani Fernandes24 , intelectuais indígenas que propõem uma crítica contundente sustentada em uma epistemologia contra colonial que valoriza os saberes ancestrais, as cosmologias originárias e o direito à autodeterminação dos povos indígenas, essenciais para pensar o campo da saúde. Suas produções, tanto do campo da educação quanto da antropologia e das ciências sociais, contribuem para uma compreensão ampliada dos processos de resistência epistêmica23,24 e de produção de sentidos no cuidado em saúde.
A construção dos esquemas visuais (Figuras 1 e 2) foi realizada como etapa integrada da análise de dados, representando interpretações derivadas das categorias emergentes. Para isso, utilizou-se o Canva Pro como recurso de apoio à diagramação. Ressalta-se que as figuras foram elaboradas com base em consenso da equipe, mas não passaram por validação junto aos participantes, o que se apresenta como limitação do estudo.
Suas ideias dialogam com os aportes das teorias críticas e pós-coloniais ao problematizar as assimetrias de poder, os epistemicídios e a marginalização dos saberes indígenas nos currículos e nas práticas institucionais23,24 . Essa base teórica possibilita compreender as falas não apenas como experiências individuais, mas como expressões de resistência, tensão e recriação25-27 diante da hegemonia do modelo biomédico28 , apontando para a necessidade de práticas de cuidado intercultural comprometidas com a equidade e a justiça cognitiva.
A pesquisa foi autorizada pelo DSEI-GUATOC e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa, sob o Parecer nº 5.145.936 de 2021. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, e, para garantir o anonimato, os depoimentos foram identificados por códigos alfanuméricos.
RESULTADOS
Participaram do estudo 13 trabalhadores, sendo quatro (30,8%) enfermeiros assistenciais e nove (69,2%) técnicos de enfermagem. Todos os trabalhadores entrevistados foram do sexo feminino, com média de idade de 38,5 anos, variando entre 27 e 55 anos. Destes, oito (61,5%) se autodeclaram pardos, quatro (30,8%), indígenas, pertencentes a quatro etnias indígenas distintas (Wai-Wai, Gavião, Munduruku e Amanayé), e um (7,7%), negro. Quanto à formação educacional, dez entrevistados (76,9%) eram provenientes de instituições privadas e três (23,1%), de instituições públicas. Em relação à especialização, todos os enfermeiros possuem pós-graduação lato sensu nas áreas da saúde indígena e/ou saúde pública. Já os técnicos de enfermagem não possuem especialização. Com relação à atuação na Rede de Atenção à Saúde indígena, seis (46,1%) atuaram em três ou mais locais específicos da Rede de Atenção à Saúde indígena, quatro (30,8%), na CASAI e em outra Rede de Atenção à Saúde, e três (23,1%), somente na CASAI.
Após o processo de categorização, os depoimentos dos profissionais foram sistematicamente organizados, permitindo a identificação de temas emergentes que refletem, de forma interligada, a organização e os desafios do PE, o cuidado intercultural e as singularidades dos cuidados prestados na CASAI, como os destaques observados a seguir:
O processo de enfermagem na saúde indígena: organização e desafios
Essa categoria apresenta os discursos sobre a compreensão e a importância do PE sob a perspectiva dos profissionais de enfermagem. De acordo com os entrevistados, o PE está direcionado principalmente a um fluxo de trabalho e a atendimentos organizados e resolutivos, priorizando um tratamento com olhar holístico na assistência e prevenção à saúde, como apontado a seguir:
[...] manter a organização do trabalho, manter o fluxo e poder analisar melhor o paciente, vir desde o histórico, ver se tem algum problema, fazer o diagnóstico e manter as anotações diárias deles [...] (E5c).
[...] sim, é importante tanto na atuação como técnico de enfermagem e no registro específico do enfermeiro(a), como exame físico, contrarreferência, envio de receitas para os polos, histórico e checagem de medicamentos [...] (E2c).
[...] é importante organizar as medicações, horário de trabalho. Isso se torna tão importante [...] (E11c).
Identificou-se ainda que os entrevistados apresentam limitações na aplicação do PE, como é preconizado, em parte, pela ausência de uma padronização do processo na CASAI, assim como pela ausência de uma gerência de enfermagem para promover a organização dessa assistência, resultando em atuações mecânicas e intuitivas.
