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A gênese do neoliberalismo no Brasil: uma análise dos ajustes da SEST* * É baseado em parte da minha tese de doutorado defendida no Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (IE/Unicamp) e intitulada “Imperialismo e empresas estatais no capitalismo dependente brasileiro (1956-1998)”.

The genesis of neoliberalism in Brazil: an analysis of SEST adjustments

Resumo

O artigo discute o início do neoliberalismo no Brasil a partir dos ajustes promovidos sobre as empresas estatais do país pela Secretaria de Controle das Empresas Estatais (SEST) no começo dos anos 1980. As políticas da SEST promoveram o neoliberalismo no Brasil antes mesmo dos ajustes propostos pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) a partir de 1983 e muito anteriormente às propostas do Consenso de Washington e à política econômica implementada a partir dos anos 1990, como costuma ser datado pela literatura econômica o marco do neoliberalismo no país.

Palavras-chave:
Empresas multinacionais; SEST; Neoliberalismo

Abstract

This article discusses the beginning of neoliberalism in Brazil during the 1980s, considering the politics introduced by the Secretariat of Control of the Public Companies (SEST) into state companies. SEST’s politics promoted neoliberalism in Brazil even before the proposals made by the IMF in 1983 and came before the Washington Consensus proposals that were implemented by the government during the 1990s, which is understood as the beginning of neoliberalism in Brazil.

Keywords:
Multinational companies; SEST; Neoliberalism

Introdução

Esta pesquisa contribui para discutir algumas transformações importantes envolvendo as estatais brasileiras que permitem um debate sobre o início do neoliberalismo no Brasil anteriormente à data que se convencionou como este marco na literatura econômica, ou seja, o ano de 1989 e a década de 1990, a partir da implementação das políticas econômicas do presidente Fernando Collor de Mello. A análise presente neste artigo leva a uma aproximação temporal do início do neoliberalismo no Brasil – começo dos anos 1980 - com o de outras experiências neoliberais da América Latina, como a do Chile, de 1973.

Parte-se da hipótese de que o enquadramento sofrido pelas empresas estatais a partir da atuação da Secretaria de Controle sobre as Empresas Estatais (SEST) mostra o começo do neoliberalismo no país, pela maneira como essas empresas foram instrumentalizadas por meio da política macroeconômica. Nesse sentido, o neoliberalismo no Brasil não seria tardio, uma vez que este se deu antes do Consenso de Washington, datado de novembro de 1989.

Para alcançar seu objetivo, analisam-se, além de autores importantes para se entender a realidade brasileira e a mudança no padrão de acumulação capitalista, fontes primárias, como os relatórios da SEST.

A fim de dar conta da sua hipótese, esse artigo recorre ao importante período dos anos 1970, quando mundialmente há a crise estrutural do capital e no Brasil, especificamente, se inicia o II Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND), o que resultou, nos anos 1980, na crise da dívida externa, por conta, sobretudo, do padrão de financiamento do II PND. É durante a década de 1980 que o governo utiliza a SEST e as empresas estatais como mecanismos de uma política econômica que, desde então, deve ser entendida como neoliberal. Além dessa introdução e das considerações finais, o artigo está dividido da seguinte forma: i) transnacionalização e o fim do espaço nacional de acumulação; ii) financiamento do II PND e crise da dívida externa; e iii) a criação da SEST e os ajustes sobre as empresas estatais.

1 Transnacionalização e o fim do espaço nacional de acumulação

Na transição para os anos 1970, o capitalismo passou por uma crise estrutural1 1 Sobre a crise ver: Mandel (1990); Mészáros (2009). , depois de um período de forte acumulação, como foram “os anos dourados”2 2 Ver: Hobsbawm (1995), especialmente p. 253-281. após a Segunda Guerra Mundial. Diante da crise das políticas keynesianas do pós-guerra, que desencadeou um período de estagnação econômica com inflação, houve uma redução dos lucros nos investimentos produtivos3 3 De acordo com Gonçalves (1999, p. 33-34), “no caso dos Estados Unidos os dados mostram uma queda dramática da taxa média de lucro de 20% em 1947-69 para 12,4% em 1970-83”. Para entender a Lei da queda da taxa de lucro, recomenda-se Marx (1984, seção III). especialmente nos países centrais. Com isso, iniciou-se um processo de reestruturação das empresas multinacionais que se direcionaram para a financeirização e para novos espaços de acumulação.

As mudanças na estratégia de atuação das empresas multinacionais fizeram parte da política dos Estados Unidos para restabelecerem seu poder imperialista, em ascensão no imediato pós-guerra, contestado após o fim dos acordos de Bretton Woods em 19714 4 A ruptura dos acordos de Bretton Woods a partir de 1971 resultou no fim do lastro dólar-ouro, permitindo assim que o dólar atuasse como moeda fiduciária e flexível, aumentando a liquidez internacional e fomentando a expansão de bancos e de empresas multinacionais, principalmente por meio do Euromercado. Já o primeiro choque do petróleo, em 1973, possibilitou aos Estados Unidos ampliarem a liquidez internacional com a reciclagem dos petrodólares e com isso aumentar o endividamento da periferia, que recorreu ao crédito externo em meio à abundância de oferta com taxas de juros baixas e flexíveis, dando força à exacerbação do capitalismo financeiro mundial. , e retomado no fim dos anos 19705 5 Em 1979, o presidente do Banco Central dos Estados Unidos (FED), Paul Volcker, adotou uma política econômica de valorização do dólar por meio da elevação da taxa de juros, canalizando os recursos financeiros mundiais para seu mercado, com a aquisição de títulos da dívida pública. Essa política econômica resultou na crise da dívida externa dos países da América Latina e nas suas dificuldades em pagar os juros dessa dívida, uma vez que os Estados Unidos passavam a ser o “porto seguro” dos investimentos financeiros. A intenção era “garantir a drenagem, para o mercado financeiro americano, de parte elevada da liquidez mundial” (Chesnais, 1996, p. 260) para equacionar os elevados déficits do governo Ronald Reagan. As taxas de juros se elevaram para 12% e 8% em termos reais entre 1980 e 1984 (Chesnais, 1996; Furtado, 1982). Além disso, de acordo com Tavares (1985, p. 6-7), “a partir daí o movimento do crédito interbancário se orientou decisivamente para os EUA e o sistema bancário passou a ficar sob o controle do FED. E não apenas sob o controle da política monetária, que dita as regras do jogo, as flutuações da taxa de juros e de câmbio, mas também a serviço da política fiscal americana”. . Este período entre meados dos anos 1960 e a década de 1970, que constituiu a transição para a internacionalização financeira6 6 Campos (2009, p. 10-11) entendeu esse período como uma fase de crise e transição, “em virtude de o capital estar se reestruturando em uma nova base produtiva e restaurando sua dimensão financeira (controlada e restringida desde a Crise de 1929), de modo a definir, na fase posterior, um tipo de acumulação assentado essencialmente na internacionalização financeira. [Esta] consolidou-se nos anos 80 e ingressou nos anos 90 mantendo seus traços essenciais até a atualidade. A dimensão financeira do capital estabelece então uma dinâmica crescente em relação à dimensão produtiva, em que as transformações iniciadas na fase anterior lhe possibilitam recentralizar o capital como um todo, impondo também uma mudança nas estratégias de acumulação das empresas multinacionais instaladas na periferia”. , se diferenciava da fase anterior denominada “internacionalização produtiva”7 7 Para Campos (2009, p. 10), “a fase de internacionalização produtiva iniciou-se no final da Segunda Guerra e seguiu até o início dos anos 60, quando o IDE, sobretudo de origem norte-americana, internacionalizou os mercados internos.”. , baseada na acumulação fordista.

A acumulação a partir de então passava principalmente “pelas novas formas de centralização de gigantescos capitais financeiros (os fundos mútuos e fundos de pensão), cuja função [era] frutificar principalmente no interior da esfera financeira” (Chesnais, 1996, p. 15CHESNAIS, F. A mundialização do capital. São Paulo: Xamã, 1996.). Como a acumulação não encontrava um retorno à taxa média de lucro esperada no setor produtivo, houve o recrudescimento do capital financeiro. Este contrarrestava a diminuição da taxa de lucro na esfera produtiva com recursos expressivos destinados à “acumulação financeira”8 8 “Por acumulação financeira, entende-se a centralização em instituições especializadas de lucros industriais não reinvestidos e de rendas não consumidas, que têm por encargo valorizá-los sob a forma de aplicação em ativos financeiros – divisas, obrigações e ações – mantendo-os fora da produção de bens e serviços” (Chesnais, 2005, p. 37). . A expansão do Euromercado9 9 O excesso de liquidez internacional após a Segunda Guerra Mundial, expresso pelo poder do dólar enquanto moeda internacional levou à constituição dos Eurodólares e “quem se beneficiará particularmente dessa conjuntura de largueza financeira, abrindolhe perspectivas e oportunidades imensas, serão naturalmente, em primeiro lugar, os grandes trustes e monopólios norte-americanos, e logo em sequência, das demais potências capitalistas, em especial a Alemanha e o Japão [...]. E aqui entra em cena o caso brasileiro. O nosso país não ficaria à margem da tremenda ofensiva, pelo mundo afora, do capitalismo internacional mobilizado pelos grupos financeiros e monopólios, e que encontraria aqui larga e generosa acolhida graças à orientação política entre nós adotada. Os primeiros, à busca de aplicações para o excesso de liquidez proporcionado pelos Eurodólares e outras fontes abundantes de capitais na época disponíveis; os outros, os monopólios, como bons negociantes, à cata de quaisquer oportunidades de novos negócios, que relativamente abundavam, e, de imediato, muito bons, nas áreas do Terceiro Mundo, semivirgem ainda do progresso capitalista mais recente, onde quase tudo, no nível desse progresso, estava por fazer ou introduzir” (Prado Jr., 2006, p. 347-348). Entre outros autores que discorrem sobre a conexão entre filiais de empresas transnacionais e o Euromercado, recomenda-se: Wells (1973); Lima (1985); Baer (1986); Tavares e Assis (1986); e Campos (2009). oferecia ao capital internacional possibilidades sem precedentes de valorização financeira10 10 Deve-se ressaltar, entretanto, que os investimentos financeiros se apropriam da riqueza produzida no setor produtivo. “A esfera financeira nutre-se da riqueza criada pelo investimento e mobilização de uma força de trabalho de múltiplas qualificações. Uma parte, hoje elevada, dessa riqueza é captada ou canalizada em proveito da esfera financeira, e transferida para esta” (Chesnais, 1996, p. 246). (Chesnais, 1996CHESNAIS, F. A mundialização do capital. São Paulo: Xamã, 1996.).

Com as mudanças no novo padrão de acumulação, entendido também como financeirização, as empresas multinacionais passaram a enviar seus recursos sobretudo para investimentos financeiros nos países periféricos. Ocorria também uma inversão no fluxo de Investimentos Diretos Externos (IDEs), não mais estes tendo como destino prioritário os países subdesenvolvidos da América Latina, mas sim o Sudeste Asiático e a China.

O deslocamento gradativo das empresas multinacionais para novos locais de acumulação era estimulado por auxílios concedidos pela legislação tributária dos Estados Unidos11 11 “Em conformidade com as seções 806/807 da lei de tarifas dos Estados Unidos, estão isentas de impostos as partes dos produtos que reingressarem nesse país, limitando-se a incidência tributária ao valor adicionado no estrangeiro, ou seja, essencialmente aos custos salariais. Graças a essas facilidades, o valor das importações chamadas ‘806/807’ subiu entre o final dos anos 60 e o dos anos 80 de menos de 1 bilhão para 40 bilhões de dólares” (Furtado, 1992, p. 20). a produtos importados e pelas facilidades estabelecidas pelos países hospedeiros aos investimentos norteamericanos12 12 “As chamadas zonas de processamento de exportações, instaladas na Coréia do Sul, em Taiwan, nas Filipinas e em outros países do Sudeste asiático são um conjunto de facilidades destinadas a atrair empresas multinacionais” (Furtado, 1992, p. 20). (Furtado, 1992FURTADO, C. Brasil: a construção interrompida. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.). Começou a ocorrer, de acordo com Chesnais (1996)CHESNAIS, F. A mundialização do capital. São Paulo: Xamã, 1996., um processo de deslocalização da produção, que favoreceu países com níveis de salário e de proteção social muito baixos. Isso potencializou elevados ganhos aos investidores e comprometeu os espaços econômicos nacionais (Sampaio Jr., 1999SAMPAIO JR., P. A. Entre a Nação e a barbárie: os dilemas do capitalismo dependente em Caio Prado, Florestan Fernandes e Celso Furtado. Petrópolis: Vozes, 1999.).

A deslocalização era uma forma de descentralização da empresa multinacional, que fragmentava sua produção pelo mundo. A partir da transnacionalização das empresas, “as relações externas, comerciais ou financeiras, [eram] vistas, de preferência, como operações internas da empresa” (Furtado, 1992, p. 32FURTADO, C. Brasil: a construção interrompida. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.), e, portanto, tenderiam a comprometer os espaços nacionais de acumulação13 13 “A extrema mobilidade do capital internacional comprometeu o controle das sociedades nacionais sobre as empresas transnacionais. Os aumentos nas escalas mínimas de produção fizeram com que os novos processos produtivos exigissem um espaço econômico de referência mais amplo, que tendia a ultrapassar os limites das fronteiras dos Estados nacionais. A integração do sistema financeiro internacional levou ao paroxismo a liberdade de movimento de capitais, generalizando, para as economias centrais, um problema que até então se restringia aos países subdesenvolvidos: a incapacidade de circunscrever o circuito de valorização do capital ao espaço econômico nacional” (Sampaio Jr., 1999, p. 18-19). . Conforme Furtado (1982, p. 121)FURTADO, C. A nova dependência: dívida externa e monetarismo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982., “posto que essas empresas têm acesso ao mercado financeiro internacional e decidem da localização de seus investimentos – decisões muitas vezes tomadas a partir de holdings localizadas em países de conveniência –, a possibilidade que tem um governo de atuar sobre elas é necessariamente limitada”.

