Qualidade de vida e atitudes alimentares de graduandos da área da saúde

RESUMO

Objetivo:

Avaliar a qualidade de vida e as atitudes alimentares de graduandos dos cursos da saúde de uma universidade pública.

Método:

Estudo observacional, transversal, quantitativo, realizado em uma universidade federal. Foram utilizados três questionários para coleta de dados: um sociodemográfico e acadêmico, o WHOQOL-BREF e o Teste de Atitudes Alimentares (EAT-26).

Resultado:

Participaram do estudo 399 graduandos, maioria feminina, idade média de 22 anos, escores médios de EAT-26 de 15,12 e médias de qualidade de vida acima de 60 pontos em todos os domínios. Os graduandos do curso de Nutrição apresentaram atitudes alimentares mais inadequadas que os de outros cursos da saúde; à medida que evolui a idade, a vulnerabilidade às atitudes alimentares inadequadas aumenta; e a renda familiar influenciou negativamente a qualidade de vida nos domínios Físico e Social.

Conclusões:

A atitude alimentar inadequada diminui a qualidade de vida dos graduandos da saúde em todos os domínios do WHOOQOL-BREF.

Descritores:
Qualidade de Vida; Comportamento Alimentar; Transtornos da Alimentação e da Ingestão de Alimentos; Estudantes de Ciências da Saúde; Universidades

ABSTRACT

Objective:

To assess the quality of life and eating attitudes of health care students of the undergraduate programs of a public university.

Method:

Observational, cross-sectional, and quantitative study performed in a federal university. Three questionnaires were used for data collection: a socio-demographic and academic, the WHOQOL-BREF and the Eating Attitudes Test (EAT-26).

Result:

399 students participated in this study, most women, average age of 22 years, average scores of EAT-26 of 15.12 and quality-of-life averages above 60 points in all domains. The students of the undergraduate program in Nutrition presented more inappropriate eating attitudes than other health care students; as the age evolves, vulnerability to inadequate eating attitudes increases; and the family income influenced negatively the quality of life in Physical and Social domains.

Conclusions:

Inadequate eating attitude diminishes the quality of life of health care students in all domains of the WHOOQOL-BREF.

Descriptors:
Quality of Life; Eating Behavior; Eating and Food Intake Disorders; Health Care Students; Universities

RESUMEN

Objetivo:

Evaluar la calidad de vida y las actitudes alimentarias de estudiantes universitarios de los cursos de la salud de una universidad pública.

Método:

Estudio observacional, transversal, cuantitativo, realizado en una universidad federal. Se utilizaron tres cuestionarios para recolección de datos: uno sociodemográfico y académico, el WHOQOL-BREF y el Test de Actitudes Alimentarias (EAT-26).

Resultado:

Participaron en el estudio 399 estudiantes universitarios, la mayoría mujeres, edad media de 22 años, puntuaciones medias de EAT-26 de 15,12 y medias de calidad de vida por encima de 60 puntos en todos los dominios. Los estudiantes universitarios del curso de Nutrición presentaron actitudes alimentarias más inadecuadas que los de otros cursos de la salud; a medida que evoluciona la edad, la vulnerabilidad a las actitudes alimentarias inadecuadas aumenta; y la renta familiar influenció de manera negativa la calidad de vida en los dominios Físico y Social.

Conclusiones:

La actitud alimentaria inadecuada disminuye la calidad de vida de los estudiantes universitarios de la salud en todos los dominios del WHOOQOL-BREF.

Descriptores:
Calidad de Vida; Comportamiento Alimentario; Trastornos de la Alimentación y de la Ingestión de Alimentos; Estudiantes de Ciencias de la Salud; Universidades

INTRODUÇÃO

A alimentação e a nutrição devem ser adequadas aos aspectos biológicos e sociais das pessoas e estar de acordo com as necessidades alimentares, levando em consideração a cultura, raça, gênero, etnia, condição financeira, dimensões sociais e culturais do ato de comer. E, ainda, alimentação saudável é alimentar o corpo, a mente e o espírito, indo muito além da simples sustentação da vida⁽¹⁾.

Atitudes alimentares envolvem a relação com a alimentação - por exemplo, comer em resposta a sentimentos emocionais⁽²⁾. As atitudes alimentares anormais incluem uma série de sintomas relacionados e caracterizam três principais tipos de transtornos alimentares, a saber: anorexia nervosa, bulimia nervosa e compulsão alimentar⁽³⁾.

