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Igualitarismo, internacionalização e cidadania

Égalitarisme, internationalisme et citoyenneté

Egalitarianism, internationalization, citizenship

Resumos

O artigo busca argumentar que a internacionalização não vai contra o igualitarismo como projeto político, mas que este só poderá sobreviver a ela se se despir de sua forma social-democrata tradicional. Após apresentar um breve quadro político geral de uma forma alternativa de igualitarismo, descreve algumas políticas promotoras de igualdade que podem ser desenvolvidas num mundo internacionalizado e, finalmente, apresenta algumas implicações deste conjunto de questões para a cidadania. Segundo o autor, o novo igualitarismo requer a existência de uma nova esfera pública, com maior envolvimento direto dos cidadãos na solução de problemas coletivos, o que aponta para a construção de uma democracia mais direta e mais deliberativa, com a transferência de certas responsabilidades consideradas caracteristicamente como atribuições do Estado para redes de arenas deliberativas, tornando menos rígidas as fronteiras entre público e privado. Os argumentos são apresentados de forma abstrata mas o ponto de referência principal (às vezes implícito) do autor são os EUA.

Internacionalização; Igualitarismo; Social-democracia; Cidadania; Democracia deliberativa


L'article cherche à démontrer que l'internationalisation ne va pas à l'encontre de l'égalitarisme en tant que projet politique, mais, plutôt, que l'égalitarisme ne pourra survivre à l'internationalisation que s'il abandonne sa forme sociale démocrate traditionnelle. Après une brève présentation du cadre politique général d'une façon alternative d'égalitarisme, l'auteur décrit certaines politiques qui font la promotion de l'égalité et qui peuvent être développées dans un monde internationalisé. Finalement, certaines implications de cet ensemble de questions par rapport à la citoyenneté sont présentées. Selon l'auteur, le nouvel égalitarisme demande l'existence d'une nouvelle sphère publique, avec une participation directe plus importante des citoyens dans la solution de problèmes collectifs, ce qui indique la construction d'une démocratie plus directe et plus délibérative, incluant le transfert de certaines responsabilités considérées comme étant des contributions de l'État pour des réseaux d'arènes délibératives. Cela rendrait les frontières entre le public et le privé moins rigides. Le principal point de référence (parfois implicite) de l'auteur sont les EUA.

Internationalisation; Égalitarisme; Social Démocratie; Citoyenneté; Démocratie Délibérative


The author argues that internationalization does not undermine egalitarianism as a political project but that egalitarianism can survive internationalization only by getting rid of its traditional social democratic form. He sketches the political framework of an alternative form of egalitarianism and describes some egalitarian policies that might be advanced within that political framework, discussing the implications of these issues for citizenship. According to the author the new egalitarianism proposed requires a new public sphere with citizen involvement in collective problem solving: a more direct and deliberative democracy. The gist of this form of egalitarianism is to advance justice through a new form of politics that involves devolving or decentralizing certain characteristically state responsibilities to networks of deliberative arenas that cut across conventional public-private lines. The arguments are presented in abstract terms, but a principal (sometimes implicit) point of reference throughout is the United States.

Internationalization; Egalitarianism; Social Democracy; Citizenship; Deliberative Democracy


IGUALITARISMO, INTERNACIONALIZAÇÃO E CIDADANIA* * Este artigo se baseia em uma conferência proferida no XXIII Encontro Anual da Anpocs, realizado em Caxambu, MG, em outubro de 1999, a qual, por sua vez, baseou-se em um trabalho conjunto realizado com Joel Rogers e Charles Sabel. Retirei uma parte significativa dos argumentos de um artigo que fiz com Rogers, "Can egalitarianism survive internationalization?", publicado na coletânea Globalization, organizada por Wolfgang Streeck (no prelo), assim como de um artigo que escrevi em parceria com Sabel, "Directly-deliberative polyarchy", publicado no European Law Journal, vol. 3, n o 4, dezembro de 1997, pp. 313-342.

Joshua Cohen

O tema deste artigo é igualitarismo e internacionalização. Pretendo argumentar que a internacionalização não vai contra o igualitarismo como projeto político. Esta é uma perspectiva otimista, mas o pessimismo é um produto de luxo, e nós intelectuais não devemos consumi-lo muito.

Organizei minhas observações em seis etapas. Iniciarei explicando o que denomino de internacionalização e igualitarismo. Logo em seguida, sustentarei que o igualitarismo poderá sobreviver à internacionalização somente se se despir de sua forma social-democrata tradicional. Em terceiro lugar, vou apresentar, muito sucintamente, o quadro político geral de uma forma alternativa de igualitarismo.1 1 Os seus elementos estão descritos em trabalhos que realizei com Joel Rogers sobre "democracia associativa" (termo que já não acho apropriado) e com Charles Sabel sobre "poliarquia diretamente deliberativa". Cf. Cohen e Rogers (no prelo) e Cohen e Sabel (1997). O quarto momento de meu argumento descreverá algumas políticas promotoras de igualdade que podem ser desenvolvidas no contexto político descrito. Em quinto lugar, indicarei por que o internacionalização não prejudica tais políticas. No sexto e último momento, finalmente, concluirei apresentando algumas implicações deste conjunto de questões para a cidadania. O ponto a ser defendido por mim é que o novo igualitarismo delineado aqui requer a existência de uma nova esfera pública: não apenas a arena dispersa de discussão informal a respeito da qual Habermas tem escrito, nem simplesmente uma associação entre confiança mútua e civilidade. O novo igualitarismo requer uma esfera pública com maior envolvimento direto dos cidadãos na solução de problemas coletivos, o que aponta para a construção de uma democracia mais direta e mais deliberativa. Em resumo, requer que o exercício da cidadania se torne mais prático e que os processos de resolução dos problemas se tornem mais cívicos.