[...] o que realizamos aqui não há tanta diferença que fazemos no plantão na visita na aferição de pressão arterial e etc. Eu não verifiquei tanta diferença entre um processo e outro [...] (E3c).
[...] na CASAI, é feito atendimento pela organização da equipe de enfermagem, conforme as necessidades de cada grupo de indígena, mas acaba não cumprindo as metas devido à falta de uma gerência de enfermagem e às demandas dos polos e CASAI. A gente ficar muito sobrecarregado de trabalhos. Com isso, às vezes, ficamos sem prestar assistência adequada para os indígenas. Se houvesse uma gerência de enfermagem, ficaria melhor, uma palavra o que é o processo de enfermagem seria organização e/ou planejamentos [...] (E10c).
[...] o posto de enfermagem é restrito no cuidado, e a gerência administrativa fica no planejamento da enfermagem [...] (E13d).
Também foi possível observar que os técnicos de enfermagem demostraram dificuldade de visualizar sua função, tanto no exercício de trabalho quanto no processo de execução, relacionado à diferença entre cuidado profissional indígena e não indígena:
[...] por exemplo, se tu tivesses no hospital cuidando de uma pessoa que não fosse o teu sangue e fosse parente teu, o que tu sentias naquele momento? Eu queria sentir que é bem diferente do teu cuidado como profissional e do teu cuidado como sangue como parente, entendeu, que pode ser muito diferente [...] (E9c).
O cuidado intercultural na atuação da enfermagem
Essa categoria engloba o cuidado intercultural e os desafios nele enfrentados. Destacou-se a comunicação entre o profissional e os indígenas-usuários, pontuando a pluralidade de noves etnias: Xikrin; Kayapó; Arara; Parakanã; Munduruku; Tiriyó; Kaxuyanã; Wai-Wai; e Waruete. Dessas, as quatros primeiras etnias apresentam maiores desafios de comunicação e de linguagem, em função das diversidades linguística, de costumes, de hábitos na interação com os profissionais indígenas e não indígenas, bem como pela ausência de intérpretes de suas culturas.
[...] a principal dificuldade é a linguagem e a língua, principalmente das etnias Kaiapó, Xikrin, Parakanã, principalmente para usuárias mulheres que não falam a língua portuguesa, e acabamos recorrendo aos parentes que falam língua portuguesa [...] (E12d).
[...] no caso da CASAI Icoaraci, a rotatividade de usuário é muito grande. Então, se eu trabalhar só com uma etnia diariamente, eu vou aprender, porque vou trabalhar só com um dialeto. Agora, há várias etnias e a rotatividade, então fica difícil compreender [...] (E8d).
Ainda foi pontuada como problemática a alta rotatividade de pacientes das mais diversas etnias, dificultando a comunicação entre profissionais e pacientes, como reforçado na fala abaixo.
[...] no caso da etnia Kaiapó, sabemos que ele sabe falar o português, mas muitas vezes eles não querem falar. Então, para quem compreende, é fácil, agora, os que não compreendem, que não fala, fica difícil da gente entender [...] (E6c).
As evidências mostram que a dificuldade de comunicação repercute na adesão aos procedimentos como exame preventivo cérvico-uterino, endoscopia, colonoscopia, de próstata, transvaginal e outros, devido às diferenças linguísticas e à ausência de intérpretes que possam colaborar para a participação desses públicos.
[...] outra dificuldade é tentar mostrar para eles algo básico que fazemos: o preventivo do câncer do colo do útero em uma indígena. Tem muitas ainda que não aceitam. Apesar de todo o trabalho que fazemos, ainda tem índias resistem a fazer. Então, a dificuldade é fazer que elas entendam de alguma forma que isso é para a melhoria da saúde e para a saúde; isso para estes procedimentos invasivos básicos e hospitalares. Outra dificuldade que a gente tem também nesse processo, vamos também falar que nós estamos dentro da CASAI, vamos ter que lidar com ele que vem da aldeia e recebê-los para os atendimentos para os hospitais. Eles vêm para a cidade, muitos sabendo que vão fazer algum procedimento e outros eles nem sabem que vão fazer, mas quando chegam lá, no momento, eles não querem fazer aquele atendimento, aí temos que intervir tentar fazer que eles façam, orientando antes do procedimento [...] (E5c).
