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Compreendendo a Prática da Gestão Escolar pela Perspectiva da Sociomaterialidade

Resumo

Bispo (2015)Bispo, M. S. (2015). Methodological reflections on practice-based research in organization studies. BAR: Brazilian Administration Review, 12(3), 309-323. doi:10.1590/1807-7692bar2015150026
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gestão escolar; teorias da prática; sociomaterialidade; educação; estudos organizacionais

Abstract

The objective of this study was to analyze the practice of school management in light of sociomateriality in a public school of a capital in the northeast of Brazil. When studying school management from the perspective of sociomateriality, it is understood that this practice does not occur exclusively through the “hands” of the principal, but is a dynamic, situated phenomenon that develops different nuances through the interaction of various actors (human and non-human). A qualitative research method was employed, through shadowing and interview to the double. Data analysis relied on the framework prepared by Bispo (2015). Three fragments of practices that make up the texture of school management were identified: pedagogical practice, administrative support practice, and social interest practice. We found that the practice of school management does not happen in isolation, but is interconnected within the greater texture of sociomaterial practices.

school management; theories of practice; sociomateriality; education; organizational studies

Introdução

A educação há algum tempo vem recebendo grande atenção e influência da área de administração, principalmente por meio da tentativa de introdução de modelos burocráticos de gestão escolar, o que inclui, entre outras coisas, a discussão de currículos, organização orçamentária e gestão de pessoas (Krawczyk, 2014Krawczyk, N. (2014). Ensino médio: empresários dão as cartas na escola pública. Educação & Sociedade, 35(126), 21-41. doi:10.1590/s0101-73302014000100002
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; Passador & Salvetti, 2013Passador, C. S., Salvetti, T. S. (2013). Gestão escolar democrática e estudos organizacionais críticos: convergências teóricas. Educação & Sociedade, 34(123), 477-492. doi:10.1590/S0101-73302013000200009
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). As mudanças ocorridas no processo educacional, principalmente no início do século XX, levaram à incorporação de um projeto moderno de administração da educação, ou seja, levou os pesquisadores da área da educação a se inspirarem nos padrões de eficiência e produtividade empresarial (Drabach & Mousquer, 2009)Drabach, N. P., Mousquer, M. E. L. (2009). Dos primeiros escritos sobre administração escolar no brasil aos escritos sobre gestão escolar: mudanças e continuidades. Currículo sem Fronteiras, 9(2), 258-285. Retrieved from https://bit.ly/3dZwvfB
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. Dessa forma, os primeiros autores do campo da gestão escolar (Leão, 1945Leão, A. C. (1945). Introducão à administracao escolar. São Paulo, SP: Companhia Editora Nacional.; Teixeira, 1961)Teixeira, A. (1961). Que é administração escolar? Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, 36(84), 84-89. Retrieved from https://bit.ly/3dLiYrN
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buscaram validar suas proposições da prática administrativa escolar nas bases científicas desenvolvidas pelos pioneiros da administração científica como Taylor e Fayol (Junquilho, Almeida, & Silva, 2012). Assim, administração e educação, tanto no contexto nacional (Krawczyk, 2014Krawczyk, N. (2014). Ensino médio: empresários dão as cartas na escola pública. Educação & Sociedade, 35(126), 21-41. doi:10.1590/s0101-73302014000100002
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; Passador & Salvetti, 2013)Passador, C. S., Salvetti, T. S. (2013). Gestão escolar democrática e estudos organizacionais críticos: convergências teóricas. Educação & Sociedade, 34(123), 477-492. doi:10.1590/S0101-73302013000200009
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como internacional (Grimaldi & Serpieri, 2014)Grimaldi, E., Serpieri, R. (2014). Italian education beyond hierarchy: governance, evaluation and headship. Educational Management Administration & Leadership, 42(4), 119-138. doi:10.1177/1741143213510501
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, passam a estabelecer uma tensão sobre em que medida a gestão escolar pode e/ou deve ser semelhante à gestão empresarial, assim como se as políticas públicas em educação devem ser orientadas por visões de mundo mais neoliberais ou de bem-estar social (Laval, 2019)Laval, C. (2019). A escola não é uma empresa: o neoliberalismo em ataque ao ensino público. São Paulo, SP: Boitempo..

Diversos acadêmicos têm conduzido pesquisas no campo da gestão escolar sob distintos aspectos. No Brasil, há uma predominância de temas como: gestão escolar democrática, direção escolar, qualidade do ensino e processos e instrumentos de gestão em geral (Oliveira & Vasques-Meneses, 2018Oliveira, I. C., Vasques-Meneses, I. (2018). Revisão de literatura: o conceito de gestão escolar. Cadernos de Pesquisa, 48(169), 876-900. doi:10.1590/198053145341
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; Souza, 2006)Souza, Â. R. (2006). Os caminhos da produção científica sobre gestão escolar no Brasil. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, 22(1), 13-39. doi:10.21573/vol22n12006.18720
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. No contexto internacional, Hallinger e Kovačević (2019)Hallinger, P., Kovačević, J. (2019). A bibliometric review of research on educational administration: science mapping the literature, 1960 to 2018. Review of Educational Research, 89(3), 335-369. doi:10.3102/0034654319830380
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identificam grandes temas, como: eficácia e desempenho escolar, liderança como fator influente para a aprendizagem dos alunos e para o desempenho de professores, e por fim, pesquisas sobre mudanças culturais na escola, professores e ensino.

Pesquisadores do campo apontam a predominância de um pensamento binário (Abdian, Nascimento, & Silva, 2016; Russo, 2004)Russo, M. H. (2004). Escola e paradigmas de gestão. EccoS: Revista Científica, 6(1), 25-42. doi:10.5585/eccos.v6i1.366
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– por um lado, oriundo da construção teórica que se baseia na administração com foco na eficiência e, por outro, na especificidade e no caráter pedagógico da escola – com ênfase normativa (Souza, 2006, 20Souza, Â. R. (2006). Os caminhos da produção científica sobre gestão escolar no Brasil. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, 22(1), 13-39. doi:10.21573/vol22n12006.18720
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, 2017Souza, Â. R. (2017). As teorias da gestão escolar e sua influência nas escolas públicas brasileiras. Revista de Estudios Teóricos y Epistemológicos en Política Educativa, 2, 1-19. doi:10.5212/retepe.v.2.016
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) que se orienta mais a apresentar como a gestão da escola deve acontecer e menos a analisar como a gestão de fato acontece. Russo (2004)Russo, M. H. (2004). Escola e paradigmas de gestão. EccoS: Revista Científica, 6(1), 25-42. doi:10.5585/eccos.v6i1.366
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argumenta que, apesar de haver uma transição paradigmática no campo teórico, há ainda a predominância do modelo burocrático no campo prático da gestão escolar.

Neste artigo, adota-se uma perspectiva que concebe a gestão escolar para além do controle das variáveis internas à escola. A gestão de uma escola, apesar de conter aspectos de qualquer prática administrativa, abrange também uma infinidade de singularidades relativas aos aspectos educativos, populares e participativos, os quais vinculam a escola ao seu entorno normativo, social, cultural e econômico (Junquilho et al., 2012Junquilho, G. S., Almeida, R. A., Silva, A. R. L. (2012). As “artes do fazer” gestão na escola pública: uma proposta de estudo. Cadernos EBAPE.BR, 10(2), 329-356. doi:10.1590/s1679-39512012000200006
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).

Dessa forma, neste trabalho, a gestão escolar no ensino básico é analisada a partir da sociomaterialidade (Leonardi, 2012Leonardi, P. M. (2012). Materiality, sociomateriality, and socio-technical systems: what do these terms mean? How are they related? Do we need them? In P. M. Leonardi, B. A. Nardi, J. Kallinikos (Eds.), Materiality and organizing: social interaction in a technological world (pp. 25-48). Oxford: Oxford University Press.; Moura & Bispo, 2020Moura, E. O., Bispo, M. S. (2020). Sociomateriality: theories, methodology, and practice. Canadian Journal of Administrative Sciences, 37(3), 350-365. doi:10.1002/cjas.1548
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; Orlikowski, 2007)Orlikowski, W. J. (2007). Sociomaterial practices: exploring technology at work. Organization Studies, 28(9), 1435-1448. doi:10.1177/0170840607081138
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, para isso, utilizamos o conceito de prática social (Gherardi, 2006Gherardi, S. (2006). Organizational knowledge: the texture of workplace learning (Vol. 53). Oxford: Blackwell Publishing.; Schatzki, Knorr-Cetina, & von Savigny, 2001) no sentido de facilitar a compreensão sobre como as relações sociomateriais acontecem na (re)produção do social a partir da prática da gestão escolar. Assim, compreender a gestão escolar como uma prática social (Gherardi, 2006)Gherardi, S. (2006). Organizational knowledge: the texture of workplace learning (Vol. 53). Oxford: Blackwell Publishing. é assumir que esta é performada por interações sociomateriais entre atores (humanos e não humanos) em que os modos de fazer não estão subordinados a teorias previamente concebidas ou a visões dicotômicas como sujeito/objeto, macro/micro, neoliberal/socialista e assim por diante.

Esta pesquisa visa responder a seguinte questão: como pensar uma alterativa de gestão escolar para além da posição funcionalista dominante nos estudos e na prática do campo? Desse modo, a pesquisa tem como objetivo geral analisar a prática da gestão escolar à luz da sociomaterialidade em uma escola pública de uma capital localizada no Nordeste brasileiro.

Os estudos organizacionais têm potencial para contribuir na discussão e solução dos grandes temas sociais, como a educação e, especialmente, a gestão escolar. Essa aproximação é importante devido à relevância desses temas para a sociedade, o que sugere que as áreas de administração e estudos organizacionais não podem ficar alheias a essas discussões. Dessa forma, este artigo visa apresentar contribuições tanto na interlocução entre estudos organizacionais e educação, assim como apresentar uma perspectiva teórica que avance na compreensão da gestão escolar. Para tanto, acreditamos que as teorias da prática são uma possibilidade consistente para a construção de tal vínculo. Nicolini (2016)Nicolini, D. (2016). Is small the only beautiful? Making sense of ‘large phenomena’ from a practice-based perspective. In A. Hui, T. Schatzki, E. Shove (Eds.), The nexus of practices: connections, constellations, practitioners (pp. 98-113). London: Routledge. doi:10.4324/9781315560816
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defende que as abordagens baseadas no conceito de prática não se limitam à compreensão de microprocessos sociais, mas também possuem grande contribuição para a investigação de grandes temas sociais. Isso se dá pelo fato da orientação ontoepistemológica das teorias da prática refutarem classificações espaciais e temporais como micro e macro, pois defendem que o que diferencia o “tamanho” de um fenômeno é essencialmente a extensão e o número de práticas que o constituem e não apenas a sua escala hierárquica ou institucional.

Dessa forma, o conceito de prática social abre uma possibilidade para se pensar e fazer a gestão escolar de maneira mais fluída e processual no que tange aos aspectos pedagógicos, administrativos e ao interesse social, já que os dois primeiros são por vezes tratados de maneira dicotômica no cotidiano escolar e o terceiro, muitas vezes, não é considerado na gestão das escolas.

