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Narrativas sobre a privação de liberdade e o desenvolvimento do self adolescente

Resumos

Apresenta-se uma revisão do percurso teórico dos conceitos de self e identidade em psicologia, situando a perspectiva teórico-metodológica sócio-histórico-cultural, com ênfase na versão narrativista-dialógica. Essa última é tomada como contribuição à interpretação de processos de desenvolvimento do self do adolescente no contexto específico da privação de liberdade, a que são submetidos adolescentes autores de infração. A perspectiva narrativista-dialógica concebe o self como uma unidade complexa, o sistema integrado da cultura e dos afetos pessoais construído por meio da interação social ocorrida em contextos socioinstitucionais concretos, tendo como principal meio de organização a linguagem humana. As situações desorganizadoras do senso de si, como é o caso dos eventos associados à delinqüência, ativam dispositivos subjetivos de reorganização do self, promovendo desenvolvimento. São apresentadas análises qualitativas de seqüências narrativas produzidas por adolescentes em privação de liberdade, em interação com o pesquisador em situação estruturada. O objetivo é estender a compreensão da formação da identidade narrativa de adolescentes a contextos específicos como os que envolvem violência e privação de liberdade. A análise das narrativas produzidas ao longo da seqüência de interação verbal selecionada, numa perspectiva microgenética, revela a dinâmica dos processos de elaboração pelos participantes de novas significações acerca de si, do contexto e dos processos sociais associados à medida de internação, apontando linhas de desenvolvimento do self.

Adolescência; Identidade; Self; Privação de liberdade


A review is presented of the theoretical trajectory of the concepts of self and identity in Psychology, situating the socio-cultural-historical theoretical-methodological perspective, with an emphasis on the narrativist-dialogical version. The latter is taken as a contribution to the interpretation of processes of development of the self in the adolescent within the specific context of the deprivation of freedom to which teenage offenders are submitted. The narrativist-dialogical perspective conceives the self as a complex unity, the integrated system of culture and personal affections constructed through the social interaction that takes place in concrete socio-institutional contexts, having the human language as its key means of organization. The situations that disorganize one's sense of self, like the events associated to delinquency, activate subjective mechanisms of reorganization of the self, which promote development. Qualitative analyses of the narrative sequences produced by teenagers deprived of their freedom are presented, obtained from interactions with the researcher in structured situations. The objective is to extend the understanding of the formation of the narrative identity of the teenagers to specific contexts such as those involving violence and deprivation of freedom. The analysis of the narratives produced along the selected sequence of verbal interaction, performed under a micro-genetic perspective, reveals the dynamics of the processes of creation of new significations by the participants about themselves, the context, and the social processes associated to the detention procedure, pointing towards new lines of development of the self.

Adolescence; Identity; Self; Deprivation of freedom


ARTIGOS

Narrativas sobre a privação de liberdade e o desenvolvimento do self adolescente

Maria Claudia Santos Lopes de OliveiraI; Alessandra Oliveira Machado VieiraII

IUniversidade de Brasília

IIUniversidade Federal de Goiás

Correspondência Correspondência: Maria Claudia S. L. de Oliveira SQSW 504, Bloco G - Apto. 512 70673-507 – Brasília – DF e-mail: claudia–unb.br

RESUMO

Apresenta-se uma revisão do percurso teórico dos conceitos de self e identidade em psicologia, situando a perspectiva teórico-metodológica sócio-histórico-cultural, com ênfase na versão narrativista-dialógica. Essa última é tomada como contribuição à interpretação de processos de desenvolvimento do self do adolescente no contexto específico da privação de liberdade, a que são submetidos adolescentes autores de infração. A perspectiva narrativista-dialógica concebe o self como uma unidade complexa, o sistema integrado da cultura e dos afetos pessoais construído por meio da interação social ocorrida em contextos socioinstitucionais concretos, tendo como principal meio de organização a linguagem humana. As situações desorganizadoras do senso de si, como é o caso dos eventos associados à delinqüência, ativam dispositivos subjetivos de reorganização do self, promovendo desenvolvimento. São apresentadas análises qualitativas de seqüências narrativas produzidas por adolescentes em privação de liberdade, em interação com o pesquisador em situação estruturada. O objetivo é estender a compreensão da formação da identidade narrativa de adolescentes a contextos específicos como os que envolvem violência e privação de liberdade. A análise das narrativas produzidas ao longo da seqüência de interação verbal selecionada, numa perspectiva microgenética, revela a dinâmica dos processos de elaboração pelos participantes de novas significações acerca de si, do contexto e dos processos sociais associados à medida de internação, apontando linhas de desenvolvimento do self.

Palavras-chave: Adolescência — Identidade — Self — Privação de liberdade.

Embora não haja consenso acerca das fronteiras temporais que caracterizam a contemporaneidade, há certo acordo de que o delineamento do panorama contemporâneo envolve o entrecruzamento de fatores tais como a transformação do espaço social para uma organização predominantemente urbana (Wigley, 1996); a emergência de novas configurações familiares transformando a organização da vida social e afetiva da família (Preto, 1994); a crise das instituições sociais que outrora desempenharam papel nuclear na transmissão de crenças e valores entre gerações; a presença hegemônica das mídias na ocupação do tempo de vida no trabalho, no lar e no lazer; a interpenetração cultural (Hall, 2003); a banalização da violência na vida cotidiana; e o imperativo do consumo (Castro, 1998; Campos; Souza, 2003).

Esses fatores não concorrem em igualdade de condições na formação do self adolescente e mantém entre si relação complexa. Campos e Souza (2003) destacam o fato de o consumo ter passado a mediar práticas e relações sociais, como efeito da hegemonia do modo de produção capitalista, cuja lógica tornou-se particularmente perversa na fase atual. Dessa forma, consideram o consumo o grande guarda-chuva sob o qual se alinham os demais aspectos da configuração da contemporaneidade. Em especial, no caso do self adolescente, vemos que este excede a condição de uma prática social e se apresenta como um dos elementos centrais na definição da auto-imagem e da identidade, caracterizada por autores como Mafesolli (2000) e Hall (2002; 2003) como identidade de consumo. Estudos como os sistematizados em Cardia (1999) dão indicativos de que, entre adolescentes autores de atos infracionais, a satisfação de necessidades básicas não figura entre os principais determinantes da criminalidade, perdendo importância para a aquisição de drogas e de bens de consumo, não-essenciais, do ponto de vista da lógica da necessidade, mas fundamentais do ponto de vista da lógica que domina a contemporaneidade.