Apresentarei meus argumentos em termos bastante abstratos, mas o ponto de referência principal (às vezes implícito) ao longo do texto é o caso norte-americano. Nos EUA existem muitos experimentos interessantes de democracia de deliberação direta — na regulação ambiental, na polícia comunitária, na educação — que podem vir a ser juntar e formar uma nova esfera pública, uma possibilidade especialmente bem-vinda tendo em vista o estado bastante precário da democracia atual.

O problema

Igualitarismo, em meu título, denomina uma família de concepções de justiça que objetivam garantir tanto liberdade, quanto igualdade. Para simplificar a exposição, estipulei uma visão específica de justiça, que compreende liberdades civis e políticas e três tipos de princípios de igualdade: primeiro, um requerimento de igualdade política substantiva, garantindo que os cidadãos, independente de suas posições políticas, tenham oportunidades iguais de influenciar as decisões coletivas; segundo, um requerimento de igualdade de oportunidades real, condenando desigualdades de oportunidade ligadas a diferenças de origem e trajetória social; e terceiro, uma concepção de bem-estar geral que dê prioridade aos indivíduos em piores condições sociais. Muitos de vocês reconhecerão esta visão como uma forma rawlsiana de liberalismo igualitário.

Por internacionalização pretendo me referir a um conjunto de condições econômicas, incluindo a crescente importância de empresas multinacionais com produção geograficamente dispersa, a explosão de investimentos diretos estrangeiros e o movimento financeiro relativamente desimpedido entre as fronteiras.

A afirmação de que há uma tensão profunda entre internacionalização e igualitarismo é corriqueira. O argumento pode ser resumido da seguinte forma: assumamos uma economia de mercado. Na ausência de um arcabouço regulatório apropriado, a justiça não pode ser alcançada: o destino de cidadãos iguais vai refletir as diferenças de origem e trajetória social, de dotes naturais e elementos acidentais tais como boa sorte e habilidades que, por acaso, se adequem às oportunidades do mercado. Mas o argumento continua: um quadro regulatório desenhado para consertar tais injustiças limitaria as escolhas dos investidores, reduziria a sua flexibilidade e elevaria os seus custos. Na ausência de limites estritos sobre a mobilidade dos capitais, a internacionalização significa que os investidores encontrarão provavelmente condições mais desejáveis em algum outro lugar, ou ao menos poderão fazer ameaças críveis de saída para regimes menos regulados.

A força destes três constrangimentos sobre a elaboração e a implementação de políticas afeta necessariamente as sensibilidades políticas comuns. Cidadãos que em outras circunstâncias buscariam soluções coletivas para problemas coletivos serão atraídos para estratégias mais individualistas. A idéia igualitária de que todos deveríamos concordar em compartilhar os destinos de uns com outros se divorciará de qualquer projeto político realista e se reduzirá a uma aspiração utópica moral, sem qualquer conexão política possível.

Sou cético sobre a importância que esta história convencional atribui à internacionalização na explicação da performance econômica, das políticas públicas e da política. Mas não estamos aqui argumentando sobre este ceticismo. As propostas que pretendo defender ainda vão ter considerável força, mesmo se a internacionalização e seus impactos econômicos tiverem uma importância muito maior do que suponha que tenham. Minha discordância central com a história convencional está em sua pressuposição de que a internacionalização força os países a entrarem em uma corrida competitiva na direção de níveis regulatórios cada vez mais baixos — de um sistema com políticas regulatórias e sociais muito pequenas. Se esta premissa é correta, então a internacionalização realmente destruirá a política igualitária. Mas será que ela é verdadeira? A premissa baseia-se na idéia de que um regime de regulação não se pode tornar atrativo o suficiente para reter investidores no lugar onde estão se estes investidores têm mobilidade e outras oportunidades, ou, em outras palavras, expressa a idéia de que um regime de regulação é só custos, sem benefícios. Isto aparenta não ser verdade, ao menos para certos tipos de regulação, o que me traz ao que chamo de "novos igualitarismos".

A essência do novo igualitarismo proposto está em tentar alcançar a justiça igualitária através de uma nova forma de política, que envolve o desenvolvimento e a descentralização de certas responsabilidades consideradas caracteristicamente como atribuições do Estado, principalmente a responsabilidade de resolver problemas coletivos, transferidos, nesta nova articulação, a redes de arenas deliberativas que tornam menos rígidas as fronteiras entre público e privado. Em termos gerais, podemos dizer que esta devolução soluciona dois problemas essenciais ao mesmo tempo: ajuda a (re)criar uma base social de apoio para as práticas igualitárias, além de encorajar o crescimento da aprendizagem social e das capacidades de solução de problemas, elementos fundamentais para trazer a democracia igualitária de volta ao campo das possibilidades práticas. Aplicando diretamente esta idéia ao argumento da internacionalização, podemos afirmar que o crescimento do aprendizado e das capacidades de solução de problemas, alcançado pelo desenvolvimento das redes de solução de problemas, poderia trazer benefícios reais para as empresas privadas, pela provisão auxiliar de bens e serviços que são importantes para a performance econômica. Muitas dessas redes não podem ser produzidas pelas próprias empresas, nem tampouco pelo Estado, como, por exemplo, sistemas eficientes de treinamento e difusão de tecnologia, administração dos mercados de trabalho regionais e uma oferta mais bem coordenada dos serviços de bem-estar social. Se esta hipótese está certa, o novo igualitarismo reduziria os atrativos para a saída por parte das empresas, mesmo no caso de regimes relativamente igualitários, e poderia restabelecer as condições favoráveis para pressionar por soluções cooperativas para problemas comuns.