A anorexia nervosa é definida como um transtorno psiquiátrico, caracterizado por critérios diagnósticos relacionados: à restrição da ingesta calórica em vista das necessidades; à incapacidade de manter um peso adequado e saudável considerando a idade e gênero; ao medo intenso de ganhar peso ou engordar; ao não reconhecimento da gravidade do baixo peso; e ao início dos sintomas ocorrendo geralmente na adolescência ou adulto jovem⁽⁴⁾.

A pessoa com bulimia nervosa apresenta episódios recorrentes de compulsão alimentar - que pode ser entendida como “ingestão em período de tempo determinado de uma quantidade de alimento definitivamente maior do que a maioria dos indivíduos comeria em um mesmo período de tempo em circunstâncias semelhantes” - aliados à sensação de falta de domínio sobre a situação. Os comportamentos compensatórios inapropriados para não ganhar peso são vômitos autoinduzidos, uso indevido de laxantes e diuréticos, jejum ou excesso de exercícios físicos, sendo que a compulsão alimentar e os comportamentos compensatórios ocorrem no mínimo uma vez por semana durante três meses⁽⁴⁾.

Transtorno alimentar compulsivo é caracterizado por episódios recorrentes de compulsão alimentar aliados à sensação de falta de controle sobre a ingestão durante o episódio. Os episódios de compulsão alimentar estão associados a três (ou mais) aspectos: comer muito rápido; comer até sentir-se dolorosamente cheio; comer muito na ausência de fome; comer sozinho por vergonha do quanto se está comendo; e sentir-se deprimido ou muito culpado em seguida⁽⁴⁾.

Em muitos casos, distúrbios alimentares ocorrem em conjunto com outros transtornos psiquiátricos como ansiedade, pânico, transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) e problemas de abuso de álcool e drogas⁽⁴⁾.

A prevalência de transtornos de conduta alimentar varia dependendo do grupo estudado, sendo importante a encontrada nos graduandos da área da saúde, que parece ser maior em comparação a outros grupos acadêmicos⁽⁵⁾.

Os hábitos alimentares podem ser influenciados pelo ingresso na vida acadêmica⁽⁶⁾. Ademais, atitudes alimentares desfavoráveis à saúde contribuem para possíveis riscos de desenvolvimento de transtornos alimentares em graduandos^(7-8).

Os graduandos da área da saúde possuem maiores esclarecimentos sobre a importância da adoção de hábitos de vida saudáveis, contudo parece que não colocam em prática, nas suas vidas, o conhecimento adquirido nos cursos⁽⁹⁾. Assim, a qualidade de vida dessa população, de maioria jovem e em latente processo de formação profissional, pode estar sinalizando fragilidade em termos de condição de vida física⁽¹⁰⁾.

Nesse período de vida acadêmica, é possível vislumbrar fatores que influenciam as morbidades, muitas vezes confirmadas apenas no envelhecimento, mas que poderiam ser identificadas enquanto jovens. Isso possibilita meios de preveni-las, minimiza os prejuízos à saúde e promove hábitos saudáveis⁽¹¹⁾.

A existência dessas atitudes inadequadas entre universitários pode estar relacionada a diversos fatores, como a rápida mudança no estilo de vida e nos hábitos alimentares⁽³⁾, à qual se juntam sentimentos como medo, angústia, insegurança e ansiedade, gerados nos graduandos quando se inicia a rotina universitária⁽¹²⁾.

A alimentação e nutrição saudável são consideradas como fator de promoção e proteção à saúde e qualidade de vida - requisitos básicos de direitos humanos⁽¹³⁾.

De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), a qualidade de vida pode ser definida como “a percepção do indivíduo de sua posição na vida no contexto da cultura e sistema de valores nos quais ele vive, e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações”. Já a saúde “é um estado de completo bem-estar físico, mental e social” e não consiste apenas na ausência de doença ou de enfermidade⁽¹⁴⁾.

As necessidades de prevenção, promoção ou recuperação do estado de saúde e qualidade de vida do ser humano serão responsabilidades profissionais que os graduandos da área da saúde assumirão futuramente. Nesse sentido, os fatores que podem favorecer a disposição para o aprendizado dessa população, principalmente no que tange às percepções positivas sobre qualidade de vida, despertam inquietações de pesquisas⁽¹⁰⁾.