Nossa visão é que esse conjunto de fatores redefine os sistemas semióticos e culturais, produzindo novas ordens de significação e engendrando práticas sociais. Promove entre os sujeitos a modelagem de certas imagens de si em detrimento de outras, que passam a definir condições específicas para seu desenvolvimento. Essas condições devem ser necessariamente investigadas, a fim de contribuir com o desenvolvimento epistemológico do paradigma do desenvolvimento humano em contexto e, dessa forma, aprimorar o conhecimento disponível sobre os processos e as condições do desenvolvimento humano no contexto contemporâneo urbano ocidental.

Formação do self narrativo e a adolescência

Bhabha (1990), interessado na categoria de identidade e considerando o contexto caótico e diaspórico do capitalismo mundial, parte de duas orientações presentes na tradição dos estudos sobre identidade:

[...] a tradição filosófica, como processo de auto-reflexão no espelho da natureza (humana); e a visão antropológica que situa na identidade a divisão entre Natureza/Cultura. (p. 95)

Considerando o tema da identidade uma parte preponderante da reflexão sobre o homem contemporâneo, defende que ele não possa ser pensado hoje com o foco apenas no sujeito. A abordagem da identidade deve remeter necessariamente à alteridade, ao outro, e aos processos de identificação, o que constitui uma terceira via de compreensão, divergente das anteriores.

O campo da Psicologia reproduz em diferentes modelos teóricos essas três tendências acima apontadas. Podemos sustentar que a noção de self, junto a outras tais como ego, personalidade e identidade e subjetividade, esteve presente desde muito tempo na teorização desse campo, embora restrita a certos modelos teóricos, nos quais era compreendida sob diferentes significados. Em geral, os sistemas que adotaram noções do tipo buscavam uma visão integradora dos processos psicológicos (Rey, 2004), diferenciando-se de modo agudo das visões correntes, marcadas por forte reducionismo. O autor identifica tendências reducionistas tanto nas perspectivas em que o fenômeno psicológico foi resumido aos comportamentos, apartados de suas condições materiais de produção; quanto naquelas em que foi igualado aos fenômenos mentais, internos, imateriais e inacessíveis.

A visão predominante em Psicologia nos estudos do self remete à primeira tradição identificada por Bhabha (1990). Nela, o self define-se como o senso de si, a tomada de consciência de que se é uma entidade independente e autônoma do outro (Goolishian; Anderson, 1996). O desenvolvimento do self coincide com o da consciência, caracterizando um processo de natureza cognitiva, o que é coerente com o enquadre racionalista do psiquismo. Esse enquadre e a concepção individualista e autocontida do self, que ele expõe, são objetos de crítica em Sinha (2005), Lopes de Oliveira (2003a; 2003b), Nelson (2000). As críticas ali apontadas destacam que o enquadre se esquiva da complexidade do fenômeno da formação do self, deixando fora da análise aspectos fundamentais como entre o papel desempenhado pelo próprio sujeito, que se reorganiza interna e externamente na relação com o outro e com a cultura (Rey, 2004), e o contexto cultural, o qual regula as condições sociais de desenvolvimento humano (Lerner; Castellino, 2002). Aspecto igualmente negligenciado é a importância das narrativas como instrumento de organização da experiência subjetiva e social, conseqüentemente, da vida mental (Bamberg, 2004a; 2004b; Chandler, 2000; Bruner, 1997). Do mesmo modo, ignora-se a natureza plural e polifônica da subjetividade, em lugar de um self individuado e autocontido (Lopes de Oliveira, 2003a; 2003b; Hermans 2001). Finalmente, pálido destaque é conferido à dimensão afetiva das relações, desconsiderando-se seu impacto sobre os processos intersubjetivos e intra-subjetivos, à proporção que os afetos são instrumentos importantes da coesão cultural. Ao regular os afetos, a cultura define a qualidade dos processos intersubjetivos, com reflexo sobre os aspectos subjetivos (Valsiner, 2005).

Apostamos numa visão crítica das perspectivas metafísicas acerca da subjetividade e do self (Lopes de Oliveira, 2003a) e aderimos à compreensão do self interdependente do outro, da interação social ocorrida em contextos socioinstitucionais concretos, tendo como principal meio de organização a linguagem humana.

Segundo Valsiner:

[...] o 'self' pode ser definido como o sistema integrado da cultura pessoal construída segundo as sugestões sociais que incidem sobre seu estilo idiossincrático. A cultura pessoal inclui a unidade de afeto e racionalidade. No self, toda idéia racional tem seu contexto afetivo e todo sentimento está intrinsecamente ligado a alguma forma de pensamento sobre a pessoa ou sobre o mundo. (1989, p. 366)

É possível caracterizar o self como a síntese particular entre o subjetivo e o social, o encontro singular entre os aspectos particulares do sujeito e das várias dimensões socioinstitucionais em que sua atividade se insere. Essa abordagem encontra seus fundamentos nas perspectivas de Vygotsky (2000; 2001; 2002) e Bakhtin (1988; 1997), embora contraditoriamente, no primeiro autor, a noção de self não se apresente de modo objetivo nem como categoria elaborada.

Segundo Sinha (2005), na obra Vygotsky assim como na de Mead, a noção de subjetividade não avança além do reconhecimento de sua condição de "uma conseqüência da intersubjetividade" (p. 201), destacando as bases sociais da formação da totalidade psicológica. Segundo ele, pistas mais esclarecedoras para a compreensão da visão de Vygotsky acerca do self são encontradas por vias indiretas, seja na abordagem holística do psiquismo humano que o teórico apresenta; na discussão de sentido e significado que desenvolve; na proposição da lei de dupla formação; assim como na ênfase que projeta sobre o papel da cultura no desenvolvimento humano. Excede o objetivo da presente discussão o aprofundamento de cada uma dessas linhas de reflexão, o que se pode acompanhar por meio das contribuições do próprio autor (Vygotsky, 2000; 2001; 2002), assim como de Van der Veer e Valsiner (1996), Vasconcellos e Valsiner (1995), Daniels (2002), entre outros.