Dentro deste quadro, os governos não mais teriam como coordenar a ação desses agentes poderosos do capitalismo. Por isso, Furtado havia estabelecido o termo “pós-nacional”14 14 Ver Furtado (1977), capítulo II: O capitalismo pós-nacional. como forma de interpretação do sistema capitalista desde então. Nesse sentido, se tornara muito mais limitada a possibilidade de um desenvolvimento nacional, especialmente nos países periféricos.

O Brasil, onde o tamanho do mercado interno chegou a ser determinante no período da internacionalização produtiva para a instalação da empresa multinacional, deixou de ter neste mercado interno um referencial para o seu crescimento. Em lugar do fortalecimento das relações internas, as regiões se vinculavam mais ao exterior. “Se se instalam plataformas de exportação no Nordeste, no estilo das ‘maquiladoras’ mexicanas, a integração regional com o exterior se fará por vários meios, em detrimento da articulação em nível nacional” (Furtado, 1992, p. 32FURTADO, C. Brasil: a construção interrompida. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.).

A possibilidade de haver desenvolvimento nacional no Brasil, deste modo, entrou em crise, uma vez que os meios (racionalidade instrumental) se sobrepuseram aos fins (racionalidade substantiva)15 15 De acordo com Furtado (2000, p. 7-8, grifos do autor), “[...] existe alguma evidência de que por toda parte, no espaço e no tempo, a invenção cultural tende a ordenar-se em torno de dois eixos: a busca da eficácia na ação e a busca de propósito para a própria vida. É o que desde Max Weber se tem chamado de racionalidade formal ou instrumental e racionalidade substantiva ou dos fins. A invenção diretamente ligada à ação supõe a existência de objetivos previamente definidos. Ela nos dá a técnica. A invenção ligada aos desígnios últimos nos dá os valores, os quais podem ser morais, religiosos, estéticos etc.” , inclusive negando-os. Os determinantes externos, expressos pela transnacionalização e pela financeirização, deixaram o Estado sem condições de mediar os fins aos meios, ou seja, a acumulação capitalista foi prioritariamente usada para atender os interesses privados dos capitalistas sem a possibilidade de se levar adiante um projeto de nação. Nesse sentido, por mais que pudesse haver desenvolvimento capitalista no Brasil, o mesmo não redundava em desenvolvimento nacional. Internamente, a articulação para que isso ocorresse se deu, principalmente, a partir do golpe civilmilitar (1964), com o apoio decisivo das burguesias brasileiras que comandavam o Estado16 16 Com o Estado autoritário a burguesia conquistava “as condições mais vantajosas possíveis: 1°) para estabelecer uma associação mais íntima com o capitalismo financeiro internacional; 2°) para reprimir, pela violência, ou pela intimidação, qualquer ameaça operária ou popular de subversão da ordem (mesmo como uma ‘revolução democrático-burguesa’); 3°) para transformar o Estado em instrumento exclusivo do poder burguês, tanto no plano econômico quanto nos planos social e político” (Fernandes, 2005, p. 255, grifos do autor). .

Como a transnacionalização do capital esteve relacionada não somente ao aparecimento das empresas transnacionais industriais, mas também das empresas transnacionais bancárias, houve a criação de uma nova forma de articulação com a economia brasileira, entendida como uma “nova dependência”17 17 Ver Furtado (1982). . Esta vinculou-se, principalmente, à crise da dívida externa18 18 A profunda crise dos anos 1980 levou Furtado (1992) a afirmar que naquele momento a construção do país havia sido interrompida. . Em grande medida, a crise do endividamento externo resultou da política econômica estabelecida no II Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND), sobretudo por conta do seu padrão de financiamento19 19 Fernandes (1972; 1975; 2005) mostrou que o imperialismo sobre a América Latina colocava esses países como reféns dos objetivos do capital internacional e com a anuência das burguesias nativas comprometia-se o desenvolvimento capitalista autônomo nessas regiões e a construção de uma nação. Dessa forma, não foi o Estado o ator que planejou e definiu o investimento do capital estrangeiro canalizando-o para um tipo de industrialização que atendesse as necessidades da nação. Mas sim foi a maturação dos capitais das empresas multinacionais no pós-Segunda Guerra Mundial e a necessidade de investir nos países da América Latina que fizeram com que as burguesias nativas se reorganizassem, tomassem o Estado para si e levassem sua autocracia adiante para satisfazer as demandas do “imperialismo total”. No caso do Brasil, o golpe civil-militar bloqueou as Reformas de Base propostas no governo de João Goulart e promoveu mudanças no sentido de aprofundar a dupla articulação – dependência externa e desenvolvimento interno desigual. De acordo com Sampaio Jr. (1999, p. 118), a visão de Prado Jr. era a de que: “a participação dos grandes monopólios internacionais no processo de substituição de importações agravou a instabilidade das economias dependentes porque, ao recorrerem à periferia atraídos pelas oportunidades de negócios abertas pela expansão do mercado interno, eles inviabilizaram a consolidação de um ‘capital industrial’ de origem nativa capaz de liderar o processo de acumulação. Por mais paradoxal que isso possa parecer, apesar do expressivo desenvolvimento das forças produtivas, a subordinação do processo de industrialização à lógica do capital financeiro internacional agravou a vulnerabilidade externa da economia, uma vez que não há nada que assegure de antemão que os lucros acumulados internamente poderão ser sancionados no mercado internacional”. Para uma contribuição mais recente a esse respeito, ver: Campos (2009). .

2 Financiamento do II PND e crise da dívida externa

O II PND20 20 Disponível em: http://www.fau.usp.br/docentes/depprojeto/c_deak/CD/5bd/2br/3plans/1974II-PND/pdf/II-PND.pdf. foi encaminhado ao Congresso Nacional no dia 10 de setembro de 1974 pelo presidente da República do regime autoritário, Ernesto Geisel. No plano, Geisel destacava a crise internacional e as possibilidades e potencialidades de o Brasil suplantar a crise internacional e integrar o seleto grupo dos países desenvolvidos. O II PND propunha equacionar o parque produtivo brasileiro e entendia que alguns setores da economia haviam ficado “atrofiados”, como era o caso dos insumos básicos e dos bens de capitais, que formavam gargalos que necessitariam ser sanados.

A crise do petróleo de 1973, ao mesmo tempo que criava problemas para a balança comercial brasileira e para o balanço de pagamentos, dada a grande dependência do país desse insumo, possibilitava a obtenção dos recursos externos necessários para levar o II PND adiante – e consequentemente diminuir a dependência em relação ao petróleo –, na visão dos formuladores do plano. A reciclagem dos petrodólares, fruto dessa crise do petróleo, era vista como a principal fonte de recursos externos aos países subdesenvolvidos.

Na leitura do governo, o endividamento externo, também chamado pela equipe econômica de “hiato de recursos”21 21 “Ideia de que o endividamento externo teria a função de financiar o déficit na conta de mercadorias e de serviços produtivos que necessariamente acompanharia a trajetória de crescimento acelerado de uma economia atrasada” (Cruz, 1995, p. 123). , configurava-se, portanto, como elemento central para o financiamento do II PND22 22 Deve-se destacar que as mudanças feitas pelo PAEG, no sentido de promover a articulação da economia brasileira com o sistema financeiro internacional, principalmente por meio da alteração da Lei 4.131 e da Resolução 63, foram fundamentais para o padrão de financiamento da economia brasileira que iria se configurar no II PND, por permitirem acesso fácil ao Euromercado. “Além das vantagens quanto a prazos e custos, os empréstimos em moeda nos moldes da Lei n. 4.131 mostraram-se especialmente atrativos às empresas de capital externo, de vez que passaram a representar um mecanismo de burla das restrições quanto à remessa de lucros originária de investimentos estrangeiros realizados no país” (Cruz, 1984, p. 110). Já a Resolução 63 favorecia a obtenção de recursos externos por parte das empresas nacionais. Os bancos capitaneavam os empréstimos no mercado internacional e os repassavam às empresas brasileiras. Essas operações de repasse por meio da Resolução 63 “constituíram, por sua vez, o elo através do qual as instituições financeiras locais absorveram quantidades massivas de recursos originários do sistema financeiro dos países avançados no bojo do forte movimento de internacionalização financeira verificado no período” (Cruz, 1984, p. 168). . Sem os recursos externos, de acordo com o governo, o plano se tornaria frustrante, assim como a previsão de crescimento para a indústria na ordem de 12% ao ano no quinquênio. Para essa ampliação, reservava-se ao setor privado papel de destaque enquanto as empresas estatais atuariam para dar suporte à iniciativa privada em setores que não eram do interesse do capital privado, mas importantes para o seu desenvolvimento industrial. A orientação do plano era deixar com a iniciativa privada a função de investir e produzir, com rentabilidade adequada. “Só [haveria] projetos sob controle de empresas governamentais se, na prática, a iniciativa privada, claramente, [demonstrasse] que não [poderia], ou não [desejaria], realizá-los (por motivos ligados ao volume dos investimentos, à baixa rentabilidade direta dos projetos ou à tecnologia)” (II PND, 1974, p. 38).

As empresas estatais teriam um papel fundamental no quinquênio, mas com o propósito de gerar economias externas às empresas privadas. “Uma leitura com maior atenção do II PND constataria o trivial mantido implícito: a Estratégia proposta desdobrar-se-ia precipuamente a partir de um elenco de projetos diretamente formulados e implantados pelas empresas estatais” (Lessa, 1998, p. 106LESSA, C. A estratégia de desenvolvimento, 1975/76; sonho e fracasso. 2. ed. Campinas, SP: Unicamp. IE, 1998. (30 Anos de Economia – Unicamp, 5)), que estimulariam e beneficiariam o setor privado.

Os novos projetos seriam realizados com recursos externos, mesmo diante do contexto internacional desfavorável já a partir de 197423 23 A equipe econômica anunciaria inclusive medidas que repercutiriam diretamente no aumento da dívida externa, principalmente do setor público, como a Circular n 230 de agosto de 1974 (Disponível em: http://www.bcb.gov.br/pre/normativos/circ/1974/pdf/circ_0230_v10_l.pdf). “Passou a ser permitido que os recursos não utilizados nas operações financeiras de repasse fossem aplicados na forma de depósitos em moeda estrangeira junto ao BACEN, como alternativa à compra de LTN. Sobre tais depósitos o BACEN assumiria os juros devidos ao credor externo e, também, o ônus do imposto de renda quando de responsabilidade do depositante (Circular n. 230)” (Cruz, 1984, p. 41). . Além de ampliar o endividamento externo em meio a uma conjuntura internacional recessiva, o país sofreria outro revés, dado pela diminuição das exportações brasileiras e pela deterioração dos termos de intercâmbio. Entre 1974 e 1976, o saldo da balança comercial ficou negativo em US$ 10,5 bilhões, impactado principalmente pela crise do petróleo (o preço do barril em 1970 era de US$ 1,80 e em 1974 já alcançava a cifra de US$ 11,58). Nesse triênio, os gastos com juros sofreram uma elevação, chegando a US$ 4 bilhões, o que significava “em termos médios anuais um acréscimo de 300% em relação à média do quinquênio 1969-73” (Cruz, 1984, p. 21CRUZ, P. D. Dívida externa e política econômica: a experiência brasileira nos anos setenta. São Paulo: Brasiliense, 1984.).

Esse quadro já ressaltava o processo que se gestava de aumento da taxa básica de juros internacionais e a elevação dos spreads bancários. Contudo, a partir do segundo semestre de 1976 o Euromercado voltava a se ampliar e a dívida externa brasileira iniciava um novo movimento de crescimento. Como exemplo, em 1972 o país demandou 8,5% de todos os empréstimos realizados por esse mercado ante 1,8% em 1970. Esse volume chegou a alcançar 11,2% em 1976, durante o II PND, mantendo uma posição de destaque na contratação desses recursos. Nos anos compreendidos entre 1977 e 1978 a dívida externa crescia “a uma taxa média de 30% a.a” (Cruz, 1984, p. 21CRUZ, P. D. Dívida externa e política econômica: a experiência brasileira nos anos setenta. São Paulo: Brasiliense, 1984.).

No período 1977-1978, no entanto, a melhora das relações comerciais do Brasil e a valorização dos preços dos produtos primários, como o café e a soja, somadas às restrições às importações, resultaram em uma balança comercial relativamente equilibrada, cujo déficit alcançou 0,9 bilhão de dólares. O problema era que “somados os déficits das contas de mercadorias e de serviços produtivos, [chegava-se] a um déficit de 3,8 bilhões de dólares no biênio” (Cruz, 1984, p. 22CRUZ, P. D. Dívida externa e política econômica: a experiência brasileira nos anos setenta. São Paulo: Brasiliense, 1984.). Em contrapartida, entraram no período a título de contratação líquida de capitais de empréstimos US$ 13,5 bilhões. Os juros líquidos da dívida externa alcançaram US$ 4,8 bilhões e as reservas internacionais chegaram a US$ 5,3 bilhões, ou seja, 36% e 40% respectivamente do total de contratação líquida de empréstimos no biênio (Cruz, 1984CRUZ, P. D. Dívida externa e política econômica: a experiência brasileira nos anos setenta. São Paulo: Brasiliense, 1984.).

