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Diálogos entre as competências cultura digital e pensamento científico, crítico e criativo na Base Nacional Comum Curricular

Dialogues between digital culture skills and scientific, critical, and creative thinking in the National Common Curricular Base

Diálogos entre habilidades en cultura digital y pensamiento científico, crítico y creativo en la Base Curricular Común Nacional

RESUMO

A Educação em Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS) resgata uma agenda política, compreendendo que a neutralidade nesse contexto se vincula à submissão a valores hegemônicos e desloca o papel das pessoas em função da racionalidade tecnológica. Assim, este artigo teve o objetivo de analisar o conteúdo da competência pensamento científico, crítico e criativo (PCCC) da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e propor relações entre ela e a competência cultura digital (CD) por meio de um viés crítico, ancorado na Teoria Crítica da Tecnologia (TCT). Para isso, utilizaram-se a metodologia da análise de conteúdo de Bardin e a TCT na construção das categorias. Observaram-se conceitos de neutralidade e de determinismo em sete das nove subdimensões analisadas. Conclui-se que o campo CTS contribui com uma aproximação crítica entre as competências PCCC e CD e na construção de uma prática pedagógica que se vincula à criticidade e à dialogicidade.

Palavras-chave:
Educação CTS; Pedagogias Críticas; BNCC

ABSTRACT

Education in Science, Technology, and Society (STS) retrieves a political agenda, understanding that neutrality in this context is linked to submission to hegemonic values and shifts the role of people in terms of technological rationality. Thus, this article analyzes the content of the scientific, critical, and creative thinking competency (PCCC) of the National Common Curricular Base (BNCC) and proposes relationships between this and the digital culture competency (CD) through a critical bias, anchored in the Critical Theory of Technology (CCT). For this, we use Bardin’s content analysis methodology and the TCT for constructing the categories. Seven of the nine analyzed sub-dimensions showed neutrality and determinism concepts. The conclusion is that the STS field contributes to a critical approach between the PCCC and CD competencies and the construction of a teaching practice linked to criticality and dialogicity.

Keywords:
STS Education; Critical Pedagogies; BNCC

RESUMEN

La Educación en Ciencia, Tecnología y Sociedad (CTS) rescata una agenda política, en que la neutralidad está ligada al sometimiento a valores hegemónicos y desplaza el rol de las personas por la racionalidad tecnológica. Este artículo tiene como objetivo analizar el contenido de la Competencia Pensamiento Científico, Crítico y Creativo (PCCC) de la Base Curricular Común Nacional (BNCC) y proponer relaciones entre esta y la Competencia Cultura Digital (CD) través un sesgo crítico, anclado en la Teoría Crítica de la Tecnología (TCT). Para ello, se utilizó la metodología de análisis de contenido de Bardin y la TCT para la construcción de categorías. Se observaron conceptos de Neutralidad y Determinismo en 7 de las 9 Subdimensiones analizadas. Se concluye que el campo CTS contribuye a un acercamiento crítico entre las Competencias PCCC y CD y a la construcción de una práctica pedagógica que se vincule a la criticidad y la dialogicidad.

Palabras clave:
Educación CTS; Pedagogías críticas; BNCC

INTRODUÇÃO

O papel das competências gerais no âmbito da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é de grande importância, pois o desenvolvimento dos conteúdos curriculares deve estar articulado com as competências ao longo das três etapas da Educação Básica. As dez competências gerais da BNCC são, portanto, pilares de sustentação da proposta pedagógica atual no Brasil. Entre elas, serão destacadas neste trabalho a competência pensamento científico, crítico e criativo (PCCC) e a competência cultura digital (CD) (Brasil, 2017BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Base Nacional Comum Curricular. 2017. Disponível em: Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br . Acesso em: 18 mai. 2022.
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).

Entende-se que a presença de competências como fundamento da BNCC faz parte de uma forma complexa de categorização promovida pelas reformas neoliberais na educação, que muitas vezes estreitam a visão da educação escolar a uma formação “naturalmente” competitiva e individualista (Melo e Marochi, 2019MELO, Alessandro de; MAROCHI, Ana Claudia. Cosmopolitismo e performatividade: categorias para uma análise das competências na base nacional comum curricular. Educação em Revista, Belo Horizonte, v. 35, p. e203727, 2019. https://doi.org/10.1590/0102-4698203727
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). Mészáros (2008MÈSZÁROS, István. A educação para além do capital. São Paulo: Boitempo, 2008.) alerta para o perigo de manter a educação aprisionada em círculos viciosos reformistas que não objetivam, em longo prazo, uma mudança duradoura e internalizada - em outras palavras, radical - e que, ao contrário, visam à manutenção de elementos fundamentais que, ainda que se anunciem “democráticos”, são, na verdade, profundamente elitistas e conservadores.

Para Saviani (2012aSAVIANI, Dermeval. Marxismo, educação e pedagogia. In: SAVIANI, Dermeval; DUARTE, Newton. (org). Pedagogia histórico-crítica e a luta de classes na educação escolar. Campinas: Autores Associados, 2012a, p. 59-85.), os documentos oficiais da educação, como por exemplo os currículos, não são neutros, mas, ao contrário, possuem temas e “conteúdos” escolhidos para satisfazer necessidades específicas. Ainda segundo o autor, “os interesses impelem os conhecimentos e, ao mesmo tempo, os circunscrevem dentro de determinados limites” (Saviani, 2012bSAVIANI, Dermeval. Origem e desenvolvimento da pedagogia histórico-crítica. Marxismo e Educação: fundamentos Marxistas da Pedagogia Histórico-Crítica. COLÓQUIO INTERNACIONAL MARX E ENGELS, VII, jul. 2012, Campinas, 2012b. Disponível em: Disponível em: https://drive.google.com/file/d/14kiDP1me-GvWergmkB0MZMkUTubsLo5j/view?usp=sharing . Acesso em: 28 mai. 2022.
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, p. 66). Evidencia-se, então, a necessidade de estudos críticos sobre o tema.

Para além de debates teóricos, ressalta-se a importância da contextualização e da valorização das vivências dos/as estudantes nesse processo, uma vez que a educação escolar faz parte da formação cidadã. Por isso, destaca-se que Saviani (2012aDUARTE, Newton. Lukács e Saviani: a ontologia do ser social e a pedagogia histórico-crítica. In: DUARTE, Newton; SAVIANI, Dermeval; (org). Pedagogia histórico-crítica e luta de classes na educação escolar. Campinas: Autores Associados, 2012. p. 1-17. Disponível em: Disponível em: https://histedbrantigo.fe.unicamp.br/acer_histedbr/seminario/seminario8/_files/GlNNNi3M.pdf . Acesso em: 04 mar. 2022.
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; 2012bSAVIANI, Dermeval. Origem e desenvolvimento da pedagogia histórico-crítica. Marxismo e Educação: fundamentos Marxistas da Pedagogia Histórico-Crítica. COLÓQUIO INTERNACIONAL MARX E ENGELS, VII, jul. 2012, Campinas, 2012b. Disponível em: Disponível em: https://drive.google.com/file/d/14kiDP1me-GvWergmkB0MZMkUTubsLo5j/view?usp=sharing . Acesso em: 28 mai. 2022.
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) também contribui com entendimentos sobre a prática pedagógica para a construção de uma educação crítica. Para o autor (Saviani, 2012aSAVIANI, Dermeval. Marxismo, educação e pedagogia. In: SAVIANI, Dermeval; DUARTE, Newton. (org). Pedagogia histórico-crítica e a luta de classes na educação escolar. Campinas: Autores Associados, 2012a, p. 59-85.; 2012bSAVIANI, Dermeval. Origem e desenvolvimento da pedagogia histórico-crítica. Marxismo e Educação: fundamentos Marxistas da Pedagogia Histórico-Crítica. COLÓQUIO INTERNACIONAL MARX E ENGELS, VII, jul. 2012, Campinas, 2012b. Disponível em: Disponível em: https://drive.google.com/file/d/14kiDP1me-GvWergmkB0MZMkUTubsLo5j/view?usp=sharing . Acesso em: 28 mai. 2022.
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) a prática social é, ao mesmo tempo, ponto de partida e ponto de chegada do processo pedagógico: o/a estudante parte de seu próprio “mundo”, de suas próprias vivências e saberes, utiliza-se da estrutura da escola e dos conhecimentos historicamente acumulados e, de forma dialética, reelabora suas impressões acerca das práticas sociais, com elas retornando ao “mundo”. Assim, os saberes e as práticas institucionalizados na escola, dos quais os/as estudantes se apropriam no processo de ensino e de aprendizagem, embora façam parte da instrumentalização dos sujeitos para sua atuação no mundo concreto, não são (ou não deveriam ser) a atividade fim da prática pedagógica.

Dessa maneira, com base em Saviani (2012aSAVIANI, Dermeval. Marxismo, educação e pedagogia. In: SAVIANI, Dermeval; DUARTE, Newton. (org). Pedagogia histórico-crítica e a luta de classes na educação escolar. Campinas: Autores Associados, 2012a, p. 59-85.; 2012bSAVIANI, Dermeval. Origem e desenvolvimento da pedagogia histórico-crítica. Marxismo e Educação: fundamentos Marxistas da Pedagogia Histórico-Crítica. COLÓQUIO INTERNACIONAL MARX E ENGELS, VII, jul. 2012, Campinas, 2012b. Disponível em: Disponível em: https://drive.google.com/file/d/14kiDP1me-GvWergmkB0MZMkUTubsLo5j/view?usp=sharing . Acesso em: 28 mai. 2022.
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), entende-se que a aprendizagem de conteúdos específicos de Ciências da Natureza ou de Tecnologias Digitais, seja por meio de disciplinas escolares, seja no formato de competências - a nova roupagem da mesma educação bancária de sempre - não deve constituir um fim em si mesmo, mas deve, por outro lado, fazer parte de um processo dialógico no qual, em um momento catártico ao longo do processo pedagógico, acontece a efetiva incorporação dos instrumentos (conhecimentos científicos e técnicos), que se tornam, então, elementos ativos de transformação social (Saviani, 2012cSAVIANI, Dermeval. Escola e democracia. Campinas: Autores Associados, 2012c., p. 9).

Reconhece-se, ainda, a necessidade de a educação escolar formar sujeitos aptos a fazer escolhas conscientes baseadas em seus conhecimentos: escolhas que lhes permitam se reconhecer, se apropriar e transformar o mundo ao seu redor. Assim, a problematização como análise crítica da realidade, por meio da ação dialógica (Freire, 1996FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1996., p. 97), é elemento imprescindível na integração das competências da BNCC às práticas pedagógicas.

O diálogo, aqui, remete à exigência de humanização das relações de ensino e aprendizagem presente na Pedagogia do Oprimido (Freire, 1996FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1996.), o que significa que a participação das pessoas na composição dessas estruturas - neste caso, tanto currículos escolares como práticas pedagógicas - não pode se dar fora da comunicação.

Com relação aos objetivos de aprendizagem relacionados nas competências gerais da BNCC, adota-se a visão de Auler (2021AULER, Décio. Freire, fermento entre os oprimidos: continua sendo? Revista Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências, Belo Horizonte, v. 21, p. 1-30, 2021. https://doi.org/10.28976/1984-2686rbpec2021u801830
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). O autor (Auler, 2021AULER, Décio. Freire, fermento entre os oprimidos: continua sendo? Revista Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências, Belo Horizonte, v. 21, p. 1-30, 2021. https://doi.org/10.28976/1984-2686rbpec2021u801830
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, p. 24-25) indica a necessidade de apropriação dos conhecimentos desenvolvidos e sistematizados pela pedagogia de Freire (1996FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1996.) para a educação transformadora, especialmente para necessárias mudanças no ensino de Ciências da Natureza. O autor (Auler, 2021AULER, Décio. Freire, fermento entre os oprimidos: continua sendo? Revista Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências, Belo Horizonte, v. 21, p. 1-30, 2021. https://doi.org/10.28976/1984-2686rbpec2021u801830
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) destaca que, além de dar centralidade aos “oprimidos” no processo de aprendizagem, é necessário buscar transformar suas demandas em verdadeiras demandas de conhecimento; dessa forma, os problemas “dos oprimidos” não são os únicos a terem centralidade no processo, passando a ser demandas reais de produção do conhecimento.

Em sua obra Pedagogia do Oprimido, Freire (1996FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1996., p. 100-101) destaca que a prática pedagógica libertadora não deve, tal qual a do sistema opressor - “bancário” - “conduzir” os/as estudantes dos contextos nos quais se acham para “aderir” a um novo contexto por meio da ação pedagógica. Ao contrário, deve proporcionar um reconhecimento do “porquê” e do “como” eles se encontram nesses contextos para que, em face disso, possam fazer suas escolhas.

