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Púrpura trombocitopênica imune na criança: qual a nossa realidade?

Autoimmune thrombocytopenic purpura in children: what is our reality?

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Púrpura trombocitopênica imune na criança: qual a nossa realidade?

Autoimmune thrombocytopenic purpura in children: what is our reality?

Angelo AtallaI; Abrahão E. Hallack NetoII

IProfessor Adjunto da Universidade Federal de Juiz de Fora

IIProfessor da Universidade Federal de Juiz de Fora

Correspondência Correspondência: Abrahão Elias Hallack Neto Avenida Rio Branco 2679/714 – Centro 36010-012 – Juiz de Fora-MG – Brasil Email: abrahallack@uol.com.br

A púrpura trombocitopênica imune (PTI) é uma patologia comum da infância, usualmente desencadeada por quadros infecciosos virais. A reação viral tipo antígeno-anticorpo pode ser demonstrada em forma aguda da doença, principalmente em crianças após infecção aguda viral, constituindo uma reação cruzada contra os antígenos plaquetários.1 Estudos recentes destacam a participação adicional de uma trombopoiese ineficaz contribuindo para o quadro de trombocitopenia na PTI.2

A forma aguda é de aparecimento súbito e, em geral, evolui em semanas ou meses para cura. Alguns casos são induzidos por drogas ou associados a outras doenças, como lúpus eritematoso sistêmico, agamaglobulinemia, doença linfoproliferativa ou mielodisplasia.3,4 Por tratar-se de doença autolimitada, poucas são as crianças que requerem tratamento, sendo seu adequado entendimento vital para o diagnóstico e condução terapêutica, principalmente nos casos mais graves e secundários a outras patologias.

O diagnóstico de PTI passa pela exclusão de patologias que cursam com trombocitopenia, mas sua abordagem propedêutica ainda é controversa. Embora o mielograma seja o único exame capaz de afastar de maneira definitiva outras patologias próprias da medula óssea, esse nem sempre é indicado.5,6 Delgado e cols.7 utilizam em sua avaliação apenas pacientes submetidos a tal exame, o que reduz o risco de diagnósticos de "falsos casos de PTI" e define critérios bem claros para inclusão e exclusão de pacientes, caracterizando de maneira inequívoca a população estudada.

Poucos são os dados epidemiológicos brasileiros sobre PTI, e o presente estudo responde a importantes perguntas, como a correlação entre o nível de plaquetas e as manifestações clínicas, deixando clara a presença de manifestações hemorrágicas graves em crianças com contagem plaquetária inferior a 10 x109/L. No referido estudo, a grande maioria dos pacientes não apresentou manifestações hemorrágicas graves, e foi o dado laboratorial que orientou a conduta terapêutica, revelando uma prática muito comum em todos os meios, mas inadequada, uma vez que se trata de doença autolimitada sem necessidade de terapia específica na maioria dos casos.

Embora rara, sua mais temida complicação é a hemorragia intracraniana, que pode ocorrer em crianças com plaquetas abaixo de 20 x109/L, assim como a hemorragia retiniana, que torna a realização do exame de fundo de olho imperativo para avaliar a presença dessa grave manifestação.6 Essas seriam indicações para a utilização de imunoglobulina humana, mas na população estudada por Delgado e cols. não foi detectado nenhum caso em que tal medicação tenha sido administrada como tratamento de primeira linha, o que provavelmente ocorreu pela pequena frequência destas graves complicações e pela dificuldade de sua obtenção no sistema público de saúde, sugerindo que, embora preconizado pela literatura internacional, seu uso em crianças pode ser evitado, mesmo em casos mais graves, reduzindo sensivelmente os custos do tratamento.

O estudo de Delgado e cols. nos remete a uma situação frequente na infância, que deve ser bem conhecida por hematologistas, mas principalmente por pediatras, que, na grande maioria dos casos, prestarão o primeiro atendimento a essas crianças, sendo esse fundamental para o seu reconhecimento, e, por conseguinte, para a conduta propedêutica e terapêutica. Estudos como este são muito relevantes para que se obtenha um melhor entendimento da PTI em nosso meio, otimizando tanto a investigação como o tratamento desta importante patologia.

Recebido: 18/01/2009

Aceito: 19/01/2009

Avaliação: O tema abordado foi sugerido e avaliado pelo editor.

  • 1. Chu YW, Korb J, Sakamoto KM. Idiopathic thrombocytopenic purpura. Pediatrics in Review. 2000;21:95-104.
  • 2. Gernsheimer TB. The pathophysiology of ITP revisited: Ineffective thrombopoiesis and the emerging role of thrombopoietin receptor agonists in the management of chronic immune thrombocytopenic púrpura. Hematology. 2008;219-26.
  • 3. Cines DB, Bussel JB. How I treat idiopathic thrombocytopenic purpura (ITP). Blood. 2005;106:2244-51.
  • 4. Borges AC, Pizza M, Borsato ML, Silva HMR, Castro HC, Luporini SM, et al. Púrpura trombocitopênica idiopática e linfoma não-Hodgkin de células T na infância. Rev. Bras. Hematol. Hemoter. 2006;28(1):73-5.
  • 5. Eden OB, Lilleyman JS. Guidelines for management of idiopathic thrombocytopenic purpura. Arch Dis Child 1992;67(8):1056-8.
  • 6. George JN, Woolf SH, Raskob GE, Wasser JS, Aledort LM, Ballem PJ, et al. Idiopathic thrombocytopenic purpura: a practice guideline developed by explicit methods for the American Society of Hematology. Blood. 1996;88:3-46.
  • 7. Delgado RB, Viana MB, Fernandes RAF. Púrpura trombocitopênica imune da criança: experiência de 12 anos em uma única instituição brasileira. Rev. Bras. Hematol. Hemoter. 2009;30(1):29-36.
  • Correspondência:

    Abrahão Elias Hallack Neto
    Avenida Rio Branco 2679/714 – Centro
    36010-012 – Juiz de Fora-MG – Brasil
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      06 Abr 2009
    • Data do Fascículo
      Fev 2009
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