Esses números explicitavam “que o acréscimo da dívida ocorrido no período [tinha] pouco a ver com o financiamento do ‘hiato de recursos’. Ou, em outras palavras, [revelava-se] o caráter predominantemente financeiro da tomada de novos recursos externos” (Cruz, 1984, p. 22CRUZ, P. D. Dívida externa e política econômica: a experiência brasileira nos anos setenta. São Paulo: Brasiliense, 1984.). O endividamento nessa época se deveu, de fato, a um “segundo movimento de ‘transbordamento’ do Euromercado de moeda e de uma política indutora de tomada de recursos externos” (Cruz, 1984, p. 23CRUZ, P. D. Dívida externa e política econômica: a experiência brasileira nos anos setenta. São Paulo: Brasiliense, 1984.). Baer (1986, p. 95)BAER, M. A internacionalização financeira no Brasil. Petrópolis: Vozes, 1986., complementando essa interpretação, chegou a destacar que “no período 1974-1978, o endividamento externo passou a guardar uma relação mais estreita com o desequilíbrio do balanço de pagamentos, tanto em sua dimensão produtiva como financeira”.

Nos anos de 1979 e 1980, a balança comercial brasileira voltou a ter déficit, acumulando um saldo negativo de US$ 5,7 bilhões, como resultado direto do segundo choque do petróleo, em 1979. O preço do barril passou de US$ 13,60 em 1978 para US$ 30,03 em 1979. Segundo Baer (1993)BAER, M. O rumo perdido: a crise fiscal e financeira do Estado brasileiro. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1993., quando ocorreu o segundo choque do petróleo o Brasil importava 87% do que consumia deste recurso.

No biênio 1979-1980, houve também um aumento significativo da taxa de juros internacional, que levou a uma situação inédita para o Brasil: o aumento da dívida externa seria insuficiente para fazer frente aos juros líquidos vencidos no período. “De fato, as tomadas líquidas totalizaram 9,2 bilhões de dólares, enquanto os juros líquidos alcançaram o montante de 10,5 bilhões de dólares”24 24 “Após 1978, o processo de endividamento externo brasileiro assumiu uma dimensão eminentemente financeira” (Baer, 1986, p. 111). (Cruz, 1984, p. 24CRUZ, P. D. Dívida externa e política econômica: a experiência brasileira nos anos setenta. São Paulo: Brasiliense, 1984.). Para fechar o balanço de pagamentos, só restavam duas alternativas: a utilização das reservas cambiais e/ou a contratação de mais empréstimos externos com um prazo menor e com custos mais elevados.

Os desequilíbrios derivados dos custos dos juros e das amortizações da dívida externa tornavam-se, assim, os causadores principais das crises do balanço de pagamentos brasileiro. Ao mesmo tempo, a política econômica voltava-se para a geração de megasuperávits na balança comercial para tentar honrar os compromissos da dívida externa.

A partir de 1980, os empréstimos e financiamentos deixavam de ser maiores do que os gastos com juros e amortizações da dívida externa. Em 1982, a diferença entre os serviços da dívida e os empréstimos e financiamentos alcançava US$ 5,59 bilhões, já em 1983 chegava a US$ 9,71 bilhões, em 1984 foi a US$ 6,27 bilhões e em 1985 atingiu impressionantes US$ 11,461 bilhões. Por isso, a única maneira que a equipe econômica encontrou para tentar saldar esses déficits, uma vez que o Brasil não pediu uma moratória da dívida, foi a geração de robustos superávits comerciais25 25 “O governo brasileiro transformou em prioridade absoluta o objetivo de gerar superávits comerciais sem precedentes na história econômica brasileira, acelerando o esforço iniciado em 1980-1981. Um dos resultados foi o imediato aprofundamento dos problemas financeiros do governo. Como o setor público responde pela maior parte da dívida externa e como o setor privado passou a responsabilizar-se pela produção de divisas necessárias ao pagamento dos juros devidos pelo setor público, o aumento do superávit comercial traduzia-se em forte pressão sobre as contas do Banco Central. A preocupação em manter algum controle sobre os agregados monetários e a impossibilidade prática de gerar superávits orçamentários comparáveis ao montante de recursos transferidos para o exterior levaram o governo a promover expansão acentuada do seu endividamento interno. Em consequência, produziu-se substancial elevação das taxas de juros, o que reforçou a pressão inflacionária, aumentou o déficit público e deprimiu o investimento privado” (Batista Jr., 1987, p. 21). , principalmente comprometendo o Sistema Produtivo Estatal (SPE), o que será discutido na próxima seção do artigo.

Dado que os empréstimos tornaram-se insuficientes, a partir de 1980 adotou-se uma política econômica ainda mais recessiva para diminuir as importações públicas e privadas e expandir as exportações, na tentativa de gerar saldos positivos na balança comercial, mesmo com o Brasil apresentando uma deterioração dos termos de troca. No período 1980-1985 houve uma queda de 27% neste indicador (Baer, 1993BAER, M. O rumo perdido: a crise fiscal e financeira do Estado brasileiro. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1993.).

Essas medidas econômicas ortodoxas significaram: “corte no gasto público e redução de subsídios, controle quantitativo de expansão do crédito com a concomitante liberação das taxas de juros praticadas no segmento livre do mercado financeiro e contenção salarial” (Cruz, 1984, p. 26CRUZ, P. D. Dívida externa e política econômica: a experiência brasileira nos anos setenta. São Paulo: Brasiliense, 1984.). Mesmo com os ajustes, ainda assim houve a necessidade de queima de reservas cambiais. Isso fragilizava as contas nacionais e tanto a capacidade do país quanto a das empresas do SPE de honrarem seus compromissos externos, uma vez que o governo havia promovido a estatização da dívida externa.

A princípio, os maiores demandantes dos recursos externos eram as empresas privadas, principalmente as multinacionais, com o privilégio de conseguir recursos no exterior por meio de suas matrizes, principalmente com as facilidades da Lei 4.131, com taxas de juros menores e prazos maiores aos praticados no mercado interno brasileiro. A dívida externa brasileira caracterizava-se, assim, em um primeiro momento, enquanto uma dívida notadamente privada. Entre os anos 1972 e 1973, quando houve o primeiro momento de crescimento elevado do endividamento externo, o setor privado detinha quase 75% de toda a dívida externa brasileira. Em 1975, essa participação diminuiu para algo em torno de 50%. Nos anos 1979-1980, houve a inversão: o setor estatal passou a responder por mais de 75% de toda a dívida externa brasileira e isso caracterizou o segundo momento do endividamento externo brasileiro (Cruz, 1984CRUZ, P. D. Dívida externa e política econômica: a experiência brasileira nos anos setenta. São Paulo: Brasiliense, 1984.).

A estatização (ou socialização) da dívida externa ganhava impulso não só com a Circular n° 230, de 1974, bem como com a Resolução 43226 26 A partir da Resolução 432 do Conselho Monetário Nacional, segundo Tavares e Assis (1986, p. 70-71), “qualquer devedor ao exterior poderia, a qualquer tempo, transferir ao Banco Central, em caráter temporário ou definitivo, o remanescente de sua dívida nas condições contratadas, desde que nele depositasse os cruzeiros correspondentes ao principal da obrigação na data. Foi o sinal para a estatização crescente da dívida privada, a um custo em dólares para o Banco Central equivalente ao spread arbitrado pelo credor e aceito pelo devedor originais – não raro, matriz externa e subsidiária interna de um mesmo banco, ou vice-versa”. do Banco Central, de junho de 1977. Ambas absorviam o endividamento externo privado assumindo os custos relacionados aos juros, aos spreads bancários e às desvalorizações cambiais27 27 Cabe ressaltar que o ministro Delfim Netto promoveu duas maxidesvalorizações de 30%, uma em dezembro de 1979 e outra em fevereiro de 1983. No que se refere aos encargos da dívida externa, as desvalorizações cambiais impactavam diretamente nos seus dispêndios. Como o SPE detinha a maior parte dessa dívida, ele foi o setor mais penalizado com as desvalorizações, uma vez que elas aumentavam na mesma proporção “o custo em moeda local dos passivos denominados em moeda estrangeira” (Cavalcanti, 1988, p. 38). .

3 A criação da SEST e os ajustes sobre as empresas estatais

Com o avanço do endividamento externo, os ajustes internos com o objetivo de amenizar a crise do país resultaram em medidas econômicas que se concentravam no combate ao déficit público, no controle da inflação, na redução da participação do Estado na economia, principalmente das empresas estatais, com a retórica de que com essas mudanças o Brasil retomaria o ciclo virtuoso do crescimento econômico com geração de emprego e renda.

Diferentemente do México que decretou moratória em agosto de 1982, a equipe econômica brasileira no período do governo militar de João Figueiredo (1979-1985) mostrou que faria todo o esforço necessário para o pagamento dos juros da dívida externa. Para tanto, o Brasil promoveu um ajuste fiscal alinhado ao conceito de Necessidade de Financiamento do Setor Público (NFSP)28 28 Mello (1994) argumentava que existia uma percepção bastante equivocada da parte do governo de que a privatização poderia reduzir o déficit público. Com o uso do conceito NFSP, o déficit realmente se reduziria quando o governo vendesse ativos, da mesma forma que aumentaria quando o governo investisse. Essa relação simplista, feita pelos defensores da privatização, no entanto, ignorava o fato de que a venda de uma empresa estatal resultaria, posteriormente, no fim da receita gerada por essa empresa, comprometendo ainda mais as contas públicas nos anos subsequentes. , que confundia a identificação dos reais motivos do déficit público e permitia ao governo fazer cortes em setores nos quais não havia “desequilíbrio”, situação que envolvia muitas empresas estatais.

Os ajustes ocorreram principalmente sobre o SPE, que tinha aumentado significativamente sua participação na economia não só na fase de instalação da indústria pesada no país como também no período dos governos ditatoriais29 29 Essa expansão nos governos militares se deu por meio do Decreto-Lei 200, de 25 de fevereiro de 1967 (Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del0200.htm). Para se ter uma ideia em 1979 o setor público representava 43,7% da formação bruta de capital fixo no país (Coutinho; Reichstul, 1998). . O SPE foi identificado pela equipe econômica como “desequilibrado” por conta do excesso de gastos do governo, principalmente para manter as empresas estatais. Estas eram entendidas como as geradoras do déficit público; do quadro inflacionário pelo excesso de demanda agregada, expansão monetária e elevação do salário acima da produtividade. Ou seja, havia uma interpretação monetarista/ortodoxa da crise e, como tal, o governo direcionava-se de maneira equivocada para tentar resolver os problemas que o país atravessava.

Para promover o ajuste das empresas estatais, foi criada a Secretaria de Controle das Empresas Estatais (SEST)30 30 “É interessante notar que, pela primeira vez, o investimento das empresas públicas, sob comando da SEST-SEPLAN, passa a ser utilizado como instrumento de política macroeconômica, muito embora vise apenas objetivos conjunturais: desaquecer a economia e controlar o fluxo de caixa governamental dentro das estreitas metas de expansão da base monetária” (Reichstul; Coutinho, 1998, p. 54, grifos dos autores). , por meio do Decreto 84.128, de 29 de outubro de 197931 31 Disponível em: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1970-1979/decreto-84128-29-outubro-1979-433673-publicacaooriginal-1-pe.html. . A SEST ficou subordinada diretamente à Secretaria de Planejamento Econômico (SEPLAN)32 32 Havia um discurso privatizante e a acusação de que as empresas estatais precisavam ter maior controle. Por conta disso, a criação da SEST foi comemorada. Kliass (1989, p. 112) ressaltou esse otimismo com as manchetes dos jornais da época: “‘Delfim passa a controlar também empresas estatais’ (FSP, 30 out. 1979). ‘Decreto dá a Delfim controle total da economia’ (JT, 30 out. 1979). ‘Um verdadeiro Ministério da Economia’ (OESP, 31 out. 1979). ‘Apoio ao controle das estatais’”. .

A presidência da SEST esteve a cargo de um representante do setor privado, Nelson Mortada, do grupo Matarazzo, indicado pelo então ministro do Planejamento Delfim Netto. Em seu primeiro relatório33 33 Brasil (1981). , publicado em 1981, a nova secretaria explicitava que as empresas estatais cresceram muito, acabaram causando desequilíbrios nas contas do governo e comprometeram a atuação do setor privado. Mortada desvelava sua preocupação com a situação inflacionária causada, em sua visão, pela forma de atuação das empresas estatais34 34 Em entrevista à revista Exame, em 21 nov. 1979, Mortada expôs que “a principal razão para o governo criar esses controles foi o fato de termos concluído que a pretensão de gastos acima de suas possibilidades colocou as empresas estatais entre as principais causas da inflação no país, seja pelo seu déficit, seja por atacarem projetos de maturação longa, que começam a gerar renda muitos anos antes de criar produtos ou serviços” (Kliass, 1989, p. 126-127). , discurso que era consonante com o do ministro que o indicou35 35 Apesar de ter criado durante o período do “milagre econômico” mais de uma centena de empresas estatais, “‘Delfim acusou as estatais de pretenderem realizar, a um só tempo, 50 grandes projetos, quando o normal seria tocar 5 e levá-los até o fim, e não iniciar todos e não concluir nenhum’. [...] Ele afirma, então, que ‘se deixarmos as estatais sozinhas, logo logo elas estarão planejando o Brasil’” (Kliass, 1989, p. 127-128). .