Singularidades dos cuidados da equipe de enfermagem da Casa de Apoio à Saúde Indígena
Esse conjunto refere-se aos cuidados que a equipe de enfermagem presta na CASAI. Apesar das dificuldades de comunicação citadas na categoria anterior, notou-se o movimento da equipe de enfermagem em manter um diálogo com os aspectos interculturais, principalmente vindo dos profissionais de enfermagem indígenas, os quais apontam a iniciativa de escuta ativa e a introdução de práticas de medicina indígena, com respeito aos hábitos de vida dos pacientes e o incentivo a uma assistência à saúde coparticipativa.
[...] respeito cada índio tem um comportamento, hábitos, olhar diferente, observação e entender, respeitar as culturas. Por exemplo, alimentação, tem índio que não come carne, então tem que respeitar, às vezes só comer batata, inhame, não comer arroz ou feijão; é da cultura deles, a gente tem que respeitar. A secretaria já fala que é uma secretária especial, então a gente é profissional, e até eu como indígena tenho que me adaptar ao sistema dele, principalmente aqueles mais originários que moram dentro das aldeias afastados [...] (E7d).
[...] sim, pensa muito nos costumes, desde a alimentação, modo de higienização, modo de vestir, pensamos muito em ter este respeito. Diferencial, cada um é diferente. Uns são mais carinhosos e outros não são. Cuidado de medicina tradicional, adaptação de cuidados e ervas medicinais, agregando o conhecimento tradicional e o dos indígenas, permitindo o uso das ervas junto com a medicação prescrita, trabalho em parceria [...] (E4d).
Contudo, alguns profissionais relataram que o PE poderia atender melhor às singularidades dos pacientes da CASAI se houvesse uma redistribuição mais clara de funções na equipe de enfermagem, distinguindo as atividades assistenciais diretas — que incluem o planejamento e a execução do cuidado pelo enfermeiro assistencial – das funções administrativas e gerenciais, que devem apoiar a supervisão, o monitoramento e a padronização do PE como um todo.
Ressalta-se que há chefia de enfermagem no cenário, porém, segundo os participantes, ainda persiste acúmulo de funções e sobrecarga entre o cuidado direto e as demandas administrativas. Essa realidade evidencia a necessidade de instrumentos organizativos mais adequados e adaptados à diversidade etnocultural dos pacientes, considerando também os cuidados já realizados nos polos-base.
[...] não, distribuição das evoluções com as enfermeiras de acordo com os horários e carga horária, ter instrumento necessário para fazer o diagnóstico de enfermagem, ter uma coordenação de enfermagem, porque acabamos fazendo os dois administrativo e assistência ou ter uma chefia imediata de enfermagem [...] (E5c).
[...] este deve ser implantado pensando nas necessidades de cada usuário, pensando no tempo de permanência e afastamento da atenção em saúde, visto que a demanda de funções de trabalho na CASAI distinta e o perfil do usuário deve ser considerada, tanto por conta do acompanhamento já feito nos POLOS e a dinâmica das atribuições diversas do trabalho [...] (E8c).
A análise das entrevistas evidenciou, de forma recorrente, os desafios da comunicação, devido à diversidade linguística e de costumes, a necessidade de considerar cosmologias e práticas espirituais como parte integrante da medicina indígena, incluindo o cuidado com ervas medicinais e outras práticas de cura, e a carência de gerência em enfermagem e instrumentos específicos, como apontado na Figura 1. Esses aspectos foram alinhados às etapas do PE, dando origem à Figura 2, que sintetiza a forma como as especificidades culturais emergidas podem ser incorporadas a cada etapa do PE.
A Figura 2 representa os elementos apontados pelos participantes que evidenciam que cada etapa do PE – da coleta de dados ao diagnóstico, planejamento, implementação e evolução – está integrada às especificidades do cuidado indígena. Reflete a necessidade de uma adaptação sistemática do PE às especificidades culturais dos usuários de saúde locais, demonstrando como cada etapa pode ser ajustada para garantir um cuidado seguro.