Com isso, a abordagem da Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS) pode vir a contribuir para a elaboração das problematizações, especialmente as que envolvem os conhecimentos relacionados às áreas das Ciências da Natureza e das Tecnologias, sobretudo as digitais. De acordo com Santos e Mortimer (2002SANTOS, Wildson Luiz Pereira dos.; MORTIMER, Eduardo Fleury. Uma análise de pressupostos teóricos da abordagem C-T-S (Ciência-Tecnologia-Sociedade) no contexto da educação brasileira. ENSAIO: Pesquisa em Educação em Ciências, Belo Horizonte, v. 2, n. 2, p. 110-132, dez. 2002. https://doi.org/10.1590/1983-21172000020202
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), muitas vezes o que se tem chamado de CTS nos currículos, particularmente das Ciências da Natureza, é uma “Ciência do Cotidiano”, que se dedica a dar nome, por exemplo, aos componentes químicos dos produtos alimentícios ou às plantas do jardim da escola. Para os autores (Santos e Mortimer, 2002SANTOS, Wildson Luiz Pereira dos.; MORTIMER, Eduardo Fleury. Uma análise de pressupostos teóricos da abordagem C-T-S (Ciência-Tecnologia-Sociedade) no contexto da educação brasileira. ENSAIO: Pesquisa em Educação em Ciências, Belo Horizonte, v. 2, n. 2, p. 110-132, dez. 2002. https://doi.org/10.1590/1983-21172000020202
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), esse tipo de abordagem contribui apenas para a educação enciclopédica, tendo pouca relação com problemas reais do cotidiano social e político no qual os/as estudantes estão imersos, nem sequer com eles estabelecendo diálogos.

Santos (2008SANTOS, Wildson Luiz Pereira dos. Educação científica humanística em uma perspectiva freireana: resgatando a função do ensino de CTS. Alexandria: Revista de Educação em Ciência e Tecnologia, Florianópolis, v. 1, n. 1. p. 109-131, mar. 2008. Disponível em: Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/alexandria/article/view/37426/28747 . Acesso em: 18 maio 2022.
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) afirma que a abordagem humanística em CTS remete ao resgate de uma agenda política em que a neutralidade é vista como submissão aos valores hegemônicos, os quais frequentemente deslocam o papel das pessoas em função da racionalidade tecnológica. Nesse sentido, Santos (2008SANTOS, Wildson Luiz Pereira dos. Educação científica humanística em uma perspectiva freireana: resgatando a função do ensino de CTS. Alexandria: Revista de Educação em Ciência e Tecnologia, Florianópolis, v. 1, n. 1. p. 109-131, mar. 2008. Disponível em: Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/alexandria/article/view/37426/28747 . Acesso em: 18 maio 2022.
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, p. 125) é categórico ao afirmar que a defesa de uma postura “apolítica” no ensino das Ciências e das Tecnologias é a defesa da ideologia dominante imposta pelos sistemas tecnológicos vigentes.

Da mesma maneira podem ser entendidas as demandas de ensino e de aprendizagem de tecnologias, destacadamente com relação às tecnologias digitais abordadas na competência CD da BNCC. Por isso, propõe-se um diálogo entre as competências PCCC e CD da BNCC e a pedagogia crítica de Freire (1996FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1996.), especialmente a pedagogia do oprimido. Acrescenta-se a pedagogia histórico-crítica dos conteúdos de Saviani (2012aSAVIANI, Dermeval. Marxismo, educação e pedagogia. In: SAVIANI, Dermeval; DUARTE, Newton. (org). Pedagogia histórico-crítica e a luta de classes na educação escolar. Campinas: Autores Associados, 2012a, p. 59-85.; 2012bSAVIANI, Dermeval. Origem e desenvolvimento da pedagogia histórico-crítica. Marxismo e Educação: fundamentos Marxistas da Pedagogia Histórico-Crítica. COLÓQUIO INTERNACIONAL MARX E ENGELS, VII, jul. 2012, Campinas, 2012b. Disponível em: Disponível em: https://drive.google.com/file/d/14kiDP1me-GvWergmkB0MZMkUTubsLo5j/view?usp=sharing . Acesso em: 28 mai. 2022.
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) como viés de diálogo, por entender-se que o autor complementa conceitos que são caros ao desenvolvimento de uma crítica aprofundada ao currículo e aos fazeres pedagógicos da forma como são atualmente construídos. Junta-se às pedagogias críticas de Freire (1996FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1996.) e Saviani (2012aSAVIANI, Dermeval. Marxismo, educação e pedagogia. In: SAVIANI, Dermeval; DUARTE, Newton. (org). Pedagogia histórico-crítica e a luta de classes na educação escolar. Campinas: Autores Associados, 2012a, p. 59-85.; 2012cSAVIANI, Dermeval. Escola e democracia. Campinas: Autores Associados, 2012c.) a Teoria Crítica da Tecnologia (TCT) de Andrew Feenberg (2010aFEENBERG, Andrew. Racionalização subversiva: tecnologia, poder e democracia. In: NEDER, Ricardo. A teoria crítica de Andrew Feenberg: racionalização democrática, poder e tecnologia. 2. ed. Brasília: Observatório do Movimento pela Tecnologia Social na América Latina/CDS/UnB/Capes, 2010a. p. 67-96.; 2017FEENBERG, Andrew. Critical theory of technology and STS. Thesis Eleven, v. 138, n. 1, p. 3-12, 2017. https://doi.org/10.1177/0725513616689388
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), acrescentando sentidos e relações pertinentes à compreensão da incorporação das tecnologias, especialmente as digitais, como componente nominal nas competências da BNCC, pela presença de uma atividade transversal/interdisciplinar denominada competência CD.

Diante dos dados observados na literatura, a questão principal que motivou este estudo foi é possível promover um diálogo, por meio da criticidade, entre as competências PCCC e CD da BNCC, com vistas à formação de uma identidade crítica nessas competências?

Dessa forma, este artigo analisa de um ponto de vista crítico as relações entre duas competências da BNCC, denominadas PCCC e CD.

Para tanto, foi realizada uma análise de conteúdo da competência PCCC da BNCC, por meio da metodologia de análise de conteúdo de Bardin (1977BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 1977.). A partir daí, foram feitos paralelos entre a competência PCCC e a competência CD da BNCC, considerando-se as relações entre ciências e tecnologias, por meio da TCT de Feenberg (2010aFEENBERG, Andrew. Racionalização subversiva: tecnologia, poder e democracia. In: NEDER, Ricardo. A teoria crítica de Andrew Feenberg: racionalização democrática, poder e tecnologia. 2. ed. Brasília: Observatório do Movimento pela Tecnologia Social na América Latina/CDS/UnB/Capes, 2010a. p. 67-96.; 2010bFEENBERG, Andrew. Teoria crítica da tecnologia: um panorama. In: NEDER, Ricardo. A teoria crítica de Andrew Feenberg: racionalização democrática, poder e tecnologia. 2. ed. Brasília: Observatório do Movimento pela Tecnologia Social na América Latina/CDS/UnB/Capes, 2010b. p. 97-118.; 2017FEENBERG, Andrew. Critical theory of technology and STS. Thesis Eleven, v. 138, n. 1, p. 3-12, 2017. https://doi.org/10.1177/0725513616689388
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). Por fim, as competências analisadas foram colocadas diante de pedagogias críticas, de forma a estabelecer conexões e diálogos entre os conteúdos analisados, buscando, no campo de estudos da CTS, viabilizar leituras e práticas críticas das competências gerais da BNCC, especialmente a PCCC e a CD.

METODOLOGIA

Compreendendo a complexidade da construção de documentos como os currículos da Educação Básica, entende-se que o rigor metodológico é de fundamental importância para a superação da sensação de transparência dos artefatos sociais, como é o caso do documento em estudo, a BNCC. Tais documentos, assim como leis, normativas e outros instrumentos sociais, são influenciados pelo período histórico, político e econômico em que são construídos (Bardin, 1977BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 1977., p. 40-42). Além disso, acrescenta-se que os contextos de produção dos currículos da Educação Básica são, por si sós, campos de disputa de poder e interesse político (Saviani, 2012aSAVIANI, Dermeval. Marxismo, educação e pedagogia. In: SAVIANI, Dermeval; DUARTE, Newton. (org). Pedagogia histórico-crítica e a luta de classes na educação escolar. Campinas: Autores Associados, 2012a, p. 59-85.).

Assim, para que fossem estabelecidos os diálogos e críticas propostos, selecionou-se como método a análise de conteúdo segundo Bardin (1977BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 1977.). Esse tipo de análise permite um afastamento das interpretações espontâneas que, baseadas em uma leitura superficial, geram a “ilusão da transparência” dos fatos sociais (Bardin, 1977BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 1977., p. 28).

A escolha dos documentos analisados faz parte da primeira etapa, denominada pré-análise. Esta, assim como as três etapas seguintes, encontra-se resumida na Figura 1.

Figura 1 -
Etapas da análise de conteúdo realizada na pesquisa, com base em Bardin (1977BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 1977.).

Ainda durante a pré-análise, optou-se por utilizar a unidade de registro semântico “referente” ou “objeto” (Bardin, 1977BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 1977., p. 106). Nesse caso, o texto é recortado em função de um eixo temático, agrupando em volta desse eixo tudo o que o texto exprime a seu respeito (Bardin, 1977BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 1977.).

Em seguida, as leituras dos textos foram realizadas de acordo com as regras da exaustividade, homogeneidade e representatividade (Bardin, 1977BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 1977., p. 77-78).

Para a terceira etapa, a leitura do material analisado permitiu interpretar o desenvolvimento científico e tecnológico apresentado na PCCC de acordo com Auler (2007AULER, Décio. Articulação entre pressupostos do educador Paulo Freire e do Movimento CTS: novos caminhos para a Educação em Ciências. Contexto e Educação, Ijuí, v. 77, n. 22, p. 167-188, jan-jun. 2007. https://doi.org/10.21527/2179-1309.2007.77.167-188
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), que os considera entrelaçados de uma forma bastante difícil de desvelar. Por isso, a categorização realizada na etapa seguinte (quarta etapa) tem como base a TCT de Andrew Feenberg (Feenberg, 2010aFEENBERG, Andrew. Racionalização subversiva: tecnologia, poder e democracia. In: NEDER, Ricardo. A teoria crítica de Andrew Feenberg: racionalização democrática, poder e tecnologia. 2. ed. Brasília: Observatório do Movimento pela Tecnologia Social na América Latina/CDS/UnB/Capes, 2010a. p. 67-96.; 2010bFEENBERG, Andrew. Teoria crítica da tecnologia: um panorama. In: NEDER, Ricardo. A teoria crítica de Andrew Feenberg: racionalização democrática, poder e tecnologia. 2. ed. Brasília: Observatório do Movimento pela Tecnologia Social na América Latina/CDS/UnB/Capes, 2010b. p. 97-118.). A mesma teoria (Feenberg, 2017FEENBERG, Andrew. Critical theory of technology and STS. Thesis Eleven, v. 138, n. 1, p. 3-12, 2017. https://doi.org/10.1177/0725513616689388
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) é utilizada para a construção das interpretações acerca da competência CD.

Dessa maneira, cada uma das subdimensões, compreendidas sob as dimensões pensamento científico e crítico, criatividade (na competência PCCC), computação e programação, pensamento computacional e cultura e mundo digital (na competência CD) foi comparada com duas categorias delineadas com base nas leituras e interpretações da TCT (Feenberg, 2010aFEENBERG, Andrew. Racionalização subversiva: tecnologia, poder e democracia. In: NEDER, Ricardo. A teoria crítica de Andrew Feenberg: racionalização democrática, poder e tecnologia. 2. ed. Brasília: Observatório do Movimento pela Tecnologia Social na América Latina/CDS/UnB/Capes, 2010a. p. 67-96.; 2010bFEENBERG, Andrew. Teoria crítica da tecnologia: um panorama. In: NEDER, Ricardo. A teoria crítica de Andrew Feenberg: racionalização democrática, poder e tecnologia. 2. ed. Brasília: Observatório do Movimento pela Tecnologia Social na América Latina/CDS/UnB/Capes, 2010b. p. 97-118.), chamadas de determinismo e neutralidade. Essas categorias, assim como as dimensões e subdimensões das competências estudadas, serão detalhadas a seguir.