A SEST surgiu como uma secretaria com grandes poderes. Ela tornou-se responsável pela elaboração do orçamento das empresas estatais, financiamentos internos e externos, cortes, quadro de trabalhadores das empresas, salários, investimentos e política de preços do setor. A SEST também ficou incumbida das alterações institucionais e patrimoniais das empresas estatais, com a meta de “evitar o excessivo crescimento do setor público na economia e, se possível, reduzir a sua participação aos setores monopolísticos e de infraestrutura” (Brasil, 1981, p. 28BRASIL. Secretaria de Planejamento (SEPLAN). Secretaria de Controle das Empresas Estatais (SEST). Empresas Estatais no Brasil e o controle da SEST; antecedentes e experiência de 1980. Brasília, 1981. 113p.).

Cabia à SEST, ainda, impor tetos de importações com o objetivo de diminuí-las para ajudar a elevar o saldo da balança comercial, controlar a aquisição de combustíveis “destinados a veículos automotores, por parte das empresas estatais e dos órgãos da Administração Direta Federal” (Brasil, 1981, p. 29BRASIL. Secretaria de Planejamento (SEPLAN). Secretaria de Controle das Empresas Estatais (SEST). Empresas Estatais no Brasil e o controle da SEST; antecedentes e experiência de 1980. Brasília, 1981. 113p.), principalmente após o segundo choque do petróleo. Além disso, a secretaria responsabilizava-se pelo recolhimento de dividendos da União, a remuneração dos dirigentes das empresas estatais e, por fim, pelo controle dos planos assistenciais e benefícios indiretos. Com todas essas atribuições, as empresas estatais passavam ao controle quase irrestrito da SEST. A secretaria ganhava mais poder do que o de vários ministérios36 36 “Mortada é bastante claro ao abordar esse tema. ‘Podem chiar, afirmou, mas nós temos todas as armas nas mãos. É aqui na SEPLAN que se decidem os preços praticados por essas empresas e o seu montante de recursos próprios. É aqui que se decidem os seus níveis de endividamento externo. Podemos também segurar as suas fontes de crédito” (Kliass, 1989, p. 131). .

Em relação aos orçamentos das empresas estatais, a SEST os elaborava a partir das informações obtidas das próprias empresas, fixava os limites máximos de “dispêndios globais” e os encaminhava para aprovação do presidente da República. As fontes de recursos eram oriundas, principalmente, de quatro itens: recursos próprios, transferências orçamentárias, operações de crédito externo e operações de crédito interno. Todas essas fontes ficavam sob o manejo da secretaria para análise e aprovação. A SEST dispunha então de “todos os instrumentos necessários à definição e controle dos limites de recursos a serem utilizados pela empresa” (Brasil, 1981, p. 27BRASIL. Secretaria de Planejamento (SEPLAN). Secretaria de Controle das Empresas Estatais (SEST). Empresas Estatais no Brasil e o controle da SEST; antecedentes e experiência de 1980. Brasília, 1981. 113p.). Com base nesses orçamentos37 37 Esses orçamentos eram definidos de diferentes formas: a) Orçamento de Recursos e Dispêndios Globais – Orçamento SEST/Dispêndios Globais; b) Orçamento de Captação de Recursos Externos – Orçamento SEST/Recursos Externos; c) Fixação de Teto de Importação do Setor Público – Orçamento SEST/Importações e; d) Fixação de Limites de Aquisição de Combustíveis Derivados de Petróleo para Autoveículos – Orçamento SEST/Combustível. , ela promovia “o acompanhamento permanente, a partir de informações ou relatórios próprios preenchidos pelas empresas regularmente a cada mês ou trimestre, dependendo do caso, estudando os devidos ajustes, se necessário, e submetendo-os à aprovação presidencial” (Brasil, 1981, p. 32BRASIL. Secretaria de Planejamento (SEPLAN). Secretaria de Controle das Empresas Estatais (SEST). Empresas Estatais no Brasil e o controle da SEST; antecedentes e experiência de 1980. Brasília, 1981. 113p.).

A secretaria lançava anualmente duas publicações: o Orçamento SEST e o Relatório Anual SEST. No Orçamento, havia inicialmente as Exposições dos Motivos (EMs) pelos quais a secretaria havia feito o planejamento para as empresas estatais referente ao ano seguinte para aprovação do presidente da República. No Relatório, por sua vez, constava um balanço sobre os resultados obtidos a partir das orientações da SEST.

No primeiro Relatório da SEST, foi realizado um histórico sobre as empresas estatais no Brasil e as razões da criação das mesmas. Concluiu-se que elas cresceram tanto que acabaram causando desequilíbrios nas contas do governo e prejudicaram a atuação do setor privado. Os organizadores do documento38 38 Assinavam o Relatório o Ministro-Chefe da Secretaria de Planejamento da Presidência da República Antonio Delfim Netto, o Ministro da Fazenda Ernane Galvêas, os Ministros do Interior, da Indústria e Comércio, da Agricultura e do Trabalho. explicitavam que a intervenção federal na economia por meio da criação das empresas estatais se deveu menos a uma opção do governo e mais a uma imposição da conjuntura mundial. Assim, as mudanças em âmbito mundial, principalmente no pós-Segunda Guerra Mundial, teriam obrigado o governo a atuar em áreas em que a iniciativa privada não tinha condições de responder prontamente e nem de atender sua crescente demanda.

Curiosamente, o relatório39 39 “No Brasil, principalmente no século XX, o Governo foi forçado a assumir crescentes responsabilidades na economia, não em função de qualquer opção no sentido do dirigismo social, mas de circunstâncias diversas relacionadas com as flutuações do comércio internacional e com as ambições de rápida industrialização do país” (Brasil, 1981, p. 11). revelou que a constituição das estatais não ocorreu como uma política estratégica do Estado brasileiro para fortalecer a economia interna no sentido de o país se dirigir para um capitalismo autodeterminado, mas se deu principalmente como uma reação às demandas externas. Como desdobramento, em uma situação de mudança do contexto internacional, da internacionalização financeira, desfazer-se dessas empresas seria a medida mais coerente. Daí o importante papel da SEST, como explicitava o decreto de sua criação ao fundamentar suas obrigações:

  • a) compatibilizar os programas de investimentos das empresas estatais com os Planos Nacionais de Desenvolvimento, segundo as prioridades estabelecidas e a disponibilidade de recursos, ajustando-os às políticas monetária, cambial e fiscal;

  • b) garantir o bom desempenho do setor público, quanto à execução de seus programas de investimentos, propiciando, em consequência, melhores condições ao setor privado para o planejamento adequado de suas atividades (BRASIL, 1981, p. 17-18BRASIL. Secretaria de Planejamento (SEPLAN). Secretaria de Controle das Empresas Estatais (SEST). Empresas Estatais no Brasil e o controle da SEST; antecedentes e experiência de 1980. Brasília, 1981. 113p.).

Antes da existência da SEST, as empresas estatais eram vinculadas aos ministérios que correspondiam às suas principais áreas de atuação (por exemplo, a Petrobrás e a CSN se vinculavam ao Ministério de Minas e Energia). Com o controle das empresas estatais por parte da SEST, alguns ministérios perderam seu poder de influência, já que seus ministros não podiam mais atuar sobre importantes estatais. Como órgão de controle das estatais, a SEST era definida como portadora de instrumentos de ação que tinham

em vista o objetivo maior de que as empresas estatais [estivessem] realmente envolvidas não só com projetos efetivamente prioritários, mas também devidamente ajustados às metas de combate ao processo inflacionário e da busca do equilíbrio da balança comercial. [Procurava-se], ainda, buscar maior eficiência do aparato estatal empresarial e, também, limitar o aumento indiscriminado da participação das empresas estatais na economia brasileira, mantendo, assim, uma das condições necessárias para o fortalecimento do setor privado. Nesse sentido, a fixação antecipada de tetos de gastos das empresas estatais [permitia] que o setor privado se [orientasse] na sua programação de trabalho e de investimentos (Brasil, 1981, p. 19BRASIL. Secretaria de Planejamento (SEPLAN). Secretaria de Controle das Empresas Estatais (SEST). Empresas Estatais no Brasil e o controle da SEST; antecedentes e experiência de 1980. Brasília, 1981. 113p.).

Os objetivos da secretaria manifestavam-se nesse primeiro relatório: atuar sobre o SPE para conter a inflação; ajudar nos resultados da balança comercial, isto é, diminuir as importações e seus investimentos; reduzir sua participação na economia, o que significava privatizações; e fortalecer o setor privado, e assim continuar favorecendo esse setor com o fornecimento de bens e serviços a preços subsidiados. A SEST sinalizava que promoveria alterações na economia brasileira que antecipavam inclusive as medidas impostas pelo FMI a partir de 198340 40 As cartas de intenções do FMI propunham, de um lado, aumentar a liberalização da economia, diminuir o protecionismo e subsídios, reduzir a presença do setor público, promover privatizações e eliminar distorções no câmbio; de outro lado, para conter a inflação, o aumento do salário dos trabalhadores deveria ocorrer abaixo da inflação, para eliminar o excesso de demanda, além de medidas econômicas recessivas para conter a expansão do mercado interno (Sampaio Jr., 1988). .

Conforme definição das empresas estatais estabelecida pelo decreto de criação da SEST41 41 Decreto 84.128, de 1979. , um dos grandes problemas foi caracterizar da mesma forma empresas totalmente diferentes em seus meios e fins e englobá-las, sem distinções, como equivalentes. Por exemplo, eram enquadradas como empresas estatais até mesmo as universidades públicas, cuja capacidade de gerar recursos próprios era baixa, uma vez que este não era seu objetivo. Ao mesmo tempo, entrava também nesta denominação a Petrobrás, uma empresa com grande capacidade de geração de recursos próprios e de autofinanciamento42 42 “Tratando de uma maneira homogênea entidades tão heterogêneas, e rotulando-as todas como empresas estatais, o orçamento Sest levou também a visões distorcidas sobre o significado da absorção de recursos do Tesouro por estas entidades. Há centenas de entidades incluídas neste orçamento que, sendo simplesmente agências governamentais que operam com relativa autonomia, têm nos recursos do Tesouro a fonte básica do financiamento de seus dispêndios. São hospitais, universidades, escolas técnicas, fundações de pesquisa, agências executoras de política regional ou setorial. Sendo basicamente unidades de dispêndio, não há por que classificá-las como empresas. Mas tendo sido assim classificadas, passou a ser mal compreendido o caráter natural das transferências de recursos do Tesouro a estas entidades” (Werneck, 1987, p. 22). (Decreto Federal, n. 84.128, 1979).

A estratégia de considerar como similares estatais tão heterogêneas43 43 “É preciso colocar em seu devido lugar o problema do desequilíbrio financeiro das estatais. Aqui a confusão, frequentemente deliberada e de má fé, começa pela classificação equivocada. Estão qualificadas como empresas tanto as entidades prestadoras de serviços públicos quanto o setor produtivo estatal” (Mello; Belluzzo, 1983, p. 19, grifos dos autores). tinha como objetivo promover a privatização e os ajustes de muitas delas, visto que com essa metodologia as especificidades desapareciam e todas as empresas caracterizadas enquanto estatais poderiam ser vistas como supostas causadoras dos desequilíbrios das contas do governo e, consequentemente, responsáveis pela inflação e por onerar o erário. “O discurso oficial com frequência chamava a atenção para o fato de que boa parte dos recursos do Tesouro acabava tendo que ser utilizada para ‘cobrir o déficit’ do orçamento das ‘empresas estatais’” (Werneck, 1987, p. 22WERNECK, R. F. Empresas estatais e política macroeconômica. Rio de Janeiro: Campus, 1987.).

Além disso, havia outro problema de metodologia por parte da SEST, uma vez que elaborava, “com base nas informações fornecidas pelas empresas estatais, propostas de fixação de limites máximos de dispêndios globais a serem aprovados pelo Presidente da República, no âmbito do Conselho de Desenvolvimento Econômico (CDE)”. Ao avaliar os gastos por meio dos dispêndios globais, impossibilitava-se uma análise das especificidades de cada estatal. Em razão disso, as despesas com pessoal ou com investimentos – certamente muito diferentes entre si – entravam simplesmente como gasto44 44 “Na tentativa de se consolidar as contas do setor público federal, tratou-se indiscriminadamente as receitas e as despesas, não importando a natureza da rubrica. Assim, a título de exemplo, um dispêndio no valor de x cruzeiros na folha de pessoal do Ministério da Justiça passou a ser tratado de forma idêntica a um dispêndio de igual montante na compra de carvão pela Companhia Siderúrgica Nacional. Implicando ambos, supostamente, no mesmo impacto sobre o orçamento consolidado do setor público” (Werneck, 1987, p. 18-19). .

O cálculo dos dispêndios globais passou a ser o principal parâmetro para o valor de recursos que as empresas estatais teriam acesso e para o montante de investimentos que poderiam realizar. Entretanto, o valor global de dispêndio representava “um agregado que não se [sabia] bem o que [significava] ou o que [media], sendo totalmente destituído de sentido macroeconômico. É surpreendente, portanto, a centralidade que se [atribuiu] exatamente ao controle deste agregado pela SEST” (Werneck, 1986a, p. 385WERNECK, R. F. A questão do controle da necessidade de financiamento das empresas estatais e o orçamento de dispêndios globais da SEST. Revista Pesquisa e Planejamento Econômico, Rio de Janeiro, v. 16, n. 2, p. 381-412, ago. 1986a.).