Além desta introdução, o artigo conta com um referencial teórico que apresenta alguns dos principais conceitos sobre a gestão escolar e como ela pode ser compreendida como uma prática sociomaterial. Em seguida, é apresentado o percurso metodológico da pesquisa empírica realizada em uma escola pública de uma capital nordestina brasileira. Na sequência são apresentadas as reflexões e interpretações dos dados obtidos no campo, e, por fim, são feitas as considerações finais, apresentando as principais reflexões geradas a partir deste estudo.

Gestão escolar

A oferta de educação passa pela gestão de um sistema educacional que possui diferentes dimensões de atuação. Gestão da educação e gestão escolar são conceitos-chave para se compreender como a gestão atua na promoção do ensino.

Por gestão da educação, entende-se que são aquelas atividades desempenhadas pelas diferentes instâncias de governo (municipal, estadual e federal) no sentido de materializar as políticas públicas e as diretrizes nacionais de educação (Vieira, 2007Vieira, S. L. (2007). Políticas e gestão da educação básica: revisitando conceitos simples. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, 23(1), 53-69. doi:10.21573/vol23n12007.19013
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). Nesse sentido, a gestão da educação atua no nível dos sistemas de ensino, na concepção de políticas e planos institucionais, concepção de projetos pedagógicos, execução, acompanhamento e avaliação das atividades de ensino e na gestão dos recursos financeiros e materiais (Sander, 2007Sander, B. (2007). A pesquisa sobre política e gestão da educação no Brasil: uma leitura introdutória sobre sua construção. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, 23(3), 421-447. doi:10.21573/vol23n32007.19141
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).

Por sua vez, a gestão escolar é parte da gestão da educação e sua atuação se dá nas unidades escolares, por meio da elaboração e execução da sua proposta pedagógica, apoio pedagógico, promoção da integração entre escola e comunidade, gestão de pessoal e gestão de recursos financeiros e gestão do patrimônio (Vieira, 2007Vieira, S. L. (2007). Políticas e gestão da educação básica: revisitando conceitos simples. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, 23(1), 53-69. doi:10.21573/vol23n12007.19013
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).

A administração escolar (ou gestão escolar) começa a tomar forma como campo de estudos acadêmicos a partir do início do século XX. No Brasil, esse processo se intensifica a partir da década de 1930, com destaque para os trabalhos desenvolvidos por Leão (1945)Leão, A. C. (1945). Introducão à administracao escolar. São Paulo, SP: Companhia Editora Nacional. e Teixeira (1961)Teixeira, A. (1961). Que é administração escolar? Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, 36(84), 84-89. Retrieved from https://bit.ly/3dLiYrN
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. Drabach e Mousquer (2009)Drabach, N. P., Mousquer, M. E. L. (2009). Dos primeiros escritos sobre administração escolar no brasil aos escritos sobre gestão escolar: mudanças e continuidades. Currículo sem Fronteiras, 9(2), 258-285. Retrieved from https://bit.ly/3dZwvfB
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destacam esses autores como pioneiros nos escritos teóricos sobre a gestão escolar no Brasil, sendo fundamentais para a consolidação desse campo de estudo. Contudo, administração e educação travam discussões, por vezes, conflituosas, como se a gestão escolar pode e/ou deve ser semelhante à gestão empresarial, assim como se as políticas públicas em educação devem ser orientadas por visões de mundo mais neoliberais ou de bem-estar social (Grimaldi & Serpieri, 2014Grimaldi, E., Serpieri, R. (2014). Italian education beyond hierarchy: governance, evaluation and headship. Educational Management Administration & Leadership, 42(4), 119-138. doi:10.1177/1741143213510501
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; Krawczyk, 2014Krawczyk, N. (2014). Ensino médio: empresários dão as cartas na escola pública. Educação & Sociedade, 35(126), 21-41. doi:10.1590/s0101-73302014000100002
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; Laval, 2019Laval, C. (2019). A escola não é uma empresa: o neoliberalismo em ataque ao ensino público. São Paulo, SP: Boitempo.; Passador & Salvetti, 2013)Passador, C. S., Salvetti, T. S. (2013). Gestão escolar democrática e estudos organizacionais críticos: convergências teóricas. Educação & Sociedade, 34(123), 477-492. doi:10.1590/S0101-73302013000200009
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.

A partir do fim da década de 1970 e início da década de 1980, inicia-se um movimento crítico no campo da gestão escolar com o intuito de fazer uma melhor análise dos trabalhos produzidos no campo e superar a visão funcionalista predominante até então. Os estudos anteriores a esse movimento tinham como sustentáculo concepções racionais funcionalistas acerca da gestão escolar, o que ofuscava a função política da escola na transformação da sociedade (Drabach & Mousquer, 2009Drabach, N. P., Mousquer, M. E. L. (2009). Dos primeiros escritos sobre administração escolar no brasil aos escritos sobre gestão escolar: mudanças e continuidades. Currículo sem Fronteiras, 9(2), 258-285. Retrieved from https://bit.ly/3dZwvfB
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). Lück (2017)Lück, H. (2017). Gestão educacional: uma questão paradigmática. Rio de Janeiro, RJ: Vozes. destaca a evolução paradigmática do conceito de gestão educacional, já que a gestão escolar, que antes era pautada em uma visão mecanicista influenciada pelas escolas da administração clássica, amplia sua concepção e passa a considerar, além dos aspectos técnicos, os políticos, pedagógicos e os processos sociais que envolvem o contexto escolar (Drabach & Mousquer, 2009Drabach, N. P., Mousquer, M. E. L. (2009). Dos primeiros escritos sobre administração escolar no brasil aos escritos sobre gestão escolar: mudanças e continuidades. Currículo sem Fronteiras, 9(2), 258-285. Retrieved from https://bit.ly/3dZwvfB
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; Lück, 2017)Lück, H. (2017). Gestão educacional: uma questão paradigmática. Rio de Janeiro, RJ: Vozes..

No contexto brasileiro, a gestão escolar é considerada parte integrante da gestão educacional, sendo regida pela Lei nº 9.394/96, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional – Lei de Diretrizes e Bases (LDB). Nesse sentido, a gestão escolar é entendida como um mecanismo que visa assegurar aspectos democráticos, garantindo qualidade e efetividade a partir da participação de todos os membros que compõem a comunidade escolar, dentre os quais se destacam professores, alunos, técnicos administrativos, pais e representantes da comunidade civil (Brasil, 1996; Lück, 2017Lück, H. (2017). Gestão educacional: uma questão paradigmática. Rio de Janeiro, RJ: Vozes.; Vargas & Junquilho, 2013Vargas, R. A. A., Junquilho, G. S. (2013). Funções administrativas ou práticas? As “artes do fazer” gestão na escola mirante. Revista de Ciências da Administração, 15(35), 180-195. doi:10.5007/2175-8077.2013v15n35p180
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).

A gestão escolar democrática está associada ao estabelecimento de mecanismos institucionais que propiciam a participação social. Assim, entende-se que a gestão não se restringe apenas à ação do(a) diretor(a) escolar (Lück, 2017Lück, H. (2017). Gestão educacional: uma questão paradigmática. Rio de Janeiro, RJ: Vozes.). Apesar da autoridade formal na direção da escola, o(a) diretor(a) constrói a gestão escolar, cotidianamente, de maneira conjunta com todos os que compõem o processo da gestão escolar na sua perspectiva democrática (Lück, 2017Lück, H. (2017). Gestão educacional: uma questão paradigmática. Rio de Janeiro, RJ: Vozes.; Paro, 2010Paro, V. H. (2010). A educação, a política e a administração: reflexões sobre a prática do diretor de escola. Educação e Pesquisa, 36(3), 763-778. doi:10.1590/S1517-97022010000300008
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; Vargas & Junquilho, 2013Vargas, R. A. A., Junquilho, G. S. (2013). Funções administrativas ou práticas? As “artes do fazer” gestão na escola mirante. Revista de Ciências da Administração, 15(35), 180-195. doi:10.5007/2175-8077.2013v15n35p180
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).

Vargas e Junquilho (2013)Vargas, R. A. A., Junquilho, G. S. (2013). Funções administrativas ou práticas? As “artes do fazer” gestão na escola mirante. Revista de Ciências da Administração, 15(35), 180-195. doi:10.5007/2175-8077.2013v15n35p180
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argumentam que para viabilizar a gestão democrática nas escolas públicas de ensino básico (educação infantil, ensino fundamental e ensino médio), alguns instrumentos são utilizados: (a) eleição para o cargo de diretor(a) escolar; (b) conselhos de escola compostos por pais, alunos, professores, servidores, moradores e o(a) diretor(a) escolar; (c) grêmios estudantis como representação política dos alunos; (d) promoção da autonomia administrativa, financeira e pedagógica da escola. Os autores ainda destacam que a gestão democrática impõe paradoxos às escolas públicas, devido às dificuldades cotidianas das relações sociais entre os agentes que compõem a comunidade escolar. Tomadas de decisão, por exemplo, são ações complexas e que se tornam passíveis de tensão e conflito de interesses, o que pode acarretar práticas de gestão centralizadas na figura da direção escolar.

Apesar dos estudos críticos em gestão da educação e gestão escolar, há ainda forte predominância de uma visão funcionalista da gestão da educação, que, por sua vez, gera impactos diretos na gestão das escolas. Diversos autores (Landri, 2014Landri, P. (2014). Governing by standards: the fabrication of austerity in the italian education system. Education Inquiry, 5(1), 24057. doi:10.3402/edui.v5.24057
https://doi.org/10.3402/edui.v5.24057...
; Ozga, 2017Ozga, J. (2017). Education policy should not be driven by performance data. Nature Human Behaviour, 1(1), 14. doi:10.1038/s41562-016-0014
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; Passador & Salvetti, 2013Passador, C. S., Salvetti, T. S. (2013). Gestão escolar democrática e estudos organizacionais críticos: convergências teóricas. Educação & Sociedade, 34(123), 477-492. doi:10.1590/S0101-73302013000200009
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) têm chamado atenção para os riscos de se pensar a gestão da educação sob esse viés.

Esta perspectiva funcionalista adota, sobretudo, aspectos de busca pelo desempenho, transparência e accountability, que são mensurados a partir de indicadores de desempenho (Gorur, 2018Gorur, R. (2018). Escaping numbers? Intimate accounting, informed publics and the uncertain assemblages of authority and non-authority. Science & Technology Studies, 31(4), 89-108. doi:10.23987/sts.56745
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). No entanto, a atenção exclusiva para os resultados dos indicadores de desempenho tem gerado debates acerca da acurácia do uso dos números (Gorur, 2018Gorur, R. (2018). Escaping numbers? Intimate accounting, informed publics and the uncertain assemblages of authority and non-authority. Science & Technology Studies, 31(4), 89-108. doi:10.23987/sts.56745
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; Ozga, 2017Ozga, J. (2017). Education policy should not be driven by performance data. Nature Human Behaviour, 1(1), 14. doi:10.1038/s41562-016-0014
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), do impacto desses resultados na comunidade escolar (Gorur, 2018Gorur, R. (2018). Escaping numbers? Intimate accounting, informed publics and the uncertain assemblages of authority and non-authority. Science & Technology Studies, 31(4), 89-108. doi:10.23987/sts.56745
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), bem como do risco de se relegar aspectos tácitos do ensino-aprendizagem do aluno e da escola, que são difíceis de ser mensurados e, consequentemente, marginalizar circuitos de conhecimentos não orientados para os padrões de mensuração de desempenho (Landri, 2014Landri, P. (2014). Governing by standards: the fabrication of austerity in the italian education system. Education Inquiry, 5(1), 24057. doi:10.3402/edui.v5.24057
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).

