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Assistência hospitalar: avaliação da satisfação dos usuários durante seu período de internação

Resumos

A equipe de saúde tem se baseado nos princípios do SUS para assegurar a melhoria do atendimento dos serviços de saúde e a satisfação dos usuários e tem sido utilizada como um dos instrumentos de avaliação da qualidade. Este estudo objetivou avaliar a satisfação dos usuários com o atendimento de suas necessidades durante a internação, num hospital geral do interior do Estado de São Paulo. Adotou-se, como metodologia, a pesquisa qualitativa e, como técnica de coleta de dados, a observação participante e o grupo focal. Foi utilizado um guia de temas e participaram da pesquisa doze sujeitos. Realizou-se a análise de conteúdo dos dados e, para a interpretação, utilizou-se a técnica de triangulação. Os resultados demonstraram que os usuários ficaram satisfeitos com o atendimento. Entretanto, a pesquisadora concluiu que a organização do trabalho da instituição não tem como meta o alcance da qualidade.

qualidade da assistência à saúde; satisfação do paciente; avaliação


Health care teams have followed the National Health System's (SUS) principles to ensure quality improvement in healthcare, and patient satisfaction is one of the instruments used to evaluate quality. This study aimed to evaluate patient satisfaction regarding the assistance to their needs during hospitalization, in a general hospital of a city in the interior of São Paulo. Data were collected through participant observation and use of focal group techniques in this qualitative research. A theme guide was used and a total of 20 subjects participated in the study. Data were analyzed through content analysis and interpreted through triangulation. Study results demonstrate that patients were satisfied with the care rendered. However, the researcher concluded that the institution's work organization is not directed to the attainment of quality.

quality of health care; patient satisfaction; evaluation


El equipo de salud ha tomado como base los principios del SUS para asegurar la calidad de la atención. La satisfacción de los pacientes ha sido utilizada como uno de los instrumentos de evaluación. Este estudio busca evaluar la satisfacción de los pacientes con la atención de sus necesidades durante la internación, en un hospital general del interior de Sao Paulo. Se adoptó como metodología la investigación cualitativa y, como técnica de recolecta de datos, la observación participante y el grupo focal. Se utilizó un guía de temas y participaron en la investigación doce sujetos. El análisis de los datos se basó en el análisis de contenido. Para la interpretación se utilizó la técnica de triangulación. Los resultados demostraron que los pacientes se sintieron satisfechos con la atención. No obstante, la investigadora concluyó que la forma de organización del trabajo de la institución no evidencia una preocupación por la calidad de la atención.

calidad de la atención de salud; satisfacción del paciente; evaluación


ARTIGO ORIGINAL

Assistência hospitalar: avaliação da satisfação dos usuários durante seu período de internação

Sônia Maria Alves de PaivaI; Elizabeth Laus Ribas GomesII

IEnfermeira; Doutor em Enfermagem, e-mail: soniaapaiva@terra.com.br

IIProfessor Doutor da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo, Centro colaborador da OMS para o desenvolvimento da pesquisa em enfermagem, Brasil, e-mail: elaus@glete.eerp.usp.br

RESUMO

A equipe de saúde tem se baseado nos princípios do SUS para assegurar a melhoria do atendimento dos serviços de saúde e a satisfação dos usuários e tem sido utilizada como um dos instrumentos de avaliação da qualidade. Este estudo objetivou avaliar a satisfação dos usuários com o atendimento de suas necessidades durante a internação, num hospital geral do interior do Estado de São Paulo. Adotou-se, como metodologia, a pesquisa qualitativa e, como técnica de coleta de dados, a observação participante e o grupo focal. Foi utilizado um guia de temas e participaram da pesquisa doze sujeitos. Realizou-se a análise de conteúdo dos dados e, para a interpretação, utilizou-se a técnica de triangulação. Os resultados demonstraram que os usuários ficaram satisfeitos com o atendimento. Entretanto, a pesquisadora concluiu que a organização do trabalho da instituição não tem como meta o alcance da qualidade.

Descritores: qualidade da assistência à saúde; satisfação do paciente; avaliação

INTRODUÇÃO

O interesse pela qualidade dos serviços de saúde está presente nos princípios do SUS e tem feito parte do cotidiano das organizações hospitalares(1). A qualidade pode ser definida como propriedade, atributo ou condição das coisas ou pessoas que as distinguem das outras e lhes determina a natureza(2). Para o controle e garantia da qualidade das ações no setor saúde, tornou-se imprescindível introduzir indicadores para avaliar os resultados alcançados e planejar as mudanças necessárias(3-4).

Avaliar significa determinar o valor de algo e explicita a noção de qualidade(2). Entre os indicadores, destacam-se os indicadores sociais (taxa de analfabetismo, nível de escolaridade, de renda, taxa de desemprego), os indicadores padronizados para gestão hospitalar, com foco nos recursos humanos (absenteísmo, rotatividade), indicadores com foco na administração hospitalar (taxa de ocupação de leitos) e indicadores com foco nos clientes (taxa de mortalidade, índice de infecção e satisfação do cliente)(6).