Além do problema de agregação das empresas estatais heterogêneas, a SEST estabeleceu um esquema de financiamento que juntava todos os tipos de financiamentos em uma única denominação, de modo a não deixar explícitas as especificidades financeiras de cada empresa. Ao serem tidos todos como iguais, desconsiderava-se que os financiamentos poderiam se dar de diferentes formas: i) receita operacional; ii) outros recursos próprios; iii) crédito; iv) recursos do Tesouro e; v) outros recursos. Essa metodologia levava a conclusões equivocadas sobre a suposta dependência dessas empresas em relação ao Estado, além de superdimensionar a participação das mesmas na economia. Essa forma de enquadramento satisfazia os apelos que recrudesceram na segunda metade da década de 1970 em defesa das privatizações. De acordo com Prado (1985, p. 166PRADO, S. R. R. Descentralização do aparelho de Estado e empresas estatais: um estudo sobre o setor público descentralizado brasileiro. Dissertação (Mestrado)–IE/Unicamp, Campinas, 1985. v.1; v. 2., grifos do autor),

Seguramente, boa parte das análises mais apressadas e superficiais se contenta com os dados a este nível de agregação, para dar suporte às críticas quanto ao gigantismo e ao parasitismo das “empresas” estatais. No entanto, tal ordem de conclusões só seria sustentável caso esta estrutura agregada de financiamento se referisse a um universo homogêneo de empresas, isto é, entidades que formassem preços para seus produtos, e caso tivessem esses preços uma relação microeconômica específica com os custos de produção. Na realidade, o universo em questão é uma disparatada coleção dos mais diversos tipos de organismos estatais, envolve padrões de financiamento os mais diversos e, principalmente, refere-se à execução de muitas atividades que nada têm de empresariais ou produtivas.

A secretaria não diferenciava recursos operacionais, ou seja, aqueles gerados pela própria empresa, e recursos fiscais, que eram externos às empresas, como, por exemplo, recursos do Tesouro Nacional. Além disso, não havia a separação, por parte da SEST, dessas empresas e das outras que eram deficitárias e dependentes por sua própria natureza, mas estratégicas para o suposto desenvolvimento do país.

As distorções causadas pela SEST no sentido de colocar em um mesmo grupo empresas tão diferentes, de não fazer distinção entre recursos operacionais e fiscais ou entre despesas correntes e despesas com capital, e de analisar simplesmente o lado dos dispêndios globais, tinha como meta fazer o ajuste das estatais de maneira indiscriminada45 45 “O dispêndio global de uma agência governamental descentralizada, que geralmente tem uma receita própria desprezível, representa apenas um gasto indireto de recursos advindos do Tesouro e tem um impacto fiscal semelhante a qualquer outra forma de dispêndio público realizado pela União. E como tal é natural que seja objeto de controle. Já o dispêndio global de uma empresa estatal, capaz de financiar o seu próprio custeio com receita própria, frequentemente não tem qualquer impacto fiscal. Quando o tem, ele se mede pelo montante de recursos do Tesouro transferido a esta empresa. Do ponto de vista exclusivamente fiscal, o que importa, no que tange às empresas estatais, é o volume de recursos do Tesouro que direta e indiretamente a elas se transfere e não os seus gastos globais” (Werneck, 1986a, p. 387). .

Para construir um parâmetro mais adequado para o enquadramento das empresas estatais e um estudo mais acurado sobre as necessidades de seu financiamento em relação às suas receitas operacionais, Prado (1985, p. 214PRADO, S. R. R. Descentralização do aparelho de Estado e empresas estatais: um estudo sobre o setor público descentralizado brasileiro. Dissertação (Mestrado)–IE/Unicamp, Campinas, 1985. v.1; v. 2., grifos do autor) caracterizou como empresas estatais aquelas nas quais ocorria “um padrão apoiado na formação do preço como elemento principal do financiamento, deslocando-se os fluxos fiscais abertos para uma posição complementar e crescentemente esporádica e assistemática”. A partir desta metodologia, concluiu o autor que a capacidade de autofinanciamento dessas empresas era bastante elevada e, portanto, não se caracterizavam enquanto empresas deficitárias como sinalizava a metodologia adotada pela SEST.

Contudo, no primeiro Relatório da SEST, ficava explícito qual era o verdadeiro objetivo da recém-criada secretaria:

  • – permitir às empresas a utilização de maior parcela relativa de recursos próprios no desenvolvimento de suas atividades, mediante política de preços e tarifas que melhor se ajustem às suas estruturas de custos, mas sem perder de vista as metas de contenção inflacionária estabelecidas para o exercício.

  • – evitar aumento da participação das empresas estatais na economia brasileira e, com isso, manter as condições necessárias para o fortalecimento do setor privado.

  • – estabelecer parâmetros, através da fixação antecipada de tetos e fluxos de gastos das empresas estatais, a fim de orientar o programa de trabalho do setor privado (Brasil, 1981, p. 74-75BRASIL. Secretaria de Planejamento (SEPLAN). Secretaria de Controle das Empresas Estatais (SEST). Empresas Estatais no Brasil e o controle da SEST; antecedentes e experiência de 1980. Brasília, 1981. 113p.).

As restrições impostas às empresas estatais foram tão grandes que elas não podiam aumentar de maneira autônoma seus investimentos mesmo que suas receitas com recursos próprios se elevassem. Isso porque os dispêndios globais estabelecidos pela secretaria eram considerados valores máximos de gastos e deveriam ser cumpridos. Caso houvesse necessidade de extrapolar esses valores, seria necessária uma autorização do presidente da República após a proposta ter o aval da SEPLAN.

Mesmo com a posterior divisão das empresas estatais em cinco grupos, a partir de 1983, o problema da agregação não foi resolvido. Werneck (1986a, p. 389)WERNECK, R. F. A questão do controle da necessidade de financiamento das empresas estatais e o orçamento de dispêndios globais da SEST. Revista Pesquisa e Planejamento Econômico, Rio de Janeiro, v. 16, n. 2, p. 381-412, ago. 1986a. chegou a destacar que “apesar da separação, todas estas entidades [continuaram] sendo inapropriadamente rotuladas de ‘empresas estatais’. E os orçamentos, embora os relatórios SEST [apresentassem] os dados separados, [continuaram] também sendo agregados”. As novas categorias, que compunham o universo das empresas estatais, passavam a ser:

  • a) Empresas do Setor Produtivo Estatal – são as empresas que produzem bens e serviços, quase sempre de forma monopolista ou oligopolista, em setores importantes, de insumos básicos, como a PETROBRÁS, CVRD, SIDERBRÁS, ELETROBRÁS e em setores de serviços, como na área de telecomunicações (TELEBRÁS), de transportes (RFFSA, PORTOBRÁS), entre outros. Normalmente essas empresas são regidas pela Lei n. 6.404/76.

  • b) Entidades Típicas de Governo – são as instituições regidas, em geral, pela Lei 4.320/64 (órgãos autônomos, autarquias e fundações e outros), que possuem objetivos típicos de atividade governamental (educação, saúde, fiscalização, normatização) e dependem basicamente de recursos do Tesouro.

  • c) Previdência Social – são as entidades que compõem o Sistema Nacional de Previdência e Assistência Social (SINPAS) cujas fontes básicas de recursos são as contribuições legais feitas por empregados e empregadores.

  • d) Bancos Oficiais Federais – são as instituições financeiras oficiais cuja atuação é regida pela Lei 4.595/64.

  • e) Empresas Estaduais – constituídas de concessionárias de energia elétrica por autorização do Governo Federal e dos dois metrôs, dado o grau de dependência de decisões na área federal no que diz respeito ao programa de investimento (Brasil, 1983, p. 10BRASIL. Secretaria de Planejamento (SEPLAN). Secretaria de Controle das Empresas Estatais (SEST). Relatório Anual da SEST em 1982. Brasília, 1983. 181p.).

Apesar de a equipe econômica do governo reconhecer que a divisão das empresas estatais estava errada, o equívoco metodológico persistiu tanto do ponto de vista do enquadramento das estatais, que continuou com grupos muito heterogêneos, quanto do ponto de vista do orçamento, que prosseguiu agregando as empresas sem considerar suas especificidades financeiras. Era esse equívoco que “justificava” os ajustes que a SEST passava a promover sobre o SPE.

3.1 Os ajustes sobre as empresas estatais e o início do neoliberalismo no Brasil

Os ajustes da SEST sobre as empresas estatais já no começo da década de 1980 foram representativos do início do neoliberalismo no Brasil, tendo antecipado as exigências do FMI com os acordos de 1983. Ideias ortodoxas nortearam o diagnóstico da secretaria, uma vez que se partia de uma leitura de que a crise pela qual o país passava se devia essencialmente a fatores endógenos, pela grande participação do Estado, por meio da forte atuação das empresas estatais na economia. Estas, aliás, na análise da SEST, teriam sido as responsáveis pelos desequilíbrios pelos quais a economia passava, basicamente resumidos em alta inflação e elevação do endividamento externo. Como complemento, a SEST ainda entendia que a expansão das empresas estatais havia comprometido o livre funcionamento das leis de mercado e prejudicado a atuação da iniciativa privada. Logo, a “solução” da secretaria seria a implantação do neoliberalismo, a partir da diminuição da presença do Estado na economia, de modo que isso supostamente resolvesse a crise do país.

Os Relatórios da SEST dos anos 1980 a 1985, que serão analisados a seguir, mostram esses ajustes sob várias formas, desde a redução do orçamento das empresas estatais no sentido de este praticamente bloquear novos investimentos produtivos, passando pelo controle de importação de equipamentos necessários ao seu desenvolvimento, a fim de que com isso o governo melhorasse a balança comercial do país, até o aumento do seu endividamento externo para que o governo pudesse usar esses recursos em dólar para diminuir o déficit no balanço de pagamentos.

Baseada em dados dos Relatórios, a tabela 1 traz a diminuição dos dispêndios globais do setor público, ou seja, explicita como o orçamento das empresas estatais sofreu forte redução e comprometeu os investimentos produtivos no país já a partir do início dos anos 1980.

Tabela 1
Dispêndios Globais SEST 1980 – 1985 (em Cr$ bilhões correntes)

Conforme a Tabela 1, apesar de os gastos entre 1980 e 1981 serem mantidos praticamente estáveis, após este período o corte tornou-se significativo. Em 1982, há uma primeira redução importante de gastos. Posteriormente, já considerando o ajuste voluntário com o FMI, a redução dos gastos foi de 31% em 1984 e, por fim, de 25% em 1985, do total dos investimentos de 198046 46 Deve-se também destacar que houve corte das importações das empresas estatais. Seguindo a política de ajustamento do SPE, a SEST também determinava uma diminuição das compras de bens importados, para ajudar nos saldos da balança comercial. As importações diminuíram consideravelmente no período. Caminharam pari passu os cortes das importações diretas (excluído o petróleo) e das importações totais (excluídos petróleo e trigo), tanto é que a relação entre eles praticamente se manteve a mesma. O recuo dessas importações foi mais intenso principalmente a partir de 1983, após o país assinar o acordo com o FMI. As importações diretas caíram, em 1985, para 62% do que eram em 1980 e as importações totais brasileiras recuaram para 56% no mesmo período. .

A tabela 2, que compara os dispêndios globais da SEST com o PIB, não deixa dúvidas sobre a diminuição das despesas com as empresas estatais na tentativa de a equipe econômica conter os déficits das contas públicas, na direção errada, uma vez que os cortes comprometiam ainda mais a possibilidade de a economia brasileira reagir diante da crise que se instalava no período.

Tabela 2
Dispêndios Globais SEST & PIB 1980 – 1985 (em Cr$ bilhões correntes)

Pelos dados da Tabela 2, observa-se uma trajetória de diminuição dos gastos com as empresas estatais em relação ao PIB. Passou-se de um patamar de gastos de 42,46% do PIB em 1980 para 41,47% em 1982, para 40,0% em 1983 e então para 37,93% do PIB em 1985. Como se nota, essa retração gradativa iniciou-se mesmo antes dos acordos com o FMI.

O aumento da entrada de recursos externos destinados ao SPE foi considerável até a moratória mexicana e refletiu em um maior endividamento das empresas estatais. Entre 1980 e 1982, portanto, antes da assinatura dos acordos com o FMI, mais que dobrou o volume de recursos externos no orçamento das empresas estatais. Após 1982 houve uma queda expressiva e em 1985 voltou a um patamar próximo ao de 1982, conforme a Tabela 3.

Tabela 3
Orçamento SEST – Recursos Externos (1980 – 1985 em US$ milhões)

Os dados da Tabela 3 explicitam que, mesmo com um discurso de contingenciamento dos dispêndios das empresas estatais, o endividamento externo por parte dessas empresas não foi controlado. Ao contrário, aumentou entre 1980 e 1982 quase 130%. E continuou em trajetória ascendente nos anos posteriores.

O governo utilizava esses recursos em moeda estrangeira para minimizar o déficit no balanço de pagamentos. Com elevado endividamento e taxas de juros mais altas no mercado internacional, o resultado não podia ser outro senão o aumento dos gastos financeiros das empresas estatais, como explicita a Tabela 4.