Bakhtin (1997), por outro lado, dedica parte de sua elaboração conceitual à categoria self, reiterando sua realidade plural, representada em três categorias integradas: o eu-para-mim, o eu-para-os-outros e o outro-para-mim. Essas dimensões coexistem como faces da subjetividade e se expressam de modo polifônico, apoiadas nas noções de voz e de dialogia. A voz é a atividade na qual a mente se atualiza em enunciado, contra o pano de fundo de outras mentes e do ambiente social. As vozes carregam as marcas dos diferentes grupos sociais, nos quais os enunciados emergem e ganham significado. A dialogia, que marca não só as interações verbais como também o pensamento individual, implica sempre na existência de duas vozes, no mínimo (Bakhtin, 1981; 1997; Hermans, 2001).

É importante identificar a contribuição que tal perspectiva abre para a visão narrativa do self, ou seja, a compreensão de que este expressa uma estrutura aberta, inacabada, multifacetada e em desenvolvimento, organizando-se e transformando-se nas práticas narrativas ocorridas em situações sociais (Roth, 2003). As narrativas constituem o contexto microgenético em que os sujeitos se apresentam publicamente e constituem, contra o pano de fundo dado pelo contexto socioinstitucional em que se insere a interação, um senso de si sustentado intersubjetivamente (Koborov; Bamberg, 2004a; 2004b).

No contexto das interações discursivas, os sujeitos aprimoram estratégias retóricas que fornecem o suporte narrativo para a constituição de um senso de si, ao mesmo tempo imaginário (apoiado em imagens) e discursivo. Essas estratégias visam garantir que o outro interprete intersubjetivamente o sujeito de modo coerente com seu próprio projeto subjetivo (Bamberg, 2004a; 2004b): como o macho, a mulherzinha, o homem de bem, a líder comunitária, o caçula, a mulher fatal, o politizado, a executiva, o punk etc. A coerência autobiográfica, a saber, a noção de que se é a mesma pessoa apesar das profundas mudanças que ocorrem ao longo da vida, também é construída sobre a base das práticas narrativas. Chandler (2000) identifica a necessidade de preservação da coerência autobiográfica como uma das características humanas essenciais, independentes de contexto. Nelson (2000) analisa a forma como essa característica do self é desenvolvida já a partir dos primeiros anos da infância, quando a criança começa a forjar a experiência de si mesmo por meio da ação e da interação com os pais e os pares de idade. Declara ela nesse trabalho que suas pesquisas sobre a

[...] construção das memórias pessoais pela criança [...] indicam que as crianças aprendem sobre si e constroem suas próprias histórias por meio da experiência narrativa com o outro. Engajar-se na experiência narrativa é tomar uma perspectiva externalista sobre a experiência. (p. 191-192)

Com efeito, o senso de si constitui-se num jogo dialético entre permanência e mudança (Lerner; Castellino, 2002). Habermas (1991) postula que se manter coerente consigo é condição da própria existência do self. Chandler (2000) reitera a necessidade de os estudos do self incorporarem a dimensão do tempo, por oposição à visão de um self idêntico a si mesmo, ao acatar o paradoxo entre "mudança e permanência pessoal" (p. 210). Sua crítica se volta contra as perspectivas metafísicas acerca do self que dominaram o cenário psicológico e passa a investigar o que denominou práticas de sustentação de si, voltadas à busca de coerência narrativa do self na linha do tempo. As práticas de sustentação de si dão suporte ao sujeito no estabelecimento de uma imagem de si que permanece, protegendo-o do medo à desintegração, que se impõe em situação de crise ou de rápidas transformações, como na adolescência. Essas práticas carregam a marca do espaço-tempo histórico-cultural e contribuem, num dado contexto, para a constituição da identidade narrativa do sujeito. São exemplos tipicamente adolescentes de práticas desse tipo a idolatria, a identificação a estereótipos e ideologias.

É possível supor que em tempos como os atuais, em que a velocidade das transformações sociais torna-se vertiginosa, os sujeitos tenham ainda maior necessidade de dispositivos de sustentação de si que forneçam a ancoragem aos diferentes posicionamentos do self (I-positions, na perspectiva de Hermans, 2001), adotados segundo o sistema de atividade em foco.

Apoiado em Flanagan (1996), Chandler (2000) define que

[...] o problema da persistência pessoal torna-se o problema hermenêutico de encontrar ou criar uma cadeia de significados compartilhados que costure diacronicamente os vários episódios transcorridos ao longo da existência do sujeito, na forma de uma história coerente. (p. 215)

Roth (2003) analisou os inúmeros dispositivos imaginários e discursivos que são ativados para sustentar o projeto de manutenção da continuidade de si, enfrentando a contradição de estar eternamente assujeitado à mudança, à medida que cada um se expõe no jogo social à diferenciação de si e do outro. Segundo ele, a experiência humana caracteriza-se pela afecção pelo outro. Estar no mundo é ser afetado. A construção da identidade é a "experiência irredutível, o encontro aberto com o mundo social e material, mais denso que a mais densa descrição que se possa fazer dele, e do qual emerge a experiência biográfica de ser afetado" (Roth, 2003). Na mesma linha, Adams e Marshall (1996) salientam que

[...] o processo de formação da identidade é influenciado por processos de tipo dialético, que envolvem conflito, incompatibilidade, inconsistência e contradição, seguidos da síntese e/ou resolução. (p. 435)

Assim, as transações humanas são, por excelência, contextos da transformação de si na negociação de sentidos com o outro. Consideramos que fatores tais como as estratégias adotadas nessa negociação; os dispositivos utilizados para instituir o contexto de trocas; o papel dos contextos comunicativos, metacomunicativos e extralingüísticos; assim como o grau da dependência do outro como matriz semiótica, a partir da qual o próprio sujeito engendra seus sentidos pessoais, concorrem para que a configuração do self se modifique na linha do tempo, o que caracteriza o desenvolvimento.

Desenvolvimento do self em privação de liberdade

Enfocamos o contexto contemporâneo, com suas práticas socializatórias próprias, como contexto de desenvolvimento humano. Especial ênfase tem sido dada em nossa pesquisa aos contextos que aliam pobreza e violência, com ênfase no tema do desenvolvimento de adolescentes autores de ato infracional grave e em cumprimento de medida socioeducativa (MSE) de privação de liberdade (Lopes de Oliveira, 2004; 2003b; Lopes de Oliveira et al., 2004). Numa perspectiva que tem como aspecto central a mediação do contexto cultural no desenvolvimento do self, a compreensão da condição de privação de liberdade como contexto de desenvolvimento de adolescentes exige a análise da formação histórico-social da cultura do jurídico e da noção de adolescente infrator como parte desse sistema.