DISCUSSÃO
A composição étnica diversificada dos participantes, além de caracterizar o perfil dos profissionais, constitui parte importante para compreender a expressão central sobre o conceito de segurança cultural21,22 e a necessidade de discutir equidade no PE em contexto indígena. Isso é afirmado porque há uma evolução na tutela dos povos indígenas em direção à conscientização, à sensibilidade e à segurança caracterizada pela presença de profissionais indígenas, na qual a autodeterminação dos povos indígenas se materializa por meio do compartilhamento de seus conhecimentos, transcendendo a representação demográfica e operando como uma estratégia decolonial23,24 que confronta o epistemicídio histórico dos povos indígenas.
Isso converge com as evidências canadenses sobre papéis expandidos de enfermeiros18 indígenas como mediadores culturais, mas divergem quanto à sistematização. Enquanto que, no Canadá, observam-se protocolos estruturados29 de mediação cultural, no contexto brasileiro da CASAI Icoaraci, essa mediação emerge de forma intuitiva, dependente da sensibilidade individual quando de não indígenas, principalmente.
Emerge uma tensão epistemológica fundamental: enquanto há programas estruturados, ainda que com limitações sistêmicas reconhecidas no contexto internacional,16 o cenário brasileiro revela ausência de protocolos institucionalizados, dependendo da sensibilidade individual dos profissionais.5,7,9 Esta configuração paradoxal reflete a persistência da colonialidade23,24 nas práticas institucionais, em que a ausência de sistematização perpetua assimetrias de poder.24
A significativa pós-graduação em saúde indígena configura estratégia compensatória às lacunas curriculares identificadas na graduação, demonstrando a necessidade de transformação estrutural dos currículos. Contudo, esta compensação individual não substitui a transformação sistêmica preconizada na PNASPI, evidenciando uma inclusão subordinada, onde profissionais indígenas são incorporados sem que as estruturas hegemônicas,23,24 incluindo principalmente as formativas, sejam questionadas.
Em relação à aplicação da ciência da enfermagem,12,13 nota-se que há algum conhecimento sobre o PE, e este é limitado quando são aplicadas todas as etapas. Por outro lado, apesar da adversidade pontuada acima, os resultados encontrados apontam que a equipe de enfermagem da CASAI Icoaraci promove adaptação das etapas para o ambiente multicultural.5,6,30 As adaptações observadas na avaliação incorporam cosmologias, práticas rituais e saberes indígenas que configuram novos papéis profissionais orientados pela segurança cultural,21,22 e requerem ressignificação quando aplicadas nos contextos indígenas, considerando o lugar de pertença dos profissionais indígenas.24
A valorização das tradições na primeira etapa do PE constitui o que denominamos de “tradução ontológica”, processo em que diferentes cosmologias sobre saúde-doença dialogam sem hierarquização epistemológica.23 Essa tradução transcende a coleta de dados biomédicos,28 incorporando epistemologias contra coloniais, em que saberes ancestrais são reconhecidos como sistemas válidos de conhecimento.23,24
Converge com experiências em que a segurança cultural20,21 exige examinar impactos da própria cultura profissional nas interações clínicas.11 Todavia, na CASAI, essa tradução ontológica emerge intuitivamente da sensibilidade dos profissionais indígenas, evidenciando tanto a potencialidade quanto a fragilidade de depender de iniciativas individuais não sistematizadas.
No diagnóstico, por sua vez, etapa com maior limitação de aplicação, há olhar para os aspectos biomédicos20,28 e também para as percepções culturais sobre saúde e doença6,7 pela visão indígena.4 Revela conflito epistemológico fundamental entre taxonomias biomédicas e cosmologias indígenas. As limitações identificadas refletem os desafios do pluralismo médico multiepistêmico,28 exigindo diálogos com conhecimento historicamente hierarquizado.
A ausência de diagnósticos específicos para saúde indígena perpetua perspectivas essencialistas de cultura, contrastando com avanços sobre segurança cultural que orientam desenvolvimento de taxonomias culturalmente sensíveis.11 A incorporação intuitiva de percepções indígenas pelos profissionais, embora promissora, carece da sistematização em que haja interpretação cultural nas etapas diagnósticas, de modo a romper com a persistência da colonialidade epistêmica,23,24 em que instrumentos diagnósticos permanecem centrados na racionalidade biomédica.