OBJETIVO

Avaliar a qualidade de vida e as atitudes alimentares de graduandos dos cursos da área da saúde de uma universidade pública no interior de Minas Gerais.

MÉTODO

Aspectos éticos

Tratou se de um estudo integrante de um projeto construído pelo grupo de pesquisa “Viver Adulto e Saúde” intitulado “Promoção e proteção da saúde física e mental de estudantes universitários”. Foi aprovado em setembro de 2015 pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) com Seres Humanos da UFTM, a fim de cumprir as exigências da Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde.

Desenho, local do estudo e período

Estudo observacional e transversal quantitativo, realizado em uma universidade pública no interior de Minas Gerais, e cuja coleta de dados se deu no segundo semestre de 2016.

População ou amostra: critérios de inclusão e exclusão

A população deste estudo foi constituída por graduandos dos cursos da área da saúde, quais sejam: Biomedicina, Educação Física, Enfermagem, Fisioterapia, Medicina, Nutrição e Terapia Ocupacional. Foram excluídos os que estavam em licença, afastamento ou trancamento do curso de graduação. Foram incluídos os regularmente matriculados e com idade igual ou superior a 18 anos, totalizando 1.996 sujeitos.

Executou-se o procedimento de amostragem aleatória simples com reposição, pelo programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 21.0, em português, 2012. Do total de 1.996 graduandos, foram sorteados aleatoriamente 590 sujeitos.

O cálculo do tamanho amostral considerou um coeficiente de determinação de R² = 0,02 em um modelo de regressão linear múltipla, com quatro preditores, tendo como nível de significância ou erro do tipo I de α = 0,05 e erro do tipo II β = 0,2, resultando, portanto, em um poder estatístico apriorístico de 80%. Utilizando-se o aplicativo Power Analysis and Sample Size (PASS), versão de 2002, introduzindo-se os valores acima descritos, obteve-se um tamanho de amostra mínimo de n = 590. Considerando reposição de amostragem de 15% (recusas em participar, não devolução do questionário, preenchimento incompleto do instrumento, trancamentos ou abandono dos cursos), o número final de tentativas de entrevistas foi 695. A variável dependente principal foi o domínio Psicológico da escala WHOQOL-BREF. Dos 590 graduandos sorteados aleatoriamente, 399 participaram do estudo, acarretando uma perda amostral de 191 sujeitos (ausências, licenças, trancamentos ou abandono de curso, recusas em participar do estudo e não devolução do instrumento de coleta de dados).

Protocolo do estudo

A coleta de dados foi realizada por meio de um instrumento com três questionários, sendo um sociodemográfico e acadêmico elaborado pelos próprios pesquisadores. A qualidade de vida foi avaliada por meio do WHOQOL-BREF, que foi traduzido e validado em 2000 para utilização no Brasil. É composto por 26 questões, das quais as duas primeiras são de percepções gerais: a primeira, sobre qualidade de vida; a segunda, sobre satisfação com a saúde; e as demais questões foram divididas em quatro domínios - Físico, Psicológico, Relações Sociais e Meio Ambiente⁽¹⁵⁾.

As pontuações são realizadas por meio de escala do tipo Likert, de 1 a 5 pontos⁽¹⁶⁾, escalonadas numa direção positiva: quanto mais próximas de 100 estiverem às médias, melhor a qualidade de vida no referido domínio⁽¹⁵⁾.

As pontuações relativas aos domínios foram multiplicadas por 4, de modo a deixar os escores de cada domínio com 100 pontos, comparados ao WHOQOL-100; para isso, foi utilizada a sintaxe disponibilizada pelo grupo WHOQOL.

A atitude alimentar foi mensurada pelo Teste de Atitudes Alimentares (EAT-26), que é uma versão abreviada do EAT-40, de 1982⁽¹⁷⁾. O resultado do teste é a soma das respostas, caracterizadas por uma escala do tipo Likert⁽¹⁶⁾. As 26 questões do teste apresentam 6 opções de resposta, sendo: sempre (3 pontos); muitas vezes (2 pontos); às vezes (1 ponto); poucas vezes, quase nunca e nunca (0 ponto). A questão de número 25 é uma exceção, pois apresenta pontos em ordem invertida, de modo que as respostas “sempre”, “muitas vezes” e “às vezes” não são pontuadas, ou seja, recebem 0, e as alternativas “poucas vezes”, “quase nunca” e “nunca” são pontuadas com 1, 2 e 3, respectivamente^(18-20).