Estudos historiográficos – como os de Foucault (1979; 2000) e Castel (1978) – e empíricos – entre os quais Oliveira (2002) – apontam a base da formação do atual sistema jurídico como estando cravada nas práticas de gestão dos pobres e de todas as formas identitárias desviantes, ocorridas a partir do século XIV na Europa. Tais práticas sociais contribuíram para a criação de dispositivos voltados à segregação dos pobres do seio da sociedade, com o fim de promover ora seu ajustamento, ora a proteção da sociedade contra os que se recusavam a adaptar-se a uma sociedade em transformação, que passava, paulatinamente, a ser dominada pela racionalidade instrumental.

Segundo Kolker (2004), entre os séculos XIV e XVIII, foi sendo desenhado o modelo jurídico prisional. Esse sistema associa num mesmo dispositivo social a punição e a exclusão/reclusão. A princípio, loucos, mendigos, doentes e delinqüentes eram confinados nos mesmos espaços institucionais, indistintamente. No século XVIII, ocorre o "processo de especialização das instituições encarregadas do seqüestro das populações marginalizadas" (p. 163), levando ao aperfeiçoamento dos instrumentos de controle social.

Com a consolidação da moderna sociedade capitalista, deu-se uma mudança na lógica que presidia o sistema correcional. Este passou progressivamente da punição do delito para sua prevenção, conduzindo ao que Foucault (2000) denomina a sociedade disciplinar. A disciplina social opera por meio de dispositivos e técnicas que buscam tornar dóceis e servis as subjetividades. Eles são colocados em prática em todas as instituições sociais, de forma a atravessar o tecido social de ponta a ponta. São mecanismos sutis e indolores utilizados para transformar as pessoas em sujeitos produtivos e adaptados ao sistema social. É o caso da disciplina militar, do relógio de ponto na fábrica, das rotinas escolares, entre outras ainda mais imperceptíveis, tais como os dispositivos de inscrição de gênero (Gilligan, 1982), de identidade profissional entre os jovens e de conversão silenciosa de crianças em sujeitos de consumo (Campos; Souza, 2003).

Nesse novo modelo baseado na prevenção, a noção de delito ou infração, ou seja, o ato que produz dano contra o outro ou contra o patrimônio, foi convertida na de delinqüência, cujo sentido é o de violação do contrato social. Isso significa que qualquer transgressão passou a ser compreendida como um ataque à toda a sociedade. A delinqüência tem relação com desvio moral, irracionalidade e tendência a agir criminosamente e sua punição necessita considerar o "criminoso em sua natureza profunda, o grau presumível de sua maldade, a qualidade intrínseca de sua vontade" (Foucault, 2000, p. 90).

É possível notar nessas elaborações de Foucault o modo como o crime foi sendo deslocado paulatinamente do enquadre moral para o psicológico, da abordagem dos atos observáveis para a da dimensão interna, subjetiva do criminoso. É no contexto dessa transição que surge um importante conceito jurídico: o da periculosidade, que envolve o tratamento do ato delituoso não na sua materialidade (o que/como ocorreu?), mas como virtualidade (qual o risco social de que X, em risco social, venha a infringir a lei ou que o infrator Y venha a reincidir criminalmente?). A periculosidade é uma antecipação que materializa algo que não aconteceu. Essa noção justificou a criação pela criminologia de todo um aparato técnico de avaliação, com o fim de dimensionar o perigo social representado pelo criminoso.

Perspectivas como a de periculosidade, assim como em certa medida a de prevenção, adotam como princípio a concepção naturalista e determinista do self, na linha que vimos criticando. Supõe como regra que o autor de ato infracional é de má índole, imoral, não confiável. Reforça a associação entre criminalidade e pobreza delineada desde os primórdios da constituição do jurídico, inscrevendo no próprio sujeito a responsabilidade por seus atos violentos. Dessa forma, deixa-se de admitir a co-responsabilidade social na produção e banalização da violência.

É importante notar que a visão da delinqüência como decorrendo de uma tendência intrínseca do sujeito à criminalidade marca até os dias de hoje as práticas penais, resultando em penas equivocadas e em baixas expectativas dos atores institucionais quanto ao potencial de mudança subjetiva daqueles que são objeto das medidas correcionais (Silva, 2003).

As novas narrativas sobre direitos humanos que se multiplicaram ao longo do século XX e a proliferação de evidências científicas contrárias à naturalização da subjetividade e do crime não bastaram para alterar o cenário. Tampouco os acordos internacionais estabelecidos para a eliminação de práticas eugênicas, da tortura e dos tratamentos desumanos alteraram o caráter das medidas socioeducativas voltadas à sanção de atos infracionais, que continuam norteadas pelo trinômio punição-repressão-disciplina, instituído como parte das práticas jurídicas há séculos. Esse quadro não foi afetado sequer pelo Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA – (Lei nº. 8069/1990), dispositivo que visa a garantia de proteção dos direitos de crianças e adolescentes.

O ECA representa a prática de ato infracional como situação de conflito com a lei, condicionada por aspectos diversos tais como os desenvolvimentais do infrator e socioculturais e contextuais. Esse quadro deve ser mudado por um processo socioeducativo, que permita ao adolescente compreender e situar-se diante do fenômeno, promovendo novas opções de vida (Volpi, 2000; 2001). A idéia era produzir mudanças significativas no atendimento e nas representações sociais de crianças e adolescentes. Segundo Leite (apud Cury; Amaral; Mendez, 2000, p. 282), "as entidades responsáveis por esse atendimento tinham como pressuposto básico 'reformar' o indivíduo, modelando-o para se tornar um cidadão exemplar", por meio da repressão e da violência, não havendo a preocupação com a escolarização e a profissionalização daqueles em cumprimento de MSE. Tais medidas são aplicadas de acordo com a natureza do ato infracional, as condições socio-familiares e os programas e serviços estaduais, municipais ou regionais existentes.

Segundo o Art. 112 do ECA, verificada a prática de ato infracional, sendo este descrito no Art. 103 como crime ou contravenção penal, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente medidas socioeducativas que se dividem em dois grupos: as não privativas de liberdade (advertência; obrigação de reparar o dano; prestação de serviços à comunidade; e liberdade assistida) e as privativas de liberdade (inserção em regime de semiliberdade e internação em estabelecimento educacional).

A internação deve ser o último recurso utilizado em relação a adolescentes autores de atos infracionais graves, devendo ainda assim ser reavaliada periodicamente. Constitui medida privativa da liberdade de ir e vir, mas não exime o adolescente de seus direitos constitucionais, como a educação e a qualificação profissional, não devendo exceder o período máximo de três anos ou os vinte e um anos completos.