A gestão escolar como prática social

Ao estudar a gestão escolar, faz-se necessário um posicionamento acerca do termo gestão que extrapole as barreiras da estreita visão de que gerir ou administrar é sinônimo de controle de variáveis, especialmente as internas (Paula, 2016Paula, A. P. P. (2016). Em busca de uma ressignificação para o imaginário gerencial: os desafios da criação e da dialogicidade. RAM: Revista de Administração Mackenzie, 17(2), 18-41. doi:10.1590/1678-69712016/administracao.v17n2p18-41
https://doi.org/10.1590/1678-69712016/ad...
). A gestão escolar, como argumenta Silva (2007)Silva, J. B. (2007). Um olhar histórico sobre a gestão escolar. Educação em Revista, 8(1), 21-34. doi:10.36311/2236-5192.2007.v8n1.616
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, apesar de considerar aspectos de qualquer prática administrativa, também emerge de seu contexto como “uma infinidade de peculiaridades inerentes às suas naturezas educativas, populares e participativas” (p. 24). Nesse sentido, buscou-se neste trabalho discutir uma perspectiva alternativa à visão hegemônica funcionalista da gestão presente na administração, abrindo espaço para uma abordagem que enfatize o dinamismo e as complexidades presentes no cotidiano das organizações e que são provenientes das ações construídas socialmente entre atores humanos e não humanos (Latour, 2005Latour, B. (2005). Reassembling the social: an introduction to actor network theory. Oxford: Oxford University Press.). Assim, propõe-se compreender a gestão escolar a partir da lente das Teorias da Prática (Bispo, 2015Bispo, M. S. (2015). Methodological reflections on practice-based research in organization studies. BAR: Brazilian Administration Review, 12(3), 309-323. doi:10.1590/1807-7692bar2015150026
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; Gherardi, 2006Gherardi, S. (2006). Organizational knowledge: the texture of workplace learning (Vol. 53). Oxford: Blackwell Publishing.).

Para Feldman e Orlikowski (2011)Feldman, M. S., Orlikowski, W. J. (2011). Theorizing practice and practicing theory. Organization Science, 22(5), 1240-1253. doi:10.1287/orsc.1100.0612
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, a ideia central das lentes da prática é a noção de vida social como uma produção contínua e emergente de ações entre diversos atores. Para as autoras, as lentes da prática consistem em uma abordagem específica para compreender o mundo, oferecendo aos pesquisadores organizacionais contribuições para entender o caráter complexo, dinâmico, móvel e transitório das organizações contemporâneas.

Na literatura é possível encontrar diversas definições de prática social, o que significa dizer que não existe uma teoria da prática, mas, sim, teorias da prática (Antonacopoulou, 2015Antonacopoulou, E. P. (2015). One more time: what is practice? Teoria e Prática em Administração, 5(2), 1-26. doi:10.21714/2238-104X2015v5i2-25854
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; Gherardi, 2017Gherardi, S. (2017). Sociomateriality in posthuman practice theory. In A. Hui, T. Schatzki, E. Shove (Eds.), The nexus of practices: connections, constellations, practitioners (pp. 38-51). New York: Routledge.). Diante disso, adotamos o conceito de prática em Gherardi (2006)Gherardi, S. (2006). Organizational knowledge: the texture of workplace learning (Vol. 53). Oxford: Blackwell Publishing., que assume a prática como “um modo relativamente estável no tempo e socialmente reconhecido de ordenar elementos heterogêneos em um conjunto coerente” (p. 34).

A gestão como prática social é entendida como um processo contínuo de articulação de práticas complexas e diversificadas que emergem e se modificam de maneira dinâmica (Reed, 1984Reed, M. I. (1984). Management as a social practice. Journal of Management Studies, 21(3), 273-285. doi:10.1111/j.1467-6486.1984.tb00411.x
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). Nesse sentido, a gestão é compreendida como complexa, pela qual não existe uma forma única de fazer. Por isso, Junquilho (2001)Junquilho, G. S. (2001). Gestão e ação gerencial nas organizações contemporâneas: para além do “folclore” e o “fato”. Gestão & Produção, 8(3), 304-318. doi:10.1590/S0104-530X2001000300007
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argumenta que não é possível desvincular a gestão do seu contexto cotidiano, ademais, a gestão como uma prática apenas pode ser analisada considerando as perspectivas institucionais, organizacionais e comportamentais como partes integrantes do fazer a gestão. Assim, a gestão escolar é entendida como um processo emergente e contínuo, produzido a partir das interações no cotidiano escolar (Poubel & Junquilho, 2019Poubel, L., Junquilho, G. S. (2019). Para além do management: o processo de managing em uma escola pública de ensino fundamental no Brasil. Cadernos EBAPE.BR, 17(3), 539-551. doi:10.1590/1679-395173528
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).

Gherardi (2006)Gherardi, S. (2006). Organizational knowledge: the texture of workplace learning (Vol. 53). Oxford: Blackwell Publishing. introduz o conceito de textura para explicar o campo das práticas. Segundo a autora, as práticas emergem em uma textura que conecta as práticas umas às outras. Essa textura se mantém unida pela composição de certo número de práticas que se ancoram entre si. Nesse sentido, pode-se utilizar o conceito de textura (Gherardi, 2006Gherardi, S. (2006). Organizational knowledge: the texture of workplace learning (Vol. 53). Oxford: Blackwell Publishing.) para compreender o vínculo existente entre elementos híbridos (humanos e não humanos), que de maneira relacional tecem o fazer gestão no contexto escolar. Para Gherardi, “a textura da organização pode ser concebida como um território imaginário, um domínio circunscrito marcado pela pluralidade dos atores organizacionais que compreende ideias, projetos, emoções etc.” (p. 49) que fazem parte do que se conhece por comportamento organizacional. Dessa forma, como destaca Bispo (2011)Bispo, M. S. (2011). O processo de aprendizagem coletiva e o uso da tecnologia em agências de viagens: contribuições dos estudos baseados em prática e da etnometodologia (PhD thesis). Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, SP., quando nos remetemos ao conceito de textura organizacional (ou textura de práticas) como um território imaginário, estamos nos referindo a uma esfera metafórica para compreender como as práticas sociais se organizam, formando o social através dos seus entrelaçamentos.

As visões predominantes nos estudos sobre gestão e organização possuem um grande enfoque em entender esses fenômenos a partir de aspectos formais e estáticos (Santos & Silveira, 2015Santos, L. L. S., Silveira, R. A. (2015). Por uma epistemologia das práticas organizacionais: a contribuição de Theodore Schatzki. Organizações & Sociedade, 22(72), 79-98. doi:10.1590/1984-9230724
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). Nesse sentido, adotar os pressupostos das teorias da prática para estudar a gestão no contexto da escola pública nos permite uma alternativa às visões tradicionais de gestão orientadas pelo funcionalismo. Ademais, o enfoque na prática nos leva a compreender a gestão escolar como uma textura socialmente construída (Gherardi, 2006)Gherardi, S. (2006). Organizational knowledge: the texture of workplace learning (Vol. 53). Oxford: Blackwell Publishing. que acontece em um contexto plural e repleto de incertezas como é, por exemplo, o da escola pública. A gestão escolar, nesse contexto, pode ser compreendida como um entretecer de diversos atores (diretores, professores, alunos, técnicos administrativos, comunidade, salas de aula, livros etc.) em ação, caracterizando-se como um fazer da sociedade.

Sociomaterialidade

A sociomaterialidade assume como social o resultado da interação entre humanos e não humanos modificando e sendo modificados uns pelos outros dinamicamente (Fenwick, Edwards, & Sawchuk, 2011). Orlikowski (2007)Orlikowski, W. J. (2007). Sociomaterial practices: exploring technology at work. Organization Studies, 28(9), 1435-1448. doi:10.1177/0170840607081138
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argumenta que os estudos organizacionais têm, de certa forma, “desconsiderado as formas com as quais as organizações têm se ligado com as formas materiais e os espaços através de como os humanos agem e interagem” (p. 1435). Para Fenwick et al. (2011)Fenwick, T., Edwards, R., Sawchuk, P. (2011). Emerging approaches in educational research: tracing the socio-material. London: Routledge., os humanos não devem ser entendidos como detentores de um status privilegiado no mundo, mas como sendo parte dele. Tal debate tem feito parte da agenda de discussão de diversos pesquisadores (Fenwick & Landri, 2012Fenwick, T., Landri, P. (2012). Materialities, textures and pedagogies: socio-material assemblages in education. Pedagogy, Culture & Society, 20(1), 1-7. doi:10.1080/14681366.2012.649421
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; Leonardi, 2012Leonardi, P. M. (2012). Materiality, sociomateriality, and socio-technical systems: what do these terms mean? How are they related? Do we need them? In P. M. Leonardi, B. A. Nardi, J. Kallinikos (Eds.), Materiality and organizing: social interaction in a technological world (pp. 25-48). Oxford: Oxford University Press.; Orlikowski, 2007)Orlikowski, W. J. (2007). Sociomaterial practices: exploring technology at work. Organization Studies, 28(9), 1435-1448. doi:10.1177/0170840607081138
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que buscam compreender os fenômenos sociais como o resultado da interação entre humanos e não humanos. Este debate tem suas raízes nos pressupostos da abordagem pós-humanista que evidencia as entidades materiais como parte relevante de análise na produção do social.

Mas, por que o foco no material? Fenwick (2010)Fenwick, T. (2010). Re-thinking the “thing”: sociomaterial approaches to understanding and researching learning in work. Journal of Workplace Learning, 22(1/2), 104-116. doi:10.1108/13665621011012898
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apresenta algumas reflexões sobre esta indagação: (a) o cotidiano é totalmente envolvido com elementos materiais (veículos, construções arquitetônicas, tecnologias, estradas e assim por diante) que acabam não sendo reconhecidos devido ao foco excessivo na atividade humana; (b) o foco no sociomaterial pode ajudar a revelar as dinâmicas que constituem a vida cotidiana; e (c) a habilidade de reorganizar categorias vem tornando convenções problemáticas (p.ex. aprendizagem formal e informal). A perspectiva da sociomaterialidade é apresentada como uma premissa de que aspectos sociais e materiais das organizações não possuem significados inerentes determinados, devendo ser vistos como partes de uma realidade inseparável, ou indissociável e que são percebidos em uma prática (Orlikowski, 2007Orlikowski, W. J. (2007). Sociomaterial practices: exploring technology at work. Organization Studies, 28(9), 1435-1448. doi:10.1177/0170840607081138
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).