No planejamento, o plano de trabalho incorpora estratégias interculturais e adaptavivas22 alinhadas ao pensamento da segurança cultural e equidade,11 contemplando as NHB de acordo com o habitual em sua etnia, incluindo práticas originárias no plano de cuidado. A sinalização da necessidade de intérpretes e/ou aplicação de instrumentos que considerem as singularidades étnicas e, principalmente para facilitação da comunicação entre a EMSI e os pacientes indígenas, converge com autodeterminação dos povos indígenas, devido à orientação para equidade linguística necessária24 nos cenários da CASAI.
Isso revela que a diversidade linguística das etnias atendidas nas CASAI extrapola questões meramente comunicacionais, refletindo assimetrias de poder históricas.15 A necessidade de intérpretes converge com achados sobre barreiras linguísticas como reflexo de racismo sistêmico em serviços de saúde.5,16 Diverge, contudo, de experiências estruturadas,11 em que mediação cultural é institucionalizada através de papéis profissionais específicos. A adaptação das NHB às especificidades étnicas sugere necessidade de debate da teoria de Wanda Horta para incorporar necessidades culturalmente situadas ao contexto brasileiro.
Orienta a abordagem holística como estratégia para implementação de comunicação, fluxos e registros adaptados, mediados pela interculturalidade,31 e demonstra a importância da PNAISPI, sugerindo como a atenção diferenciada é benéfica para a qualidade do serviço.23,24 Ratifica que os procedimentos e planos de cuidados técnicos devem dialogar com as práticas de medicina indígena e suas tecnologias,5 sendo importante avançar na saúde intercultural almejada.32-34 Converge com a recriação cultural,24 em que profissionais indígenas não apenas reproduzem protocolos, mas os ressignificam a partir de suas cosmologias, criando tecnologias de cuidado híbridas.
Sobre a evolução da enfermagem, sinaliza-se a necessidade de incluir feedbacks dos próprios indígenas por meio da sua visão de mundo4 , com protocolos que observem elementos, como linguística, símbolos, cosmovisão, cosmologia e práticas de cuidado próprias quando é providenciada assistência a grupos étnicos, a fim de diminuir a centralidade no modelo biomédico.35 A incorporação transcende mera consulta, e deve ser determinada pelos próprios pacientes indígenas, não pelos profissionais,11 refletindo princípios de autodeterminação.24 Contudo, isso diverge da realidade observada na CASAI, onde protocolos de avaliação permanecem centrados em indicadores biomédicos, marginalizando critérios indígenas de eficácia terapêutica.
Devem ser plurais, alinhados às peculiaridades das etnias registradas nos fluxos das CASAI, possibilitando que o cuidado prestado seja relevante, otimizado, respeitoso e em cooperação e diálogo entre a equipe de saúde e as comunidades indígenas, efetivando o preconizado na PNAISPI.1,2,3 Esta necessidade converge com modelos de co-gestão18 e com os princípios de segurança cultural,11 que enfatizam poder de autodeterminação dos povos indígenas.24
A implementação de protocolos assistenciais que incorporem elementos cosmológicos e práticas tradicionais de cura, validados conjuntamente com as comunidades indígenas atendidas, deve ser uma estratégia para efetivar a atenção diferenciada nesses ambientes.34 Isso também deve ser realizado por meio do desenvolvimento de indicadores específicos que mensurem a efetividade da integração. Essa validação comunitária está alinhada a princípios que reconhecem a necessidade de parcerias equitativas e mecanismos de superação da colonialidade na transformação organizacional,11 evidenciando necessidade de institucionalização de mecanismos para superação da colonialidade24 nas práticas de saúde.