A trajetória de vida do jovem infrator internado em instituições de privação de liberdade é marcada por experiências de dor, sofrimentos, humilhações, maus-tratos, rebeliões, fugas e corrupção. Marcílio (2001) resume a história dessa medida, narrando que a idéia de isolar os jovens delinqüentes em instituições totais, com o fim de recuperá-los e devolvê-los à sociedade, surgiu aqui no fim do período imperial, repetindo uma tendência comum em países da Europa ocidental e nos Estados Unidos. No período republicano, o crescimento das cidades levou à multiplicação desse tipo de instituição. Os reformatórios, como eram chamados, aglutinavam a função de correção e de higiene social. Isolavam os "desviantes da ordem" para "prevenir a contaminação" e ensinavam-nos a necessidade de comportamentos e disciplinas. Punições corporais eram adotadas como um dos meios para obter obediência, disciplina e ordem, impondo-se ainda aos internos pesadas rotinas diárias, que começavam já no raiar do dia.

Tendo em conta as reflexões propostas, como conceber os contextos de privação de liberdade como contextos de desenvolvimento, considerando-se a possibilidade de o sujeito viver ali grande parte de seu adolescer? O que o foco microgenético sobre esse contexto nos revela?

É legítimo supor que o self adolescente formado em privação de liberdade constitui-se por meio de relações produzidas na interface entre os sistemas semióticos formais e não formais da instituição de internação. Entre os primeiros estão suas normas de funcionamento, hierarquias, dispositivos de avaliação técnica empregados. Entre os sistemas semióticos não formais, embora atuando de modo tão ativo quanto os primeiros, estão as crenças e os valores sobre a criminalidade ali disseminadas, os mecanismos sutis de disciplina, a cultura organizacional e os aspectos da cultura juvenil dos internos. Marca também o desenvolvimento humano em tal contexto o entrecruzamento das várias temporalidades institucionais (o tempo de internação, o tempo da adolescência, o tempo das rotinas diárias, o "tempo que não passa" etc.).

A interação entre esses vários aspectos concorre para a regulação das condições de enunciação e de expressão de si entre os adolescentes, definindo limites ao desenvolvimento do self narrativo, com impacto sobre os desdobramentos subjetivos da medida. Compreender a especificidade desses processos a partir da narrativa dos adolescentes, buscando fazer da pesquisa um contexto de promoção e reconfiguração do self, e propiciar a reflexão dos atores institucionais sobre os efeitos subjetivos das formas de sanção adotadas são aspectos norteadores do trabalho.

Método

A adoção da perspectiva narrativista e dialógica envolve o compromisso com o projeto no qual as narrativas investigadas e sua interpretação possam fornecer pistas confiáveis sobre o processo de formação do self daqueles que se encontram na posição de sujeitos da enunciação. A análise de narrativa que implementamos em nosso trabalho é coerente com a pesquisa qualitativa, agregando elementos da psicologia discursiva (Potter, 2003; Linnel, 1998), da análise de conversação e da etnometodologia (Coulon, 1993; Heritage, s/d), numa aproximação à análise microgenética. As perspectivas em foco abordam as narrativas como parte de práticas sociais, tendo como princípios comuns: (1) o foco sobre a interação, ou seja, sobre significados produzidos no encontro dos interlocutores e, ao mesmo tempo, sobre cada segmento enunciativo particular. Admite-se que o pesquisador é um mediador privilegiado na ressignificação do self dos entrevistados e que o setting de pesquisa promove reconfigurações no contexto interativo e nas relações institucionais, engendrando a experiência de alteridade entre os participantes e promovendo condições para o desenvolvimento global (Kraus, 2000); e (2) a visão de que as práticas discursivas são orientadas à ação, organizadas retoricamente e expressam a inscrição institucional dos contextos em que se produzem. Toda enunciação produz efeitos sobre quem fala, quem escuta e sobre o próprio contexto interacional, traduzindo simultaneamente quem fala e aquilo sobre o que se fala, por meio de dispositivos discursivos e metacomunicativos específicos (Lopes de Oliveira, 2002).

Na pesquisa em andamento, os registros são objetos de nossa análise narrativas produzidas na interação pesquisador-adolescentes, bem como de adolescentes em grupos de pares. São registros obtidos em sessões de observação direta e videogravação das rotinas institucionais em centros de internação de adolescentes infratores. Ênfase tem sido dada a relatos produzidos em, basicamente, três condições: (a) entrevistas semi-estruturadas; (b) interações em situação de intervenção psicopedagógica; e (c) interações espontâneas no contexto institucional. Cada um desses sistemas de elaboração de informação apresenta condições e possibilidades próprias de produção de narrativas, dando pistas para a compreensão dos processos identitários em jogo.

Participam do estudo adolescentes de 14 a 21 anos, de ambos os sexos e predomínio do sexo masculino, internos em duas instituições de privação de liberdade do centro-oeste brasileiro, em decorrência de práticas infracionais graves associadas ao envolvimento pelo uso e/ou tráfico de drogas.

Resultados e discussão

A seqüência dialógica aqui destacada deu-se entre um dos participantes e a pesquisadora, durante intervenção psicopedagógica. Na ocasião, o grupo investigado vinha elaborando um jornal, com o uso de ferramentas de informática educativa. Jorge1 1 Nome fictício de adolescente de 18 anos que, na ocasião da construção das informações da pesquisa, estava havia cinco meses em cumprimento de medida socioeducativa de internação em função de participação em roubo. , no texto que produz enquanto dialoga com a pesquisadora, aborda a relação entre família, polícia, drogas e delinqüência, no processo de sua própria formação subjetiva. As questões intencionalmente apresentadas pela pesquisadora servem de contexto para ele iniciar um processo de reflexão sobre sua história de vida anterior à medida de restrição de liberdade.

Apresentamos a seqüência em duas partes, expressando momentos do processo de ressignificação de si, dos atos delinqüentes e dos outros sociais. Verifica-se que no desenvolvimento da interação, o adolescente vai assumindo uma posição subjetiva cada vez mais central em sua narrativa. Para fins de análise, apontamos esse movimento em relação às figuras familiares e, em seguida, em relação a outras figuras mais intimamente relacionadas à criminalidade (corrupção, traficantes, polícia, parceiros de infração):

(T1) Pesquisadora: "E aí, vai sugerir uma solução no seu texto?"