Tabela 4
SEST – Encargos Financeiros & Receita Operacional (1980 – 1985 em Cr$ bilhões)

Como mostra a Tabela 4, é importante notar que houve um salto do endividamento já a partir de 1981, quando os encargos chegaram a 11,20% da receita operacional. Em 1982, essa relação subiu para 15,67%. Após os acordos com o FMI, cresceu um pouco mais, para 17,39% e chegou a 23,33% em 1985.

As estatais sofreram um duplo processo de endividamento: tanto para assumir boa parte da dívida externa privada de terceiros quanto para si mesmas em busca de dólares a fim de ajudar as contas públicas. Nesse período, os encargos financeiros cresceram quase 300% em relação às receitas operacionais, sem contrapartida nos investimentos.

A Tabela 5 complementa este quadro ao mostrar o aumento dos encargos com a dívida externa de quatro setores estatais: elétrico, siderúrgico, petrolífero e de telecomunicações.

Tabela 5
Evolução e serviço da dívida externa das estatais (em US$ milhares)

De acordo com a Tabela 5, o setor elétrico teve uma elevação de seus encargos entre 1977 e 1983 na ordem de 350%. Entre 1983 e 1985, o aumento foi de 123%. O setor siderúrgico viu seus gastos com a dívida externa aumentarem entre 1977 e 1983 em 325% e entre 1983 e 1985 em 108%. O setor de petróleo, por sua vez, teve seus custos com a dívida externa exorbitados em mais de 380% em 1983 se comparado com os gastos em 1977 e, entre os anos de 1983 e 1985, contata-se uma diminuição de 11%; esse recuo se deveu ao grande crescimento de sua dívida externa no período anterior. Por fim, apenas o setor de telecomunicações teve uma diminuição de seus encargos com a dívida externa, que caíram em torno de 26% em 1983 em relação a 1977, e em 37% entre 1983 e 1985, situação que evidencia sua menor capacidade de angariar recursos externos.

Esses números revelam o quanto esses setores foram sacrificados para trazer recursos externos, sobretudo para o país pagar juros e amortizações da dívida externa. E também explicitam um ajuste robusto antes daquele feito após os acordos com o FMI em 1983.

Além da elevação do endividamento, que aumentava o passivo dessas empresas, elas também tiveram que lidar com outro problema relativo às suas receitas. Apesar do discurso do governo sobre “realismo tarifário”, as tarifas das empresas estatais não eram reajustadas de acordo com a inflação. Seus preços ficavam sempre abaixo desse nível, na tentativa de conter o avanço de preços da economia. Essa situação comprometeu a rentabilidade e a capacidade de promoverem o autofinanciamento. Tal cenário favorecia as empresas privadas, sobretudo as multinacionais, que adquiriam bens e serviços das empresas estatais com preços bastante defasados.

O descompasso entre o aumento dos preços do SPE e a inflação fica evidente na análise de cinco estatais: Petrobrás, Siderbrás, Telebrás, Eletrobrás e CVRD. A forte baixa real de seus preços caracterizou as melhorias que o setor privado obteria em sua relação comercial com as empresas estatais, além de confirmar os ajustes que essas empresas sofreram sob controle da SEST.

Entre os anos 1980 e 1983, a Petrobrás teve um aumento de seus preços abaixo da inflação. Essa diferença se acentua a partir de 1984, chegando em 1985 a uma situação na qual seus preços ficaram defasados em quase 60% em relação à inflação (Gráfico 1).

Gráfico 1
Evolução de Preços – Petrobrás (índice base: dez. de 1979 = 100)

O Sistema Siderbrás apresentou preços menores do que a inflação em todo o período considerado (1980-1985), de acordo com o Gráfico 2. Essa diferença foi aprofundada em 1983, quando seus preços ficaram defasados em mais de 35%, diminuindo em 1984 para 27% e em 1985, quando ficaram 22% abaixo da inflação.

Gráfico 2
Evolução de Preços - Sistema Siderbrás (índice base: dez. de 1978 = 100)

O Grupo Telebrás também teve seus preços aumentados em patamares inferiores aos da inflação entre 1980 e 1985, mas essa discrepância começou a ficar mais notória a partir de 1984, alcançando o pico em 1985, conforme Gráfico 3. Naquele ano, seus preços representavam apenas 47% do índice de inflação (IGP-DI).

Gráfico 3
Evolução de Preços – Grupo Telebrás (índice base: dez. de 1979 = 100)

O Grupo Eletrobrás teve o reajuste dos preços de seus bens e serviços em número sempre menor do que a inflação de 1980 a 1985, de acordo com o gráfico 4. A diferença entre reposição tarifária e inflação começou a ficar mais acentuada a partir de 1984, alcançando maior descompasso em 1985, quando seu preço ficou abaixo da inflação em 38%.

Gráfico 4
Evolução de Preços – Grupo Eletrobrás (índice base: dez. de 1979 = 100)

A CVRD também mostrou preços defasados em relação à inflação nos anos de 1980 a 1985, conforme o Gráfico 5, ficando mais evidente essa desigualdade em 1984, quando seus preços ficaram em torno de 40% abaixo da inflação.

Gráfico 5
Evolução de Preços - Grupo CVRD (índice base: dez. de 1979 = 100)

Como apontado, houve um comportamento similar dos preços dos bens e serviços fornecidos pelas empresas estatais analisadas, destacando-se o seu contingenciamento como resultado de uma política deliberada da SEST. No triênio 1980-1982, os reajustes dos preços das empresas estatais ficaram abaixo do índice de inflação (IGP-DI), e após os acordos com o FMI, a partir de 1983, essa discrepância ficou ainda maior, mostrando que a SEST já seguia uma política junto a essas empresas em consonância com as propostas do Fundo, mesmo antes do programa de ajustamento monitorado pelo FMI47 47 Para uma análise detalhada desse “Programa”, ver Sampaio Jr. (1988). .

Com a grande defasagem nos preços dessas empresas e o crescente endividamento, os encargos financeiros em relação à receita operacional elevaram-se significativamente, alcançando quase um quarto de toda a receita operacional em 1985. Como resultado, houve redução e cancelamento de investimentos.

Durante o início dos anos 1980, essa diminuição dos investimentos foi considerável, especialmente a partir do triênio 1983/1985, “situando-se em média, 40% abaixo dos níveis verificados em 1980” (Cruz, 1995, p. 137). Com a queda dos investimentos do SPE, houve um impacto imediato na Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), que comprometeu a capacidade de crescimento da economia (Tabela 6).

Tabela 6
Formação Bruta de Capital Fixo/PIB (1980 – 1985, em %)

Com uma retração tão expressiva da FBCF na economia brasileira, que já mostrava uma tendência de diminuição entre os anos 1980/1983, período em que decresceu de 23,5% para 19,9% do PIB; apresentou uma redução ainda maior entre os anos 1983 e 1985, alcançando neste último ano apenas 18% do Produto. Observa-se que a industrialização, mesmo que dependente, deixou de ser o foco da política econômica. Isto significou o abandono por completo da política econômica desenvolvimentista e a introdução do neoliberalismo no país a partir dos ajustes promovidos pela SEST.

Considerações finais

A crise estrutural do capital na transição dos anos 1960 para os anos 1970 estimulou as empresas multinacionais a caminharem cada vez mais no sentido da financeirização e a promover sua reestruturação produtiva mundial, com diversos desdobramentos sobre o Brasil. Internamente, as respostas às transformações do capitalismo global foram dadas pelos governos ditatoriais sob várias políticas, entre as mais relevantes, a elaboração do II PND, ancorado em um elevado endividamento externo, que não só conduziu o país ao circuito financeiro internacional, como resultou no fim dos anos 1970 e início dos anos 1980 na crise da dívida externa, dada a manutenção da captação externa mesmo nos momentos mais desfavoráveis da conjuntura internacional. Como forma de “resolver” o problema do endividamento externo e da alta inflação, entendido, em grande medida, como excesso de Estado na economia, iniciaram-se nos anos 1980 ajustes sobre o SPE por meio da SEST, que introduziria o neoliberalismo no país.

Após experimentarem um processo de endividamento significativo, por absorver parte da dívida externa privada nos anos 1970, as empresas estatais sofreram nos anos 1980, por meio da SEST, ajustes para que o governo “resolvesse” a crise que se instalou no país. Com praticamente o congelamento dos seus orçamentos para investimentos e reajustes tarifários abaixo da inflação, as empresas estatais foram sucateadas. Ao mesmo tempo que ampliavam o seu passivo, uma vez que eram obrigadas a capitanear no mercado externo recursos em moeda estrangeira, mesmo que a condições desfavoráveis, para auxiliar o governo no pagamento dos juros da dívida externa, também sofriam redução de suas receitas.

O fato é que as políticas da SEST direcionavam-se prioritariamente para o uso das estatais como meio de o governo conseguir os recursos necessários para pagar os juros e as amortizações da dívida externa. Esses ajustes de cunho ortodoxo resultaram, na verdade, no aumento da dívida pública; numa recessão interna que comprometia o crescimento da economia e a geração de empregos; numa diminuição da FBCF; e no fim de uma política econômica desenvolvimentista que preconizava uma industrialização, mesmo que dependente.

Neste processo, caracterizou-se a gênese do neoliberalismo no Brasil já no início da década de 1980. Dados os ajustes promovidos pela SEST no SPE, a introdução do neoliberalismo no Brasil não pode, portanto, ser considerada tardia em relação a outros países da América Latina.