Utilizar a TCT de Feenberg (2010aFEENBERG, Andrew. Racionalização subversiva: tecnologia, poder e democracia. In: NEDER, Ricardo. A teoria crítica de Andrew Feenberg: racionalização democrática, poder e tecnologia. 2. ed. Brasília: Observatório do Movimento pela Tecnologia Social na América Latina/CDS/UnB/Capes, 2010a. p. 67-96.; 2017FEENBERG, Andrew. Critical theory of technology and STS. Thesis Eleven, v. 138, n. 1, p. 3-12, 2017. https://doi.org/10.1177/0725513616689388
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) nesse contexto vem ao encontro de questões no âmbito da educação CTS, principalmente no ensino de Ciências da Natureza. Isso porque, de acordo com Feenberg (1999FEENBERG, Andrew. Questioning technology. 1. ed. Londres: Routledge. 1999., p. 77-78), o desenvolvimento da ciência e das tecnologias ao longo da história nunca foi linear e unidirecional. Feenberg (1999FEENBERG, Andrew. Questioning technology. 1. ed. Londres: Routledge. 1999.) ainda afirma que a ciência e as tecnologias não são determinantes do desenvolvimento da sociedade, mas, ao contrário, são parte dos múltiplos elementos que influenciam e são influenciados pelas pessoas.

Ainda na terceira etapa, portanto, são extraídas da TCT de Feenberg (1999FEENBERG, Andrew. Questioning technology. 1. ed. Londres: Routledge. 1999.; 2010aFEENBERG, Andrew. Racionalização subversiva: tecnologia, poder e democracia. In: NEDER, Ricardo. A teoria crítica de Andrew Feenberg: racionalização democrática, poder e tecnologia. 2. ed. Brasília: Observatório do Movimento pela Tecnologia Social na América Latina/CDS/UnB/Capes, 2010a. p. 67-96.; 2010bFEENBERG, Andrew. Teoria crítica da tecnologia: um panorama. In: NEDER, Ricardo. A teoria crítica de Andrew Feenberg: racionalização democrática, poder e tecnologia. 2. ed. Brasília: Observatório do Movimento pela Tecnologia Social na América Latina/CDS/UnB/Capes, 2010b. p. 97-118.) duas premissas que compõem a base de categorização dos referentes: o determinismo/não determinismo e a neutralidade/não neutralidade no desenvolvimento das ciências e das tecnologias.

A necessária comunicação entre a análise do conteúdo, por meio de categorias produzidas com base na TCT de Feenberg (2010aFEENBERG, Andrew. Racionalização subversiva: tecnologia, poder e democracia. In: NEDER, Ricardo. A teoria crítica de Andrew Feenberg: racionalização democrática, poder e tecnologia. 2. ed. Brasília: Observatório do Movimento pela Tecnologia Social na América Latina/CDS/UnB/Capes, 2010a. p. 67-96.; 2010bFEENBERG, Andrew. Teoria crítica da tecnologia: um panorama. In: NEDER, Ricardo. A teoria crítica de Andrew Feenberg: racionalização democrática, poder e tecnologia. 2. ed. Brasília: Observatório do Movimento pela Tecnologia Social na América Latina/CDS/UnB/Capes, 2010b. p. 97-118.), e o campo da Educação Crítica é feita na quarta e última da análise, por meio das concepções de Paulo Freire (Freire, 1996FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1996.; 1997FREIRE, Paulo. Pedagogia da Esperança: um reencontro com a pedagogia do oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1997.) e de Dermeval Saviani (Saviani, 2012aSAVIANI, Dermeval. Marxismo, educação e pedagogia. In: SAVIANI, Dermeval; DUARTE, Newton. (org). Pedagogia histórico-crítica e a luta de classes na educação escolar. Campinas: Autores Associados, 2012a, p. 59-85.; 2012cSAVIANI, Dermeval. Escola e democracia. Campinas: Autores Associados, 2012c.). Esses autores (Freire, 1996FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1996.; 1997FREIRE, Paulo. Pedagogia da Esperança: um reencontro com a pedagogia do oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1997.; Saviani, 2012bSAVIANI, Dermeval. Origem e desenvolvimento da pedagogia histórico-crítica. Marxismo e Educação: fundamentos Marxistas da Pedagogia Histórico-Crítica. COLÓQUIO INTERNACIONAL MARX E ENGELS, VII, jul. 2012, Campinas, 2012b. Disponível em: Disponível em: https://drive.google.com/file/d/14kiDP1me-GvWergmkB0MZMkUTubsLo5j/view?usp=sharing . Acesso em: 28 mai. 2022.
https://drive.google.com/file/d/14kiDP1m...
; 2012cSAVIANI, Dermeval. Escola e democracia. Campinas: Autores Associados, 2012c.) apresentam possibilidades de compreensão e construção de currículos e de práticas pedagógicas que se vinculam de forma menos tecnocrática e mais humanista ao currículo, sendo assim aderentes ao campo de CTS no qual esta pesquisa se inscreve.

AS COMPETÊNCIAS NO CONTEXTO DA BNCC: A CULTURA DIGITAL E O PENSAMENTO CIENTÍFICO, CRÍTICO E CRIATIVO EM ANÁLISE

Na BNCC, a competência CD presume que seja tarefa da Educação Básica ensinar a “utilizar e criar tecnologias digitais de informação e comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais” (Brasil, 2017BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Base Nacional Comum Curricular. 2017. Disponível em: Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br . Acesso em: 18 mai. 2022.
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, p. 9). Ela prevê, portanto, a adoção de artefatos digitais para as práticas pedagógicas de todas as áreas do conhecimento, implicando modificações nas estruturas físicas e instalações das escolas, mas também mudanças nos fazeres pedagógicos.

A CD como competência geral da BNCC não possui caráter disciplinar, mas estabelece um fio condutor que deve permear as práticas educativas em todas as disciplinas ou componentes curriculares, desde a Educação Infantil até o fim do Ensino Médio.

Ainda de acordo com a BNCC (Brasil, 2017BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Base Nacional Comum Curricular. 2017. Disponível em: Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br . Acesso em: 18 mai. 2022.
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), a competência PCCC visa a exercitar a curiosidade intelectual e utilizar as ciências com criticidade e criatividade, para investigar causas, elaborar e testar hipóteses, formular e resolver problemas e criar soluções. Assim, diferente da CD, a competência PCCC, muito embora seja de caráter multi ou interdisciplinar como as demais competências da BNCC, traz uma relação mais clara quanto aos seus objetivos, o que motiva a sua intersecção mais direta com as Ciências da Natureza do que com outras áreas do conhecimento.

Assim como no trabalho de Wartha e Santos (2020WARTHA, Edson José; SANTOS, Edson José Santana. Pensamento científico, crítico e criativo: entendendo campos teóricos e perseguindo suas interações. Poiésis - Revista do Programa de Pós Graduação em Educação, Tubarão, v. 14, n. 26, p. 325-346, jul-dez 2020. https://doi.org/10.19177/prppge.v14e262020325-346
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), esta pesquisa adota uma concepção na qual se acredita que a competência PCCC pode representar uma base importante para a elaboração das atividades em sala de aula e para a produção de sentidos decorrente dessas atividades, principalmente tendo em vista o cenário da educação atual e os ataques crescentes à credibilidade da ciência. Entende-se, assim, que a perspectiva de ampliação do conhecimento com base científica, aliada aos conhecimentos técnicos e tecnológicos, com aspectos humanísticos apoiados na centralização do papel das pessoas em relação aos artefatos e aos conhecimentos, pode contribuir para a formação de uma consciência sobre a importância da ciência, em que esta apresenta mais sentido na vida cotidiana das pessoas (Wartha e Santos, 2020WARTHA, Edson José; SANTOS, Edson José Santana. Pensamento científico, crítico e criativo: entendendo campos teóricos e perseguindo suas interações. Poiésis - Revista do Programa de Pós Graduação em Educação, Tubarão, v. 14, n. 26, p. 325-346, jul-dez 2020. https://doi.org/10.19177/prppge.v14e262020325-346
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, p. 327).

Contudo, Auler (2002AULER, Décio. Articulação entre pressupostos do educador Paulo Freire e do Movimento CTS: novos caminhos para a Educação em Ciências. Contexto e Educação, Ijuí, v. 77, n. 22, p. 167-188, jan-jun. 2007. https://doi.org/10.21527/2179-1309.2007.77.167-188
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) destaca que a perspectiva salvacionista em relação às ciências e às tecnologias ainda é bastante comum nos discursos dos professores de Ciências. Para o autor (Auler, 2002AULER, Décio. Articulação entre pressupostos do educador Paulo Freire e do Movimento CTS: novos caminhos para a Educação em Ciências. Contexto e Educação, Ijuí, v. 77, n. 22, p. 167-188, jan-jun. 2007. https://doi.org/10.21527/2179-1309.2007.77.167-188
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, p. 106), além de errônea, essa perspectiva ainda coloca em risco a necessária discussão sobre o contexto no qual essas ciências e essas tecnologias são produzidas.

De acordo com a BNCC (Brasil, 2017BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Base Nacional Comum Curricular. 2017. Disponível em: Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br . Acesso em: 18 mai. 2022.
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), a competência PCCC visa a exercitar a curiosidade intelectual e utilizar as ciências com criticidade e criatividade, para investigar causas, elaborar e testar hipóteses, formular e resolver problemas e criar soluções.

É importante considerar, também, que cada uma das três “divisões” da competência PCCC - a crítica, a criatividade e a ciência - tem seus próprios méritos e limitações (Wartha e Santos, 2020WARTHA, Edson José; SANTOS, Edson José Santana. Pensamento científico, crítico e criativo: entendendo campos teóricos e perseguindo suas interações. Poiésis - Revista do Programa de Pós Graduação em Educação, Tubarão, v. 14, n. 26, p. 325-346, jul-dez 2020. https://doi.org/10.19177/prppge.v14e262020325-346
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, p. 326), que são tensionados e discutidos neste artigo.

Dessa maneira, a BNCC (Brasil, 2017BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Base Nacional Comum Curricular. 2017. Disponível em: Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br . Acesso em: 18 mai. 2022.
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) divide os objetivos dessa competência em duas categorias básicas: criatividade; e pensamento científico e crítico, conforme observado nos Quadros 1 e 2.

Quadro 1 -
A dimensão criatividade na competência pensamento científico, crítico e criativo da Base Nacional Comum Curricular, contemplando os objetivos de cada uma de suas 5 subdimensões.
Quadro 2 -
A dimensão pensamento científico e crítico na competência pensamento científico, crítico e construtivo da Base Nacional Comum Curricular, contemplando os objetivos de cada uma de suas seis subdimensões.

Com a leitura do Quadro 1, é possível afirmar que, quando se fala na competência PCCC, em criatividade, não se trata de qualquer criatividade, mas sim daquela relacionada às habilidades necessárias para investigar e resolver um problema. Esse problema, por sua vez, também não é de qualquer natureza: é um problema “científico”, amparado no paradigma de ciência vigente.

Essa visão aproxima-se das ideias de Peirce (2011PEIRCE, Charles Sanders. The essential Peirce: selected philosophical writings (1813-1913). Bloomington: Indiana University Press, 2011.), para quem a criatividade na ciência é entendida como forma de expressão racional, que pode ser desenvolvida quando os sujeitos têm algo a dizer sobre um tema determinado, exigindo, para tanto, conhecimentos teóricos obtidos por meio da ação investigativa do próprio sujeito. Esses conhecimentos, articulados, resultam do que ele chama de raciocínio abdutivo, cuja característica principal é a de acrescentar novos elementos a conclusões lógicas baseadas em fatos ou fenômenos, produzindo assim uma conclusão ou insight “surpreendente” para o problema apresentado (Peirce, 2011PEIRCE, Charles Sanders. The essential Peirce: selected philosophical writings (1813-1913). Bloomington: Indiana University Press, 2011., p. 235).

Observando-se ainda as subdimensões abordadas no Quadro 1, pode-se afirmar também que não existe uma relação explícita entre a dimensão criatividade (Quadro 1) e a crítica social e da ciência. As cinco subdimensões abordadas - exploração de ideias, conexões, criação de processos de investigação, soluções e execução - reforçam a ideia do modelo de racionalidade e de método científico predominante em modelos propedêuticos do ensino de Ciências da Natureza (Auler, 2007AULER, Décio. Articulação entre pressupostos do educador Paulo Freire e do Movimento CTS: novos caminhos para a Educação em Ciências. Contexto e Educação, Ijuí, v. 77, n. 22, p. 167-188, jan-jun. 2007. https://doi.org/10.21527/2179-1309.2007.77.167-188
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, p. 171). Esses modelos, de acordo com Auler (2007AULER, Décio. Articulação entre pressupostos do educador Paulo Freire e do Movimento CTS: novos caminhos para a Educação em Ciências. Contexto e Educação, Ijuí, v. 77, n. 22, p. 167-188, jan-jun. 2007. https://doi.org/10.21527/2179-1309.2007.77.167-188
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), nasceram no pós-Guerra e tinham o objetivo de formar “futuros cientistas”, introduzindo, desde cedo, o método científico e a investigação como base das aprendizagens nas Ciências da Natureza.