O EAT-26 é um teste psicométrico válido⁽¹⁹⁾, que se propõe a mensurar a frequência de restrição alimentar, compulsão alimentar, comportamentos purgativos e pressão do meio ambiente para a ingesta alimentar⁽²⁰⁾. Ele foi traduzido e validado no Brasil por Bighetti e outros em 2004 para população feminina, em um estudo com 365 adolescentes do sexo feminino na cidade de Ribeirão Preto, SP⁽¹⁹⁾.

O questionário é composto por três subescalas: Dieta; Bulimia e preocupação com os alimentos; e Controle oral.

Para este estudo com graduandos da área da saúde, foram considerados os escores totais de maneira quantitativa, que podem variar de 0 a 78 pontos, de modo que, quanto maior o escore total, maior o risco para desenvolvimento de transtornos alimentares.

Análise dos resultados e estatística

Foi realizada análise univariada de variáveis categóricas, que incluiu frequências absoluta e relativa, ao passo que as variáveis quantitativas foram resumidas empregando-se medidas de tendência central (média e mediana) e dispersão (amplitude e desvio-padrão). A análise bivariada dos escores do EAT-26 incluiu teste t para preditores dicotômicos, correlações de Spearman para variáveis quantitativas ordinais (renda familiar mensal e período do curso) e correlações de Pearson para variável quantitativa (idade); e a regressão linear múltipla incluiu a influência simultânea dos preditores sociodemográficos, acadêmicos e do desfecho secundário (EAT-26). A variável “curso” foi dicotomizada em Nutrição e Outros, para análise de regressão linear.

O nível de significância utilizado foi p ≤ 0,05.

RESULTADOS

Observou-se maior participação dos graduandos do curso de Medicina (29,6%) e menor adesão do curso de Educação Física (5,3%), Tabela 1.

Tabela 1
Distribuição dos graduandos dos cursos da área da saúde em Uberaba, Minas Gerais, Brasil, 2017

Variáveis	Participantes
	n	%
Curso
Biomedicina	55	13,8
Educação Física	21	5,3
Enfermagem	77	19,3
Fisioterapia	62	15,5
Medicina	118	29,6
Nutrição	35	8,8
Terapia Ocupacional	31	7,8
Total	399	100

Neste estudo, houve maior participação do sexo feminino (72,4%) com predomínio (67,2%) de sujeitos entre 20 e 24 anos e idade modal de 22,37 anos. Aproximadamente metade (51,6%) da amostra possuía renda familiar de 2 até 10 salários.

Os escores totais do EAT-26 tiveram amplitude de 1 a 49 pontos, média de 15,12 e desvio-padrão de 10,01.

A correlação entre os escores do EAT-26 com a idade e o período do curso de graduação (Tabela 2) apresentou-se fraca e positiva, com diferença estatisticamente significante, indicando que, quanto maior a idade e o período acadêmico, mais inadequado é o comportamento alimentar.

Tabela 2
Correlação entre os escores do EAT-26 com a idade, renda familiar e período dos graduandos dos cursos da área da saúde da Universidade Federal do Triângulo Mineiro, Uberaba, Minas Gerais, Brasil, 2017

Variáveis	Escores do EAT-26
	R	p
Idade	0,145	0,004*
Renda Familiar	0,048	0,343**
Período	0,229	< 0,001**

• Nota:
• ^*
  Coeficiente de correlação de Pearson;
• ^**
  Coeficiente de correlação de Spearman

De acordo com a Tabela 3, a consistência interna do WHOQOL-BREF foi calculada utilizando-se o coeficiente α de Cronbach para cada domínio e apresentou valores satisfatórios que indicam boa fidedignidade das respostas dos participantes. A maior média foi obtida no domínio Social (71,30) e a menor no domínio Meio Ambiente (62,44).

Tabela 3
Medidas de Centralidade e dispersão dos escores dos domínios de qualidade de vida (WHOQOL-BREF) dos graduandos dos cursos da área da saúde em Uberaba, Minas Gerais, Brasil, 2017

Domínios WHOQOL-BREF	Mínimo	Máximo	Mediana	Média	Desvio-Padrão	α*
Físico	14,29	100,00	67,85	65,82	15,01	0,78
Psicológico	8,33	95,93	62,50	63,27	14,93	0,77
Social	8,33	100,00	75,00	71,30	17,78	0,70
Meio Ambiente	28,13	96,88	62,50	62,44	12,81	0,72

• Nota:
• ^*
  Medida de consistência interna (α de Cronbach).

