Acessibilidade / Reportar erro

Improviso decorado

An Improvisation Learnt by Heart

Resumos

Neste artigo pretendo refletir sobre o caráter improvisado da prática do freestyle, descrito por seus cultores como "rap feito na hora". A partir de pesquisa realizada ao longo de três anos na batalha de freestyle da Santa Cruz, em São Paulo, recuperarei alguns exemplos de versos que podem ajudar a pensar tanto a importância atribuída à improvisação quanto o uso recorrente de chavões, que colocam em xeque a própria noção de improviso verbal. Diante da impossibilidade de discernir com precisão um verso improvisado de outro decorado, proponho que o desafio dos praticantes de freestyle é fazer com que suas rimas pareçam improvisadas. Demonstrarei que o principal procedimento adotado para atingir tal objetivo é atualizar os chavões no contexto de cada batalha.

Improviso; rap; freestyle


In this article I will discuss the improvisational element of freestyle, described by its performers as rap created "off the top of the head". I will utilize some examples collected in a three year research project about a freestyle battle that takes place by the Santa Cruz metro station, in São Paulo. This selection of verses will demonstrate the importance assigned by the freestylers to the improvisation of lyrics, whilst as the same time showing how clichés are used so abundantly that they call into question the very notion of improvisation. I'll propose that the challenge of the performers of freestyle is to make their verses seem improvised and will try to demonstrate how freestylers make memorized verses appear to be fresh verses created "off the top of the head", simply by making references to the present context of the battle.

Improvisation; rap; freestyle


  • 3 Cf., entre outros, ANDRADE, Mario de. Dicionário Musical Brasileiro. São Paulo: Edusp, 1989;
  • CASCUDO, Luís da Câmara. Literatura oral no Brasil. São Paulo: Global, 2006;
  • HUIZINGA, Johan. Homo ludens: o jogo como elemento da cultura. São Paulo: Perspectiva, 2008;
  • OLIVEIRA, Allan de Paula. Quando se canta o conflito: contribuições para a análise de desafios cantados. Revista de Antropologia. São Paulo, v. 50, n. 1, 2007. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-77012007000100008&lng=pt&nrm=iso Acesso em: mar. 2013. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-77012007000100008
  • 4 Beat é o termo nativo para designar as bases musicais dos raps. Cf., entre outros ROSE, Tricia. Black Noise: Rap Music and Black Culture in Contemporary America. Connecticut: Wesleyan University Press, 1994;
  • e TOOP, David. Rap Attack 3: African Rap to Global Hip hop. Londres: Serpent's Tail, 2000.
  • 7
    7 A maneira de anotar os versos no quadro abaixo foi inspirada por Edwards , que batizou o quadro de flow diagram . Cf. EDWARDS, Paul. How to Rap: The Art and Science of The Hip hop MC. Chicago: Chicago Reviews Press, 2009.
  • 9 BRADLEY, Adam. Book of Rhymes: The Poetics of Hip hop. Nova Iorque: Basic Civitas, 2009, p. 50.
  • 11 CASCUDO, Luís da Câmara. Literatura oral no Brasil, op. cit., p. 373.
  • 15 FINNEGAN, Ruth. Oral Traditions and the Verbal Arts:A Guide to Research Practices. Londres: Routledge, 1992, p. 193.
  • 16 Carlos Sandroni faz uma reflexão muito interessante sobre o conceito de síncope em seu livro Feitiço decente. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.
  • 18 SODRÉ, Muniz apud GARCIA, Walter. Bim Bom, a contradição sem conflitos de João Gilberto. São Paulo: Paz e Terra, 1999, p. 27.
  • 21 TATIT, Luiz. O cancionista: composição de canções no Brasil. São Paulo: Edusp, 1996, p. 22, grifos do autor.
  • 23 GARCIA, Walter. Ouvindo Racionais MC's. Revista Teresa (USP), São Paulo, v. 4/5, 2003. p. 175.
  • 25 GARCIA, Walter. Ouvindo Racionais MC's, op. cit., p. 175.
  • 26 NETTL, Bruno. The Study of Ethnomusicology. Chicago: University of Illinois Press, 1983, p. 23.
  • 27 SEEGER, Anthony. Music and Dance. In: INGOLD, Tim (Org.) Companion Encyclopedia of Anthropology. Londres: Routledge, 1994, p. 695.
  • 28 ZEGNANI, Sami. Le Rap comme activité scripturale: l'émergence d'un groupe illégitime de lettrés. Langage et société. Paris, n. 110, dez. 2004.
  • 30 ROSE, Tricia. Black Noise: Rap Music and Black Culture in Contemporary America, op. cit., p. 95.
  • 31 SILVA, José Carlos Gomes. Juventude e segregação urbana na cidade de São Paulo: os números da vulnerabilidade juvenil e a percepção musical dos rappers Ponto Urbe - Revista do Núcleo de Antropologia Urbana. Ano 1, versão 1.0, jul. 2007.
  • 32 GARCIA, Walter. Sobre uma cena de "Fim de semana no parque", do Racionais MC's. Estudos Avançados, São Paulo, n. 25 (71), p. 231, 2011. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142011000100015&lng=pt&nrm=iso Acesso em: mar. 2013. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0103-40142011000100015
  • 34 BURKE, Peter. Cultura popular na Idade Moderna. São Paulo: Companhia das Letras, 1989, p. 169.
  • 35 BLUM, Stephen. Recognizing Improvisation. In: NETTL, Bruno; RUSSEL, Melinda (Orgs.) In the Course of Performance: Studies in the World of Musical Improvisation. . Chicago: The University of Chicago Press, 1998, p. 28 - grifo do autor.
  • 36 NETTL, Bruno. Thoughts on Improvisation: A Comparative Approach. The Musical Quarterly, vol. 60, n. 1, jan., 1974, p. 1-19, p.6. DOI: doi:10.1093/mq/LX.1.1.
  • 37 ONG, Walter. Orality and Literacy. Nova Iorque: Routledge, 2002, p. 60.
  • 38 ANDRADE, Mario de. Notas sobre o cantador nordestino. Folha da Manhã, São Paulo, 13 jan. 1944. Mundo Musical.
  • 39 SOUZA, Gilda de Mello. O tupi e o alaúde. São Paulo: Duas Cidades, 1979, p. 24.
  • 40 NETTL, Bruno. Thoughts on Improvisation: A Comparative Approach, op. cit.
  • 42 BÉTHUNE, Christian. Le Rap: une esthétique hors la loi. Paris: Éditions Autrement, 1999, p. 74.
  • 43 CASCUDO, Luís da Câmara. Vaqueiros e cantadores. São Paulo: Global, 2005, p. 204.
  • 47 NETTL, Bruno. Thoughts on Improvisation: A Comparative Approach, op. cit., p. 13.
  • 50 PEREIRA, Alexandre Barbosa. De rolê pela cidade: os pixadores em São Paulo. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social), Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, 2005, p. 95.
  • 51 MAGNANI, José Guilherme. Festa no pedaço. São Paulo: Hucitec, 2003, p. 138.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Fev 2014
  • Data do Fascículo
    Jun 2013
Instituto de Estudos Brasileiros Espaço Brasiliana, Av. Prof. Luciano Gualberto, 78 - Cidade Universitária, 05508-010 São Paulo/SP Brasil, Tel. (55 11) 3091-1149 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revistaieb@usp.br