Nesse sentido, as formações contínua e intercultural são fundamentais para compreensão das especificidades culturais5,14,32,33 e enfrentamento de disparidades de saúde.31 Um exemplo é o curso de sensibilização para os direitos indígenas, promovido pela pedagoga Rosani Fernandes, em 2015, que teve como alvo os profissionais não indígenas, resultando na maior compreensão desses para a diversidade de cosmologias e cosmovisões originárias, e na diminuição de ações e falas discriminatórias,24 convergindo com achados sobre efetividade de abordagens experienciais que aumentam aceitação de práticas tradicionais.15-17
Há estratégias bem desenvolvidas no âmbito da saúde. As iniciativas da Universidade Aberta do Sistema Único de Saúde e da Universidade de Brasília configuram tentativas de institucionalização que convergem com modelos de cultural safety training,17 embora permaneçam fragmentadas comparadas a sistemas integrados observados internacionalmente. O curso de idiomas ministrado por acadêmicos indígenas como profissionais indígenas conduz formações específicas, assim como experiências com outras populações indígenas sobre segurança cultural4,11 e intervenção de saúde digital adaptada,33 por exemplo.
No entanto, é necessário avançar na inclusão de componentes curriculares com carga horária própria sobre o tema da saúde indígena, tendo em vista que o conhecimento ocidental e o seu modelo biomédico em saúde não suprem todas as necessidades dos povos originários.36 Essa limitação demonstra a necessidade de transformação curricular baseada em equidade e justiça social,11 no qual a transformação é epistêmica24 deve transcender mera inclusão de conteúdos.
Além disso, projetos de extensão nas CASAI e de pesquisas na área que subsidiem o desenvolvimento de tecnologias,33,34 que mapeiem as diferentes realidades das CASAI5,6 e que colaborem para diagnósticos de enfermagem e para a construção de instrumentos adaptados para avaliação dos indígenas devem avançar, observando os avanços tecnológicos digitais.29 Devem incorporar metodologias participativas, alinhando-se com princípios decoloniais23 e horizontalização das relações de produção de conhecimento.
É necessário, ainda, o encontro com diferentes saberes que oportunize a incorporação de outras epistemologias que abordem aspectos culturais e sociais,23 que evidenciem a prestação de cuidados a partir da medicina indígena,5,23 com oportunidade para implementação do PE, a partir de visões crítica e reflexiva, e que incluam interculturalidade. As diversidades linguística e cultural, por exemplo, são apontadas, pelos profissionais de saúde5,6,14 como desafios à comunicação efetiva. É essencial a inclusão de intérpretes,5,14 profissionais indígenas de diferentes etnias, para capacitação de enfermeiros não indígenas para as diferentes línguas e/ou desenvolvimento de tecnologias para subsidiar essa comunicação.33
Destaca-se a importância da manutenção das línguas indígenas23 como elemento fundamental no cuidado à saúde,5,6,34 bem como dos valores atribuídos à oralidade, força motriz dos povos indígenas e elemento de compreensão de suas cosmovisões.23 Os diferentes perfis no serviços de saúde demonstram as potencialidade das políticas de inclusão, que têm inserido indígenas como profissionais de saúde, com oportunidade para formação de intérpretes ou profissionais que sejam fluentes nas línguas indígenas.5,14 Isso evidencia que é preciso contemplar diversas produções de etnoconhecimentos e diversidade de povos.24
No exercício profissional do enfermeiro, ao incorporar a interculturalidade, promove-se um ambiente de cuidado, em que a abordagem é apoiada pela Resolução n.º 736/2024 do COFEN, que reconhece a necessidade de adaptar o PE a contextos socioambientais diversos, incluindo o respeito às práticas e aos saberes culturais indígenas. Para isso, o diálogo sobre cuidado intercultural na formação deve avançar para inclusão de outras epistemologias,23 com ênfase em estudos de intelectuais indígenas, de ementas e de objetivos que tratem sobre interculturalidade, diversidade, equidade, inclusão, ancestralidade, etnicidade e outros aspectos, por meio de uma visão decolonial.23
Ainda na perspectiva do exercício profissional, outros pontos têm impactado a atuação desses profissionais. Há uma deficiência significativa que sobrecarrega a gestão de enfermagem, como déficits de equipamentos como de espaços físicos adequados, assim como de treinamento formal em línguas indígenas com foco em terminologia de saúde para toda a equipe, para registro adequado dos elementos culturais no PE e formação conjunta das EMSI que incorporem os AIS como mediadores culturais formais nas etapas do PE. Essas necessidades específicas de equipamentos e capacitações foram apontadas pelos participantes como essenciais para superar o modelo biomédico predominante e alcançar a efetiva integração preconizada na PNASPI e na Resolução COFEN nº 736/2024.