A antiga solução

Para compreendermos melhor a lógica desta abordagem, vamos nos distanciar um passo atrás agora, e pensar sobre outra forma de projeto democrático igualitário — a social-democracia. Até a primeira metade deste século, a possibilidade de combinar liberdade e igualdade, na linha indicada anteriormente, estava posta apenas em termos teóricos. Mas o surgimento da social-democracia e do Estado do Bem-Estar moderno fortaleceu, na prática, o projeto democrático-igualitário.

A social-democracia era ao mesmo tempo um projeto da classe trabalhadora e um projeto universalista. Oferecia a redistribuição da renda na direção dos trabalhadores e uma divisão de poder limitada entre trabalhadores e capitalistas. O keynesianismo conectou o particular com o universal, ligando os interesses dos trabalhadores a um projeto de interesse social geral. Esta conjunção de universal e particular dependeu de um conjunto de condições conjunturais que incluíam, com maior destaque, um Estado-nação com poder de direção sobre o ambiente econômico no interior do seu território e de organização do capital em um sistema dominado pela produção em massa, e uma economia de grandes empresas em diferentes conglomerados industriais-chave. Em resumo, a social-democracia retirava a base social do seu igualitarismo, primeiro, do Estado, como principal locus de aprendizado coletivo e de solução de problemas e, segundo, de uma classe trabalhadora enraizada na produção em massa.

Todos estes elementos agora mudaram, e as transformações trouxeram importantes implicações para o projeto político igualitário. Em primeiro lugar, o Estado é hoje um aliado com muito menos recursos. A internacionalização é parte da origem desse enfraquecimento, mas transformações nos problemas que o Estado é chamado a resolver também ressaltaram mais visivelmente os limites da competência estatal. Com um leque mais amplo de interesses sociais reconhecidos e menos auto-regulação, o Estado é chamado a regular um campo mais amplo e extenso que no passado. Suas agências freqüentemente não dispõem do conhecimento local necessário para determinar os padrões apropriados ou os meios mais eficientes para a realização de tais tarefas, sendo inadequados, por exemplo, o seu monitoramento e a sua capacidade de imposição, assim como a sua habilidade para administrar soluções que demandem coordenação entre campos de política pública e comunidades de interesse.

Por outro lado, a produção em massa tradicional entrou em colapso, provocando um aumento da heterogeneidade social. A competição entre empresas cresceu significativamente e ocorreram também alterações na organização da produção — maior dinamismo em empresas menores, maior descentralização em empresas grandes, e variação crescente nos termos e condições de trabalho, nas estruturas de carreira e na trajetória ocupacional, assim como nas remunerações —, o que causou uma ruptura na estrutura de ocupações e nas experiências de trabalho que davam base ao sindicalismo industrial tradicional.

Da mesma forma, a própria heterogeneidade política cresceu. Há já uma geração com interesses organizados em torno de questões como justiça racial ou de gênero, autogestão por grupos específicos, direitos de etnias ou meio ambiente, interesses que se têm expressado de forma mais robusta e intensa do que aqueles tradicionamente organizados em torno de classes. Entretanto, nenhuma solidariedade nova parece se originar dessa heterogeneidade de interesses, nem parece haver qualquer base óbvia na vida cotidiana ou na cultura para a sua emergência.

Como conseqüência de todos estes processos, o projeto social-democrata vive um momento muito difícil. A profundidade dos problemas indica a premência da construção de um modelo institucional fundamentalmente diferente, que não derive simplesmente novas instituições e políticas públicas de princípios de justiça. O seu ponto de partida, ao contrário, deve ser levar seriamente em consideração os pontos de ruptura da social-democracia. Isto significa a construção de um modelo institucional que reconstrua as capacidades de solução de problemas coletivos, os controle e reoriente na direção de práticas igualitárias, e descreva as bases sociais de suporte desta prática, assim como da política que pode fazê-la avançar.

A nova solução

A proposta do novo igualitarismo emerge de duas idéias básicas presentes no diagnóstico dos problemas da social-democracia. Primeiramente, qualquer ordem democrática, para funcionar bem, requer uma base social. Para além do mundo dos eleitores e partidos, são necessárias organizações para garantir representação a interesses que, de outra forma, não seriam representados. Sem elas não há esperança de se encontrar as condições de igualdade política ou de eqüidade distributiva.

Em segundo lugar, organizações e arenas que não se localizem completamente no interior do Estado podem funcionar como solucionadores de problemas, acrescentando, conseqüentemente, competência de regulação de políticas, elemento particularmente importante tendo em vista as limitações atuais colocadas às capacidades estatais. Podemos ver isto, por exemplo, no papel desempenhado conjuntamente pelos sindicatos e pelas associações de empregados no estabelecimento de padrões para treinamento de trabalhadores em todos os sistemas de treinamento que funcionam bem, ou no papel que as organizações ambientalistas cumprem, às vezes, no estabelecimento de padrões para o uso de substâncias tóxicas, ou no papel de comitês de saúde e segurança em local de trabalho no monitoramento da aplicação de padrões, ou das organizações comunitárias em certos arranjos de policiamento comunitário.