Para Orlikowski (2007)Orlikowski, W. J. (2007). Sociomaterial practices: exploring technology at work. Organization Studies, 28(9), 1435-1448. doi:10.1177/0170840607081138
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, “não existe social que não seja também material e material que não seja também social” (p. 1437). Isto também significa assumir que: (a) “toda materialidade é social de modo que foi criada por meio de processos sociais e é interpretada e utilizada em contextos sociais”, e (b) “que toda ação social é possível por causa de alguma materialidade” (Leonardi, 2012Leonardi, P. M. (2012). Materiality, sociomateriality, and socio-technical systems: what do these terms mean? How are they related? Do we need them? In P. M. Leonardi, B. A. Nardi, J. Kallinikos (Eds.), Materiality and organizing: social interaction in a technological world (pp. 25-48). Oxford: Oxford University Press., p. 32).

Ainda que o conceito de sociomaterialidade seja fortemente associado aos estudos da área de ciência e tecnologia (Leonardi, 2012Leonardi, P. M. (2012). Materiality, sociomateriality, and socio-technical systems: what do these terms mean? How are they related? Do we need them? In P. M. Leonardi, B. A. Nardi, J. Kallinikos (Eds.), Materiality and organizing: social interaction in a technological world (pp. 25-48). Oxford: Oxford University Press.; Scott & Orlikowski, 2017Scott, S. V., Orlikowski, W. J. (2017). Entanglements in practice: performing anonymity through social media. MIS Quarterly, 38(3), 873-893. doi:10.25300/misq/2014/38.3.11
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), nesse artigo buscamos tratar a sociomaterilaidade como um conceito que está presente em outras abordagens. O que se defende é que diversas abordagens teóricas podem ser consideradas sociomateriais (Fenwick et al., 2011Fenwick, T., Edwards, R., Sawchuk, P. (2011). Emerging approaches in educational research: tracing the socio-material. London: Routledge.; Moura & Bispo, 2020)Moura, E. O., Bispo, M. S. (2020). Sociomateriality: theories, methodology, and practice. Canadian Journal of Administrative Sciences, 37(3), 350-365. doi:10.1002/cjas.1548
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, como, por exemplo: novas materialidades (Coole & Frost, 2010)Coole, D., Frost, S. (2010). Introducing the new materialisms. In D. Coole, S. Frost (Eds.), Ontology, agency, and politics (pp. 1-47). Durham: Duke University Press., a teoria da atividade histórico-cultural (Engeström, 2001)Engeström, Y. (2001). Expansive learning at work: toward an activity theoretical reconceptualization. Journal of Education and Work, 14(1), 133-156. doi:10.1080/13639080020028747
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, a teoria da complexidade (Morin, 2005)Morin, E. (2005). Ciência com consciência (8th ed.). Rio de Janeiro, RJ: Bertrand Brasil., a estética organizacional (Strati, 2007)Strati, A. (2007). Organização e estética. Rio de Janeiro, RJ: FGV Editora., teoria ator-rede (Latour, 2005)Latour, B. (2005). Reassembling the social: an introduction to actor network theory. Oxford: Oxford University Press., dentre outras.

É importante deixar claro que elementos materiais enfatizados em uma análise sociomaterial podem variar de acordo com as perspectivas teóricas adotadas. Assim, o foco das análises sociomateriais pode variar de acordo com cada abordagem, como por exemplo: elementos tecnológicos, espaços, símbolos, emoções, dentre outros. O que estas abordagens compartilham é a noção de que o social é constituído a partir das interações entre elementos humanos e não humanos e que os não humanos têm capacidade de agência em maior ou menor grau, de acordo com as especificidades de cada abordagem.

Procedimentos metodológicos

Esta pesquisa assumiu uma abordagem qualitativa sustentada por uma ontologia das práticas (Gherardi, 2006Gherardi, S. (2006). Organizational knowledge: the texture of workplace learning (Vol. 53). Oxford: Blackwell Publishing.) para compreender a prática da gestão escolar como um fenômeno situado a partir da interação entre diversos atores humanos e não humanos, incluindo os próprios pesquisadores. O local escolhido para pesquisa é uma escola pública da rede estadual de ensino básico localizada em um bairro periférico de uma capital nordestina brasileira. A escola já está instalada no bairro há mais de trinta anos e atende cerca de 1.100 alunos divididos nos três turnos e distribuídos em séries que vão desde o Ensino Fundamental I ao Ensino Médio. Além disso, possui 68 funcionários entre professores, auxiliares e técnicos administrativos.

Diante do aceite da gestora da escola, mediante assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para o desenvolvimento da pesquisa, as visitas se iniciaram em julho e se encerraram em dezembro de 2015, o que gerou aproximadamente 140 horas de observações de campo. A maior parte desse tempo foi cumprido na própria escola e outra parte em eventos, reuniões e seminários fora da escola. As visitas à escola não obedeciam a uma regularidade quanto à frequência no que se refere a dias da semana e horários, assim como ao período de permanência no campo. Essas visitas variaram entre duas e cinco vezes por semana e entre duas a oito horas por dia. Esta estratégia teve como objetivo estimular um agir natural das pessoas envolvidas de modo a evitar situações diferentes das que comumente acontecem naquele ambiente devido às visitas dos pesquisadores. O acesso ao campo foi por meio de shadowing (Czarniawska, 2008Czarniawska, B. (2008). Organizing: how to study it and how to write about it. Qualitative Research in Organizations and Management, 3(1), 4-20. doi:10.1108/17465640810870364
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) e do interview to the double (ou entrevista com o sósia) (ITTD) (Nicolini, 2009a) baseados em uma estratégia de zooming in e zooming out (Nicolini, 2009b).

O shadowing foi utilizado como estratégia de levantamento de dados no intuito de acompanhar a mobilidade da prática e de seus atores. Nessa técnica de levantamento de dados o pesquisador segue a prática (gestão escolar) e seus atores (humanos e não humanos) como uma espécie de sombra no intuito de apreender os aspectos das práticas frutos da interação entre esses atores. Os principais atores sombreados foram a gestora e a vice-gestora da escola pelo fato de serem atores-chave no desenvolvimento das atividades investigadas. No entanto outros atores como professores, alunos e técnicos administrativos também foram sombreados. Destaca-se que o uso do shadowing não foi restrito à investigação da ação humana, mas também foram observados os elementos não humanos que compunham as práticas pesquisadas, visto que eles assumem papel relevante na materialidade das práticas (Bruni, 2005Bruni, A. (2005). Shadowing software and clinical records: on the ethnography of non-humans and heterogeneous contexts. Organization, 12(3), 357-378. doi:10.1177/1350508405051272
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).

É importante salientar que os períodos de condução do shadowing eram alternados entre momentos de aproximação e de distanciamento, que correspondiam ao zooming in e zooming out (Nicolini, 2009b, 2009c), respectivamente. Para isso, utilizou-se estratégias apresentadas por Nicolini (2009c) no sentido de orientar o pesquisador na condução das análises mais aproximadas ou mais distanciadas. Assim, os movimentos de zooming in foram conduzidos a partir da observação das interações dos atores, bem como de seus dizeres e fazeres; de normas, regras e aspectos institucionais; e, também, dos elementos não humanos que materializavam a prática. Por sua vez, o zooming out foi conduzido a partir de uma análise dos agentes intermediários presentes na prática, bem como das relações formadas através das práticas que a conectavam com outras práticas sociais do seu entrono. Estes movimentos metafóricos proporcionaram aos pesquisadores tanto um aprofundamento sobre as minúcias e meandros da prática investigada (zooming in) quanto de uma percepção mais ampliada (zooming out), buscando entender como a prática se relaciona com outras práticas, formando uma espécie de textura de práticas. Dessa maneira, foi possível aos pesquisadores analisar as práticas dentro do campo vivendo-o e, fora do campo, refletindo sobre ele.

As idas a campo eram registradas em um laptop e um aparelho celular com funções de gravador e câmera. Os dados oriundos das observações e das conversas informais eram anotados logo que possível (durante ou após as visitas) em um diário de campo. As anotações do diário de campo eram digitadas em um documento eletrônico sempre no mesmo dia ou no dia seguinte à visita. Esta estratégia visou organizar o material coletado e propiciar aos pesquisadores momentos de reflexão sobre os pontos destacados durante o período no campo. A captura das imagens e as gravações foram feitas por meio do aparelho celular. Essa opção se deu por ser uma ferramenta que chamava menos atenção dos participantes da pesquisa para garantir maior naturalidade durante as interações. É importante destacar que os atores investigados durante a pesquisa estavam cientes da situação e que os dados levantados durante a pesquisa tiveram autorização dos participantes diretos através do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

A técnica do ITTD consiste em pedir para que os entrevistados relatem suas atividades como se os pesquisadores fossem substituí-los em suas funções. Essa técnica foi realizada com três membros da escola (gestora, vice-gestora e um técnico administrativo), em novembro de 2015, após o período de condução do shadowing inicial. O objetivo do ITTD foi compreender melhor como as atividades diárias eram desenvolvidas pelos atores entrevistados a partir de questionamentos que surgiram durante o período do shadowing. Optou-se por essa ordem das técnicas, pois o objetivo era complementar os dados coletados durante as observações. Além disso, nessa fase os pesquisadores já tinham familiaridade maior com as práticas identificadas e com os atores, o que ajudou durante a negociação com os entrevistados.

Além das imagens e gravações, foram utilizados como fontes de dados para a pesquisa documentos que estavam ligados às atividades dos atores. Outras fontes de dados para o desenvolvimento dessa pesquisa foram materiais coletados na internet, como, por exemplo, informações da página da escola na rede social Facebook, e-mails e conversas no aplicativo WhatsApp (com autorização da gestora escolar). Essas fontes de dados foram importantes para representar as diversas formas de interação existentes entre os atores que compõem a gestão escolar na escola, bem como o papel dos não humanos nessa prática. Para a análise dos dados foi utilizado as orientações do framework proposto por Bispo (2015)Bispo, M. S. (2015). Methodological reflections on practice-based research in organization studies. BAR: Brazilian Administration Review, 12(3), 309-323. doi:10.1590/1807-7692bar2015150026
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para o processo de análise de dados nos estudos sob a abordagem das teorias da prática. O framework foca na identificação de atividades que em conjunto formam as práticas sociais. Estas práticas devem ser analisadas em etapa posterior em relação ao objetivo de pesquisa proposto inicialmente (Bispo).

O primeiro passo para a análise dos dados foi uma revisão de todas as informações coletadas na pesquisa: notas de campo, anotações de conversas informais, gravações de momentos em campo, fotografias e imagens, bem como as reflexões feitas durante o processo de acesso aos dados. Apesar da reunião de todos os dados da pesquisa só ser possível ao fim do período de campo, esse processo de análise teve início desde os primeiros dias em campo. O passo seguinte envolveu o tratamento dos dados, por meio das transcrições e categorização das entrevistas e notas de campo, bem como das análises das imagens capturadas. A partir disso, buscou-se a identificação das principais atividades que formam o conjunto de práticas que compõem a gestão escolar como uma textura de práticas sociomateriais na escola estudada. Após mapeamento das principais atividades referentes à gestão da escola estudada, buscou-se identificar que práticas eram formadas por esse conjunto de atividades mapeadas.