(T2) Jorge: "Vou deixar disso, é muito difícil. Tudo é corrupção, né cara".

(T3) Pesquisadora: "Mas assim, como você acha que isso pode ser mudado? É difícil, mas como poderia?"

(T4) Jorge: "Acho assim, a população está bem conscientizada disso, pelo menos uma grande parte, mas não adianta porque a população não tem força contra traficantes, que são mais fortes. Então..." [não conclui]

(T5) Pesquisadora: "Essa questão de 'conscientização': as pessoas falam tanto nisso, como vê isso?"

(T6) Jorge: "Eu tenho comigo assim, tem que vir da educação que o pai tem que ter para com seus filhos, à medida que eles forem crescendo e tal. Explicar, conscientizar seus filhos sobre o que é bom e ruim, o que é a droga, onde leva, para o cara escolher o caminho certo. Apesar de que muitos têm esse conceito, mas não seguem, assim, ... como eu..."

(T7) Pesquisadora: "Seu pai te deu essa educação?"

(T8) Jorge: "Nossa, demais da conta. Se educação resolvesse... queria ter dinheiro, tudo do bom e do melhor e por isso fui roubar. Quantas vezes eu cheguei com CD e toca fita em casa e meu pai dizia 'vai apanhar, menino' e ainda saía atrás do dono para devolver."

(T9) Pesquisadora: "Nossa, ele deve ter ficado grilado demais, né?"

(T10) Jorge: "Puxa, demais. Me arrependo até hoje".

As perguntas apresentadas pela pesquisadora no início da seqüência interativa (T1 e T3) convidam o adolescente à reflexão sobre processos de mudança, em geral. Ao responder, Jorge fala 'do outro', uma alteridade genérica e pouco definida: "tudo é corrupção", "a população está bem conscientizada"; "o pai para com seus filhos". Ele remete a temas nos quais se encontra profundamente implicado, mas na terceira pessoa, como se não envolvesse aspectos de sua própria história. Isso é obtido com o auxílio de dispositivos enunciativos que o mantêm à margem dos processos significativos engendrados no texto. Em (T6), finalmente, Jorge parece migrar para o centro da narrativa: "muitos têm esse conceito, mas não seguem, assim, ... como eu..." . As longas pausas entre palavras e o tom emocional que perpassa sua fala a partir desse turno sugerem o momento da tomada de consciência e de identificação com a posição de autor e protagonista da história narrada.

Ao acatar o tema da 'conscientização' (T6), pinçado de seu texto pela pesquisadora, Jorge remete à experiência carregada de emoção que foi sua trajetória delituosa e os conflitos enfrentados nas relações familiares em função dela: "quantas vezes eu cheguei com CD e toca fita em casa e meu pai..." A maneira emocionada como recorda e relata oferece um indício de que os eventos em foco foram nucleares na formação de sua auto-imagem atual, o que é enfatizado no uso reiterado das interjeições tais como "Nossa"; "Puxa" (T8, T9 e T10), bem como na culpa e no arrependimento trazidos à cena em meio à tomada de consciência do erro. Para Rey (2003), essa tomada de consciência é um momento essencial na redefinição da subjetividade, pois revela a intencionalidade e a qualidade da vivência na relação do sujeito com seu complexo mundo psicológico. Ao debruçar-se narrativamente sobre sua história, Jorge toma posição sobre fatos que expressam sua dupla condição de sujeito ativo e determinado pelo espaço-tempo em que se insere sua ação: "... queria ter dinheiro, tudo do bom e do melhor e por isso fui roubar"; ao mesmo tempo produto de uma sociedade do consumo que impõe o querer-se "tudo do bom e do melhor" e autor de uma trajetória pessoal em que o consumo é mediado pela prática de delitos.

Essa tomada de posição, entretanto, não é linear. No processo de construção de significações, a narrativa de Jorge é atravessada por sentidos e afetos contraditórios, tanto uns como outros extraídos da matriz sociohistórica. Exemplos dessa contradição são: "a população está bem conscientizada disso" / "mas não adianta porque a população não tem força contra traficantes"; em (T2) e (T4): "[a conscientização] tem que vir da educação" / "Se educação resolvesse..."; e em (T2): "muitos têm esse conceito" / "mas não seguem". Rossetti-Ferreira (2004) reitera a importância da contradição e da reflexão para o desenvolvimento, à medida que favorecem a construção de novos sentidos. Na parte final da seqüência, Jorge apresenta uma síntese narrativa dos processos subjetivos engendrados pela situação interativa: "Me arrependo até hoje". Esse último enunciado parece estabelecer um elo entre o sentido subjetivo e o significado atribuído pela família aos delitos por ele cometidos, à medida que o tema da narrativa vai migrando da educação da população para a educação familiar e daí para a relação de Jorge com seu próprio pai. Isso é percebido pela pesquisadora, que assim dá continuidade ao diálogo:

(T11) Pesquisadora: "E se fosse seu filho, como você faria para educá-lo?"

(T12) Jorge: "Com a experiência que estou tendo, não bateria nele. Não é que achei errado meu pai me bater, cada um tem seu tipo de educação. Às vezes ele achou que isso resolveria, mas não resolveu, com outra pessoa pode resolver, mas comigo não. A primeira vez ele falou 'Você quer roubar, moleque? Então vai'. Aí ele me levou no DPJ. Eu acho isso importante, o pai querer mostrar para o filho onde realmente leva o mundo do crime, pedir autorização e sair com o filho mostrando, passeando, conhecendo o CIP, o CIA, a CPP2 2 Siglas que se referem a diferentes instituições jurídicas e correcionais da região. . Eu mesmo o levaria, deixaria lá um tempo e se visse que continuou aprontando e não mudou, eu ia no juiz antes dele aprontar de novo. Uma hora aprende."

(T13) Pesquisadora: "Você mesmo faria isso com seu filho?"

(T14) Jorge: "Faria"

(T15) Pesquisadora: "Seu pai faria isso?"