De acordo com a Tabela 4, observou-se que a variável “sexo” não se apresentou estatisticamente significante, demonstrando que não há diferença entre atitudes alimentares de homens e mulheres no período acadêmico. A variável “curso” apresentou β positivo (0,10) e significância estatística (p = 0,03), mostrando que os graduandos do curso de Nutrição apresentam atitudes alimentares mais inadequadas, de maneira que estão mais expostos ao risco de desenvolvimento de transtorno alimentar do que os de outros cursos da área da saúde da universidade-campo deste estudo.

Tabela 4
Regressão linear entre os escores do EAT-26 e as variáveis "sexo", "curso de graduação", "idade" e "renda familiar mensal" dos graduandos dos cursos da área da saúde em Uberaba, Minas Gerais, Brasil, 2017

Variáveis	Escores do EAT-26
	β	p
Sexo	0,08	0,09
Curso	0,10	0,03
Idade	0,14	0,004
Renda familiar mensal	-0,10	0,04

A variável idade apresentou β positivo (0,14) e significância estatística (p = 0,004), indicando que, quanto maior a idade, maiores os escores do EAT-26, ou seja, quanto mais aumenta a idade, mais inadequado se torna o comportamento alimentar e maior o risco de desenvolvimento de transtorno alimentar.

O valor negativo do β (-0,10) para a variável renda familiar mensal (p = 0,04) indicou que, quanto menor a renda familiar, maior o escore do EAT-26, implicando comportamento alimentar mais inadequado.

Conforme a Tabela 5, a renda familiar mostrou diferença estatisticamente significante nos domínios Físico (p = 0,009) e Social (p = 0,03), com β positivo (0,13 e 0,10, respectivamente) em ambos os domínios. Esses achados indicam que a qualidade de vida do participante do estudo nos referidos domínios é melhor quanto maior a sua renda familiar.

Tabela 5
Regressão linear entre dos escores dos domínios de qualidade de vida (WHOQOL-BREF: Físico, Psicológico, Social e Meio Ambiente) com sexo, idade, renda familiar mensal e escores do EAT-26 dos graduandos dos cursos da área em Uberaba, Minas Gerais, Brasil, 2017

Variáveis	Domínio Físico		Domínio Psicológico		Domínio Social		Domínio Meio Ambiente
	β	p	β	p	β	p	β	p
Sexo	-0,03	0,58	-0,01	0,78	0,08	0,09	0,06	0,21
Idade	0,001	0,98	0,02	0,56	-0,06	0,22	0,03	0,50
Renda familiar	0,13	0,009	0,07	0,16	0,10	0,03	0,21	0,67
EAT-26	-0,16	0,001	-0,16	0,002	-0,15	0,002	-0,13	0,008

Os escores do EAT-26 mostraram-se estatisticamente significativos nos quatro domínios de qualidade de vida com valores de β negativos. Diante disso, observou-se que atitude alimentar inadequada diminui a qualidade de vida dos graduandos em termos físicos, psicológicos, sociais e ambientais.

DISCUSSÃO

Em estudo realizado em 9 universidades espanholas com universitários de Ciências da Saúde, houve maior participação dos estudantes de Enfermagem (63,6%) seguidos de Fisioterapia (22,7%), Medicina (11,4%) e Dietética (2,3%), com predomínio do sexo feminino (70,4%). A idade média foi de 21,35 anos⁽²¹⁾.

No sudoeste asiático, em uma amostra composta por graduandos em Enfermagem (49,8%), Radiografia (26,6%) e Tecnologia em Análise Médica (23,7%), foi identificada idade média de 20 anos⁽²²⁾. No nordeste brasileiro, também foi encontrado predomínio (77,7%) do sexo feminino e média de idade foi 22 anos⁽¹²⁾.

Os estudantes colombianos de Fisioterapia, Medicina, Nutrição, Enfermagem e Microbiologia apresentaram resultados semelhantes, sendo 62,9% do sexo feminino, idade média de 20,6 anos⁽²³⁾.