Nesse sentido, foram identificados os seguintes fragmentos de práticas: prática pedagógica, prática de apoio administrativo e prática do interesse social. Os fragmentos de práticas foram analisados com bases nas abordagens da teoria ator-rede, ciência e tecnologia e da estética organizacional a partir dos elementos-chave: (a) noção de agência dos atores e das relações heterogêneas na (re)produção do social; (b) noção de prática social como um emaranhado constitutivo a partir da relação entre humanos e não humanos; e (c) julgamentos estéticos organizacionais.

Além disso, para ajudar na análise e representar como os fragmentos de práticas estão conectados e interagem entre si, utilizou-se o conceito de “textura” de práticas (Gherardi, 2006Gherardi, S. (2006). Organizational knowledge: the texture of workplace learning (Vol. 53). Oxford: Blackwell Publishing.) com o intuito de compreender como se dá o entrelaçamento dessas práticas que constituem a gestão escolar enquanto uma textura de práticas sociomateriais.

A gestão escolar como uma textura de práticas sociomateriais

O principal papel e função social de uma escola é proporcionar o acesso ao ensino de qualidade, formação de alunos e promoção da aprendizagem (Lück, 2009Lück, H. (2009). Dimensões da gestão escolar e suas competências. Curitiba, PR: Positivo.). Nesse sentido, a gestão escolar é entendida como o meio de viabilizar esse processo e torná-lo possível, gerenciando os diversos aspectos que compõem a escola enquanto organização. No entanto, assegurar o desenvolvimento da prática educacional não está restrito apenas a questões como, por exemplo, currículo ou elementos voltados diretamente à formação do estudante, mas também diz respeito à gestão de outros elementos que suportam a ação educacional e a tornam mais complexa e dinâmica. Dessa forma, a gestão escolar é entendida como um entretecer formado por diversos atores humanos e não humanos (gestores, professores, alunos, técnicos administrativos, comunidade, salas de aula, livros etc.), caracterizando-se como um fazer da sociedade, ou seja, a gestão escolar é performada pela ação destes diferentes atores.

Durante o processo de investigação, buscou-se observar quais as principais atividades integrantes da gestão na escola. Apesar de todas as atividades possuírem relação entre si, percebeu-se que em certos momentos boa parte delas estavam associadas a olhares ou dimensões diferentes da gestão, que, para uma melhor apresentação dos dados, optou-se por chamar de fragmentos de práticas pedagógica, fragmentos da prática de apoio administrativo e fragmentos da prática do interesse social. A Figura 1 apresenta o framework analítico que detalha o processo.

Figura 1
Framework do processo de análise de dados baseados em prática

Apesar de representarem certo agrupamento de atividades com as mesmas características, entende-se que esses fragmentos de práticas não podem ser assumidos de maneira isolada. É preciso atenção para o caráter sem fronteira (Tureta & Araújo, 2013Tureta, C., Araújo, B. F. V. B. (2013). Escolas de samba: trajetórias, contradições e contribuições para os estudos organizacionais. Organizações & Sociedade, 20(64), 111-129. doi:10.1590/S1984-92302013000100008
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) da organização escolar e de sua gestão, destacando o entrelaçamento existente entre essas práticas que formam a textura da gestão escolar.

A textura da gestão escolar é constituída, dentro desse território imaginário, por práticas que acontecem de maneira simultânea e que estão em constante interação umas com as outras, o que torna difícil delimitar rigidamente as suas fronteiras (Gherardi, 2006Gherardi, S. (2006). Organizational knowledge: the texture of workplace learning (Vol. 53). Oxford: Blackwell Publishing.; Orlikowski, 2007Orlikowski, W. J. (2007). Sociomaterial practices: exploring technology at work. Organization Studies, 28(9), 1435-1448. doi:10.1177/0170840607081138
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).

Além disso, o termo fragmentos é utilizado para representar os retratos do que foi apreendido durante o estudo, assumindo que seria utópico afirmar que os resultados aqui apresentados capturam totalmente o fenômeno sob investigação. Assim, por meio do conceito de textura, buscou-se compreender a gestão escolar não a partir de dimensões isoladas, mas a partir do entretecer dos fragmentos de prática que estão relacionados entre si e que juntos compõem a gestão escolar como uma textura de práticas sociomateriais.

Fragmentos da prática pedagógica

Lück (2009)Lück, H. (2009). Dimensões da gestão escolar e suas competências. Curitiba, PR: Positivo. argumenta que o principal (não único) objetivo da escola enquanto organização social é a formação (no sentido de Walker, Golde, Jones, Bueschel, & Hutchings, 2008) dos alunos garantida pela promoção da aprendizagem e pela qualidade no ensino. Na escola investigada, o conjunto de atividades que compõem a prática pedagógica na gestão escolar consiste em ações dedicadas a garantir esse objetivo principal e giram em torno de um conjunto de atividades que envolvem planejamento, acompanhamento e avaliação das ações pedagógicas, além do acompanhamento do desempenho de professores e alunos.

No tocante às atividades de planejamento, percebeu-se uma grande ênfase por parte da gestão da escola estudada no que se refere ao Projeto Político Pedagógico (PPP). Um PPP com a cara da escola deve ser fruto das ações, objetivos e valores compartilhados pelos atores que formam a comunidade escolar. Ademais, esse é um documento que materializa um processo social de interação entre atores humanos (pais, professores, alunos, gestores, funcionários, representantes da comunidade) e não humanos (princípios democráticos, LDB, instrumentos de participação) (Leonardi, 2012Leonardi, P. M. (2012). Materiality, sociomateriality, and socio-technical systems: what do these terms mean? How are they related? Do we need them? In P. M. Leonardi, B. A. Nardi, J. Kallinikos (Eds.), Materiality and organizing: social interaction in a technological world (pp. 25-48). Oxford: Oxford University Press.). Durante algumas reuniões foi possível observar que, apesar de um discurso democrático em relação à construção do PPP, a real responsabilidade da construção do documento, em grande parte, fica por conta dos gestores escolares e professores. Os demais membros da comunidade escolar apenas estavam nas assembleias para a votação das ações propostas. Uma possível justificativa para isso foi levantada na reunião que teve como objetivo discutir a proposta da Base Nacional Curricular Comum que, em tese, deveria ser debatida conjuntamente com toda a comunidade escolar, mas que segundo a gestora seria uma situação inviável sob a seguinte justificativa: “quem é o pai ou aluno que vai entender essa discussão?” (Notas de Campo, dezembro, 2015).

Para que o PPP e os outros mecanismos de gestão democrática possam ser percebidos como um elemento que materializa o resultado das interações sociais na escola, e não apenas como meras obrigações institucionais, é preciso que o processo de elaboração seja firmado em estratégias que deem voz a todos os atores da comunidade escolar. Dessa forma, é papel do(a) gestor(a) escolar conduzir esse processo para que todos possam avaliar e propor melhorias ou novos direcionamentos para a escola. Na escola estudada, a participação, principalmente dos pais e representantes da comunidade, ocorre de maneira ainda muito limitada. Nesse sentido, é necessário que a relação entre esses atores e a escola não seja apenas no sentido de prestar contas, repassar informes ou de reclamar sobre atos de indisciplina dos filhos, mas que seja uma relação de troca para que a comunidade escolar se sinta parte desse processo. Diante disso, é importante a utilização de uma linguagem inteligível (Schatzki, 2001Schatzki, T. R. (2001). Introduction: practice theory. In T. R. Schatzki, K. Knorr-Cetina, E. von Savigny (Eds.), The practice turn in contemporary theory (pp. 1-14). New York: Routledge.), ou seja, uma linguagem clara e simples que possa fomentar a participação de todas as representações da comunidade escolar.

Além das ações de planejamento, a prática pedagógica também se preocupa com a gestão dos resultados educacionais (índices de qualidade da educação), que também são elementos abordados na construção do PPP. Os exames e índices de avaliação, tanto em âmbito nacional (Exame Nacional do Ensino Médio – Enem, Índice de Desenvolvimento da Educação Básica – Ideb) como em âmbito estadual (Índice de Desenvolvimento da Educação da Paraíba – IDEPB), funcionam como uma espécie de monitoramento ou prestação de contas da qualidade da educação escolar. Nesse sentido, há uma grande importância dada a estes índices por parte dos órgãos que compõem a gestão educacional (Gerência Regional Ensino e Secretaria de Educação do estado). Ademais, um bom desempenho nesses exames influencia diretamente na percepção de qualidade do ensino e da escola, ou seja, de uma boa gestão.

A proposta dessa discussão não é condenar a utilização de mecanismos de mensuração que visam a qualidade da educação, mas procurar discutir o julgamento de uma gestão como boa ou ruim apenas pela frieza e limitações de indicadores. Ademais, a educação é constituída por múltiplas interações e atravessa diversas relações visíveis, opacas ou até mesmo invisíveis (Fenwick et al., 2011Fenwick, T., Edwards, R., Sawchuk, P. (2011). Emerging approaches in educational research: tracing the socio-material. London: Routledge.). A gestão escolar acompanha a complexidade e a incerteza desse contexto, o que dificulta a mensuração da sua qualidade por meio de notas ou escalas padronizadas. Esse contexto de complexidade e incerteza fica evidenciado na escola estudada em aspectos como: turmas com muitos alunos (principalmente no Ensino Fundamental), a maioria dos alunos possui um perfil socioeconômico variando de baixo a muito baixo, má estrutura física, indisciplina dos alunos, violência, drogas, conflitos de interesses entre funcionários, pouca participação dos pais, dentre outros aspectos que caracterizam a gestão da escola como uma prática situada (Notas de Campo, agosto, 2015).

Em conversa com um dos professores, ele relatou sua perspectiva sobre o impacto da gestão por índices e a cobrança exercida pelos órgãos da gestão educacional:

Um resultado positivo em uma avaliação como essa, ela é estimulante, né?. . . Ela é estimulante para o aluno . . . Porque assim, enfim o aluno começa a se sentir confiante . . . Os professores começam a perceber que seu trabalhado está dando resultado, né? . . . E isso se transforma em propaganda positiva para a escola . . .. E a propaganda positiva é tudo que a secretaria de educação quer ouvir. . . Às vezes eles não fizeram nada para melhorar as coisas aqui, mas aí pega bem para eles lá . . ..

Um resultado negativo. . . É desestímulo ao aluno, é o professor perguntando “onde foi que eu errei?” . . . E a escola sente, a Secretaria de Educação começa a “cozinhar o juízo” da diretora e da vice-diretora: “E aí o que vocês podem fazer para melhorar?” . . . Aí você sabe, né? A pressão sobre eles vem pra cima de nós, e a pressão sobre nós vai pra cima do aluno [risos]. (Professor 1, 2015)

Percebe-se o caráter top-down que a gestão da educação assume nesse contexto. Os gestores são cobrados por parte dos órgãos controladores que, por sua vez, fazem com que essa cobrança recaia sobre os professores e alunos. Este modelo é prejudicial para a gestão da escola, pelo fato de que o foco no desenvolvimento da aprendizagem e cidadania dos alunos e nas demandas específicas da comunidade ficam em segundo plano, cedendo espaço para um modelo de gestão feito para cima, na busca de mostrar resultados ou prestar contas para os órgãos controladores. Na contramão, pensar a gestão escolar como uma prática situada (Gherardi, 2006Gherardi, S. (2006). Organizational knowledge: the texture of workplace learning (Vol. 53). Oxford: Blackwell Publishing.) evidencia a deficiência desse tipo de gestão considerada como mera parte de uma estrutura maior, passiva de cobranças e reprodução de normas e orientações, sugerindo que a escola deve ser vista como estando inserida em um contexto macrossocial que leva em consideração seu entorno normativo, social, econômico e cultural (Junquilho et al., 2012Junquilho, G. S., Almeida, R. A., Silva, A. R. L. (2012). As “artes do fazer” gestão na escola pública: uma proposta de estudo. Cadernos EBAPE.BR, 10(2), 329-356. doi:10.1590/s1679-39512012000200006
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).