(T16) Jorge: "Depois que saí da provisória, continuei andando com um elemento aí que meu pai não queria. Eu estava na porta de casa, mexendo num som de carro e tal, ele ligou para a polícia porque viu a gente montando um som e falou 'Olha, meu filho está mexendo com furto de carro, desmanchando carro'. Cheguei em casa e encontrei minha mãe chorando. Aí ela disse 'Seu pai chamou a polícia'. Eu perguntei 'Por quê?'. Ela disse 'Ele viu que você continua roubando carro'. Fui tomar meu banho. Não dei nem moral. Aí ia sair com uns amigos quando bateram na porta, quase arrebentaram o portão e eu fui atender. Os caras perguntaram quem era o Jorge e falei 'Sou eu'. Eles já me algemaram, perguntaram onde estava o carro e foram me batendo. Eu disse que não tinha carro nenhum. Meu pai sentiu, viu que não era bem o que ele esperava. O que ele queria era que fosse alguém lá para conversar comigo. Ele viu que o negócio era na taca. Ele falou para os policiais que não era bem assim, que eu só estava começando a me envolver de novo com os meninos. O policial pagou o maior sapo pra ele 'Isso aqui não é brincadeira não. Isso é operação de choque, não serve para ficar educando seus filhos não'. Meu pai disse 'Eu não sei mais o que faço com esse menino'. Aí os policiais falaram pra mim 'É, seu moleque, seu pai já de idade aí, não toma vergonha?' Eles batiam e meu pai dizia 'Não bate não'. Os policiais diziam 'O senhor chamou, agora agüenta'."

(T17) Pesquisadora: "Você apanhou muito?"

(T18) Jorge: "Nossa senhora. Os vizinhos eram tudo ladrões de carro, viram três Blaisers da ROTAM3 3 ROTAM – Ronda Ostensiva Tático Metropolitana – companhia da Polícia Militar que atende às ocorrências de grande vulto e casos de grande periculosidade. parada na porta de casa, ficaram loucos. Meu pai passou mal e nós ficamos uma semana sem conversar, eu e ele."

(T19) Pesquisadora: "E como ficou seu sentimento em relação ao seu pai?"

(T20) Jorge: "Não senti raiva. Na mesma hora não sei se senti pena, dó, ou ... amor também. Cara, ele é meu velho e não estava sabendo o que fazer mais, o cara já não tinha mais consciência do que estava fazendo, estava ficando já louco comigo. Meu pai já está ficando velho, de cabelo branco. Mas é aquele negócio, os amigos né."

O encaminhamento dado pela pesquisadora à conversação, por meio de perguntas apresentadas em (T11): "E se fosse seu filho?"; em (T13): "Você mesmo faria isso com seu filho?"; e em (T15): "Seu pai faria isso?", engendra um exercício de reversibilidade no qual Jorge alterna-se nas posições de filho e de pai, o que propicia um contexto para a avaliação, a crítica e a compreensão das atitudes tomadas por seu progenitor, em busca de prevenir seu envolvimento irreversível com a carreira infracional.

Em (T12), quando diz: "Com a experiência que estou tendo,..." e "...uma hora aprende", assim como em (T10), ao afirmar que se arrependia até hoje de não ter atendido aos apelos do pai para não voltar a delinqüir, Jorge marca discursivamente a importância do momento presente – que envolve a medida socioeducativa, a oportunidade de profissionalização em informática e a própria participação na pesquisa – na possibilidade de assumir novas posições de self seja em face do pai, da família, da sociedade ou da própria instituição onde cumpre medida socioeducativa. Nesse mesmo turno discursivo, suas falas são marcadas por significações contraditórias. Ora se identifica com o pai (Aí ele me levou no DPJ. Eu acho isso importante, o pai querer mostrar para o filho onde realmente leva o mundo do crime,... ), ora o critica ([se eu tivesse um filho] não bateria nele), embora pareça respeitar suas motivações (Não é que achei errado meu pai me bater, cada um tem seu tipo de educação). Em certas passagens, Jorge apresenta-se um pai ainda mais severo que o seu: Eu mesmo o levaria, deixaria lá um tempo e se visse que continuou aprontando e não mudou, eu ia no juiz antes dele aprontar de novo. Uma hora aprende".

Embora se admitindo a especificidade do sistema de atividade no qual Jorge faz essa última afirmação, em que o adolescente pode buscar coerência com a imagem de alguém "que agora respeita a lei e a ordem e reconhece a necessidade dos limites", deve-se considerar o enunciado como parte de uma cadeia na qual ele vinha, desde seqüências anteriores, tecendo juízos de valor sobre o papel do pai: "Todo mundo joga a culpa também nos pais, mas nem sempre são eles" (extraído de outro episódio da mesma sessão) ou em (T2) da seqüência em análise: "[o pai deve] explicar, conscientizar seus filhos sobre o que é bom e ruim, o que é a droga, onde leva, para o cara escolher o caminho certo".

O turno (T16) marca o momento em que Jorge sintetiza narrativamente a imagem restaurada do pai, em meio a suas reminiscências sobre o episódio que marcou a perda de sua liberdade. São reminiscências vívidas, intensas e que trazem dramaticamente, em discurso direto, as vozes do pai, da mãe, da polícia e dele próprio; e indiretamente as vozes da vizinhança, do 'elemento' e dos 'meninos' com os quais delinqüia, configurando o clímax da narrativa. Nela, em meio ao jogo de identificação com as posições de filho 'que não dá nem moral' e de pai que tenta transmitir valores de conduta e orientação aos filhos, Jorge migra da condição passiva (aquele que transgride porque anda com transgressores) para a ativa (aquele que é capaz de compreender os motivos do pai); ou de outro modo, daquele que se percebia como ladrão de CD player e toca-fitas, para o que identifica a necessidade de orientar o filho e que, à medida que não consiga cumprir seu papel, deve pedir ajuda ao juiz, como ele revela que faria (T12), ou à polícia, como fez o pai (T16): "ele não estava sabendo o que fazer mais, o cara já não tinha mais consciência do que estava fazendo, estava ficando já louco comigo"; "o que ele queria era que fosse alguém lá para conversar comigo".

Ao reconhecer-se nessa dupla condição, Jorge se torna capaz de conceder o perdão ao pai (T20): "Não senti raiva. Na mesma hora não sei se senti pena, dó, ou ... amor também. Cara, ele é meu velho".

Se por um lado, a família e, especialmente, o pai participam da narrativa de Jorge como personagens que medeiam as construções de novas significações em torno da delinqüência, por outro é importante considerar o papel aí desempenhado pelas instituições diretamente vinculadas à criminalidade. Bem no início da seqüência, ele traz os temas da corrupção e dos traficantes, para afirmar tanto a falta de poder da população em relação aos últimos (T4), quanto o poder da educação na prevenção ao envolvimento com drogas (T6). Em (T12), entram em sua narrativa igualmente as instituições do jurídico que, segundo ele, deveriam ser mais bem conhecidas pelos adolescentes como tentativa de prevenção à delinqüência, embora a estratégia não tenha funcionado em seu próprio caso. Até aqui prevalece a abordagem desses tópicos de forma genérica, em que o self de Jorge parece não se implicar, embora expressando claramente as contradições a partir das quais Jorge pode vir a engendrar novas significações sobre os temas em foco.