Achados de estudos espanhol⁽²¹⁾, malásio⁽²²⁾, colombiano⁽²³⁾, nordestino⁽¹²⁾ e também de resultados de pesquisa com universitários chilenos⁽²⁴⁾ corroboram os resultados desta pesquisa, com maior população feminina entre os graduandos da área da saúde. Já os dados de 2014 de pesquisa nacional informam que as mulheres são as estudantes mais frequentes, independentemente da modalidade de ensino⁽²⁵⁾.

A faixa etária entre a população dos estudos esteve muito próxima, e a média variou entre 20 a 22 anos, o que ratifica à média de 22,37 obtida neste estudo e a idade modal de 21 anos divulgada pelo Censo de educação superior⁽²⁵⁾.

Em consonância com este estudo, foram identificadas faixas de renda predominantes (40,2%) entre 4 e 6 salários mínimos⁽²⁶⁾. Em outro estudo, 74,6% dos sujeitos da pesquisa possuíam renda entre 3 e 4 salários mínimos⁽²³⁾, e ainda foi identificado que 68% de uma amostra de estudantes mexicanos de uma universidade pública responderam que a renda disponível era insuficiente⁽²⁷⁾.

A estratificação da renda familiar variou muito de estudo para estudo, mas foi perceptível a importância dessa variável para os estudos com graduandos relacionados à qualidade de vida.

Em relação aos escores do EAT-26, média muito semelhante (15,3) foi encontrada entre universitários de Educação Física do interior de São Paulo⁽⁷⁾. Já em estudantes de Enfermagem na Índia, o escore médio foi de 7,9⁽²⁸⁾. Estudo realizado nas cinco regiões do Brasil (Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul) mostrou que 26,1% da amostra de graduandas da área da saúde apresentavam um comportamento de risco para desenvolvimento de transtornos alimentares⁽²⁾; e, no Karachi (Paquistão), foram encontrados 22,75% de homens e mulheres em período acadêmico em risco de desenvolvimento desses transtornos⁽²⁹⁾.

Resultados semelhantes, relacionados a maior média de qualidade de vida no domínio Social (média de 74,3), foram encontrados em graduandos de enfermagem⁽¹²⁾. E, em estudantes de Medicina da Universidade Estadual do Rio de Janeiro a média no domínio Meio Ambiente foi de 58,0⁽³⁰⁾, dados que confirmam os obtidos, neste estudo, de menor média para o domínio Meio Ambiente.

No presente trabalho, não foi observada diferença entre as atitudes alimentares de homens e mulheres; em oposição, foi encontrada diferença significativa (p = 0,01) de atitudes alimentares entre os sexos⁽²⁹⁾. E, também no interior de Minas Gerais, universitários de diversas áreas do conhecimento (Ciências da computação, Direito, Engenharias Civil e Elétrica, Filosofia, Fisioterapia, Matemática, Medicina e Psicologia) apresentaram diferença significativa (p = 0,001) entre os escores masculinos e femininos⁽³¹⁾. Tais achados de oposição foram confirmados também pela American Psychiatric Association, em que as mulheres apresentaram maior prevalência de transtornos alimentares⁽⁴⁾.

Em relação ao resultado observado neste estudo, de maior risco de transtorno alimentar em graduandos de Nutrição, resultados aditivos foram encontrados, pois foram verificados maiores níveis de restrição dietética e compulsão alimentar, que indicaram um comportamento alimentar inadequado em estudantes portugueses de Nutrição de ambos os sexos, quando comparados com de outras áreas do conhecimento (Educação Básica, História, Psicologia, Odontologia, Medicina, Engenharia Eletrotécnica, História da Arte, Ciência Política, Geografia e Arquitetura)⁽³²⁾. Em uma universidade espanhola, estudantes de Nutrição e Dietética e de Enfermagem mantêm comportamento alimentar inadequado⁽³³⁾. Corroborando esses achados, risco expressivo para desenvolvimento de transtornos alimentares foi identificado entre as participantes do curso de Nutrição, pois 21,7% apresentaram escores iguais ou superiores a 21 pontos em uma universidade no interior de Minas Gerais⁽²⁶⁾.

Os transtornos alimentares, na maioria das vezes, acometem mais mulheres entre as idades de 12 e 35, faixa de idade em que a maioria das participantes deste estudo se encontra⁽⁴⁾. Contudo, foi identificada frequência de 24% (idêntica à encontrada neste estudo com graduandos) de comportamentos alimentares inadequados em adolescentes de até 15 anos, com aumento de restrição alimentar e comportamentos purgativos entre as meninas com sobrepeso/obesidade⁽³⁴⁾.