Outro ponto que envolve o aspecto pedagógico da gestão escolar é o acompanhamento dos professores, no sentido de monitorar e oferecer suporte ao desempenho do aluno e da atividade docente. Ao falar sobre o acompanhamento do desempenho acadêmico do docente, a vice-gestora reconhece que tem bastante dificuldade pelo fato de não possuir, em sua visão, um corpo técnico adequado (pedagogo, supervisor e coordenador pedagógico) que assuma essa função, recaindo essa responsabilidade integralmente para os gestores. Segundo ela, esta situação dificulta o acompanhamento dos professores sem o apoio de uma equipe especializada. Contudo, mais uma vez tal percepção evidencia uma gestão burocrática que desconsidera o contexto, visto que na escola há duas pedagogas que atuam exclusivamente com um número bem reduzido de alunos com necessidades especiais e que poderiam assumir o acompanhamento dos professores, visto que durante as visitas foi possível notar tempo ocioso significativo dessas profissionais.

Quanto ao desempenho dos professores, alguns aspectos podem ser destacados como suscetíveis para o desestímulo e, por vezes, a falta de compromisso com a profissão. Destaca-se a falta de motivação para inovar na prática docente, formação continuada, frustração com as condições de trabalho etc. Alguns trechos de conversas com professores evidenciam esses desafios inerentes à prática docente no contexto estudado:

Já faz três anos que eu me dedico aqui. . . [escola] . . . mas eu já cheguei a trabalhar em duas escolas ao mesmo tempo. . . e é uma experiência horrível . . . tem muitos professores aqui que ensinam aqui e na prefeitura, ensinam aqui e em escolas particulares pra complementar [a renda] . . . eu acho complicado demais você se dedicar a duas instituições. . . aí onde é que fica o seu tempo para o ócio produtivo? . . . pra você ler, pra você pensar a sua prática, pra você planejar as suas ações?

Não temos infraestrutura . . . se a gente precisa passar um vídeo . . . às vezes a televisão tá quebrada, às vezes falta um cabo, às vezes é um controle que tá sem pilha, né . . . você precisa levar os estudantes para um trabalho de campo. . . você tem que dar seu jeito. . . às vezes a escola não tem uma máquina para fazer cópias da prova, você tem que tirar do seu próprio bolso . . . então, daí você vai vendo . . ..

Eu nunca imaginei que ia pegar uma briga em sala de aula com cadeiras “voando” . . . isso não se aprende na universidade. (Professor 1, 2015)

A partir das falas percebe-se como alguns atores não humanos exercem agência (Latour, 2005Latour, B. (2005). Reassembling the social: an introduction to actor network theory. Oxford: Oxford University Press.) na prática docente como a remuneração e a estrutura de trabalho, neste caso como limitadores do exercício da profissão. Diante disso, coloca-se em xeque alguns aspectos da atuação docente.

Diante disso, os fragmentos da prática pedagógica apresentados conectam-se à prática da gestão escolar, buscando atender os aspectos relacionados à função social da escola de oferecer ensino de qualidade aos alunos, assim como orientando as ações da comunidade escolar para a promoção da aprendizagem e formação dos alunos.

Fragmentos da prática de apoio administrativo

Apesar de todas as práticas envolverem aspectos de caráter administrativo, os fragmentos de prática denominados neste trabalho como apoio administrativo envolvem atividades que exigem maior controle, como é o caso da gestão de recursos financeiros e materiais. São atividades que também exigem tomadas de decisão para resolução de problemas com pessoas (indisciplina de alunos, gestão de pessoas, demanda dos pais de alunos), assim como para atividades tidas como burocráticas (organização de registros e documentação escolar). São as atribuições que mais causam impacto no(a) gestor(a) escolar ao assumir a sua função. O fato de se deparar com a incumbência de prestar contas, tomadas de preço, seleção de fornecedores, gestão de compras, dentre outras atividades que pertencem a uma esfera mais gerencial, coloca o(a) gestor(a) escolar em uma situação, por vezes, desconfortável pelo fato de, na maioria dos casos, essas atividades fugirem das competências de sua formação original como pedagogo ou licenciado.

Apesar de a promoção do ensino ser a atividade-fim de uma escola, uma boa estrutura se faz necessária (papel, material de limpeza, material higiênico, merenda, copos, recursos didáticos, dentre outros) para que as atividades aconteçam, ou seja, a condução das atividades escolares só é possível pelo suporte desses elementos materiais. Nesse sentido, no que tange à gestão de recursos materiais e financeiros, os principais programas que financiam o funcionamento da escola estudada são o Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) e o Plano Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). O PDDE é destinado, sobretudo para as despesas com custeio (manutenção da escola) e capital (aquisição de patrimônio). Já o PNAE é responsável pelo repasse da verba destinada à alimentação dos alunos. Toda a verba é repassada diretamente para a escola e gerido pela gestão da escola juntamente com o conselho escolar. Contudo, alguns problemas são relatados pela gestora no que se refere ao repasse de recursos e que influenciam diretamente na gestão da escola: (a) atraso do repasse das verbas; (b) insuficiência dos recursos; e (c) autonomia limitada na aplicação dos recursos.

O atraso ou a ausência de recursos financeiros (elemento não humano) impacta diretamente a gestão e o funcionamento da escola. Na ausência de recursos, a alternativa é solicitar a intervenção da secretaria estadual de educação por meio de ofícios. “Manda um ofício, agora eles atenderem é que tá difícil. . . mas, a gente envia os ofícios, né?”, relatou a gestora (2015). Segundo a gestora, o fato de enviar os ofícios mesmo sabendo que a possibilidade de serem atendidos seja difícil, explica-se por ser uma maneira de se resguardar de alguma cobrança futura, ou seja, o elemento não humano, neste caso, o ofício (que por vezes é entregue pessoalmente e outras por e-mail) funciona como uma espécie de comprovante de que os pedidos foram solicitados e que a gestão da escola buscou resolver o problema no seu aspecto burocrático.

Em uma das visitas de campo, notou-se certa preocupação da gestora com algumas alunas que estavam registrando fotos do banheiro feminino, que se encontrava em condições precárias, para compartilhar na rede social Facebook como um ato de reivindicação. Contudo, segundo a gestora, diversas solicitações e ofícios já tinham sido enviados à Gerência Regional de Ensino (GRE) relatando o problema. Ao entrar em contato com a GRE e relatar o caso, de imediato foi enviada uma equipe da secretaria para fazer a manutenção do banheiro (Notas de Campo, setembro, 2015). Percebe-se que nessa situação, a agência do elemento não humano tecnológico (Bruni, 2005Bruni, A. (2005). Shadowing software and clinical records: on the ethnography of non-humans and heterogeneous contexts. Organization, 12(3), 357-378. doi:10.1177/1350508405051272
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) Facebook teve mais impacto do que a própria solicitação da diretora. Esse fato nos chama a atenção para como a prática da gestão escolar se conecta com a prática da gestão política. Neste caso, a utilização do Facebook como um instrumento de resistência propaga rapidamente reinvindicações dos alunos, já que consequentemente recaem cobranças e questionamentos da população sobre as responsabilidades do Estado.

Quanto à insuficiência dos recursos, a gestora afirma que:

O dinheiro da merenda é de acordo com o censo [escolar] do ano anterior. . . no ano anterior nós tínhamos oitocentos alunos, esse ano nós temos mil cento e setenta. . . mas a gente tem que dar comida a esses mil e poucos, com o dinheiro. . . com a verba para oitocentos, entendesse? . . . e é trinta centavos por aluno . . . centavos [ênfase]! (Gestora escolar, 2015)

Durante o período de condução do shadowing, a gestora da escola falou sobre o atraso do recurso do PDDE: “a gente tá ainda com resquício da primeira parcela de 2014. . . de 2014, viu? a gente não tá com 2015 não, viu?”. Com o atraso dos recursos a escola fica impossibilitada de realizar determinadas ações (compra de material de escritório, material de limpeza, material higiênico, pequenas manutenções) por falta de recursos (Notas de Campo, setembro, 2015).

Percebe-se novamente a influência dos números na gestão de uma escola. O número de alunos que a escola possui se reflete na verba que ela vai dispor no ano seguinte, ou seja, quanto mais alunos a escola tiver maior será o repasse do recurso. Contudo, se houver um aumento considerável de um ano para o outro, a escola pode ter dificuldades com a gestão de seus recursos, como no caso da fala da gestora, tendo que fornecer alimentação para 1.170 alunos com a verba destinada a oitocentos alunos. Além do atraso e da insuficiência dos recursos, a gestão da escola aponta a pouca flexibilização existente na aplicação dos recursos. Do repasse recebido, obrigatoriamente 80% devem ser destinados a despesas com custeio (manutenção da escola) e 20% para capital (aquisição de patrimônio). Tomando como guia essas porcentagens, a comunidade escolar decide como irá aplicar o dinheiro conforme as demandas da escola.

Nesse sentido, Paro (2010)Paro, V. H. (2010). A educação, a política e a administração: reflexões sobre a prática do diretor de escola. Educação e Pesquisa, 36(3), 763-778. doi:10.1590/S1517-97022010000300008
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argumenta que os esforços despendidos para remediar tais insuficiências dificultam a construção de relações mais participativas e democráticas entre a comunidade escolar. Além disso, percebe-se que a participação dos gestores e da comunidade escolar nesse processo se torna o que Silva (2005)Silva, L. C. F. (2005). Estado e políticas de gestão financeira para a escola pública: a autonomia da escola no PDDE (Master thesis). Universidade Federal do Pará, Belém, PA. chama de participação operativa, ou seja, não possui caráter político de decisão, mas apenas operacional. Dessa forma, a descentralização que ocorre não é de responsabilidade ou decisão, e sim de atividades operativas e executoras (Silva).

Diante disso, os fragmentos da prática de apoio administrativo apresentados, de maneira geral, se conectam com a prática da gestão escolar já que se trata de atender os aspectos que dão suporte ao funcionamento da escola, que consiste em garantir uma estrutura adequada, a correta aplicação e gestão dos recursos financeiros e materiais, além de cuidar da gestão das pessoas que compõem o quadro de funcionários da escola.

Fragmentos da prática do interesse social

A prática da gestão com a comunidade envolve diversas questões e aspectos que atravessam os muros da escola e que evidenciam como o ambiente escolar e, consequentemente, sua gestão são influenciados pelo contexto em que a organização escolar está inserida.