  • *
    É baseado em parte da minha tese de doutorado defendida no Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (IE/Unicamp) e intitulada “Imperialismo e empresas estatais no capitalismo dependente brasileiro (1956-1998)”.
  • 1
    Sobre a crise ver: Mandel (1990)MANDEL, E. A crise do capital: os fatos e sua interpretação marxista. São Paulo: Ensaio; Campinas, SP: Editora da Universidade Estadual de Campinas, 1990.; Mészáros (2009)MÉSZÁROS, I. A crise estrutural do capital. São Paulo: Boitempo, 2009..
  • 2
    Ver: Hobsbawm (1995)HOBSBAWM. E. A era dos extremos: o breve século XX: 1914-1991. São Paulo: Companhia das Letras, 1995., especialmente p. 253-281.
  • 3
    De acordo com Gonçalves (1999, p. 33-34)GONÇALVES, R. Globalização e desnacionalização. São Paulo: Paz e Terra, 1999., “no caso dos Estados Unidos os dados mostram uma queda dramática da taxa média de lucro de 20% em 1947-69 para 12,4% em 1970-83”. Para entender a Lei da queda da taxa de lucro, recomenda-se Marx (1984, seção III)MARX, K. O capital: crítica da economia política. São Paulo: Abril Cultural, 1984. v. III, Livro Terceiro. (Os Economistas)..
  • 4
    A ruptura dos acordos de Bretton Woods a partir de 1971 resultou no fim do lastro dólar-ouro, permitindo assim que o dólar atuasse como moeda fiduciária e flexível, aumentando a liquidez internacional e fomentando a expansão de bancos e de empresas multinacionais, principalmente por meio do Euromercado. Já o primeiro choque do petróleo, em 1973, possibilitou aos Estados Unidos ampliarem a liquidez internacional com a reciclagem dos petrodólares e com isso aumentar o endividamento da periferia, que recorreu ao crédito externo em meio à abundância de oferta com taxas de juros baixas e flexíveis, dando força à exacerbação do capitalismo financeiro mundial.
  • 5
    Em 1979, o presidente do Banco Central dos Estados Unidos (FED), Paul Volcker, adotou uma política econômica de valorização do dólar por meio da elevação da taxa de juros, canalizando os recursos financeiros mundiais para seu mercado, com a aquisição de títulos da dívida pública. Essa política econômica resultou na crise da dívida externa dos países da América Latina e nas suas dificuldades em pagar os juros dessa dívida, uma vez que os Estados Unidos passavam a ser o “porto seguro” dos investimentos financeiros. A intenção era “garantir a drenagem, para o mercado financeiro americano, de parte elevada da liquidez mundial” (Chesnais, 1996, p. 260CHESNAIS, F. A mundialização do capital. São Paulo: Xamã, 1996.) para equacionar os elevados déficits do governo Ronald Reagan. As taxas de juros se elevaram para 12% e 8% em termos reais entre 1980 e 1984 (Chesnais, 1996CHESNAIS, F. A mundialização do capital. São Paulo: Xamã, 1996.; Furtado, 1982FURTADO, C. A nova dependência: dívida externa e monetarismo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982.). Além disso, de acordo com Tavares (1985, p. 6-7)TAVARES M. C. A retomada da hegemonia norte-americana. Revista de Economia Política, v. 5, n. 2, abr./jun. 1985., “a partir daí o movimento do crédito interbancário se orientou decisivamente para os EUA e o sistema bancário passou a ficar sob o controle do FED. E não apenas sob o controle da política monetária, que dita as regras do jogo, as flutuações da taxa de juros e de câmbio, mas também a serviço da política fiscal americana”.
  • 6
    Campos (2009, p. 10-11)CAMPOS, F. A. A arte da conquista: o capital internacional no desenvolvimento capitalista brasileiro (1951-1992). Tese (Doutorado)–Instituto de Economia. Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2009. entendeu esse período como uma fase de crise e transição, “em virtude de o capital estar se reestruturando em uma nova base produtiva e restaurando sua dimensão financeira (controlada e restringida desde a Crise de 1929), de modo a definir, na fase posterior, um tipo de acumulação assentado essencialmente na internacionalização financeira. [Esta] consolidou-se nos anos 80 e ingressou nos anos 90 mantendo seus traços essenciais até a atualidade. A dimensão financeira do capital estabelece então uma dinâmica crescente em relação à dimensão produtiva, em que as transformações iniciadas na fase anterior lhe possibilitam recentralizar o capital como um todo, impondo também uma mudança nas estratégias de acumulação das empresas multinacionais instaladas na periferia”.
  • 7
    Para Campos (2009, p. 10)CAMPOS, F. A. A arte da conquista: o capital internacional no desenvolvimento capitalista brasileiro (1951-1992). Tese (Doutorado)–Instituto de Economia. Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2009., “a fase de internacionalização produtiva iniciou-se no final da Segunda Guerra e seguiu até o início dos anos 60, quando o IDE, sobretudo de origem norte-americana, internacionalizou os mercados internos.”.
  • 8
    “Por acumulação financeira, entende-se a centralização em instituições especializadas de lucros industriais não reinvestidos e de rendas não consumidas, que têm por encargo valorizá-los sob a forma de aplicação em ativos financeiros – divisas, obrigações e ações – mantendo-os fora da produção de bens e serviços” (Chesnais, 2005, p. 37CHESNAIS, F. (Org.). A finança mundializada: raízes sociais e políticas, configuração, consequências. São Paulo: Boitempo, 2005.).
  • 9
    O excesso de liquidez internacional após a Segunda Guerra Mundial, expresso pelo poder do dólar enquanto moeda internacional levou à constituição dos Eurodólares e “quem se beneficiará particularmente dessa conjuntura de largueza financeira, abrindolhe perspectivas e oportunidades imensas, serão naturalmente, em primeiro lugar, os grandes trustes e monopólios norte-americanos, e logo em sequência, das demais potências capitalistas, em especial a Alemanha e o Japão [...]. E aqui entra em cena o caso brasileiro. O nosso país não ficaria à margem da tremenda ofensiva, pelo mundo afora, do capitalismo internacional mobilizado pelos grupos financeiros e monopólios, e que encontraria aqui larga e generosa acolhida graças à orientação política entre nós adotada. Os primeiros, à busca de aplicações para o excesso de liquidez proporcionado pelos Eurodólares e outras fontes abundantes de capitais na época disponíveis; os outros, os monopólios, como bons negociantes, à cata de quaisquer oportunidades de novos negócios, que relativamente abundavam, e, de imediato, muito bons, nas áreas do Terceiro Mundo, semivirgem ainda do progresso capitalista mais recente, onde quase tudo, no nível desse progresso, estava por fazer ou introduzir” (Prado Jr., 2006, p. 347-348PRADO JR., C. História econômica do Brasil. São Paulo: Brasiliense, 2006.). Entre outros autores que discorrem sobre a conexão entre filiais de empresas transnacionais e o Euromercado, recomenda-se: Wells (1973)WELLS, John. Euro-dólares, dívida externa e o milagre brasileiro. Estudos Cebrap, n. 6, out./dez. 1973.; Lima (1985)LIMA, M. L. L. M. P. O Euromercado e a expansão do capital financeiro internacional. Dissertação (Mestrado)–Instituto de Economia. Universidade Estadual de Campinas, 1985.; Baer (1986)BAER, M. A internacionalização financeira no Brasil. Petrópolis: Vozes, 1986.; Tavares e Assis (1986)TAVARES M. C.; ASSIS, J. C. O grande salto para o caos: a economia política e a política econômica do regime autoritário. 2. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zaar,1986.; e Campos (2009)CAMPOS, F. A. A arte da conquista: o capital internacional no desenvolvimento capitalista brasileiro (1951-1992). Tese (Doutorado)–Instituto de Economia. Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2009..
  • 10
    Deve-se ressaltar, entretanto, que os investimentos financeiros se apropriam da riqueza produzida no setor produtivo. “A esfera financeira nutre-se da riqueza criada pelo investimento e mobilização de uma força de trabalho de múltiplas qualificações. Uma parte, hoje elevada, dessa riqueza é captada ou canalizada em proveito da esfera financeira, e transferida para esta” (Chesnais, 1996, p. 246CHESNAIS, F. A mundialização do capital. São Paulo: Xamã, 1996.).
  • 11
    “Em conformidade com as seções 806/807 da lei de tarifas dos Estados Unidos, estão isentas de impostos as partes dos produtos que reingressarem nesse país, limitando-se a incidência tributária ao valor adicionado no estrangeiro, ou seja, essencialmente aos custos salariais. Graças a essas facilidades, o valor das importações chamadas ‘806/807’ subiu entre o final dos anos 60 e o dos anos 80 de menos de 1 bilhão para 40 bilhões de dólares” (Furtado, 1992, p. 20FURTADO, C. Brasil: a construção interrompida. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.).
  • 12
    “As chamadas zonas de processamento de exportações, instaladas na Coréia do Sul, em Taiwan, nas Filipinas e em outros países do Sudeste asiático são um conjunto de facilidades destinadas a atrair empresas multinacionais” (Furtado, 1992, p. 20FURTADO, C. Brasil: a construção interrompida. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.).
  • 13
    “A extrema mobilidade do capital internacional comprometeu o controle das sociedades nacionais sobre as empresas transnacionais. Os aumentos nas escalas mínimas de produção fizeram com que os novos processos produtivos exigissem um espaço econômico de referência mais amplo, que tendia a ultrapassar os limites das fronteiras dos Estados nacionais. A integração do sistema financeiro internacional levou ao paroxismo a liberdade de movimento de capitais, generalizando, para as economias centrais, um problema que até então se restringia aos países subdesenvolvidos: a incapacidade de circunscrever o circuito de valorização do capital ao espaço econômico nacional” (Sampaio Jr., 1999, p. 18-19SAMPAIO JR., P. A. Entre a Nação e a barbárie: os dilemas do capitalismo dependente em Caio Prado, Florestan Fernandes e Celso Furtado. Petrópolis: Vozes, 1999.).
  • 14
    Ver Furtado (1977), capítulo II: O capitalismo pós-nacional.
  • 15
    De acordo com Furtado (2000, p. 7-8FURTADO, C. Introdução ao desenvolvimento: enfoque histórico-estrutural. 3. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2000., grifos do autor), “[...] existe alguma evidência de que por toda parte, no espaço e no tempo, a invenção cultural tende a ordenar-se em torno de dois eixos: a busca da eficácia na ação e a busca de propósito para a própria vida. É o que desde Max Weber se tem chamado de racionalidade formal ou instrumental e racionalidade substantiva ou dos fins. A invenção diretamente ligada à ação supõe a existência de objetivos previamente definidos. Ela nos dá a técnica. A invenção ligada aos desígnios últimos nos dá os valores, os quais podem ser morais, religiosos, estéticos etc.”
  • 16
    Com o Estado autoritário a burguesia conquistava “as condições mais vantajosas possíveis: 1°) para estabelecer uma associação mais íntima com o capitalismo financeiro internacional; 2°) para reprimir, pela violência, ou pela intimidação, qualquer ameaça operária ou popular de subversão da ordem (mesmo como uma ‘revolução democrático-burguesa’); 3°) para transformar o Estado em instrumento exclusivo do poder burguês, tanto no plano econômico quanto nos planos social e político” (Fernandes, 2005, p. 255FERNANDES, F. A revolução burguesa no Brasil: ensaio de interpretação sociológica; prefácio de José de Souza Martins. 5. ed. São Paulo: Globo, 2005., grifos do autor).
  • 17
    Ver Furtado (1982)FURTADO, C. A nova dependência: dívida externa e monetarismo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982..
  • 18
    A profunda crise dos anos 1980 levou Furtado (1992)FURTADO, C. Brasil: a construção interrompida. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992. a afirmar que naquele momento a construção do país havia sido interrompida.
  • 19
    Fernandes (1972FERNANDES, F. Sociedade de classes e subdesenvolvimento. 2. ed. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1972.; 1975FERNANDES, F. Capitalismo dependente e luta de classes na América Latina. 9. ed. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1975; 2005FERNANDES, F. A revolução burguesa no Brasil: ensaio de interpretação sociológica; prefácio de José de Souza Martins. 5. ed. São Paulo: Globo, 2005.) mostrou que o imperialismo sobre a América Latina colocava esses países como reféns dos objetivos do capital internacional e com a anuência das burguesias nativas comprometia-se o desenvolvimento capitalista autônomo nessas regiões e a construção de uma nação. Dessa forma, não foi o Estado o ator que planejou e definiu o investimento do capital estrangeiro canalizando-o para um tipo de industrialização que atendesse as necessidades da nação. Mas sim foi a maturação dos capitais das empresas multinacionais no pós-Segunda Guerra Mundial e a necessidade de investir nos países da América Latina que fizeram com que as burguesias nativas se reorganizassem, tomassem o Estado para si e levassem sua autocracia adiante para satisfazer as demandas do “imperialismo total”. No caso do Brasil, o golpe civil-militar bloqueou as Reformas de Base propostas no governo de João Goulart e promoveu mudanças no sentido de aprofundar a dupla articulação – dependência externa e desenvolvimento interno desigual. De acordo com Sampaio Jr. (1999, p. 118)SAMPAIO JR., P. A. Entre a Nação e a barbárie: os dilemas do capitalismo dependente em Caio Prado, Florestan Fernandes e Celso Furtado. Petrópolis: Vozes, 1999., a visão de Prado Jr. era a de que: “a participação dos grandes monopólios internacionais no processo de substituição de importações agravou a instabilidade das economias dependentes porque, ao recorrerem à periferia atraídos pelas oportunidades de negócios abertas pela expansão do mercado interno, eles inviabilizaram a consolidação de um ‘capital industrial’ de origem nativa capaz de liderar o processo de acumulação. Por mais paradoxal que isso possa parecer, apesar do expressivo desenvolvimento das forças produtivas, a subordinação do processo de industrialização à lógica do capital financeiro internacional agravou a vulnerabilidade externa da economia, uma vez que não há nada que assegure de antemão que os lucros acumulados internamente poderão ser sancionados no mercado internacional”. Para uma contribuição mais recente a esse respeito, ver: Campos (2009)CAMPOS, F. A. A arte da conquista: o capital internacional no desenvolvimento capitalista brasileiro (1951-1992). Tese (Doutorado)–Instituto de Economia. Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2009..
  • 20
  • 21
    “Ideia de que o endividamento externo teria a função de financiar o déficit na conta de mercadorias e de serviços produtivos que necessariamente acompanharia a trajetória de crescimento acelerado de uma economia atrasada” (Cruz, 1995, p. 123).
  • 22