Por outro lado, de uma perspectiva crítica da educação, conectada às ideias de Duarte (2012DUARTE, Newton. Lukács e Saviani: a ontologia do ser social e a pedagogia histórico-crítica. In: DUARTE, Newton; SAVIANI, Dermeval; (org). Pedagogia histórico-crítica e luta de classes na educação escolar. Campinas: Autores Associados, 2012. p. 1-17. Disponível em: Disponível em: https://histedbrantigo.fe.unicamp.br/acer_histedbr/seminario/seminario8/_files/GlNNNi3M.pdf . Acesso em: 04 mar. 2022.
https://histedbrantigo.fe.unicamp.br/ace...
) e Saviani (2012aSAVIANI, Dermeval. Marxismo, educação e pedagogia. In: SAVIANI, Dermeval; DUARTE, Newton. (org). Pedagogia histórico-crítica e a luta de classes na educação escolar. Campinas: Autores Associados, 2012a, p. 59-85.; 2012cSAVIANI, Dermeval. Escola e democracia. Campinas: Autores Associados, 2012c.), a dimensão criatividade observada na competência PCCC pode ser considerada um elemento importante no desenvolvimento de uma racionalidade científica e de criticidade com vistas à emancipação dos sujeitos, uma vez que é tarefa da escola proporcionar acesso ao saber na direção de uma formação social, histórica e crítica (Saviani, 2012aSAVIANI, Dermeval. Marxismo, educação e pedagogia. In: SAVIANI, Dermeval; DUARTE, Newton. (org). Pedagogia histórico-crítica e a luta de classes na educação escolar. Campinas: Autores Associados, 2012a, p. 59-85.).

Nesse mesmo sentido, Freire (1996FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1996.) afirma que a professora e o professor comprometidos com uma educação centrada na humanização devem buscar formas de não apenas “narrar” o conteúdo para os/as estudantes - a chamada “educação bancária”. Em lugar disso, Freire (1996FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1996., p. 35) propõe a criação de situações gnosiológicas em que o objeto a ser “aprendido”, em lugar de ser o fim do ato de ensinar-aprender, seja o meio pelo qual os sujeitos desse ato (professor/a e estudantes) compreendem e problematizam o mundo - este sim, a finalidade do ato educativo.

Na sequência, apresenta-se o quadro com a dimensão pensamento científico e crítico, assim como as subdimensões relacionadas e suas descrições (Quadro 2).

Consoante ao que foi observado na dimensão criatividade (Quadro 1), verifica-se que a dimensão pensamento científico e crítico foca a racionalidade científica, principalmente com base na neutralidade do método científico. As suas subdimensões (formulação de perguntas, interpretação de dados, lógica e raciocínio, desenvolvimento de hipóteses, avaliação do raciocínio e explicação de evidências e síntese) reforçam as metodologias de ensino de Ciências da Natureza que supervalorizam o método e o cientista como produtores “neutros” de conhecimento (Nascimento e Von Linsingen, 2021NASCIMENTO, Tatiana Galieta; VON LINSINGEN, Irlan. Articulações entre o enfoque CTS e a pedagogia de Paulo Freire como base para o ensino de ciências. Convergencia, Toluca , v. 13, n. 42, p. 95-116, set-dez. 2006. Disponível em: Disponível em: https://www.scielo.org.mx/pdf/conver/v13n42/v13n42a6.pdf . Acesso em: 04 mar. 2022.
https://www.scielo.org.mx/pdf/conver/v13...
).

Corroborando esse posicionamento, Auler e Delizoicov (2006AULER, Décio; DELIZOICOV, Demétrio. Educação CTS: articulação entre pressupostos do educador Paulo Freire e referenciais ligados ao movimento CTS. 2006. In: Seminário Ibérico de Ciências, Tecnologia y Sociedad em la Educación Científica, IV; 2006, Málaga (Espanha) [recurso eletrônico]. p. 1-7. Disponível em: Disponível em: http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/2010/artigos_teses/Pedagogia2/aeducacao_cts.pdf . Acesso em: 05 mar. 2022.
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) destacam em seu trabalho como o determinismo tecnológico, em oposição à abordagem CTS no ensino de ciências, leva à errônea conclusão de que a neutralidade das Ciências da Natureza e, por conseguinte, das Tecnologias, leva ao bem-estar e ao desenvolvimento social.

Auler e Delizoicov (2006AULER, Décio; DELIZOICOV, Demétrio. Educação CTS: articulação entre pressupostos do educador Paulo Freire e referenciais ligados ao movimento CTS. 2006. In: Seminário Ibérico de Ciências, Tecnologia y Sociedad em la Educación Científica, IV; 2006, Málaga (Espanha) [recurso eletrônico]. p. 1-7. Disponível em: Disponível em: http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/2010/artigos_teses/Pedagogia2/aeducacao_cts.pdf . Acesso em: 05 mar. 2022.
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, p. 7) identificam três diferentes perspectivas deterministas presentes nas visões de ensino de ciências:

  • perspectiva tecnocrática: que é a ideia de que existe uma “solução ótima” para cada problema, que pode ser prescrita de forma eficiente e ideologicamente neutra por um/a especialista;

  • perspectiva salvacionista: a ideia de que, em algum momento, de alguma forma, a ciência e a tecnologia darão conta de todos os problemas da humanidade, conduzindo-a a um estado de bem-estar social generalizado;

  • perspectiva do determinismo tecnológico, que é a crença de que o desenvolvimento científico-tecnológico representa a própria marcha do progresso, sendo irreversível e excluindo a possibilidade de qualquer participação social alterar o ritmo e a direção desse desenvolvimento.

Auler e Delizoicov (2006AULER, Décio; DELIZOICOV, Demétrio. Educação CTS: articulação entre pressupostos do educador Paulo Freire e referenciais ligados ao movimento CTS. 2006. In: Seminário Ibérico de Ciências, Tecnologia y Sociedad em la Educación Científica, IV; 2006, Málaga (Espanha) [recurso eletrônico]. p. 1-7. Disponível em: Disponível em: http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/2010/artigos_teses/Pedagogia2/aeducacao_cts.pdf . Acesso em: 05 mar. 2022.
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, p. 7) apresentam, então, a articulação entre os métodos freireanos e a abordagem CTS no ensino de ciências como possibilidade de superação dessas perspectivas que levam à crença na neutralidade e no determinismo das Ciências da Natureza. Para os autores (Auler e Delizoicov, 2006AULER, Décio; DELIZOICOV, Demétrio. Educação CTS: articulação entre pressupostos do educador Paulo Freire e referenciais ligados ao movimento CTS. 2006. In: Seminário Ibérico de Ciências, Tecnologia y Sociedad em la Educación Científica, IV; 2006, Málaga (Espanha) [recurso eletrônico]. p. 1-7. Disponível em: Disponível em: http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/2010/artigos_teses/Pedagogia2/aeducacao_cts.pdf . Acesso em: 05 mar. 2022.
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), quando utilizadas no contexto do ensino de ciências, a abordagem CTS e a metodologia do oprimido de Freire (1996FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1996.) permitem a leitura crítica da realidade e a compreensão crítica sobre as relações entre a ciência, as tecnologias e os contextos sociais, promovendo assim a superação de modelos deterministas e das barreiras de silenciamento impostas à participação social.

No Quadro 3, são apresentadas as três dimensões da competência CD. Cada Dimensão desdobra-se em subdimensões, cada uma com seus objetivos específicos, que se encontram na coluna “Descrição”, mais à direita.

Quadro 3 -
Competência cultura digital da Base Nacional Comum Curricular, contemplando suas dimensões, subdimensões e a descrição dos objetivos de cada subdimensão.

De acordo com a análise de conteúdo realizada por (Machado e Amaral, 2021MACHADO, Aline Alvares; AMARAL, Marilia Abrahão. Uma análise crítica da competência cultura digital na Base Nacional Curricular Comum. Ciência & Educação, Bauru, v. 27, p. e21034, 2021. https://doi.org/10.1590/1516-731320210034
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), a competência CD apresenta diversos elementos que evidenciam seu caráter determinista e instrumental, relacionados com uma visão linear e neutra das tecnologias e da ciência, conforme o conceito de determinismo tecnológico de Feenberg (2010aFEENBERG, Andrew. Racionalização subversiva: tecnologia, poder e democracia. In: NEDER, Ricardo. A teoria crítica de Andrew Feenberg: racionalização democrática, poder e tecnologia. 2. ed. Brasília: Observatório do Movimento pela Tecnologia Social na América Latina/CDS/UnB/Capes, 2010a. p. 67-96.). Machado e Amaral (2021MACHADO, Aline Alvares; AMARAL, Marilia Abrahão. Uma análise crítica da competência cultura digital na Base Nacional Curricular Comum. Ciência & Educação, Bauru, v. 27, p. e21034, 2021. https://doi.org/10.1590/1516-731320210034
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) afirmam, ainda, que os artefatos indicados nos objetivos de aprendizagem na competência CD se relacionam de forma puramente técnica com a aprendizagem e com o ambiente escolar, citando como exemplo os objetivos presentes na dimensão pensamento computacional.

Ainda sob a influência da TCT de Feenberg (2010cFEENBERG, Andrew. Ten paradoxes of technology. Techné: Research in Philosophy and Technology, v. 14, n. 1, p. 3-15, 2010c. https://doi.org/10.5840/techne20101412
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), pode-se observar na competência CD da BNCC a presença de uma visão paradoxal das tecnologias, destacando o que o autor (Feenberg, 2010cFEENBERG, Andrew. Ten paradoxes of technology. Techné: Research in Philosophy and Technology, v. 14, n. 1, p. 3-15, 2010c. https://doi.org/10.5840/techne20101412
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, p. 10) chama de “paradoxo dos meios”. Segundo essa visão, as tecnologias são muitas vezes identificadas como um instrumento social, quando, na verdade, são a própria identidade social. Usando a definição do autor (Feenberg, 2010cFEENBERG, Andrew. Ten paradoxes of technology. Techné: Research in Philosophy and Technology, v. 14, n. 1, p. 3-15, 2010c. https://doi.org/10.5840/techne20101412
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, p. 10), “os meios são o fim”; essa máxima pode ser entendida, também, no contexto de aplicação da BNCC, ou seja, na prática pedagógica propriamente dita, em que muitas vezes o uso das tecnologias tem como fim somente o “contato” com as tecnologias digitais, sem contextualização, sem aprofundamento e sem uma leitura crítica dos seus usos e não usos.

A presença do paradoxo dos meios (Feenberg, 2010cFEENBERG, Andrew. Ten paradoxes of technology. Techné: Research in Philosophy and Technology, v. 14, n. 1, p. 3-15, 2010c. https://doi.org/10.5840/techne20101412
https://doi.org/10.5840/techne20101412...
) nos projetos e políticas públicas de tecnologias para a educação no Brasil, em geral, é evidenciada no artigo de Amiel (2018AMIEL, Tel. Geringonça, jeitinho, gambiarra: a pesquisa em tecnologia e educação diante de suas políticas e projetos. In: VALENTE, José Armando; FREIRE, Fernanda Maria Pereira; ARANTES, Flávia Linhalis. (org.). Tecnologia e educação: passado, presente e o que está por vir. Campinas: NIED/UNICAMP, 2018. p. 164-179. Disponível em: Disponível em: http://www.realp.unb.br/jspui/bitstream/10482/36915/1/CAPITULO_GeringoncaJeitinhoGambiarra.pdf . Acesso em: 18 maio 2022.
http://www.realp.unb.br/jspui/bitstream/...
). O autor ressalta que a maioria das políticas públicas de informática no Brasil é baseada na compra, distribuição e monitoramento de equipamentos, com base nos quais são elaborados os projetos e práticas pedagógicas (Amiel, 2018AMIEL, Tel. Geringonça, jeitinho, gambiarra: a pesquisa em tecnologia e educação diante de suas políticas e projetos. In: VALENTE, José Armando; FREIRE, Fernanda Maria Pereira; ARANTES, Flávia Linhalis. (org.). Tecnologia e educação: passado, presente e o que está por vir. Campinas: NIED/UNICAMP, 2018. p. 164-179. Disponível em: Disponível em: http://www.realp.unb.br/jspui/bitstream/10482/36915/1/CAPITULO_GeringoncaJeitinhoGambiarra.pdf . Acesso em: 18 maio 2022.
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, p. 172-173). Ou seja, essas políticas são centradas nos artefatos, e não nas necessidades da sociedade: o meio é o próprio fim.