Na escola investigada, o cotidiano da gestão escolar é marcado pela necessidade de se lidar com aspectos que vão além das práticas pedagógicas e administrativas, como, por exemplo: violência, drogas, indisciplina, acessibilidade, participação dos pais, integração com a comunidade, dentre outras demandas. Nesse sentido, percebe-se o quão amplo é a prática da gestão escolar e como ela é influenciada pelo seu entorno, exigindo da gestão diferentes responsabilidades de acordo com o contexto.

Como parte da sua comunidade, a escola estudada sofre com o contexto em que está inserida. A principal prática que reflete isso é a presença de menores infratores, conhecidos popularmente na região como “môfi”, que pulam os muros da escola durante o período de aulas. A principal preocupação é que os “môfis” entram na escola para usar drogas na quadra e em alguns casos acabam aliciando alguns alunos menores para fazer pequenos furtos de celulares.

Segundo a gestora, os menores encontram na escola um espaço livre da ação da polícia para atuar. Ainda, segundo ela, os menores pertencem a grupos criminosos que atuam nas comunidades vizinhas. O grupo criminoso a que a gestora se refere se autointitula como “Okaida” ou “OKD” (forma abreviada adotada pelo grupo), que faz referência ao grupo fundamentalista islâmico Al-Qaeda (Notas de Campo, julho, 2015).

A utilização de símbolos também faz parte da caracterização de certas práticas, pelo fato de carregarem consigo uma série de valores e significados (Leonardi, Nardi, & Kallinikos, 2012). Nesse sentido, os menores membros da “Okaida” picham as suas identificações como forma de demarcar o território de atuação do grupo. A Figura 2 apresenta a presença desses menores infratores e os símbolos da presença do grupo criminoso na escola. No primeiro momento o porteiro da escola tenta negociar a saída do menor. Na segunda e terceira imagens aparecem as pichações feitas nos muros da escola.

Figura 2
Presença dos “môfis” na escola e pichações de grupos criminosos

A maneira de se vestir também é uma caracterização do grupo. O modo como usam o boné, pulseiras, cordões e tatuagens são exemplos de símbolos utilizados para representar a identidade do grupo. As tatuagens, por exemplo, além de serem uma maneira de identificação como membro do grupo, estão relacionadas também à função que o indivíduo exerce dentro do grupo (Notas de Campo, julho, 2015).

A presença desses menores e as suas práticas dentro do ambiente escolar incomodam gestores, alunos e professores. Alguns alunos relataram como se sentem com a presença destes:

Eu particularmente acho errado. . . eu me sinto incomodada, porque os meninos usam droga na frente dos alunos. . . maconha. . . assim. . . é mais maconha. . . a gente fica com medo de ser roubado, teve gente que já foi roubado aqui. . . tem vez que a gente usa o celular entre as pernas, assim ó [apontando], porque eles ficam olhando. . . e quando a gente sai daqui a gente não sabe se a gente se “tromba” com ele . . . a maioria é daqui do bairro mesmo. É muito constrangedor, porque a gente tá na hora do intervalo e a gente não tem o “nosso” intervalo. (Aluno 2, 2015)

Como forma de identificar esses menores ou de ao menos evitar que estes se misturem entre os alunos, a gestora exige a utilização do fardamento escolar para a identificação do aluno. Nesse sentido, o fardamento, além de um símbolo (Leonardi et al., 2012Leonardi, P. M., Nardi, B. A., Kallinikos, J. (Eds.). (2012). Materiality and organizing: social interaction in a technological world. Oxford: Oxford University Press.) que identifica o aluno como tal, assume uma característica que põe em destaque quem não o utiliza (Strati, 2007Strati, A. (2007). Organização e estética. Rio de Janeiro, RJ: FGV Editora.). Essa foi a maneira encontrada pela gestão de evidenciar a presença dos menores que não são alunos e a partir disso tomar as providências cabíveis.

Além dos aspectos discutidos até aqui, a pouca participação da comunidade escolar ficou bastante evidente durante a pesquisa, como foi apresentado nas seções anteriores no que tange à construção do PPP e à ação do conselho escolar. Outro ponto pode ser destacado pela falta de participação dos pais e responsáveis na escola.

As reuniões com os pais e mestres acontecem sempre após o fim de cada bimestre e têm como intuito proporcionar um momento em que os pais possam conversar com os professores sobre a situação dos seus filhos. Comparadas com a quantidade de alunos matriculados na escola, as reuniões contam com um número ainda baixo de participantes. Além disso, a quantidade não reflete a qualidade da participação (Notas de Campo, setembro, 2015).

Para fazer esse contato com os pais que pouco frequentam a escola e que na maioria das vezes são os responsáveis pelos alunos com mau comportamento, a vice-gestora entra em contato com cada um desses pais ou responsáveis pelo telefone. A Figura 3 apresenta um caderninho que ela utiliza como organização para o contato com os pais.

Figura 3
Caderno de anotações com informações do conselho de classe

Como pode ser observado na Figura 3, o caderno utilizado pela vice-gestora contém uma lista de alunos elaborada pelos professores após a reunião do conselho de classe, realizada ao fim de cada bimestre, para que possam entrar em contato com os responsáveis, alertá-los sobre a situação do aluno e solicitar o comparecimento na escola. Para cada aluno é atribuído um status da sua situação na escola. Os mais utilizados são: “sumiu”, “turista”, “falta e sem notas”, “sem notas” e “não assiste aula”. Para título de esclarecimento, o aluno conhecido pelos professores como “turista”, segundo os participantes, são os alunos que vão à escola apenas para “passear” e não assistem aula. O caderno, nesse contexto, materializa a atividade de acompanhamento dos alunos por parte da gestão, que segundo a vice-gestora é utilizado pela praticidade do manuseio (Notas de campo, setembro, 2015).

O processo de envolvimento dos responsáveis nas atividades das organizações escolares ainda é um desafio que exige o estabelecimento de plataformas de diálogo que busquem aproximar a escola e a família a partir das características do seu contexto (Veloso, Craveiro, & Rufino, 2012). Nesse sentido, para que isso seja bem operacionalizado é interessante conhecer a realidade dos responsáveis, como, por exemplo: ter ciência do horário de trabalho dos responsáveis, promover a participação no planejamento das atividades, permitir que opinem na definição de temas e promover momentos de avaliação para sintetizar o que foi discutido e para que possam opinar sobre possíveis sugestões, no sentido de reafirmar o espaço da família na escola.

A partir dos fragmentos da prática apresentados é importante perceber como a escola e, consequentemente, a gestão escolar se relacionam com o seu entorno, evidenciando o que Tureta e Araújo (2013)Tureta, C., Araújo, B. F. V. B. (2013). Escolas de samba: trajetórias, contradições e contribuições para os estudos organizacionais. Organizações & Sociedade, 20(64), 111-129. doi:10.1590/S1984-92302013000100008
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chamam de caráter sem fronteiras da organização. Ademais, a prática não acontece de maneira isolada, mas se conecta a outras práticas, como, por exemplo, a gestão pública nas esferas da saúde, segurança e desenvolvimento social.

Enlaces da textura da gestão escolar

Ao investigar como a prática da gestão acontece no cotidiano da escola estudada – por meio do shadowing, ITTD e do zooming in – e como ela se relaciona com outras práticas do seu entorno – por meio do zooming out –, percebeu-se que, ainda que exista uma forte presença de elementos burocráticos de gestão administrativa e pedagógica, a gestão escolar não ocorre de forma normativa. Pelo contrário, ela assume diversas nuances que permitem que a gestão se materialize de diferentes formas para a comunidade escolar.

A opção por utilizar a metáfora da textura de práticas para compreender a gestão escolar teve como principal intuito representar que a prática da gestão escolar não acontece em dimensões separadas (administrativo/pedagógico). Mas que é constituída por diversas atividades e práticas que acontecem de maneira simultânea e entrelaçadas dentro de um território imaginário e que estão em constante interação umas com as outras, o que torna difícil delimitar rigidamente as suas fronteiras (Gherardi, 2006Gherardi, S. (2006). Organizational knowledge: the texture of workplace learning (Vol. 53). Oxford: Blackwell Publishing.; Orlikowski, 2007Orlikowski, W. J. (2007). Sociomaterial practices: exploring technology at work. Organization Studies, 28(9), 1435-1448. doi:10.1177/0170840607081138
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).

Esses enlaces são formados por pontos comuns entre os fragmentos de práticas investigados. Durante as observações e mais intensamente no processo de análise dos dados, muito se refletiu acerca do aspecto político como um elemento transversal às práticas que compõem a gestão escolar, ou seja, um ponto em comum que permite o entrelaçamento entre as práticas que compõem a textura da gestão escolar.

Alguns pontos comuns identificados por meio da análise sociomaterial das práticas que podemos destacar são: (a) as diferentes percepções de qualidade (“boa escola”); (b) as estratégias de gestão utilizadas no cotidiano da escola; e (c) o elemento político como pano de fundo para as ações e interações entre os atores.

No que se refere às diferentes percepções de qualidade, percebe-se que a “boa escola” se materializa de maneira diferente para os diferentes atores. Na seção em que são apresentados os fragmentos da prática pedagógica, evidencia-se a noção de qualidade da escola mensurada a partir do desempenho dos alunos nos exames externos de avaliação (Enem, Ideb etc.). Dessa forma, o desempenho de professores e a qualidade da gestão na oferta do ensino não leva em consideração os aspectos contextuais e cotidianos da gestão, como, por exemplo, os problemas com a carreira dos professores, infraestrutura e recursos.

No entanto, a boa escola é apresentada pelos participantes (principalmente os alunos) nas seções de fragmentos da prática do apoio administrativo e do interesse social, como uma escola que oferta condições de funcionamento – como apresentado no caso da ameaça de denúncia feita pelas alunas sobre as más condições do banheiro feminino, ou ainda no caso da insuficiência e atraso dos recursos para a alimentação e custeio da escola – e de segurança – como nos relatos sobre a presença de menores infratores. Assim, como destacam Favero e Meier (2013)Favero, N., Meier, K. J. (2013). Evaluating urban public schools: parents, teachers, and state assessments. Public Administration Review, 73(3), 401-412. doi:10.1111/puar.12022
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, a comunidade escolar (pais, professores, alunos etc.) consegue ter uma avaliação da qualidade da escola a partir de elementos que os indicadores de desempenho não conseguem.

Quanto às estratégias de gestão adotadas frente aos desafios específicos da gestão da escola estudada, destacamos: (a) a ressignificação do fardamento escolar não apenas como uma simples identidade escolar, mas como uma estratégia para evidenciar os menores infratores que acessam a escola para outros fins; e (b) o acompanhamento do desempenho dos alunos pelo conselho escolar, diante da baixa frequência dos pais nas reuniões da escola, por meio do contato direto por telefone com os pais e responsáveis. Estas estratégias foram apresentadas na seção de fragmentos da prática do interesse social, no entanto, têm forte ligação com as práticas de apoio administrativo e pedagógico, e possuem a presença de elementos não humanos como agentes na elaboração e execução dessas estratégias.