    Deve-se destacar que as mudanças feitas pelo PAEG, no sentido de promover a articulação da economia brasileira com o sistema financeiro internacional, principalmente por meio da alteração da Lei 4.131 e da Resolução 63, foram fundamentais para o padrão de financiamento da economia brasileira que iria se configurar no II PND, por permitirem acesso fácil ao Euromercado. “Além das vantagens quanto a prazos e custos, os empréstimos em moeda nos moldes da Lei n. 4.131 mostraram-se especialmente atrativos às empresas de capital externo, de vez que passaram a representar um mecanismo de burla das restrições quanto à remessa de lucros originária de investimentos estrangeiros realizados no país” (Cruz, 1984, p. 110CRUZ, P. D. Dívida externa e política econômica: a experiência brasileira nos anos setenta. São Paulo: Brasiliense, 1984.). Já a Resolução 63 favorecia a obtenção de recursos externos por parte das empresas nacionais. Os bancos capitaneavam os empréstimos no mercado internacional e os repassavam às empresas brasileiras. Essas operações de repasse por meio da Resolução 63 “constituíram, por sua vez, o elo através do qual as instituições financeiras locais absorveram quantidades massivas de recursos originários do sistema financeiro dos países avançados no bojo do forte movimento de internacionalização financeira verificado no período” (Cruz, 1984, p. 168CRUZ, P. D. Dívida externa e política econômica: a experiência brasileira nos anos setenta. São Paulo: Brasiliense, 1984.).
  • 23
    A equipe econômica anunciaria inclusive medidas que repercutiriam diretamente no aumento da dívida externa, principalmente do setor público, como a Circular n 230 de agosto de 1974 (Disponível em: http://www.bcb.gov.br/pre/normativos/circ/1974/pdf/circ_0230_v10_l.pdf). “Passou a ser permitido que os recursos não utilizados nas operações financeiras de repasse fossem aplicados na forma de depósitos em moeda estrangeira junto ao BACEN, como alternativa à compra de LTN. Sobre tais depósitos o BACEN assumiria os juros devidos ao credor externo e, também, o ônus do imposto de renda quando de responsabilidade do depositante (Circular n. 230)” (Cruz, 1984, p. 41CRUZ, P. D. Dívida externa e política econômica: a experiência brasileira nos anos setenta. São Paulo: Brasiliense, 1984.).
  • 24
    “Após 1978, o processo de endividamento externo brasileiro assumiu uma dimensão eminentemente financeira” (Baer, 1986, p. 111BAER, M. A internacionalização financeira no Brasil. Petrópolis: Vozes, 1986.).
  • 25
    “O governo brasileiro transformou em prioridade absoluta o objetivo de gerar superávits comerciais sem precedentes na história econômica brasileira, acelerando o esforço iniciado em 1980-1981. Um dos resultados foi o imediato aprofundamento dos problemas financeiros do governo. Como o setor público responde pela maior parte da dívida externa e como o setor privado passou a responsabilizar-se pela produção de divisas necessárias ao pagamento dos juros devidos pelo setor público, o aumento do superávit comercial traduzia-se em forte pressão sobre as contas do Banco Central. A preocupação em manter algum controle sobre os agregados monetários e a impossibilidade prática de gerar superávits orçamentários comparáveis ao montante de recursos transferidos para o exterior levaram o governo a promover expansão acentuada do seu endividamento interno. Em consequência, produziu-se substancial elevação das taxas de juros, o que reforçou a pressão inflacionária, aumentou o déficit público e deprimiu o investimento privado” (Batista Jr., 1987, p. 21BATISTA JR., P. N. Formação de capital e transferência de recursos ao exterior. Revista de Economia Política, v. 7, n. 1, jan./mar. 1987.).
  • 26
    A partir da Resolução 432 do Conselho Monetário Nacional, segundo Tavares e Assis (1986, p. 70-71)TAVARES M. C.; ASSIS, J. C. O grande salto para o caos: a economia política e a política econômica do regime autoritário. 2. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zaar,1986., “qualquer devedor ao exterior poderia, a qualquer tempo, transferir ao Banco Central, em caráter temporário ou definitivo, o remanescente de sua dívida nas condições contratadas, desde que nele depositasse os cruzeiros correspondentes ao principal da obrigação na data. Foi o sinal para a estatização crescente da dívida privada, a um custo em dólares para o Banco Central equivalente ao spread arbitrado pelo credor e aceito pelo devedor originais – não raro, matriz externa e subsidiária interna de um mesmo banco, ou vice-versa”.
  • 27
    Cabe ressaltar que o ministro Delfim Netto promoveu duas maxidesvalorizações de 30%, uma em dezembro de 1979 e outra em fevereiro de 1983. No que se refere aos encargos da dívida externa, as desvalorizações cambiais impactavam diretamente nos seus dispêndios. Como o SPE detinha a maior parte dessa dívida, ele foi o setor mais penalizado com as desvalorizações, uma vez que elas aumentavam na mesma proporção “o custo em moeda local dos passivos denominados em moeda estrangeira” (Cavalcanti, 1988, p. 38CAVALCANTI, C. B. Transferência de recursos ao exterior e substituição de dívida externa por dívida interna. Rio de Janeiro: BNDES, 1988.).
  • 28
    Mello (1994)MELLO, M. F. Privatização e ajuste fiscal no Brasil. Rio de Janeiro: Departamento de Economia, PUC, abr. 1994. (Texto para Discussão, n. 317). argumentava que existia uma percepção bastante equivocada da parte do governo de que a privatização poderia reduzir o déficit público. Com o uso do conceito NFSP, o déficit realmente se reduziria quando o governo vendesse ativos, da mesma forma que aumentaria quando o governo investisse. Essa relação simplista, feita pelos defensores da privatização, no entanto, ignorava o fato de que a venda de uma empresa estatal resultaria, posteriormente, no fim da receita gerada por essa empresa, comprometendo ainda mais as contas públicas nos anos subsequentes.
  • 29
    Essa expansão nos governos militares se deu por meio do Decreto-Lei 200, de 25 de fevereiro de 1967 (Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del0200.htm). Para se ter uma ideia em 1979 o setor público representava 43,7% da formação bruta de capital fixo no país (Coutinho; Reichstul, 1998COUTINHO, L. G.; REICHSTUL, H. P. Investimento estatal 1974/80: ciclo e crise. In: BELLUZZO, L. G.; COUTINHO, R. (Org.). Desenvolvimento capitalista no Brasil. 4. ed. Campinas: Unicamp. IE, 1998. v. 2. (30 Anos de Economia – Unicamp, 10).).
  • 30
    “É interessante notar que, pela primeira vez, o investimento das empresas públicas, sob comando da SEST-SEPLAN, passa a ser utilizado como instrumento de política macroeconômica, muito embora vise apenas objetivos conjunturais: desaquecer a economia e controlar o fluxo de caixa governamental dentro das estreitas metas de expansão da base monetária” (Reichstul; Coutinho, 1998, p. 54COUTINHO, L. G.; REICHSTUL, H. P. Investimento estatal 1974/80: ciclo e crise. In: BELLUZZO, L. G.; COUTINHO, R. (Org.). Desenvolvimento capitalista no Brasil. 4. ed. Campinas: Unicamp. IE, 1998. v. 2. (30 Anos de Economia – Unicamp, 10)., grifos dos autores).
  • 31
  • 32
    Havia um discurso privatizante e a acusação de que as empresas estatais precisavam ter maior controle. Por conta disso, a criação da SEST foi comemorada. Kliass (1989, p. 112)KLIASS, P. O processo de criação da SEST: aspectos e momentos das empresas estatais no Brasil. Dissertação (Mestrado)–São Paulo: USP, 1989. ressaltou esse otimismo com as manchetes dos jornais da época: “‘Delfim passa a controlar também empresas estatais’ (FSP, 30 out. 1979). ‘Decreto dá a Delfim controle total da economia’ (JT, 30 out. 1979). ‘Um verdadeiro Ministério da Economia’ (OESP, 31 out. 1979). ‘Apoio ao controle das estatais’”.
  • 33
    Brasil (1981)BRASIL. Secretaria de Planejamento (SEPLAN). Secretaria de Controle das Empresas Estatais (SEST). Empresas Estatais no Brasil e o controle da SEST; antecedentes e experiência de 1980. Brasília, 1981. 113p..
  • 34
    Em entrevista à revista Exame, em 21 nov. 1979, Mortada expôs que “a principal razão para o governo criar esses controles foi o fato de termos concluído que a pretensão de gastos acima de suas possibilidades colocou as empresas estatais entre as principais causas da inflação no país, seja pelo seu déficit, seja por atacarem projetos de maturação longa, que começam a gerar renda muitos anos antes de criar produtos ou serviços” (Kliass, 1989, p. 126-127KLIASS, P. O processo de criação da SEST: aspectos e momentos das empresas estatais no Brasil. Dissertação (Mestrado)–São Paulo: USP, 1989.).
  • 35
    Apesar de ter criado durante o período do “milagre econômico” mais de uma centena de empresas estatais, “‘Delfim acusou as estatais de pretenderem realizar, a um só tempo, 50 grandes projetos, quando o normal seria tocar 5 e levá-los até o fim, e não iniciar todos e não concluir nenhum’. [...] Ele afirma, então, que ‘se deixarmos as estatais sozinhas, logo logo elas estarão planejando o Brasil’” (Kliass, 1989, p. 127-128KLIASS, P. O processo de criação da SEST: aspectos e momentos das empresas estatais no Brasil. Dissertação (Mestrado)–São Paulo: USP, 1989.).
  • 36
    “Mortada é bastante claro ao abordar esse tema. ‘Podem chiar, afirmou, mas nós temos todas as armas nas mãos. É aqui na SEPLAN que se decidem os preços praticados por essas empresas e o seu montante de recursos próprios. É aqui que se decidem os seus níveis de endividamento externo. Podemos também segurar as suas fontes de crédito” (Kliass, 1989, p. 131KLIASS, P. O processo de criação da SEST: aspectos e momentos das empresas estatais no Brasil. Dissertação (Mestrado)–São Paulo: USP, 1989.).
  • 37
    Esses orçamentos eram definidos de diferentes formas: a) Orçamento de Recursos e Dispêndios Globais – Orçamento SEST/Dispêndios Globais; b) Orçamento de Captação de Recursos Externos – Orçamento SEST/Recursos Externos; c) Fixação de Teto de Importação do Setor Público – Orçamento SEST/Importações e; d) Fixação de Limites de Aquisição de Combustíveis Derivados de Petróleo para Autoveículos – Orçamento SEST/Combustível.
  • 38
    Assinavam o Relatório o Ministro-Chefe da Secretaria de Planejamento da Presidência da República Antonio Delfim Netto, o Ministro da Fazenda Ernane Galvêas, os Ministros do Interior, da Indústria e Comércio, da Agricultura e do Trabalho.
  • 39
    “No Brasil, principalmente no século XX, o Governo foi forçado a assumir crescentes responsabilidades na economia, não em função de qualquer opção no sentido do dirigismo social, mas de circunstâncias diversas relacionadas com as flutuações do comércio internacional e com as ambições de rápida industrialização do país” (Brasil, 1981, p. 11BRASIL. Secretaria de Planejamento (SEPLAN). Secretaria de Controle das Empresas Estatais (SEST). Empresas Estatais no Brasil e o controle da SEST; antecedentes e experiência de 1980. Brasília, 1981. 113p.).
  • 40
    As cartas de intenções do FMI propunham, de um lado, aumentar a liberalização da economia, diminuir o protecionismo e subsídios, reduzir a presença do setor público, promover privatizações e eliminar distorções no câmbio; de outro lado, para conter a inflação, o aumento do salário dos trabalhadores deveria ocorrer abaixo da inflação, para eliminar o excesso de demanda, além de medidas econômicas recessivas para conter a expansão do mercado interno (Sampaio Jr., 1988SAMPAIO JR., P. A. Padrão de reciclagem da dívida externa e política econômica do Brasil em 1983 e 1984. Dissertação (Mestrado)–Instituto de Economia. Universidade Estadual de Campinas, 1988.).
  • 41
    Decreto 84.128, de 1979.
  • 42
    “Tratando de uma maneira homogênea entidades tão heterogêneas, e rotulando-as todas como empresas estatais, o orçamento Sest levou também a visões distorcidas sobre o significado da absorção de recursos do Tesouro por estas entidades. Há centenas de entidades incluídas neste orçamento que, sendo simplesmente agências governamentais que operam com relativa autonomia, têm nos recursos do Tesouro a fonte básica do financiamento de seus dispêndios. São hospitais, universidades, escolas técnicas, fundações de pesquisa, agências executoras de política regional ou setorial. Sendo basicamente unidades de dispêndio, não há por que classificá-las como empresas. Mas tendo sido assim classificadas, passou a ser mal compreendido o caráter natural das transferências de recursos do Tesouro a estas entidades” (Werneck, 1987, p. 22WERNECK, R. F. Empresas estatais e política macroeconômica. Rio de Janeiro: Campus, 1987.).
  • 43
    “É preciso colocar em seu devido lugar o problema do desequilíbrio financeiro das estatais. Aqui a confusão, frequentemente deliberada e de má fé, começa pela classificação equivocada. Estão qualificadas como empresas tanto as entidades prestadoras de serviços públicos quanto o setor produtivo estatal” (Mello; Belluzzo, 1983, p. 19MELLO, J. M. C.; BELLUZZO, L. G. Introdução. In: FÓRUM Gazeta Mercantil. Brasil X FMI: a armadilha da recessão. São Paulo: Gazeta Mercantil, 1983., grifos dos autores).
  • 44
    “Na tentativa de se consolidar as contas do setor público federal, tratou-se indiscriminadamente as receitas e as despesas, não importando a natureza da rubrica. Assim, a título de exemplo, um dispêndio no valor de x cruzeiros na folha de pessoal do Ministério da Justiça passou a ser tratado de forma idêntica a um dispêndio de igual montante na compra de carvão pela Companhia Siderúrgica Nacional. Implicando ambos, supostamente, no mesmo impacto sobre o orçamento consolidado do setor público” (Werneck, 1987, p. 18-19WERNECK, R. F. Empresas estatais e política macroeconômica. Rio de Janeiro: Campus, 1987.).
  • 45
    “O dispêndio global de uma agência governamental descentralizada, que geralmente tem uma receita própria desprezível, representa apenas um gasto indireto de recursos advindos do Tesouro e tem um impacto fiscal semelhante a qualquer outra forma de dispêndio público realizado pela União. E como tal é natural que seja objeto de controle. Já o dispêndio global de uma empresa estatal, capaz de financiar o seu próprio custeio com receita própria, frequentemente não tem qualquer impacto fiscal. Quando o tem, ele se mede pelo montante de recursos do Tesouro transferido a esta empresa. Do ponto de vista exclusivamente fiscal, o que importa, no que tange às empresas estatais, é o volume de recursos do Tesouro que direta e indiretamente a elas se transfere e não os seus gastos globais” (Werneck, 1986a, p. 387WERNECK, R. F. A questão do controle da necessidade de financiamento das empresas estatais e o orçamento de dispêndios globais da SEST. Revista Pesquisa e Planejamento Econômico, Rio de Janeiro, v. 16, n. 2, p. 381-412, ago. 1986a.).
  • 46
    Deve-se também destacar que houve corte das importações das empresas estatais. Seguindo a política de ajustamento do SPE, a SEST também determinava uma diminuição das compras de bens importados, para ajudar nos saldos da balança comercial. As importações diminuíram consideravelmente no período. Caminharam pari passu os cortes das importações diretas (excluído o petróleo) e das importações totais (excluídos petróleo e trigo), tanto é que a relação entre eles praticamente se manteve a mesma. O recuo dessas importações foi mais intenso principalmente a partir de 1983, após o país assinar o acordo com o FMI. As importações diretas caíram, em 1985, para 62% do que eram em 1980 e as importações totais brasileiras recuaram para 56% no mesmo período.
  • 47
    Para uma análise detalhada desse “Programa”, ver Sampaio Jr. (1988)SAMPAIO JR., P. A. Padrão de reciclagem da dívida externa e política econômica do Brasil em 1983 e 1984. Dissertação (Mestrado)–Instituto de Economia. Universidade Estadual de Campinas, 1988..
  • JEL O10, H23, H63, H83.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2022

Histórico

  • Recebido
    21 Fev 2019
  • Aceito
    23 Maio 2022
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