No entanto, é exatamente em (T16) que o tópico se torna mais prenhe de sentido, ao emergir a subjetividade social da polícia. Seu pai chama a polícia como última tentativa de afastar o filho da delinqüência, mas chega uma polícia repressiva, que bate e algema, que age violentamente tanto em relação ao adolescente quanto à família, infantilizando-a (O policial pagou o maior sapo pra ele 'Isso aqui não é brincadeira não...) e ameaçando-a ('Isso é operação de choque, não serve para ficar educando seus filhos não', 'O senhor chamou, agora agüenta'). Isso nos remete aos dispositivos sociojurídicos que levaram historicamente à abordagem da pobreza como forma de desvio social e à associação estreita entre pobreza e violência, como destacam, entre outros, Foucault (1979; 2000) e Kolker (2004).

Ainda assim, deve-se admitir que a mediação da polícia – e a reminiscência dos eventos e sua ressignificação no contexto da entrevista – foi elemento importante no processo de superação das mágoas em relação ao pai, expressas por Jorge em (T15). Envolvendo a polícia no caso, o pai dele contribuiu para a determinação de sua internação, à medida que aquela não era sua primeira ocorrência infracional. Por outro lado, a abordagem policial favoreceu com que Jorge pudesse reconhecer a vulnerabilidade do pai que, embora não tendo cometido qualquer delito, tornou-se tão vítima da conduta policial repressiva quanto ele mesmo, condição em que passa a se identificar com ele. Esse é um exemplo claro em que situações de crise acabam por promover desenvolvimento subjetivo e do sistema social dos envolvidos.

Considerações finais

Procuramos evidenciar nas análises acima a importância das trocas dialógicas pesquisadora/participante, ao criar a oportunidade para Jorge refletir, rever e reconstruir sentidos sobre eventos específicos de sua vida. Como contexto eminentemente dialógico, as interações verbais favorecem aos interlocutores oportunidades de expressão de si e engendram processos de ressignificação do self e de sua reorganização interna e externa, como parte do jogo dialético entre permanência e mudança no tempo.

A permanência de si, apoiada em práticas de sustentação de si (Chandler, 2000), reflete a necessidade de coerência narrativa do self no tempo. Os dispositivos de sustentação de si são ativados em especial quando ocorrem mudanças sentidas como ameaçadoras, ou seja, o fluxo de desenvolvimento passa a causar sofrimento e o presente necessita ser perseverado a qualquer custo. O self permanece como que congelado num eterno presente. Nesse caso, para que mudanças subjetivas ocorram, o papel das emoções, parte intrínseca dos processos intersubjetivos, é capital, constituindo importante fator a mediar as transformações do self. Tudo leva a crer que a emoção atua na direção oposta aos dispositivos de sustentação de si, ou seja, como elemento de quebra de coerência de si no tempo, gerando na estrutura do self a contradição, aquela fresta pela qual a mudança se torna viável. O episódio acima é prenhe de oportunidades do tipo, como evidenciam as expressões emocionais (pausas, choro, excitação e tristeza) ocorridas nos turnos (T4), (T6), (T12), (T16) e (T20).

Considerando-se que as narrativas constituem o contexto microgenético em que os sujeitos constituem, contra o pano de fundo dado pelo contexto socioinstitucional, um senso de si sustentado intersubjetivamente, eventos marcantes como os que foram narrados por Jorge costumam ter especial impacto no desenvolvimento.

Ao convertê-los em narrativas e em objeto de negociação de sentidos na situação dialógica, são ressignificados, com a possibilidade de promover mudanças no sujeito, como pudemos observar no caso narrado. As significações construídas por Jorge expressam um balanço entre a auto-imagem de delinqüente e a de cidadão, consciente de seus erros e em processo de mudança.

Considerando a natureza dos sistemas de significação social em que se insere a delinqüência, não é uma tarefa fácil, quer para Jorge ou qualquer um, ser bem sucedido em tal ressignificação. Conforme Foucault (2000, p. 90), a produção social da delinqüência levou à representação das infrações como formas de "desvio moral, irracionalidade e tendência a agir criminosamente", por meio de discursos de naturalização e de atribuição da única responsabilidade por seus atos ao próprio infrator, o que influencia diretamente as práticas sociais por meio das quais a delinqüência é abordada. Se pudermos resumir o sucesso das medidas socioeducativas, entre as quais as restritivas de liberdade, como sendo a possibilidade de o adolescente se reconhecer por meio de outras imagens de si, abandonando os dispositivos de conservação da auto-imagem infratora em prol de novas alternativas de self, identificadas com a criação, a produção e a novas pautas de inserção social e política, precisamos refletir e transformar as práticas e os sistemas semióticos que restringem essa possibilidade.

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Recebido em 21.04.05

Aprovado em 13.02.06

Este trabalho contou com o apoio financeiro do CNPq e da FINATEC/UnB.

Maria Claudia Santos Lopes de Oliveira é professora adjunta do Laboratório de Microgênese das Interações Sociais (LABMIS), Departamento de Psicologia Escolar e do Desenvolvimento e Programa em Pós-Graduação em Psicologia da Universidade de Brasília.

Alessandra Oliveira Machado Vieira é professora assistente no Departamento de Fundamentos da Educação da Universidade Federal de Goiás

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  • Correspondência:

    Maria Claudia S. L. de Oliveira
    SQSW 504, Bloco G - Apto. 512
    70673-507 – Brasília – DF
    e-mail:
  • 1
    Nome fictício de adolescente de 18 anos que, na ocasião da construção das informações da pesquisa, estava havia cinco meses em cumprimento de medida socioeducativa de internação em função de participação em roubo.
  • 2
    Siglas que se referem a diferentes instituições jurídicas e correcionais da região.
  • 3
    ROTAM – Ronda Ostensiva Tático Metropolitana – companhia da Polícia Militar que atende às ocorrências de grande vulto e casos de grande periculosidade.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      19 Jun 2006
    • Data do Fascículo
      Abr 2006

    Histórico

    • Recebido
      21 Abr 2005
    • Aceito
      13 Fev 2006
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