Frequentemente, resulta dessa prática que a longevidade de uma política pública depende, muitas vezes, de apropriações e intervenções dos atores locais, as quais Amiel (2018AMIEL, Tel. Geringonça, jeitinho, gambiarra: a pesquisa em tecnologia e educação diante de suas políticas e projetos. In: VALENTE, José Armando; FREIRE, Fernanda Maria Pereira; ARANTES, Flávia Linhalis. (org.). Tecnologia e educação: passado, presente e o que está por vir. Campinas: NIED/UNICAMP, 2018. p. 164-179. Disponível em: Disponível em: http://www.realp.unb.br/jspui/bitstream/10482/36915/1/CAPITULO_GeringoncaJeitinhoGambiarra.pdf . Acesso em: 18 maio 2022.
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) chama de “jeitinho”. O jeitinho, nesse contexto, são práticas de apropriação que fazem com que o projeto, elaborado inicialmente distante da realidade, encontre espaço na prática pedagógica (Amiel, 2018AMIEL, Tel. Geringonça, jeitinho, gambiarra: a pesquisa em tecnologia e educação diante de suas políticas e projetos. In: VALENTE, José Armando; FREIRE, Fernanda Maria Pereira; ARANTES, Flávia Linhalis. (org.). Tecnologia e educação: passado, presente e o que está por vir. Campinas: NIED/UNICAMP, 2018. p. 164-179. Disponível em: Disponível em: http://www.realp.unb.br/jspui/bitstream/10482/36915/1/CAPITULO_GeringoncaJeitinhoGambiarra.pdf . Acesso em: 18 maio 2022.
http://www.realp.unb.br/jspui/bitstream/...
, p. 170).

Amiel (2018AMIEL, Tel. Geringonça, jeitinho, gambiarra: a pesquisa em tecnologia e educação diante de suas políticas e projetos. In: VALENTE, José Armando; FREIRE, Fernanda Maria Pereira; ARANTES, Flávia Linhalis. (org.). Tecnologia e educação: passado, presente e o que está por vir. Campinas: NIED/UNICAMP, 2018. p. 164-179. Disponível em: Disponível em: http://www.realp.unb.br/jspui/bitstream/10482/36915/1/CAPITULO_GeringoncaJeitinhoGambiarra.pdf . Acesso em: 18 maio 2022.
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) destaca, contudo, que as intervenções e participações precisam ser planejadas e compor uma agenda contínua, na qual os atores da educação tenham um papel que vá além de reagir, na ponta, a práticas pouco democráticas. Segundo Amiel (2018AMIEL, Tel. Geringonça, jeitinho, gambiarra: a pesquisa em tecnologia e educação diante de suas políticas e projetos. In: VALENTE, José Armando; FREIRE, Fernanda Maria Pereira; ARANTES, Flávia Linhalis. (org.). Tecnologia e educação: passado, presente e o que está por vir. Campinas: NIED/UNICAMP, 2018. p. 164-179. Disponível em: Disponível em: http://www.realp.unb.br/jspui/bitstream/10482/36915/1/CAPITULO_GeringoncaJeitinhoGambiarra.pdf . Acesso em: 18 maio 2022.
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, p. 176), as práticas pedagógicas devem ser atravessadas por propostas diferentes e projetos desafiadores, resultando em ações que passem pela experimentação com dispositivos, mas que não se resumam a isso, ressignificando as atividades com as tecnologias digitais no âmbito da escola.

Da mesma maneira que Auler e Delizoicov (2006AULER, Décio; DELIZOICOV, Demétrio. Educação CTS: articulação entre pressupostos do educador Paulo Freire e referenciais ligados ao movimento CTS. 2006. In: Seminário Ibérico de Ciências, Tecnologia y Sociedad em la Educación Científica, IV; 2006, Málaga (Espanha) [recurso eletrônico]. p. 1-7. Disponível em: Disponível em: http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/2010/artigos_teses/Pedagogia2/aeducacao_cts.pdf . Acesso em: 05 mar. 2022.
http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/...
), Machado e Amaral, (2021MACHADO, Aline Alvares; AMARAL, Marilia Abrahão. Uma análise crítica da competência cultura digital na Base Nacional Curricular Comum. Ciência & Educação, Bauru, v. 27, p. e21034, 2021. https://doi.org/10.1590/1516-731320210034
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) sugerem a abordagem crítica como caminho para a superação do determinismo tecnológico que pode permear o trabalho pedagógico com a competência CD, destacando que é necessário, ainda, o estabelecimento de diretrizes para que esse trabalho aconteça de forma participativa e resulte em uma visão de tecnologia situada social e culturalmente, com valores que influenciam e são influenciados pelas pessoas (Machado e Amaral, 2021MACHADO, Aline Alvares; AMARAL, Marilia Abrahão. Uma análise crítica da competência cultura digital na Base Nacional Curricular Comum. Ciência & Educação, Bauru, v. 27, p. e21034, 2021. https://doi.org/10.1590/1516-731320210034
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).

OS DIÁLOGOS POSSÍVEIS ENTRE AS COMPETÊNCIAS PENSAMENTO CIENTÍFICO, CRÍTICO E CRIATIVO ECULTURA DIGITAL DA BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR

Por meio da descrição de cada uma das subdimensões da competência PCCC dada pela BNCC e explicitada nos Quadros 1 e 2, foi realizada a análise de conteúdo de acordo com a metodologia proposta por Bardin (1977BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 1977.). As unidades de análise foram categorizadas com recurso à TCT de Feenberg (1999FEENBERG, Andrew. Questioning technology. 1. ed. Londres: Routledge. 1999.; 2010aFEENBERG, Andrew. Racionalização subversiva: tecnologia, poder e democracia. In: NEDER, Ricardo. A teoria crítica de Andrew Feenberg: racionalização democrática, poder e tecnologia. 2. ed. Brasília: Observatório do Movimento pela Tecnologia Social na América Latina/CDS/UnB/Capes, 2010a. p. 67-96.), resultando em duas categorias de análise produzidas pelas autoras.

A categoria determinismo foi criada considerando-se que, assim como as tecnologias, a ciência é considerada, no contexto de análise, um aspecto determinante da vida humana, ou seja, as tecnologias e a ciência são vistas de forma positivista e direcionadas quase sempre para o “bem-estar” das pessoas (Feenberg, 2010aFEENBERG, Andrew. Racionalização subversiva: tecnologia, poder e democracia. In: NEDER, Ricardo. A teoria crítica de Andrew Feenberg: racionalização democrática, poder e tecnologia. 2. ed. Brasília: Observatório do Movimento pela Tecnologia Social na América Latina/CDS/UnB/Capes, 2010a. p. 67-96.). De acordo com a visão determinista, as sociedades devem se adaptar ao progresso das ciências e da tecnologia. Nessa categoria estão as unidades de análise que foram entendidas como expressões do progresso inescapável da ciência, da mesma maneira que as tecnologias podem ser vistas como orientadoras do progresso das sociedades, indiferentes às interferências de qualquer natureza, até mesmo humanas (Feenberg, 2010aFEENBERG, Andrew. Racionalização subversiva: tecnologia, poder e democracia. In: NEDER, Ricardo. A teoria crítica de Andrew Feenberg: racionalização democrática, poder e tecnologia. 2. ed. Brasília: Observatório do Movimento pela Tecnologia Social na América Latina/CDS/UnB/Capes, 2010a. p. 67-96., 72-73).

Já a categoria neutralidade traduz um valor relacionado à eficiência: aqui, a ciência e o método científico são vistos como a “solução ótima” diante da maioria dos problemas da humanidade, da mesma maneira que as tecnologias são, em Feenberg (2010aFEENBERG, Andrew. Racionalização subversiva: tecnologia, poder e democracia. In: NEDER, Ricardo. A teoria crítica de Andrew Feenberg: racionalização democrática, poder e tecnologia. 2. ed. Brasília: Observatório do Movimento pela Tecnologia Social na América Latina/CDS/UnB/Capes, 2010a. p. 67-96.), vistas como criações que têm como único objetivo a eficiência.

Observou-se que uma única subdimensão pode ter elementos que evidenciam a presença de uma ou mais categorias, simultaneamente. Dessa maneira, são expostos, no Quadro 4, os resultados da análise de conteúdo de cada uma das subdimensões da competência PCCC na BNCC (Brasil, 2017BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Base Nacional Comum Curricular. 2017. Disponível em: Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br . Acesso em: 18 mai. 2022.
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).

Quadro 4 -
Análise de conteúdo da competência pensamento científico, crítico e criativo com base na metodologia de análise de conteúdo de Bardin (1977BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 1977.) e nos princípios da Teoria Crítica da Tecnologia de Feenberg (2010aFEENBERG, Andrew. Racionalização subversiva: tecnologia, poder e democracia. In: NEDER, Ricardo. A teoria crítica de Andrew Feenberg: racionalização democrática, poder e tecnologia. 2. ed. Brasília: Observatório do Movimento pela Tecnologia Social na América Latina/CDS/UnB/Capes, 2010a. p. 67-96.).

Ao analisar esses dados, é importante considerar que cada uma das três “divisões” da competência PCCC - a crítica, a criatividade e a ciência - tem seus próprios méritos e limitações (Wartha e Santos, 2020WARTHA, Edson José; SANTOS, Edson José Santana. Pensamento científico, crítico e criativo: entendendo campos teóricos e perseguindo suas interações. Poiésis - Revista do Programa de Pós Graduação em Educação, Tubarão, v. 14, n. 26, p. 325-346, jul-dez 2020. https://doi.org/10.19177/prppge.v14e262020325-346
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, p. 326), que são aqui tensionados e discutidos, sempre com base no texto apresentado no documento.

Destaca-se que a categoria determinismo foi identificada como presente em três das seis subdimensões em criatividade, sendo elas: exploração de ideias; criação de processos de investigação; e soluções.

A presença do determinismo foi evidenciada em trechos como a definição da subdimensão “exploração de ideias”, na qual se lê que os/as estudantes são estimulados a testar, combinar, modificar e gerar ideias para atingir objetivos e resolver problemas. Neste caso, considera-se pertinente questionar a origem dos objetivos e dos problemas dados à resolução. Considera-se que o/a professor/a deva ser o/a responsável por tal seleção, mas ainda assim, considerando-se os achados de Auler e Delizoicov (2006AULER, Décio; DELIZOICOV, Demétrio. Educação CTS: articulação entre pressupostos do educador Paulo Freire e referenciais ligados ao movimento CTS. 2006. In: Seminário Ibérico de Ciências, Tecnologia y Sociedad em la Educación Científica, IV; 2006, Málaga (Espanha) [recurso eletrônico]. p. 1-7. Disponível em: Disponível em: http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/2010/artigos_teses/Pedagogia2/aeducacao_cts.pdf . Acesso em: 05 mar. 2022.
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), é necessário observar sob qual perspectiva o/a profissional irá realizar essa abordagem.

Ainda em relação à dimensão “criatividade”, observou-se a presença de componentes de neutralidade nas subdimensões: criação de processos de investigação; soluções; e execução.

Um exemplo da presença da categoria de análise neutralidade é a definição da subdimensão “soluções” como a competência em que se desenvolve o “questionamento e modificação de ideias existentes e criação de soluções inovadoras”. Neste caso, chama atenção de modo particular a expressão “criação de soluções inovadoras”: de que tipo de inovação se está falando e para quem servirá tal inovação? É importante lembrar que Freire (1996FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1996., p. 26) destaca que a ciência é instrumento essencial para a manutenção do status quo, assim como as tecnologias. A tese da neutralidade, em Feenberg (2010aFEENBERG, Andrew. Racionalização subversiva: tecnologia, poder e democracia. In: NEDER, Ricardo. A teoria crítica de Andrew Feenberg: racionalização democrática, poder e tecnologia. 2. ed. Brasília: Observatório do Movimento pela Tecnologia Social na América Latina/CDS/UnB/Capes, 2010a. p. 67-96.), também deixa claro que a neutralidade é um conceito no qual a tecnologia é validada com base em um único critério: sua eficiência. Ainda que não seja questionado o critério falsamente objetivo da eficiência, questões anteriores a ela, como quem é o público atendido por tal inovação, e critérios posteriores, como por quais públicos essa inovação será acessada, não são explicitados. Assim, é perfeitamente cabível o questionamento: quais os interesses envolvidos na “inovação”, nesse contexto de “soluções de problemas”?

Ainda sobre a questão da neutralidade nas competências da BNCC, é possível estabelecer um vínculo com o trabalho de Freire (1996FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1996.), quando o autor assevera que uma ação educativa, seja ela técnica ou política, que ignora a particular visão do mundo das pessoas que estão envolvidas na ação, se constitui em uma “invasão cultural”, ainda que feita com a melhor das intenções.

Por outro lado, pontua-se que, na descrição da subdimensão conexões, foi observada uma preocupação em não direcionar e não determinar quais tipos de conexões de ideias deveriam ser feitas com base no ato criativo. Em comparação com as categorias de análise, considera-se que esse conteúdo caracteriza uma posição não determinista com relação às ciências. Ao ressaltar, em sua definição, o “questionamento e modificação de ideias existentes e criação de soluções inovadoras” (Brasil, 2017BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Base Nacional Comum Curricular. 2017. Disponível em: Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br . Acesso em: 18 mai. 2022.
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), portanto, observa-se a ausência de termos e expressões que denotam um tom linear e determinista encontrado em outras dimensões e subdimensões analisadas.