Para além disso, foi possível observar que, em boa parte das interações entre os atores, o elemento político atuava como pano de fundo para essas ações. Neste trabalho, entende-se a política como uma ciência que tem por objeto o bem-estar individual e coletivo. Assim, o Estado é uma necessidade humana pelo fato de que o homem é um animal social e político por natureza (Aristóteles, 1998Aristóteles. (1998). A política (2nd ed.). São Paulo, SP: Martins Fontes.). Nesse sentido, o homem possui uma necessidade natural de conviver em sociedade. Dessa forma, o pensamento aristotélico sobre a política se aproxima dos pressupostos das teorias da prática pelo fato de propor uma ideia de filosofia prática, em que o conhecimento emerge da ação e não é idealizado ou especulado, como fazem outros filósofos, por exemplo Platão.

Souza (2012)Souza, Â. R. (2012). A natureza política da gestão escolar e as disputas pelo poder na escola. Revista Brasileira de Educação, 17(49), 159-174. doi:10.1590/S1413-24782012000100009
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destaca o forte elemento político presente no espaço escolar que se caracteriza a partir de diversas disputas e tensões. A política, tratada aqui no contexto da gestão escolar, atua como um espaço onde ocorrem as interações e negociações entre os atores e tem como objetivo a harmonização dos conflitos. Contudo, nem sempre uma solução comum é a melhor solução, devido à diversidade de interesses existentes nesse contexto (órgãos controladores, gestores, professores, pais, alunos), mas representa a solução possível diante do contexto.

Na prática da gestão pedagógica o elemento político ficou evidenciado no que tange às atividades que envolvem os exames e índices de avaliação da educação. O fato de os órgãos controladores darem bastante ênfase ao desempenho da escola nos exames de avaliação acaba gerando uma cobrança para a gestão da escola e se reflete na ação dos professores e até mesmo nos próprios alunos. Isso é evidenciado na fala do professor que diz “a pressão sobre eles [gestores], vem pra cima de nós, e a pressão sobre nós vai pra cima do aluno” (Professor 1, 2015). Diante disso, percebe-se como a gestão da escola recebe influência de diversos elementos e entidades, neste caso dos órgãos controladores (Secretária Estadual de Educação e Gerência Regional de Ensino), que acabam influenciando nas ações do cotidiano da gestão da escola.

Por sua vez, na prática de apoio administrativo, a presença do aspecto político se faz presente principalmente no que tange à gestão de pessoas. Os gestores alegam dificuldades no gerenciamento de pessoas, principalmente na relação entre efetivos e prestadores de serviço. Segundo os gestores, os funcionários efetivos possuem a segurança da estabilidade do cargo, e isso acarreta alguns momentos certa falta de preocupação, principalmente no que tange à pontualidade e à frequência. Já os funcionários prestadores de serviço possuem uma preocupação maior com o desempenho das atividades, devido à instabilidade no cargo e pelo fato de, na maioria das vezes, terem sido indicados por políticos para ocupar o cargo. Nesse sentido, a gestão da escola tem de administrar diferentes situações provocadas pela postura ocasionada por diferentes interesses e influências de elementos externos (políticos).

Por fim, os fragmentos de prática do interesse social evidenciam o aspecto político quando apresentam a gestão escolar como uma prática que não acontece de maneira isolada, ou seja, quando destacam que a prática da gestão escolar está ligada a outras práticas maiores, como gestão da segurança, desenvolvimento social e saúde, o que comprova que a textura da gestão escolar possui conexões com outras texturas formadas por práticas diferentes, que se conectam no entretecer da construção social.

A Figura 4 apresenta a proposta de textura de práticas da gestão escolar adotada neste trabalho a partir do contexto investigado.

Figura 4
Textura de práticas da gestão escolar

A Figura 4 representa a composição dos fragmentos de práticas identificados durante a pesquisa e que retratam a prática da gestão escolar no contexto estudado, composto pelos fragmentos da prática pedagógica, apoio administrativo e interesse social. É importante destacar que a Figura 4 é fruto de um processo de abstração dos autores a partir do objeto e do fenômeno estudado. Nesse sentido, a figura não tem como objetivo definir a gestão escolar como algo fechado, mas tornar concreto e inteligível ao leitor como as práticas se inter-relacionam na constituição da prática da gestão escolar no contexto estudado.

Nesse sentido, a partir da reflexão sobre os entrelaçamentos que formam a textura de práticas da gestão escolar, buscou-se evidenciar que a gestão escolar está longe de ser algo prescrito, mas é uma ação performada por diversos atores e interesses que buscam, por meio de suas interações, uma solução comum que represente o “melhor” para todos, mesmo que não seja por vezes o idealizado.

Conclusões

O objetivo desta pesquisa foi analisar a prática da gestão escolar à luz da sociomaterialidade em uma escola pública de uma capital localizada no Nordeste do Brasil. Nesse sentido, retomando o problema que norteou esta pesquisa, isto é, como pensar uma alterativa de gestão escolar para além da posição funcionalista dominante nos estudos e na prática do campo, entende-se, a partir da experiência empírica, a prática da gestão escolar como um fenômeno dinâmico, situado e que assume várias nuances que dependem da ação de diversos atores (humanos e não humanos) e do contexto de interação entre eles.

Ou seja, compreender a prática da gestão escolar à luz da sociomaterialidade consiste em conceber a gestão para além de um processo prescritivo e racional, como um fenômeno processual e dinâmico que é produzido, reproduzido e modificado cotidianamente. Por meio da análise dos fragmentos de prática apreendidos durante a pesquisa, foi possível perceber como os elementos não humanos (físicos e não físicos) participam das práticas da gestão escolar, seja como elementos que suportam as práticas, por exemplo os recursos materiais e financeiros, seja como mediadores da relação entre os atores.

De modo geral, acredita-se que esta pesquisa contribui teoricamente para o entendimento das organizações escolares como acontecimento (Schatzki, 2001Schatzki, T. R. (2001). Introduction: practice theory. In T. R. Schatzki, K. Knorr-Cetina, E. von Savigny (Eds.), The practice turn in contemporary theory (pp. 1-14). New York: Routledge.), e que por isso a gestão destas não pode estar pautada por visões atomizadas e dicotômicas (pedagógico/administrativo e teoria/prática). Além disso, esta pesquisa também contribuiu para fomentar o entendimento da gestão escolar como uma prática sociomaterial, superando a miopia (existente tanto nos estudos em administração como em educação) referente à presença da materialidade e à importância dos elementos não humanos como atores que constituem e performam a prática.

A partir da análise empírica, podemos inferir que a prática da gestão escolar é constantemente (re)configurada a partir da agência dos elementos não humanos, seja pela presença ou, em muitos casos, pela ausência desses atores. Nesse sentido, este estudo possui implicações práticas e teóricas já que pensar a gestão escolar como uma prática sociomaterial permite: (a) tanto ao praticante quanto ao pesquisador compreender os aspectos que envolvem a organização da prática e reconhecer os atores humanos e não humanos que nela estão envolvidos para, a partir disso, pensar possibilidades de intervenção, mudanças e melhorias da gestão; (b) chamar a atenção para o fato de que a gestão escolar não acontece sozinha, mas deve estar ancorada em outras práticas e entidades, formando uma textura de práticas que envolvem a gestão escolar; e (c) compreender que a qualidade da gestão de uma escola não envolve apenas o gerenciamento de indicadores, mas compreende outros aspectos situados e inerentes ao cotidiano da escola.

Além disso, esta pesquisa contribui para aproximar áreas como a administração e os estudos organizacionais de temas relevantes para a sociedade como a gestão escolar. Uma vez que, como apresentam Oliveira e Vasques-Menezes (2018) em revisão da literatura sobre a produção científica sobre gestão escolar entre 2005 e 2015, o tema possui seus estudos predominantemente desenvolvidos por pesquisadores da área da educação. Hallinger e Kovačević (2019)Hallinger, P., Kovačević, J. (2019). A bibliometric review of research on educational administration: science mapping the literature, 1960 to 2018. Review of Educational Research, 89(3), 335-369. doi:10.3102/0034654319830380
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também destacam os journals da área de educação como mainstream nos estudos em administração da educação. Nesse sentido, buscamos também apresentar empiricamente a possibilidade da adoção das teorias da prática como alternativa para a investigação de grandes temas da sociedade.

Contudo, aponta-se como limitação desta pesquisa a grande dinamicidade das ações que envolvem a gestão escolar e a ocorrência de diversas atividades ao mesmo tempo e em lugares diferentes, o que talvez tenha contribuído para que, em alguns momentos, certas ações ou evoluções da prática não fossem discernidas pelos pesquisadores. Por exemplo, enquanto os pesquisadores acompanhavam as gestoras em uma das atividades externas à escola (reuniões, seminários) outros tipos de interações poderiam ocorrer dentro do ambiente escolar sem que isso fosse apreendido.

Acredita-se que, pela gestão escolar representar um campo de práticas, há inúmeros caminhos para a realização de estudos, portanto, são feitas algumas sugestões nesse sentido. Uma das possibilidades poderia ser seguir caminhos já apontados por Fenwick et al. (2011)Fenwick, T., Edwards, R., Sawchuk, P. (2011). Emerging approaches in educational research: tracing the socio-material. London: Routledge. para estudos em educação. Nesse caso se propõe como sugestão para pesquisas futuras o estudo da gestão escolar por meio da lente das diferentes abordagens sociomateriais (teoria da complexidade, teoria da atividade histórico-cultural, teorias de espacialidade, teoria ator rede), considerando suas contribuições particulares. Outra sugestão de pesquisas futuras consiste em adotar a sociomaterialidade como abordagem teórica para o desenvolvimento de pesquisas em gestão da educação, analisando a dinâmica de uma secretaria estadual ou municipal de educação, ou até mesmo de alguma gerência regional de ensino. Além disso, outra possibilidade de estudo seria compreender os processos de aprendizagem à luz da abordagem sociológica, dos gestores e docentes, visto que muitos não vivenciam aspectos característicos do cotidiano profissional durante sua formação e acabam tendo que aprender na prática.

Agradecimentos

Os autores agradecem ao editor associado e aos revisores pelas contribuições que possibilitaram a melhoria do artigo durante o processo de revisão por pares.

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  • Walker, G. E., Golde, C. M., Jones, L., Bueschel, A. C., Hutchings, P. (2008). The formation of scholars: rethinking doctoral education for the twenty-first century. San Francisco: Jossey-Bass.
  • Verificação de plágio
    A O&S submete todos os documentos aprovados para a publicação à verificação de plágio, mediante o uso de ferramenta específica.
  • Disponibilidade de dados
    A O&S incentiva o compartilhamento de dados. Entretanto, por respeito a ditames éticos, não requer a divulgação de qualquer meio de identificação dos participantes de pesquisa, preservando plenamente sua privacidade. A prática do open data busca assegurar a transparência dos resultados da pesquisa, sem que seja revelada a identidade dos participantes da pesquisa.
  • Financiamento
    Os autores agradecem o apoio financeiro da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (Capes) – Código de Financiamento 001 e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Maio 2021
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2021

Histórico

  • Recebido
    16 Fev 2018
  • Aceito
    05 Dez 2019
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