Infelizmente, o tipo certo de organizações e arenas não emerge natural ou espontaneamente, nem para os propósitos de garantir uma igualdade política relativamente justa, nem para a solução de problemas requerida em uma ordem igualitária bem-sucedida. Tampouco podemos observar alguma tendência evidente para o seu desenvolvimento autônomo diante da atual diversidade de aspirações políticas.

Concordo, portanto, com a necessidade da existência de uma base social e com a importância de que sejam expandidas as competências para a solução de problemas, assim como concordo que estas condições não surgem espontaneamente. Assim, em um trabalho anterior (em parceria com Joel Rogers), defendi a importância da idéia de uma "democracia associativa", que use os poderes públicos para forjar ideais igualitários e democráticos pela promoção da organização e da atividade de associações intermediárias entre o Estado e o mercado. A idéia associativa apresenta como principal diferença em relação ao pluralismo convencional o fato de que as associações intermediárias poderiam, elas próprias, servir como solucionadoras de problemas, assumindo o espaço vazio deixado para trás por um Estado de competência decrescente.

Esta idéia é boa, mas o termo "associativo" pode levar a engano, por privilegiar, aparentemente, as associações intermediárias — uma categoria específica de organizações — como formas de se solucionar os problemas, e por esta razão não estou usando o termo aqui. Digamos simplesmente que existe uma necessidade premente de entregar de volta o aprendizado e a solução de problemas para unidades encarregadas de processos de decisão mais próximas dos problemas. Estas unidades não serão nem públicas em termos convencionais (já que devem operar autonomamente das deliberações dos legislativos ou das agências estatais), nem privadas em termos convencionais (já que elas terão poderes de solução de problemas e operarão mediante discussão e diálogo entre cidadãos, ao invés da concessão de direitos de propriedade). Elas operarão no interior de redes de entidades similares de solução de problemas, que compararão soluções entre diferentes lugares com a ótica da melhora. Chamemos simplesmente a filosofia de governo que realiza esta transferência das atividades de solução de problemas de "novo igualitarismo".

Os benefícios desta nova forma de governança para a promoção de igualdade política parecem evidentes. Assim, enfocarei aqui as suas capacidades de enfrentar algumas das maiores dificuldades na resolução de problemas colocadas no período atual para democracias, dificuldades que, se não forem solucionadas, impedirão qualquer projeto igualitário de sair do papel.

Em termos gerais, a idéia de que redes de arenas deliberativas locais devem ocupar um papel regulatório substancial reflete um sentimento da limitação das capacidades do Estado de resolver problemas de maneira eficaz e competente em várias localidades. Estes limites aparecem em quatro tipos de casos:

Caso um: As localizações nas quais os problemas aparecem e requerem solução são numerosas e dispersas demais para que um monitoramento da obediência às regulações seja realizado centralizadamente de maneira fácil e com baixo custo. Mesmo quando regulações uniformes e estáveis entre localidades são apropriadas, estas condições indicam a necessidade de descentralizar a capacidade de monitoramento. Discussões no local de trabalho sobre regulamentações de saúde e segurança enfatizam este problema com freqüência, destacando que existem locais de trabalho demais para serem inspecionados por uma agência central.

Caso dois: A diversidade dos locais nos quais os problemas similares emergem sugere que os responsáveis pela solução dos problemas desejarão empregar diferentes meios para atingir objetivos similares, assim como especificar de forma diferente os próprios objetivos a alcançar.

Caso três: Quando a natureza altamente mutável dos problemas sugere a necessidade de uma reflexão contínua sobre os meios e os fins, e a importância de ajustá-los à luz de novas informações sobre o ambiente que cerca os problemas.

Caso quatro: Quando os problemas e as soluções são altamente complexos, ou seja, quando eles são o produto de causas múltiplas e são conectados com outros problemas, cruzando campos tradicionais de política, assim como processos. Como resultado, a estratégia adequada requer coordenação entre estes domínios. Os problemas neste caso incluem a pobreza urbana, o desenvolvimento econômico local e a promoção eficiente de serviços sociais. Solucionar problemas deste tipo requer a cooperação entre instituições e grupos bastante diferentes — por exemplo, instituições de financiamento, provedores de serviços de saúde, estabelecimentos de educação e treinamento, autoridades habitacionais, agências de desenvolvimento local e associações de bairro.

A concepção de governança do novo igualitarismo propõe enfrentar estes limites à solução dos problemas por meio do uso explícito da capacidade dos corpos deliberativos locais de solução de problemas para a obtenção de informações locais, para as atividades de monitoramento e para a promoção de cooperação. Estes corpos deliberativos também devem ser capazes de comparar as suas soluções com as adotadas por organizações similares em outros locais, evitando assim a armadilha do localismo. Isto significa, na verdade, a implementação de programas com participação cidadã mais direta na deliberação da solução de problemas, possível apenas através da deliberação pública em novas arenas localizadas fora das arenas políticas convencionais. O objetivo destas arenas, e das redes de arenas que comparam soluções alternativas, seria estabelecer a coordenação entre os atores públicos e privados necessários para a solução dos problemas.

Esta é a idéia. Mas mesmo que todos concordemos que as capacidades de solução de problemas do Estado são limitadas, particularmente em um ambiente altamente diversificado, volátil e complexo como o atual, por que supor que as arenas deliberativas representariam um avanço em relação à condição presente?