Achado referente a renda mensal e transtorno alimentar condizente com o desta pesquisa foi identificado em outro estudo, pois houve maior probabilidade de transtornos alimentares em graduandos cujos pais ganham menos de um salário mínimo mensal⁽³⁵⁾.

Em regressão linear realizada com graduandos de Medicina, foi identificado, em consonância com nossos achados, influência da renda no domínio Físico e, diferentemente dos achados neste estudo, nos domínios Psicológico e Meio Ambiente⁽³⁰⁾.

O fato de possuir transtorno alimentar grave está associado à maior necessidade de cuidados de saúde⁽³⁶⁾, sendo essa necessidade uma faceta do domínio Meio Ambiente do WHOQOL-BREF.

As populações com transtornos alimentares possuem níveis de qualidade de vida significativamente menores em todas as áreas, assim a qualidade de vida da população com esses transtornos é um importante ponto para traçar metas de intervenções clinicas enquanto a cura definitiva ainda não está disponível⁽³⁷⁾. Prejuízos na qualidade de vida de indivíduos com transtornos alimentares são superiores quando comparados com pessoas sadias ou com outros transtornos psiquiátricos⁽³⁸⁾.

Limitações do estudo

Este estudo apresentou como limitações o desenho transversal com abordagem única, uso de questionários autoaplicáveis que depende do comprometimento e da veracidade do respondente, escassez de estudos relacionados a qualidade de vida e atitudes alimentares para fortalecer a discussão, bem como perda amostral (32%) superior ao previsto (15%) devido à adesão dos graduandos ao movimento paredista no final do período da coleta de dados.

Contribuições para a área da enfermagem, saúde ou política pública

Trata-se de um estudo original e considera-se contribuir para despertar inquietações e fomentar a discussão de políticas públicas relacionadas aos graduandos do Ensino Superior. Exercer atividades acadêmicas e laborais que visem prestar assistência direta ou indireta à comunidade pressupõe tanto contribuir para a melhoria de qualidade de vida e saúde da população quanto cuidar de si para ter condições de fazê-lo pelo outro.

Nesse sentido, este estudo visou provocar a reflexão acerca das atitudes alimentares e da qualidade de vida dos graduandos da área da saúde, pois a identificação precoce de atitudes alimentares inadequadas pode contribuir para a não evolução de transtornos alimentares e para a promoção da melhor qualidade de vida. Os resultados deste trabalho proporcionaram novas informações relacionadas à população pesquisada, bem como corroboraram os achados de outras pesquisas já realizadas.

Sugere-se que estudos futuros sejam efetuados, ampliando a população estudada e/ou com outros delineamentos para contribuírem e melhor avaliarem a tendência de qualidade de vida e atitudes alimentares entre graduandos.

CONCLUSÃO

Neste estudo, o sexo não acarretou diferença de atitudes alimentares inadequadas entre os graduandos da área da saúde, contradizendo a maioria dos trabalhos que afirmam maior prevalência em mulheres.

Os graduandos do curso de Nutrição apresentaram atitudes alimentares mais inadequadas quando comparados aos de outros cursos da área da saúde; assim, foram considerados mais expostos ao risco de apresentarem transtornos alimentares, o que merece destaque, pois serão os futuros profissionais que trabalharão com a promoção e prevenção de hábitos alimentares saudáveis.

A fragilidade para desenvolvimento de transtorno alimentar mostrou-se maior com o aumento da idade dos graduandos, levando à reflexão sobre a necessidade de dedicar atenção a esses jovens, não somente no período de ingresso no Ensino Superior, mas também durante todo o período acadêmico.

O oferecimento de condições de melhorias que favoreçam a promoção da qualidade de vida dos graduandos de baixa renda deverá ser discutido por meio de políticas públicas educacionais, pois, quanto menor a renda familiar, menor a qualidade de vida dos graduandos.

A identificação do comportamento alimentar dos graduandos da área da saúde é necessária para evitar possíveis desencadeamentos de transtornos psiquiátricos relacionados à alimentação, visto que a qualidade de vida dessa população, em latente processo de formação profissional, foi diminuída pelas atitudes alimentares inadequadas.

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  2018

Histórico

• Recebido
  11 Abr 2017
• Aceito
  11 Jun 2017