Para Martins (2012MARTINS, Amilton Rodrigo de Quadros. Usando o Scratch para potencializar o pensamento criativo em crianças do ensino fundamental. 2012. 114f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade de Passo Fundo, Passo Fundo, 2012.), as instituições escolares em geral discutem muito pouco as estratégias que podem estabelecer para estimular de forma efetiva o pensamento criativo de seus estudantes. Para o autor (Martins, 2012MARTINS, Amilton Rodrigo de Quadros. Usando o Scratch para potencializar o pensamento criativo em crianças do ensino fundamental. 2012. 114f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade de Passo Fundo, Passo Fundo, 2012., p. 27), o pensamento criativo seria a principal estratégia para a formação da opinião crítica, pois proporciona aos/às estudantes momentos e espaços para expressão e gera autonomia nesse processo. Isso, de acordo com o autor (Martins, 2012MARTINS, Amilton Rodrigo de Quadros. Usando o Scratch para potencializar o pensamento criativo em crianças do ensino fundamental. 2012. 114f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade de Passo Fundo, Passo Fundo, 2012., p. 32-34), faz com que os/as estudantes não sejam apenas “consumidores” de conhecimento, mas incorporem a perspectiva de construção dos próprios saberes por meio do ato criativo.

Na interpretação de Saviani (2012aSAVIANI, Dermeval. Marxismo, educação e pedagogia. In: SAVIANI, Dermeval; DUARTE, Newton. (org). Pedagogia histórico-crítica e a luta de classes na educação escolar. Campinas: Autores Associados, 2012a, p. 59-85., p. 81), a criatividade como expressão do sujeito concreto nunca é absoluta, uma vez que se encontra limitada pelas suas relações sociais, ou seja, pelas condições em que se encontra e que não escolheu. Se entendida sob essa ótica, a criatividade presente na competência PCCC pode ser vista como parte do desenvolvimento da originalidade e da autonomia que é centro do processo criativo em uma pedagogia crítica (Saviani, 2012aSAVIANI, Dermeval. Marxismo, educação e pedagogia. In: SAVIANI, Dermeval; DUARTE, Newton. (org). Pedagogia histórico-crítica e a luta de classes na educação escolar. Campinas: Autores Associados, 2012a, p. 59-85., p. 80-81).

Ponderando o conceito extraído de Peirce (2011PEIRCE, Charles Sanders. The essential Peirce: selected philosophical writings (1813-1913). Bloomington: Indiana University Press, 2011., p. 235) com relação aos conhecimentos teóricos exigidos para o desenvolvimento da criatividade, podem ser realizadas aproximações com o pensamento de Duarte (2012DUARTE, Newton. Lukács e Saviani: a ontologia do ser social e a pedagogia histórico-crítica. In: DUARTE, Newton; SAVIANI, Dermeval; (org). Pedagogia histórico-crítica e luta de classes na educação escolar. Campinas: Autores Associados, 2012. p. 1-17. Disponível em: Disponível em: https://histedbrantigo.fe.unicamp.br/acer_histedbr/seminario/seminario8/_files/GlNNNi3M.pdf . Acesso em: 04 mar. 2022.
https://histedbrantigo.fe.unicamp.br/ace...
). De acordo com este (Duarte, 2012DUARTE, Newton. Lukács e Saviani: a ontologia do ser social e a pedagogia histórico-crítica. In: DUARTE, Newton; SAVIANI, Dermeval; (org). Pedagogia histórico-crítica e luta de classes na educação escolar. Campinas: Autores Associados, 2012. p. 1-17. Disponível em: Disponível em: https://histedbrantigo.fe.unicamp.br/acer_histedbr/seminario/seminario8/_files/GlNNNi3M.pdf . Acesso em: 04 mar. 2022.
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), a luta pela socialização do conhecimento é componente imprescindível de um sistema educacional que vai contra a lógica do mercado. Para o pesquisador (Duarte, 2012DUARTE, Newton. Lukács e Saviani: a ontologia do ser social e a pedagogia histórico-crítica. In: DUARTE, Newton; SAVIANI, Dermeval; (org). Pedagogia histórico-crítica e luta de classes na educação escolar. Campinas: Autores Associados, 2012. p. 1-17. Disponível em: Disponível em: https://histedbrantigo.fe.unicamp.br/acer_histedbr/seminario/seminario8/_files/GlNNNi3M.pdf . Acesso em: 04 mar. 2022.
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, p. 154), é de fundamental importância para o currículo escolar que um conjunto basilar de conhecimentos historicamente construídos faça parte da formação de todas as pessoas. Além do mais, afirma o autor (Duarte, 2012DUARTE, Newton. Lukács e Saviani: a ontologia do ser social e a pedagogia histórico-crítica. In: DUARTE, Newton; SAVIANI, Dermeval; (org). Pedagogia histórico-crítica e luta de classes na educação escolar. Campinas: Autores Associados, 2012. p. 1-17. Disponível em: Disponível em: https://histedbrantigo.fe.unicamp.br/acer_histedbr/seminario/seminario8/_files/GlNNNi3M.pdf . Acesso em: 04 mar. 2022.
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), os artefatos estão carregados de conhecimentos, sendo assim condição primordial de uma educação libertadora que todos e todas tenham acesso a esses conhecimentos, que fazem parte, direta ou indiretamente, dos meios de produção de suas existências.

A propósito do ato criativo, Freire (1996FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1996., p. 33) afirma categoricamente que “só existe saber na invenção” e que, em oposição à educação libertadora, a educação bancária é vazia de criatividade, a qual, quando não está completamente ausente, encontra-se limitada, “domesticada”, em uma visão estreita de mundo. No caso da dimensão criatividade da PCCC, entende-se que essa “domesticação” se dá por meio dos sutis mecanismos de determinismo e de neutralidade presentes nas descrições das subdimensões, as quais conduzem as interpretações e fazeres dos profissionais da educação que nelas se baseiam.

De forma semelhante à dimensão da criatividade, é possível verificar que a dimensão pensamento científico e crítico (Quadro 4), suscitada pela competência PCCC, se volta para a análise e interpretação de dados, fatos, textos e experimentos científicos.

De acordo com Santos (2008SANTOS, Wildson Luiz Pereira dos. Educação científica humanística em uma perspectiva freireana: resgatando a função do ensino de CTS. Alexandria: Revista de Educação em Ciência e Tecnologia, Florianópolis, v. 1, n. 1. p. 109-131, mar. 2008. Disponível em: Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/alexandria/article/view/37426/28747 . Acesso em: 18 maio 2022.
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, p. 21), essa racionalidade científica é também um modelo totalitário, que nega a racionalidade de quaisquer outras formas de conhecimento, utilizando como critério de exclusão seus próprios princípios epistemológicos e suas regras metodológicas. Esses princípios, conforme Santos (2008SANTOS, Wildson Luiz Pereira dos. Educação científica humanística em uma perspectiva freireana: resgatando a função do ensino de CTS. Alexandria: Revista de Educação em Ciência e Tecnologia, Florianópolis, v. 1, n. 1. p. 109-131, mar. 2008. Disponível em: Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/alexandria/article/view/37426/28747 . Acesso em: 18 maio 2022.
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, p. 27-29), definem que a ciência é tudo aquilo que é quantificável e que, sendo complexo, necessita ser estudado em partes, assim como as relações dessas partes entre si e com o todo, levando assim a uma suposta “neutralidade” das ciências.

No Quadro 4, a análise da descrição das subdimensões da dimensão pensamento científico e crítico identificou o determinismo em duas das seis categorias, estando presente nas subdimensões interpretação de dados e síntese. Como exemplo da presença do determinismo, tem-se a descrição da subdimensão interpretação de dados: “interpretação de dados e informações com base em critérios científicos, éticos e estéticos”. Essa definição não deixa claro, porém demonstra apreço a um tipo específico de construção científica, evidenciando o caráter determinista no contexto..

No entanto, a presença do determinismo em apenas duas das seis subdimensões analisadas demonstra que a perspectiva determinista (Feenberg, 2010FEENBERG, Andrew. Racionalização subversiva: tecnologia, poder e democracia. In: NEDER, Ricardo. A teoria crítica de Andrew Feenberg: racionalização democrática, poder e tecnologia. 2. ed. Brasília: Observatório do Movimento pela Tecnologia Social na América Latina/CDS/UnB/Capes, 2010a. p. 67-96.) em relação ao ensino de Ciências da Natureza na Educação Básica pode estar dando lugar, gradativamente, a novas formas de conhecer e interpretar os fatos da natureza nos currículos escolares.

Fica evidente, portanto, que a maioria das subdimensões do pensamento científico e crítico na BNCC, no lugar do determinismo, traz a possibilidade de múltiplos paradigmas serem utilizados na construção de respostas. Toma-se como exemplo a subdimensão desenvolvimento de hipóteses (Brasil, 2017BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Base Nacional Comum Curricular. 2017. Disponível em: Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br . Acesso em: 18 mai. 2022.
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). Nela, é encontrado o incentivo à “sustentação de raciocínio com intuição, observação, modelo ou teoria”, ressaltando que diferentes sistemas de pensamento podem embasar teorias científicas e atribuindo significado social (Feenberg, 2010aFEENBERG, Andrew. Racionalização subversiva: tecnologia, poder e democracia. In: NEDER, Ricardo. A teoria crítica de Andrew Feenberg: racionalização democrática, poder e tecnologia. 2. ed. Brasília: Observatório do Movimento pela Tecnologia Social na América Latina/CDS/UnB/Capes, 2010a. p. 67-96., p. 78) aos estudos realizados no campo das Ciências da Natureza.

Por outro lado, conforme demonstrado no Quadro 4, a categoria neutralidade foi identificada mais vezes do que o determinismo na competência PCCC. Com base na leitura das descrições, o conceito de neutralidade foi identificado em referentes presentes nas subdimensões: interpretação de dados; lógica e raciocínio; avaliação do raciocínio e explicação de evidências; e síntese.

Um exemplo de referente da categoria neutralidade é a expressão “interpretação de dados e informações com base em critérios científicos, éticos e estéticos”, na subdimensão lógica e interpretação de dados (Quadro 4). Neste caso, percebe-se que a ciência, a ética e a estética são consideradas conhecimentos meramente instrumentais, necessariamente comprometidos com um conceito único e linear de uma “boa” análise ou de uma “boa” decisão técnica.

Conforme demonstrado, a presença de determinismo e de neutralidade, simultaneamente, nas subdimensões do pensamento científico e crítico foi identificada duas vezes, nas subdimensões interpretação de dados e síntese. Entende-se, por isso, que essas subdimensões devem ser interpretadas com cuidado na composição dos currículos e na construção de aulas que objetivem o pensamento crítico, especialmente envolvendo abordagens e temas do campo CTS.

Para Piza e Pansarelli (2012PIZA, Suze de Oliveira; PANSARELLI, Daniel. Sobre a descolonização do conhecimento: a invenção de outras epistemologias. Estudos de Religião, São Paulo, v. 26, n. 43, p. 25-35, 2012. https://doi.org/10.15603/2176-1078/er.v26n43p25-35
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), a ciência, mais especificamente as Ciências da Natureza, apresentam-se, de maneira geral, como uma epistemologia dominante que, assim sendo, apresenta-se universal e neutra. Entende-se que essa afirmação corrobora os resultados encontrados, com frequência maior de neutralidade do que de determinismo na dimensão mais relacionada ao pensamento científico em si.

Todavia, a crítica à razão europeia, da qual as chamadas “ciências duras” são beneficiárias, não as desqualificam enquanto campo do conhecimento, principalmente na Educação Básica (Piza e Pansarelli, 2012PIZA, Suze de Oliveira; PANSARELLI, Daniel. Sobre a descolonização do conhecimento: a invenção de outras epistemologias. Estudos de Religião, São Paulo, v. 26, n. 43, p. 25-35, 2012. https://doi.org/10.15603/2176-1078/er.v26n43p25-35
https://doi.org/10.15603/2176-1078/er.v2...
, p. 31). Para Piza e Pansarelli (2012PIZA, Suze de Oliveira; PANSARELLI, Daniel. Sobre a descolonização do conhecimento: a invenção de outras epistemologias. Estudos de Religião, São Paulo, v. 26, n. 43, p. 25-35, 2012. https://doi.org/10.15603/2176-1078/er.v26n43p25-35
https://doi.org/10.15603/2176-1078/er.v2...
), o problema consiste na necessidade de superação do totalitarismo epistêmico, pois o totalitarismo da ciência e da razão vai muito além da própria ciência ou dos limites do conhecimento. Tal afirmação também vai ao encontro do que foi verificado na análise de conteúdo da competência PCCC, verificando-se, com relação ao pensamento científico e crítico, uma presença não muito expressiva de referentes que se vinculam com o conceito do determinismo da TCT (Feenberg, 2010aFEENBERG, Andrew. Racionalização subversiva: tecnologia, poder e democracia. In: NEDER, Ricardo. A teoria crítica de Andrew Feenberg: racionalização democrática, poder e tecnologia. 2. ed. Brasília: Observatório do Movimento pela Tecnologia Social na América Latina/CDS/UnB/Capes, 2010a. p. 67-96.).