Por cinco razões. Primeiro, consideramos que as partes locais de um discussão tenham conhecimento local relevante, assim como sejam bem posicionadas para entender mudanças nas circunstâncias locais. Além disto, elas podem utilizar bem as informações porque compreendem o problema melhor que atores mais distantes, além de terem um interesse imediato na sua solução.

Segundo, assumindo uma preocupação compartilhada para ser solucionada, e a expectativa de que os resultados da deliberação vão regular a ação, os participantes tenderão naturalmente a levar mais em conta os outros do que fariam em outro tipo de situação. O requerimento de se encontrar uma solução a respeito da qual os outros possam concordar, mais do que simplesmente pressionar o Estado para uma solução, ajudaria a forjar debates que respeitem e avancem interesses mais gerais.

Em terceiro lugar, preocupações pelos outros encorajariam as pessoas a revelar mais informações, e permitiriam uma definição mais aguda dos problemas e soluções. A realização de discussões em arenas deliberativas, com diferenças duradouras entre participantes, também influenciaria as partes a serem mais reflexivas na definição dos problemas e nas estratégias propostas para sua solução. Tudo isso tenderia a libertar as discussões dos preconceitos que normalmente limitam a consideração de opiniões a grupos definidos mais restritamente, novamente permitindo a definição de soluções de forma mais completa e imaginativa. O monitoramento da implementação dos acordos também seria um subproduto natural do desenvolvimento das discussões, gerando um conjunto mais amplo de informações compartilhadas.

Quarto, se as coisas funcionarem como previsto, os resultados incluiriam a construção mútua da confiança, elemento-chave para a produção de cooperação no futuro.

Finalmente, em quinto lugar, a necessidade prévia de se testarem soluções adotadas em outros lugares incentivaria a inovação e a melhoria. Resumindo, a nova governança igualitária traz promessas consideráveis de que se obtenha estratégias mais eficientes e completas para a solução de problemas, baseadas em melhores informações sobre conceitos e opções, assim como de que se consiga gerar capacidades e disposição crescentes de fazê-lo mais ainda no futuro.

Suponha que você aceita estes julgamentos especulativos. Ainda assim, pode ser dito que essa proposta aponta uma direção improvável para uma estratégia igualitária. A objeção está no fato de que o papel dos grupos organizados na solução de problemas estabeleceria vínculos de identidades políticas com estes grupos, e não com a posição dos cidadãos iguais. Os vínculos construídos por estas identidades, por seu lado, iriam reduzir a função integradora do Estado democrático, assim como a posição do cidadão igual no seu interior, produzindo, como conseqüência, uma diminuição na base social de apoio requerida para a construção da ordem igualitária.

Esta preocupação compreende mal o novo projeto igualitário e o papel central do aprendizado e da solução de problemas coletivos no seu interior. O ponto não é forjar solidariedades de grupo tradicionais, mas construir solidariedades menos orgânicas e mais imediatamente políticas, por meio de processos deliberativos de definição e resposta a preocupações comuns, assim como comparar soluções e práticas implementadas em outros lugares. Uma coisa é um sindicato em boas condições financeiras, com uma identidade bem definida, ser chamado a participar no desenho de padrões de treinamento de óbvio interesse para seus membros, assim como para a sociedade mais ampla. Outra coisa muito diferente é uma organização ambiental comunitária nova, ou que conta com poucos meios, ganhar recursos e vida organizacional mais ampla em troca de ajudar a desenhar um sistema de proteção ambiental que informe e avise contra problemas de poluição iminentes antes que eles se tornem incontroláveis. Neste caso, o apoio para o grupo está vinculado ao serviço público que ele presta. De maneira similar, podemos imaginar uma associação de bairro e uma organização de desenvolvimento local em uma comunidade pobre recebendo assistência para se integrar, em termos organizacionais, em um programa de treinamento para pais, ou um programa de cuidados com as crianças para monitores como parte de um esforço de treinamento profissional mais amplo. A característica importante desses casos é que a participação de grupos e o apoio público estão condicionados a um projeto de interesse público.

As solidariedades incentivadas por esses esforços serão os laços entre as pessoas com preocupações comuns — como, por exemplo, lutar contra a pobreza urbana resiliente —, gerando relações entre indivíduos que se tratam como parceiros iguais no enfrentamento de preocupações comuns. Arenas deliberativas estabelecidas para a solução coordenada de problemas agregam pessoas com diferentes identidades sociais, mas que compartilham preocupações concretas e operam sob considerável incerteza sobre as formas pelas quais os problemas podem ser enfrentados. Essa incerteza, a pressão pela descoberta de uma estratégia de solução comum, e o foco disciplinador dos próprios problemas vão se combinar, de formas saudáveis, para criar laços que se assemelham mais a solidariedades de cidadania do que às estreitas identidades de grupo associadas com a política de facções ou grupos.

E a igualdade?

Assumamos que esta nova estratégia igualitária de governança e resolução de problemas seja plausível e desejável. Ainda assim, a questão original permanece. O que acontece quando o sistema de solução diretamente deliberativa de problemas acima descrito se engaja explicitamente na promoção de políticas igualitárias? Mais precisamente, há razões para acreditarmos que esses arranjos políticos reforçariam as políticas igualitárias desenhadas para alcançar justa igualdade de oportunidade ou para maximizar o bem-estar dos indivíduos em piores condições sociais? Resumidamente, podemos dizer que sim.