Por outro lado, a nova configuração do Ministério dos Povos Indígenas tem apontado para diferentes perspectivas, com a articulação de novos gestores, com grande participação das vozes indígenas em diferentes cenários.30,35 Essa reestruturação institucional pode possibilitar: 1) maior participação de profissionais indígenas nas posições de gestão dos DSEI, o que facilita a validação cultural dos instrumentos de enfermagem propostos; 2) estabelecimento de diretrizes específicas para adaptação do PE às realidades étnicas; 3) alocação de recursos específicos para capacitação intercultural dos profissionais de saúde. Essas mudanças estruturais têm potencial para impactar diretamente a operacionalização do PE nas CASAI, pois estabelecem mecanismos concretos para a integração entre o conhecimento técnico-científico da enfermagem e os saberes ancestrais dos povos indígenas.
Diferentes frentes devem avançar para o fortalecimento do PE adaptado. A participação de professores e de pesquisadores oportuniza, a princípio, a sensibilização ao diálogo para inclusão de conteúdos sobre o tema, com posterior fortalecimento de profissionais da área que tenham olhares diferenciados.37 Isso vai ao encontro da releitura de clássicos, a fim de possibilitar novas leituras e de lentes pela qual se lê o mundo, a partir dos povos indígenas e sua pertença.24
Além disso, a colaboração interprofissional é um componente-chave na prestação de um cuidado abrangente; logo, a interação entre enfermeiros, nutricionistas, farmacêuticos e outros profissionais de saúde deve ser incentivada, para garantir que as múltiplas dimensões do bem-estar dos pacientes sejam consideradas.5 Isso fortalece a assistência prestada e promove um ambiente de cuidado com respostas mais completas e contextualizadas,25,27 facilitando a construção de um cuidado que realmente atenda às expectativas da PNAISPI.1
CONSIDERAÇÕES FINAIS E IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA
Os resultados revelam que o PE na CASAI integra práticas técnicas e interculturais de forma limitada. Os desafios apontados envolvem barreiras linguísticas e sobrecarga decorrente da falta de uma gestão específica. As adaptações necessárias incluem registros detalhados, uso de saberes tradicionais e personalização do cuidado. Assim, o estudo destaca a importância de estratégias que integrem as especificidades culturais e étnicas dos povos indígenas como instrumento adaptado específico para anamnese intercultural, diagnósticos de enfermagem culturalmente sensíveis, protocolos específicos desenvolvidos para cada CASAI e desenvolvimento de aplicativos de tradução específicos para terminologias de saúde nas línguas das etnias atendidas.
Este estudo se limita a analisar um cenário de uma CASAI relacionado às etnias atendidas, podendo não refletir outros cenários. Futuras investigações poderiam explorar a formação de indígenas na graduação em enfermagem e a eficácia de programas de formação intercultural para enfermeiros e para outros profissionais de saúde, avaliando seus impactos na qualidade do atendimento e a implementação de componente curricular obrigatório sobre saúde indígena na graduação em enfermagem. Além disso, estudos longitudinais poderiam examinar como a integração das medicinas indígenas com o PE afeta a saúde e o bem-estar das populações indígenas a longo prazo.
AGRADECIMENTOS
Aos coordenadores e técnicos do Distrito Sanitário GUATOC e a Eliene Rodrigues Putira Sacuena, indígena coordenadora da APS da SASISUS.
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FINANCIAMENTO
Sem financiamento.
DISPONIBILIDADE DE DADOS DA PESQUISA
Os conteúdos subjacentes ao texto da pesquisa estão contidos no artigo.
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Editado por
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EDITOR ASSOCIADO
Gerson Luiz Marinho https://orcid.org/0000-0002-2430-3896
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EDITOR CIENTÍFICO
Marcelle Miranda da Silva https://orcid.org/0000-0003-4872-7252
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
08 Set 2025 -
Data do Fascículo
2025
Histórico
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Recebido
03 Abr 2025 -
Aceito
07 Jul 2025



Fonte: elaborada pelos autores (Canva Pro. Disponível em
Fonte: elaborada pelos autores (Canva Pro. Disponível em