Bazzo (2012BAZZO, Walter Antonio. Cultura científica versus humanística: a CTS é o elo? Revista Ibero-Americana de Educação, Madrid, n. 58, p. 61-79, 2012. http://dx.doi.org/10.35362/rie580473
https://doi.org/10.35362/rie580473...
) enfatiza que a liberdade, o bem-estar e a maturidade intelectual dependem da educação em uma perspectiva que ultrapassa o mero conhecimento científico e técnico, numa suposta neutralidade da ciência. O autor (Bazzo, 2012BAZZO, Walter Antonio. Cultura científica versus humanística: a CTS é o elo? Revista Ibero-Americana de Educação, Madrid, n. 58, p. 61-79, 2012. http://dx.doi.org/10.35362/rie580473
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, p. 73) defende que os conhecimentos historicamente construídos são de suma importância, mas que as questões políticas e sociais não podem apenas tangenciar a educação, pois o dever da educação formal não deve ser educar para o desenvolvimento tecnológico, mas sim educar para a civilidade.

Para Santos (2007SANTOS, Wildson Luiz Pereira dos. Contextualização no ensino de ciências por meio de temas CTS em uma perspectiva crítica. Ciência & Ensino, Piracicaba, v. 1, número especial, nov. 2007. Disponível em: Disponível em: https://www.academia.edu/27297895/Contextualiza%C3%A7%C3%A3o_no_ensino_de_ci%C3%AAncias_por_meio_de_temas_CTS_em_uma_perspectiva_cr%C3%ADtica . Acesso em: 04 mar. 2022.
https://www.academia.edu/27297895/Contex...
, p. 4), o ensino de ciências é, muitas vezes, descontextualizado da sociedade. Por isso, o autor (Santos, 2007SANTOS, Wildson Luiz Pereira dos. Contextualização no ensino de ciências por meio de temas CTS em uma perspectiva crítica. Ciência & Ensino, Piracicaba, v. 1, número especial, nov. 2007. Disponível em: Disponível em: https://www.academia.edu/27297895/Contextualiza%C3%A7%C3%A3o_no_ensino_de_ci%C3%AAncias_por_meio_de_temas_CTS_em_uma_perspectiva_cr%C3%ADtica . Acesso em: 04 mar. 2022.
https://www.academia.edu/27297895/Contex...
, p. 4-5) argumenta que, para muitas pessoas, a simples menção do cotidiano nos textos e aulas de ciências já significa contextualização social. Santos (2007SANTOS, Wildson Luiz Pereira dos. Contextualização no ensino de ciências por meio de temas CTS em uma perspectiva crítica. Ciência & Ensino, Piracicaba, v. 1, número especial, nov. 2007. Disponível em: Disponível em: https://www.academia.edu/27297895/Contextualiza%C3%A7%C3%A3o_no_ensino_de_ci%C3%AAncias_por_meio_de_temas_CTS_em_uma_perspectiva_cr%C3%ADtica . Acesso em: 04 mar. 2022.
https://www.academia.edu/27297895/Contex...
, p. 15) afirma, ainda, que a simples menção da relação entre os processos naturais (físicos, químicos e biológicos) e as situações do cotidiano não torna o ensino de Ciências da Natureza mais relevante.

É importante ressaltar, também, que Santos (2007SANTOS, Wildson Luiz Pereira dos. Contextualização no ensino de ciências por meio de temas CTS em uma perspectiva crítica. Ciência & Ensino, Piracicaba, v. 1, número especial, nov. 2007. Disponível em: Disponível em: https://www.academia.edu/27297895/Contextualiza%C3%A7%C3%A3o_no_ensino_de_ci%C3%AAncias_por_meio_de_temas_CTS_em_uma_perspectiva_cr%C3%ADtica . Acesso em: 04 mar. 2022.
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) defende a discussão de aspectos sociocientíficos articulada aos conteúdos científicos e aos contextos sociais para proporcionar aos estudantes a compreensão do mundo social, o que deve servir de apoio no desenvolvimento da capacidade de tomada de decisão autônoma e responsável, valorizando e acentuando a qualidade de cidadão/ã e não reduzindo o/a estudante a mero aprendiz.

Por outro lado, concordando com Libâneo (2010LIBÂNEO, José Carlos. Pedagogia e Pedagogos, para quê? 12. ed. São Paulo: Cortez, 2010.), Santos (2007SANTOS, Wildson Luiz Pereira dos. Contextualização no ensino de ciências por meio de temas CTS em uma perspectiva crítica. Ciência & Ensino, Piracicaba, v. 1, número especial, nov. 2007. Disponível em: Disponível em: https://www.academia.edu/27297895/Contextualiza%C3%A7%C3%A3o_no_ensino_de_ci%C3%AAncias_por_meio_de_temas_CTS_em_uma_perspectiva_cr%C3%ADtica . Acesso em: 04 mar. 2022.
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, p. 7) admite que a abordagem científica que engloba aspectos críticos sociais, políticos, econômicos e ambientais e que, ao mesmo tempo, estimula a criatividade e a ação não pode ser vista como uma “pedra de salvação” - algo que, por si só, vai resolver os problemas da educação e, especialmente, da educação científica. Com isso, Santos (2007SANTOS, Wildson Luiz Pereira dos. Contextualização no ensino de ciências por meio de temas CTS em uma perspectiva crítica. Ciência & Ensino, Piracicaba, v. 1, número especial, nov. 2007. Disponível em: Disponível em: https://www.academia.edu/27297895/Contextualiza%C3%A7%C3%A3o_no_ensino_de_ci%C3%AAncias_por_meio_de_temas_CTS_em_uma_perspectiva_cr%C3%ADtica . Acesso em: 04 mar. 2022.
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) reitera que o simples fato de mencionar questões cotidianas da sociedade ou do senso comum nas aulas de ciências não é suficiente para que os alunos aprendam os conteúdos escolares com maior profundidade.

De acordo com Borges e Gomes (2005BORGES, Antônio Tarciso; GOMES, Alessandro Damásio Trani. Percepção de estudantes sobre desenhos de testes experimentais. Caderno Brasileiro de Ensino de Física, Florianópolis, v. 22, n. 1, p. 71-94, abr. 2005. Disponível em: Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/fisica/article/view/6394/5919 . Acesso em: 27 fev. 2022.
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), o desenvolvimento do pensamento científico no âmbito da escola é algo difícil e de longo prazo, uma vez que não envolve somente um conjunto de habilidades, mas também a formação de hábitos e o desenvolvimento daquilo que os autores denominam de competências que caracterizam a sensibilidade e o raciocínio científico em ação (Borges e Gomes, 2005BORGES, Antônio Tarciso; GOMES, Alessandro Damásio Trani. Percepção de estudantes sobre desenhos de testes experimentais. Caderno Brasileiro de Ensino de Física, Florianópolis, v. 22, n. 1, p. 71-94, abr. 2005. Disponível em: Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/fisica/article/view/6394/5919 . Acesso em: 27 fev. 2022.
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, p. 73).

Tensionando aspectos comuns entre as análises das duas competências da BNCC, CD e PCCC, observa-se que o determinismo e a neutralidade ainda são fortemente presentes em ambas as competências. Assim, são situações limite a serem superadas por meio de mecanismos de apropriação democrática dos currículos, muitas vezes entendidos como “currículo oculto” (Sacristán, 2000SACRISTÁN, J. Gimeno. O currículo: uma reflexão sobre a prática. Porto Alegre: Penso Editora, 2000.).

Nesse sentido, se por um lado a competência PCCC (Brasil, 2017BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Base Nacional Comum Curricular. 2017. Disponível em: Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br . Acesso em: 18 mai. 2022.
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) direciona ao conhecimento historicamente construído baseado em uma epistemologia hegemônica das ciências - pensamento “científico” -, por outro, é possível perceber a tentativa de estabelecer um suporte que direcione a um possível caminho menos linear para os conhecimentos científicos, pois propõe-se uma postura mais ativa e propositiva dos/as estudantes - pensamento “criativo” -, por meio de análises e questionamentos - pensamento “crítico” - que contribuem para o trabalho dos professores e professoras comprometidos com a ação dialógico-libertadora (Freire, 1996FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1996., p. 100).

Indo ao encontro dessas proposições, Santos (2008SANTOS, Wildson Luiz Pereira dos. Educação científica humanística em uma perspectiva freireana: resgatando a função do ensino de CTS. Alexandria: Revista de Educação em Ciência e Tecnologia, Florianópolis, v. 1, n. 1. p. 109-131, mar. 2008. Disponível em: Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/alexandria/article/view/37426/28747 . Acesso em: 18 maio 2022.
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) afirma que a abordagem humanística em CTS remete ao resgate de uma agenda política em que a neutralidade é vista como submissão aos valores hegemônicos, os quais frequentemente deslocam o papel das pessoas em função da racionalidade tecnológica. Nesse sentido, Santos (2008SANTOS, Wildson Luiz Pereira dos. Educação científica humanística em uma perspectiva freireana: resgatando a função do ensino de CTS. Alexandria: Revista de Educação em Ciência e Tecnologia, Florianópolis, v. 1, n. 1. p. 109-131, mar. 2008. Disponível em: Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/alexandria/article/view/37426/28747 . Acesso em: 18 maio 2022.
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, p. 125) é categórico ao afirmar que a defesa de uma postura “apolítica” no ensino das ciências e das tecnologias é a defesa da ideologia dominante imposta pelos sistemas tecnológicos vigentes.

Freire (1996FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1996., p. 100-101) afirma que o objetivo da ação dialógica-libertadora não deve ser “conduzir” os/as estudantes dos contextos nos quais se acham para “aderir” a um novo contexto, por meio da ação pedagógica. Ao contrário, deve proporcionar um reconhecimento do “porquê” e do “como” se encontram nesses contextos para que, em face disso, eles possam fazer suas escolhas.

Da mesma maneira, Santos (2008SANTOS, Wildson Luiz Pereira dos. Educação científica humanística em uma perspectiva freireana: resgatando a função do ensino de CTS. Alexandria: Revista de Educação em Ciência e Tecnologia, Florianópolis, v. 1, n. 1. p. 109-131, mar. 2008. Disponível em: Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/alexandria/article/view/37426/28747 . Acesso em: 18 maio 2022.
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, p. 126) sugere que o papel do/a professor/a no ensino das ciências não deve ser voltado para a imposição de valores ou soluções, mas sim proporcionar a compreensão de diferentes alternativas pelas quais o/a estudante consegue selecionar, com autonomia e responsabilidade, o caminho possível para si e para a sua comunidade, de acordo com seu contexto cultural e social.

Nessa acepção, faz sentido a noção freireana de reconhecimento da posição de oprimido (Freire, 1996FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1996., p. 101), que se faz não em sentido unilateral, do/a professor/a para o/a estudante, mas em uma práxis dialógica, com participação ativa de todos os sujeitos envolvidos.

O método da dialogicidade em Freire (1996FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1996.) propõe que a participação dos/as oprimidos/as deve ser um exercício mútuo de reflexão, crítica e criatividade que ultrapassa o exercício teórico, estendendo-se para a prática cidadã desses valores e conhecimentos, que, em última instância, podem contribuir para a construção de uma nova cartografia epistemológica. Conclama, como Freire (1996FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1996., p. 31), educadores/as e educandos/as (liderança e massas), cointencionados, em uma tarefa em que ambos são sujeitos no ato de conhecer e recriar criticamente o conhecimento.

Para tanto, é necessário subverter a centralidade dos objetos do conhecimento, sejam eles técnicos ou científicos, o que se propõe que seja realizado da perspectiva do/a estudante, ainda que o ponto de partida seja a epistemologia científica hegemônica e, por isso, opressora (Freire, 1996FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1996., p. 100).