Antes de explicar por que, clarifiquemos primeiro os termos da pergunta. O novo sistema igualitário de solução de problemas contribuiria, é certo, para a promoção da igualdade de várias formas. Ele encorajaria, por exemplo, a igualdade política pela promoção da participação direta dos cidadãos na solução de problemas. Ao fortalecer a capacidade social de resolução de problemas, este novo sistema geraria mais bens públicos e um senso mais robusto do comum, do público. Ao melhorar a eficiência da regulação pública, ele estenderia tal regulação.

Ainda assim, as desigualdades geradas pelo capitalismo de mercado continuariam a existir. Portanto, políticas com o objetivo específico de retirar o bem-estar econômico do alcance das variações erráticas das qualidades pessoais e da sorte, para não mencionar o efeito danoso dos ciclos econômicos, são necessárias. Como sempre, a justiça deve ser desejada para que seja atingida.

A forma precisa dessas políticas, entretanto, está aberta à discussão. O ponto mais sensível a destacar, na minha opinião, diz respeito às estratégias redistributivas e relacionadas com os ativos econômicos, ou, mais precisamente, a um conjunto de "dividendos de cidadania" direcionados implicitamente para os mais necessitados e para as classes médias (cf. Freeman, 1999; Ackerman e Alstott, 1999). Como uma fonte adicional de estabilidade, eu também gostaria de destacar um deslocamento no pacote redistributivo recebido ao longo da vida dos indivíduos, aumentando a proporção dos benefícios destinados a promover um melhor início para as crianças. Mesmo preservando o acesso ao seguro social e a outras formas de proteção aos adultos, seu objetivo principal seria garantir um acesso justo aos mercados de trabalho antes que a renda seja ganha, ao invés de centrar-se na correção dos efeitos de oportunidades diferenciadas por meio de transferências realizadas após a incidência de impostos.

Esse sistema teria uma afinidade natural com a nova governança igualitária, na medida em que esta procura remediar o descompasso citado anteriormente: acomodar as mudanças na organização do capitalismo, direcionando mais deliberadamente a organização social para objetivos produtivos, submetendo os regimes regulatórios a padrões mais precisos de eficiência, melhorando os sistemas de promoção de capital humano e promovendo, acima de tudo, um igualitarismo do lado da oferta, caracterizado por maior igualdade na dotação de recursos econômicos. Ele impõe padrões aos mercados, mas também aceita a sua operação competitiva. Por fim, ele dá respostas ao declínio das solidariedades orgânicas tentando desenvolver, através das redes de arenas deliberativas dedicadas à solução de problemas sociais reconhecidos, uma forma de universalismo e de reconhecimento da alteridade social disciplinada pela busca pragmática de resultados concretos. Um salário social mais alto com um foco mais concentrado na redistribuição de ativos produtivos e direitos de mercados tem a mesma qualidade. Representaria uma política igualitária de tipo muito flexível, centrada no indivíduo e não antagônica ao mercado.

De qualquer forma, defendendo o argumento de que a internacionalização não é fatal para o igualitarismo, eu tomo essas políticas igualitárias como um complemento, em termos de programa e de política pública, para uma nova política igualitária deliberativa direta de solução de problemas.

Até que ponto a internacionalização impede esse quadro?

Voltemos agora à internacionalização. Minha afirmação é que a devolução da resolução de problemas para as arenas deliberativas, sob condições de maior igualdade de rendimentos básicos e de ativos produtivos, fornece, ou ao menos é plausível acreditar que forneça, um poderoso antídoto contra o desenraizamento do capital e a degeneração das solidariedades sociais que colocam em risco os regimes tradicionais de promoção de igualdade — mesmo sob as novas condições colocadas pela internacionalização. As considerações que levam a essa conclusão podem ser melhor observadas, em uma primeira análise, no nível subnacional, na operação de mercados de trabalho regionais. Enfoco aqui, principalmente, o caso norte-americano.

Até recentemente os Estados Unidos perseguiram uma estratégia que se chama às vezes de low road, como resposta às novas pressões competitivas internacionais. As empresas que optam pelo low road competem mantendo os preços baixos, o que significa manter os custos baixos, começando, em quase todos os casos, pelos salários. As empresas que optam pelo high road centram seu foco na competição por qualidade (com mais altos salários baseados na disposição dos consumidores de pagar mais por alta qualidade), requerendo inovação continuada e, conseqüentemente, empregados mais competitivos e mais bem treinados. De uma forma geral, podemos dizer que as estratégias que tomam o high road estão associadas a alta produtividade, altos salários, melhores relações de trabalho, reduzidos danos ambientais e o compromisso das empresas com o bem-estar e a estabilidade das comunidades humanas que as cercam. Empresas podem ser bem-sucedidas em termos empresariais adotando qualquer um dos dois caminhos, mas os ganhos sociais são muito maiores quando se opta pelo high road. Um deslocamento para o high road implica custos de transição e depende de apoios sociais. Requer instituições educacionais e de treinamento eficazes, mercados de trabalho que funcionem melhor, com informação mais completa a respeito dos requisitos para o acesso ao trabalho e melhoria de qualificação, infra-estrutura avançada, serviços que promovam a modernização e outros meios para difundir melhores práticas de produção, assim como barreiras que reduzam os incentivos para as empresas desistirem e voltar ao low road. Todos esses elementos têm o caráter de bens públicos, o que quer dizer que as empresas individuais não podem produzi-los, sendo necessário produzi-los socialmente, o que, até o momento, não foi realizado.

Na nova ordem igualitária, esses bens poderiam ser providos no interior de economias regionais organizadas apropriadamente. Uma vez em ação, essas condições influenciariam as empresas na direção de estratégias de produção do high road. Além de aumentar a saúde econômica das regiões, o efeito estaria em garantir uma parcela crescente de investimento, que seria efetivamente aplicado em bens públicos em localizações específicas. À medida que a capacidade de uma região cresce, a sua habilidade de capturar a demanda local também cresce. E à medida que a proporção de firmas avançadas nos mercados locais aumenta, todos os tipos de aumentos de eficiência por associação produtiva podem ser realizados, levando a um crescente retorno de escala do investimento que resulta da aglomeração. E tudo isso, por sua contribuição para a densidade e a renda, fornece uma base cada vez mais expandida para a produção de bens públicos tradicionais e para políticas igualitárias generosas.

Então, se os apoios às políticas igualitárias fossem necessários apenas no interior de regiões particulares, não haveria problemas. Supondo a existência de um quadro nacional apropriado para a solidariedade produtiva no nível regional, podemos conceber o caminho para a construção de uma ordem democrática sustentável nessa escala.

A questão, é claro, está na possibilidade de esse quadro ser criado nacionalmente e de ele encontrar, da mesma forma que as instituições locais, uma base social sobre a qual possa se apoiar. Como, então, podemos imaginar de forma plausível a produção de solidariedades supra-regionais nos termos do esquema apresentado há pouco? Será que este tipo de ordenamento regional, por si só, leva naturalmente à produção e manutenção dessas solidariedades, e será que a política associada a arenas deliberativas organizadas regionalmente as leva naturalmente à expansão territorial, alcançando todo o espaço nacional? Novamente, acredito que a resposta seja sim. Há razões para acreditar que as regiões reconheceriam a necessidade da construção de um quadro geral nacional para aprofundar as suas próprias invenções locais.

O medo da competição entre regiões seria um aspecto dessa dinâmica. Entretanto, olhando pelo lado positivo, o mesmo interesse no aprendizado mútuo e na solução de problemas que opera em espaços intra-regionais também pode se estender para as relações entre regiões. As regiões que buscam capacitação crescente naturalmente olhariam para outras como fontes de ajuda para aumentar suas capacidades, estabelecer padrões de comparação para performances, ou comparar as suas estratégias produtivas com as implementadas em outros lugares. Aquelas que buscam melhorias em suas práticas econômicas ou administrativas procurariam exemplos em qualquer lugar. E a boa condução dessa produção conjunta ou do aprendizado requereria algum quadro geral de discussão e garantias a todos os engajados nessas discussões, de forma análoga às produzidas no nível regional.

Podemos imaginar que, quando essas forças são colocadas em contato, uma política deliberativa de nível supra-regional e as políticas públicas igualitárias podem conseguir apoio de diferentes regiões em um dado país. Como no nível regional, as solidariedades poderiam, em certa medida, ser induzidas por uma ênfase na solução de problemas. Assumindo a interdependência econômica, as autoridades de nível nacional poderiam, de forma muito razoável, exigir como condição para o seu apoio às unidades regionais limites à competição regional destrutiva e esforços afirmativos no sentido de comparar práticas e auferir ganhos de ações cooperativas. Nesse sentido, não é demais imaginar a reconstrução das instituições tradicionais nacionais.

Os legislativos, em particular, poderiam ser devotados a especificar mais os fins do que os meios de suas ações e a prover recursos necessários para os solucionadores de problemas locais. Os poderes executivos e as agências administrativas, por sua vez, poderiam dar maior atenção a organizar o apoio privado para a ação, assim como a facilitar a coordenação das organizações de solução de problemas autônomas, ao invés de simplesmente assumir as tarefas administrativas adicionais eles próprios. As linhas divisórias entre governo e formas público-privadas de regulação devem ser exploradas, ao invés de estipuladas constitucionalmente.

Nesse ponto eu retorno à questão da cidadania e da esfera pública. Gostaria de estabelecer dois pontos principais. Em primeiro lugar, a esfera pública, no esquema delineado aqui, é dispersa em termos organizacionais, assim como socialmente heterogênea. Ela é dispersa em termos organizacionais porque a opinião pública se constitui tendo como referência não apenas o legislativo nacional, mas também o trabalho deliberativo dos solucionadores de problemas locais, e a exploração conjunta de suas possibilidades. E é socialmente heterogênea porque não se presume que os seus membros compartilhem características sociais, visões morais ou informações comuns. Embora a arena pública seja, em ambos os sentidos, pluralista, suas partes se conectam pela necessidade de comparação explícita com outras unidades que estão, elas próprias, conduzindo comparações, e pela existência de um debate público mais amplo, em uma esfera pública renovada informada por tais comparações e direcionada para projetos nacionais.

Em segundo lugar e de maneira mais fundamental, a arena pública é o lugar onde a praticidade na forma de solução de problemas encontra-se com o princípio político da deliberação por meio da oferta de razões entre cidadãos que se reconhecem mutuamente como livres e iguais. Em uma poliarquia de deliberação direta, a deliberação pública reduz a distinção entre reflexão sobre objetivos políticos e avaliação dos esforços para alcançar tais objetivos — uma distinção central nas teorias mais conhecidas da democracia representativa. A cidadania torna-se mais prática — preocupada com a solução de problemas, ao invés de observar confusa a sua criação — e a prática corriqueira de solução de problemas reais torna-se cívica.