Para Santos (2008SANTOS, Wildson Luiz Pereira dos. Educação científica humanística em uma perspectiva freireana: resgatando a função do ensino de CTS. Alexandria: Revista de Educação em Ciência e Tecnologia, Florianópolis, v. 1, n. 1. p. 109-131, mar. 2008. Disponível em: Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/alexandria/article/view/37426/28747 . Acesso em: 18 maio 2022.
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, p. 121), o enfoque CTS freireano é diferente do enfoque CTS geral no ensino das ciências. Isso porque, relata o autor (Santos, 2008SANTOS, Wildson Luiz Pereira dos. Educação científica humanística em uma perspectiva freireana: resgatando a função do ensino de CTS. Alexandria: Revista de Educação em Ciência e Tecnologia, Florianópolis, v. 1, n. 1. p. 109-131, mar. 2008. Disponível em: Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/alexandria/article/view/37426/28747 . Acesso em: 18 maio 2022.
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), muitas perspectivas que abordam questões sociais ou cotidianas são apresentadas para o ensino de ciências como socialmente relevantes, quando na verdade carregam em seu arcabouço o discurso de manutenção do processo de opressão que é marca do mundo globalizante de nossos tempos.

Percebe-se, ainda, que a subalternização dos saberes não contemplados pelo paradigma hegemônico da ciência eurocêntrica se faz presente no escopo da competência PCCC, pois não assume outros paradigmas e saberes na sua composição. Para Piza e Pansarelli (2012PIZA, Suze de Oliveira; PANSARELLI, Daniel. Sobre a descolonização do conhecimento: a invenção de outras epistemologias. Estudos de Religião, São Paulo, v. 26, n. 43, p. 25-35, 2012. https://doi.org/10.15603/2176-1078/er.v26n43p25-35
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, p. 34), a “não existência” de outras formas de conhecimento e, consequentemente, dos povos que a produzem permite concluir que a humanidade moderna não se concebe sem uma espécie de sub-humanidade moderna.

O conhecimento radical, de acordo com Freire (1996FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1996., p. 101), dá-se na problematização da subalternização dos saberes, no reconhecimento da proibição do “estar sendo” que, assim, problematiza a situação histórica real, concreta.

De forma similar, na competência CD (Brasil, 2017BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Base Nacional Comum Curricular. 2017. Disponível em: Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br . Acesso em: 18 mai. 2022.
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), a subalternização dos conhecimentos e usos das tecnologias está implícita, haja vista que não é aberto espaço no documento para a discussão dos pontos de vista das diversas culturas e apropriações, nem espaço para a discussão de tecnologias diversas. Conforme Freire (1996FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1996., p. 26), os/as estudantes, quase que como “coisas”, são vistos como tábulas rasas de conhecimento, sendo a ciência e as tecnologias forças indiscutíveis de manutenção de uma ordem que oprime, com a qual os grupos hegemônicos manipulam as sociedades.

Ainda mesmo em relação aos saberes populares, Freire (1997FREIRE, Paulo. Pedagogia da Esperança: um reencontro com a pedagogia do oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1997.) ressalta que não se pode admitir o desrespeito ao saber de senso comum, não sendo possível superá-lo sem partir e passar por ele.

Finalizando, a abordagem proposta considera que “descoisificar” os sujeitos da educação depende de ações que vão além do estabelecimento de linhas gerais (que, no caso da BNCC, são as competências) para o desenvolvimento de lógica, análise, criticidade ou criatividade: a humanização - processo que visa a “descoisificar” o sujeito - deve, fundamentalmente, descolonizar o conhecimento e, com isso, descolonizar o ser (Piza e Pansarelli, 2008PIZA, Suze de Oliveira; PANSARELLI, Daniel. Sobre a descolonização do conhecimento: a invenção de outras epistemologias. Estudos de Religião, São Paulo, v. 26, n. 43, p. 25-35, 2012. https://doi.org/10.15603/2176-1078/er.v26n43p25-35
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, p. 35).

CONCLUSÃO

A TCT de Feenberg (2010aFEENBERG, Andrew. Racionalização subversiva: tecnologia, poder e democracia. In: NEDER, Ricardo. A teoria crítica de Andrew Feenberg: racionalização democrática, poder e tecnologia. 2. ed. Brasília: Observatório do Movimento pela Tecnologia Social na América Latina/CDS/UnB/Capes, 2010a. p. 67-96.; 2010bFEENBERG, Andrew. Teoria crítica da tecnologia: um panorama. In: NEDER, Ricardo. A teoria crítica de Andrew Feenberg: racionalização democrática, poder e tecnologia. 2. ed. Brasília: Observatório do Movimento pela Tecnologia Social na América Latina/CDS/UnB/Capes, 2010b. p. 97-118.; 2017FEENBERG, Andrew. Critical theory of technology and STS. Thesis Eleven, v. 138, n. 1, p. 3-12, 2017. https://doi.org/10.1177/0725513616689388
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) mostrou-se adequada para a análise do tema investigado, sendo elemento essencial na construção das categorias de análise utilizadas neste estudo. Tais categorias permitiram a visualização de elementos essenciais presentes na descrição das subdimensões das competências da BNCC analisadas, retornando resultados que foram interpretados de acordo com pedagogias críticas (Freire, 1996FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1996.; 1997FREIRE, Paulo. Pedagogia da Esperança: um reencontro com a pedagogia do oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1997.; Saviani, 2012aSAVIANI, Dermeval. Marxismo, educação e pedagogia. In: SAVIANI, Dermeval; DUARTE, Newton. (org). Pedagogia histórico-crítica e a luta de classes na educação escolar. Campinas: Autores Associados, 2012a, p. 59-85.; 2012bSAVIANI, Dermeval. Origem e desenvolvimento da pedagogia histórico-crítica. Marxismo e Educação: fundamentos Marxistas da Pedagogia Histórico-Crítica. COLÓQUIO INTERNACIONAL MARX E ENGELS, VII, jul. 2012, Campinas, 2012b. Disponível em: Disponível em: https://drive.google.com/file/d/14kiDP1me-GvWergmkB0MZMkUTubsLo5j/view?usp=sharing . Acesso em: 28 mai. 2022.
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).

Com base nos resultados obtidos na análise de conteúdo da competência PCCC da BNCC, observou-se que a abordagem proposta na competência procura lançar olhar para além dos conteúdos científicos e/ou disciplinares. De forma análoga, também se observa que o tipo de trabalho proposto na competência PCCC tem caráter multidisciplinar e deve estar entrelaçado ao currículo ao longo de toda a Educação Básica. Esses aspectos foram prevalentes em subdimensões em que se observou a ausência de referentes que remetiam às categorias de análise consideradas neste trabalho, o determinismo e a neutralidade. Tais aspectos só parecem ser possíveis de alcançar ao articular os conceitos científicos aos diversos contextos sociais, no que a abordagem CTS pode ser uma aliada. Esses resultados concordam com Santos (2007SANTOS, Wildson Luiz Pereira dos. Contextualização no ensino de ciências por meio de temas CTS em uma perspectiva crítica. Ciência & Ensino, Piracicaba, v. 1, número especial, nov. 2007. Disponível em: Disponível em: https://www.academia.edu/27297895/Contextualiza%C3%A7%C3%A3o_no_ensino_de_ci%C3%AAncias_por_meio_de_temas_CTS_em_uma_perspectiva_cr%C3%ADtica . Acesso em: 04 mar. 2022.
https://www.academia.edu/27297895/Contex...
, p. 6), que sugere que a ciência seja abordada no currículo em estreita relação com temas sociais e situações reais, desenvolvendo aspectos sociocientíficos relacionados a questões ambientais, econômicas, sociais, políticas, culturais e éticas.

Ainda com relação à competência PCCC, considerando-se as contribuições de Peirce (2011PEIRCE, Charles Sanders. The essential Peirce: selected philosophical writings (1813-1913). Bloomington: Indiana University Press, 2011.) para a compreensão da criatividade nas ciências, a análise crítica da dimensão criatividade indicou aspectos que podem contribuir para a construção de uma visão crítica da realidade.

Contudo, considerando-se a importância da BNCC na construção dos currículos da Educação Básica e as competências com seu caráter transversal ao currículo de todas as etapas da Educação Básica, entende-se que a forte presença de termos que remetem ao determinismo (Feenberg, 2010aFEENBERG, Andrew. Racionalização subversiva: tecnologia, poder e democracia. In: NEDER, Ricardo. A teoria crítica de Andrew Feenberg: racionalização democrática, poder e tecnologia. 2. ed. Brasília: Observatório do Movimento pela Tecnologia Social na América Latina/CDS/UnB/Capes, 2010a. p. 67-96.) e à neutralidade (Feenberg, 2010aFEENBERG, Andrew. Racionalização subversiva: tecnologia, poder e democracia. In: NEDER, Ricardo. A teoria crítica de Andrew Feenberg: racionalização democrática, poder e tecnologia. 2. ed. Brasília: Observatório do Movimento pela Tecnologia Social na América Latina/CDS/UnB/Capes, 2010a. p. 67-96.; 2010bFEENBERG, Andrew. Teoria crítica da tecnologia: um panorama. In: NEDER, Ricardo. A teoria crítica de Andrew Feenberg: racionalização democrática, poder e tecnologia. 2. ed. Brasília: Observatório do Movimento pela Tecnologia Social na América Latina/CDS/UnB/Capes, 2010b. p. 97-118.) pode exercer pressão e influência tanto na construção dos currículos regionais e locais como nas práticas pedagógicas e nas formações e estudos dos profissionais da educação.

Também foi possível identificar, em estudo anterior (Machado e Amaral, 2021MACHADO, Aline Alvares; AMARAL, Marilia Abrahão. Uma análise crítica da competência cultura digital na Base Nacional Curricular Comum. Ciência & Educação, Bauru, v. 27, p. e21034, 2021. https://doi.org/10.1590/1516-731320210034
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), que a competência CD apresenta aspectos similares aos do determinismo caracterizado pela TCT de Feenberg (2010aFEENBERG, Andrew. Racionalização subversiva: tecnologia, poder e democracia. In: NEDER, Ricardo. A teoria crítica de Andrew Feenberg: racionalização democrática, poder e tecnologia. 2. ed. Brasília: Observatório do Movimento pela Tecnologia Social na América Latina/CDS/UnB/Capes, 2010a. p. 67-96.; 2017FEENBERG, Andrew. Critical theory of technology and STS. Thesis Eleven, v. 138, n. 1, p. 3-12, 2017. https://doi.org/10.1177/0725513616689388
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), entre os quais as categorias determinismo e neutralidade também foram identificadas. Analogamente ao que já foi evidenciado para a competência PCCC, reitera-se a necessidade de superação dos aspectos relacionados ao determinismo para a apropriação crítica dos conhecimentos e das tecnologias que são apresentados nos objetivos de aprendizagem da competência CD, com vistas a uma educação emancipadora.

Concordando com Santos (2008SANTOS, Wildson Luiz Pereira dos. Educação científica humanística em uma perspectiva freireana: resgatando a função do ensino de CTS. Alexandria: Revista de Educação em Ciência e Tecnologia, Florianópolis, v. 1, n. 1. p. 109-131, mar. 2008. Disponível em: Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/alexandria/article/view/37426/28747 . Acesso em: 18 maio 2022.
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), também se destaca a importância de abordagens do tipo CTS, especialmente no campo das Ciências da Natureza, mas deslocando-as do lugar-comum das implicações sociais teóricas, dos exemplos distantes e presentes apenas em vídeos e textos, para uma abordagem mais radical, no sentido freireano: de uma educação política que pretende transformar o modelo racional de ciência e tecnologia excludente em um modelo voltado para a justiça e a igualdade social (Santos, 2008SANTOS, Wildson Luiz Pereira dos. Educação científica humanística em uma perspectiva freireana: resgatando a função do ensino de CTS. Alexandria: Revista de Educação em Ciência e Tecnologia, Florianópolis, v. 1, n. 1. p. 109-131, mar. 2008. Disponível em: Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/alexandria/article/view/37426/28747 . Acesso em: 18 maio 2022.
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, p. 111).

Em Freire (1996FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1996., p. 40) é possível perceber que tal atitude radical só é possível diante do compromisso ético do professor e da professora perante a opressão, buscando a emersão das consciências dos/as estudantes, que resulta em sua inserção crítica na realidade.

Conclui-se, portanto, que o campo da CTS se constitui num elemento interessante no estabelecimento de uma aproximação crítica entre as competências PCCC e CD, bem como na construção de uma prática pedagógica que se vincula à criticidade e à dialogicidade, deixando o campo aberto para aprofundamentos nesses estudos.

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  • Como citar este artigo:

    MACHADO, Aline Alvares; AMARAL, Marília Abrahão. Diálogos entre as competências cultura digital e pensamento científico, crítico e criativo na Base Nacional Comum Curricular. Revista Brasileira de Educação, v. 29, p. e290006, 2024. https://doi.org/10.1590/S1413-24782024290006
  • Financiamento:

    O estudo não recebeu financiamento.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Fev 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    12 Jun 2022
  • Aceito
    31 Jan 2023
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