NOTAS

BIBLIOGRAFIA

RESUMOS / ABSTRACTS / RÉSUMÉS

IGUALITARISMO, INTERNACIONALIZAÇÃO E CIDADANIA

Joshua Cohen

Palavras-chave

Internacionalização; Igualitarismo; Social-democracia; Cidadania; Democracia deliberativa.

O artigo busca argumentar que a internacionalização não vai contra o igualitarismo como projeto político, mas que este só poderá sobreviver a ela se se despir de sua forma social-democrata tradicional. Após apresentar um breve quadro político geral de uma forma alternativa de igualitarismo, descreve algumas políticas promotoras de igualdade que podem ser desenvolvidas num mundo internacionalizado e, finalmente, apresenta algumas implicações deste conjunto de questões para a cidadania. Segundo o autor, o novo igualitarismo requer a existência de uma nova esfera pública, com maior envolvimento direto dos cidadãos na solução de problemas coletivos, o que aponta para a construção de uma democracia mais direta e mais deliberativa, com a transferência de certas responsabilidades consideradas caracteristicamente como atribuições do Estado para redes de arenas deliberativas, tornando menos rígidas as fronteiras entre público e privado. Os argumentos são apresentados de forma abstrata mas o ponto de referência principal (às vezes implícito) do autor são os EUA.

EGALITARIANISM, INTERNATIONALIZATION, CITIZENSHIP

Joshua Cohen

Key words

Internationalization; Egalitarianism; Social Democracy; Citizenship; Deliberative Democracy.

The author argues that internationalization does not undermine egalitarianism as a political project but that egalitarianism can survive internationalization only by getting rid of its traditional social democratic form. He sketches the political framework of an alternative form of egalitarianism and describes some egalitarian policies that might be advanced within that political framework, discussing the implications of these issues for citizenship. According to the author the new egalitarianism proposed requires a new public sphere with citizen involvement in collective problem solving: a more direct and deliberative democracy. The gist of this form of egalitarianism is to advance justice through a new form of politics that involves devolving or decentralizing certain characteristically state responsibilities to networks of deliberative arenas that cut across conventional public-private lines. The arguments are presented in abstract terms, but a principal (sometimes implicit) point of reference throughout is the United States.

ÉGALITARISME, INTERNATIONALISME ET CITOYENNETÉ

Joshua Cohen

Mots-clés

Internationalisation; Égalitarisme; Social Démocratie; Citoyenneté; Démocratie Délibérative.

L'article cherche à démontrer que l'internationalisation ne va pas à l'encontre de l'égalitarisme en tant que projet politique, mais, plutôt, que l'égalitarisme ne pourra survivre à l'internationalisation que s'il abandonne sa forme sociale démocrate traditionnelle. Après une brève présentation du cadre politique général d'une façon alternative d'égalitarisme, l'auteur décrit certaines politiques qui font la promotion de l'égalité et qui peuvent être développées dans un monde internationalisé. Finalement, certaines implications de cet ensemble de questions par rapport à la citoyenneté sont présentées. Selon l'auteur, le nouvel égalitarisme demande l'existence d'une nouvelle sphère publique, avec une participation directe plus importante des citoyens dans la solution de problèmes collectifs, ce qui indique la construction d'une démocratie plus directe et plus délibérative, incluant le transfert de certaines responsabilités considérées comme étant des contributions de l'État pour des réseaux d'arènes délibératives. Cela rendrait les frontières entre le public et le privé moins rigides. Le principal point de référence (parfois implicite) de l'auteur sont les EUA.

Tradução de Eduardo Cesar Marques.

Revisão técnica de Zairo B. Cheibub.

  • ACKERMAN, Bruce e ALSTOTT, Anne. (1999), The stakeholder society. New Haven, Yale University Press.
  • COHEN, Joshua e SABEL, Charles. (1997), "Directly-deliberative polyarchy". European Law Journal, 3, 4, dez.: 313-42.
  • COHEN, Joshua e ROGERS, Joel. (no prelo), "Can egalitarianism survive internationalization?", in Wolfgang Streeck (org.), Globalization.
  • FREEMAN, R. (1999), in J. Cohen e J. Rogers (orgs.), The new inequality, Boston, Beacon Press.
  • 1
    Os seus elementos estão descritos em trabalhos que realizei com Joel Rogers sobre "democracia associativa" (termo que já não acho apropriado) e com Charles Sabel sobre "poliarquia diretamente deliberativa". Cf. Cohen e Rogers (no prelo) e Cohen e Sabel (1997).
  • *
    Este artigo se baseia em uma conferência proferida no XXIII Encontro Anual da Anpocs, realizado em Caxambu, MG, em outubro de 1999, a qual, por sua vez, baseou-se em um trabalho conjunto realizado com Joel Rogers e Charles Sabel. Retirei uma parte significativa dos argumentos de um artigo que fiz com Rogers, "Can egalitarianism survive internationalization?", publicado na coletânea
    Globalization, organizada por Wolfgang Streeck (no prelo), assim como de um artigo que escrevi em parceria com Sabel, "Directly-deliberative polyarchy", publicado no
    European Law Journal, vol. 3, n
    o 4, dezembro de 1997, pp. 313-342.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      06 Abr 2001
    • Data do Fascículo
      Out 2000
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