Acrescenta-se a esses, os indicadores que avaliam a assistência através da tríade(5), estrutura, que envolve os recursos físicos, humanos, materiais, equipamentos e financeiros necessários para a assistência médica, o processo, que se refere às atividades que envolvem os profissionais de saúde e pacientes e o resultado, que corresponde ao produto final da assistência prestada. No serviço de enfermagem, são comumente utilizados pontos críticos da assistência para traduzir a qualidade do atendimento, como os registros de enfermagem, processos éticos, aparecimento de úlceras de pressão, quedas, administração de medicamentos, dimensionamento de pessoal entre outros(7). Atualmente, a satisfação do usuário tem sido considerada importante componente da qualidade do cuidado, como parte do modelo de atenção participativa proposto pelo SUS e pelo fato de os usuários estarem mais conscientes de seus direitos, além de possuir papel significativo na interação entre o prestador e o usuário, pois expressa as expectativas e as avaliações dos usuários quanto à assistência recebida(3-4). Utilizar a satisfação do usuário como instrumento de avaliação significa compreender e agir segundo as suas necessidades quanto aos serviços e produtos da equipe, considerar suas subjetividades e sua percepção sobre o processo de trabalho(8).

Com base nessas afirmações, esse estudo foi desenvolvido com o objetivo de avaliar a satisfação dos usuários quanto ao atendimento de suas necessidades de saúde, durante o período de internação, enquanto elemento para se avaliar a qualidade.

METODOLOGIA

A metodologia escolhida foi a pesquisa qualitativa, e a coleta de dados teve início após a aprovação do projeto de pesquisa pela Comissão Ética em Pesquisa da Instituição, e pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (EERP-USP). O estudo foi realizado na Unidade de Clínica Médica de um hospital do interior do Estado de São Paulo, de caráter privado e filantrópico. Foram utilizadas como técnicas de coleta de dados a observação participante e o grupo focal, complementados pela análise documental dos prontuários.

A observação participante foi importante para a pesquisa, porque permitiu a caracterização do contexto da unidade, a apreensão do modo de organização técnica e social do trabalho, e a identificação dos recursos humanos e de aspectos do relacionamento da equipe e usuário. Além disso, possibilitou interação contínua com os sujeitos para a apreensão de suas vivências, seu relacionamento com os profissionais e foi fundamental para captar as "pistas" que permitiram selecionar os sujeitos para a conformação dos grupos focais. Transcorreu no período de maio a julho de 2005, diariamente, no período da manhã.

Os critérios de inclusão nos grupos focais abrangeram usuários que permaneceram internados, no mínimo, quatro dias, porque se considerou esse período necessário para sua adaptação ao ambiente hospitalar; adultos residentes do município, que poderiam se comunicar verbalmente, estar orientados cronologicamente e no espaço e auto-suficientes quanto à mobilidade física.

A opção pela estratégia metodológica de se utilizar o grupo focal ocorreu por acreditar que o mesmo permite amplo processo de vivências, informações e pelo fato de que o indivíduo se torna mais suscetível de ser estimulado quando está com outros do que quando está sozinho(9).

Os usuários foram informados sobre a pesquisa e aqueles que aceitaram participar receberam orientações sobre o sigilo e o anonimato das informações e sobre o consentimento livre e informado. O documento era lido junto a eles e, em seguida, era solicitada sua assinatura. Também foram esclarecidos sobre a necessidade da gravação e da anotação da reunião. Dessa maneira fizeram parte da pesquisa 12 sujeitos.

Foram formados dois grupos focais, o grupo A, composto por Iara, Márcio, Carolina, Ronaldo e Fabrício (nomes fictícios) e o grupo B, constituído por Natal, Fábio, Selmo, Ana, Jair, Álvaro e Naldo (nomes fictícios), a partir do referencial teórico(10). Optou-se por trabalhar com os grupos fora do ambiente hospitalar, após a alta, por se considerar que a hospitalização poderia interferir nas respostas dos usuários. Os locais escolhidos foram as Unidades Básicas de Saúde, próximas às residências dos mesmos. Para o funcionamento de cada grupo foram estabelecidas as regras básicas de convivência, o horário, o tempo de duração de cada sessão. Foram reafirmados o compromisso de cada um e o sigilo do que era discutido em grupo.

Ocorreram dois encontros para cada grupo e foi utilizado um guia de temas, a partir de questões norteadoras que os levaram a refletir sobre a assistência que receberam dos profissionais durante o período em que estiveram hospitalizados:

- quais foram as dificuldades para conseguir a internação?

- quais foram os profissionais que prestaram o cuidado? O que achou do atendimento?

- como avaliou se uma assistência é boa?

- quais situações o deixaram satisfeito com a internação?

Para a realização dos grupos, a pesquisadora contou com a colaboração de uma estudante de enfermagem no papel de observadora, que foi previamente orientada para essa função e que ficou responsável pelo registro dos comentários do grupo, por monitorar o tempo e controlar o gravador.

Na análise dos dados, foi utilizada a análise de conteúdo(11).Com base nessa perspectiva de análise, foi realizada a transcrição das fitas e os dados obtidos das observações foram sistematizados na forma de texto; em seguida, foi organizado o material dos grupos focais. Procurou-se trabalhar horizontalmente o conjunto das observações e das falas dos grupos, fazendo os recortes, a categorização e a codificação na fase de pré-análise. Na segunda etapa, realizou-se o recorte das unidades significativas, chegando-se aos núcleos de registro e, na terceira etapa, foi realizada a interpretação dos dados, utilizando a técnica de triangulação dos mesmos, triangulando as falas provenientes dos grupos com os dados dos diários de campo e da observação participante(12).

RESULTADOS E DISCUSSÃO DOS DADOS

Caracterização dos sujeitos

Os dados demonstraram que 6 dos sujeitos eram aposentados, 2 dedicavam-se às tarefas do lar, 2 eram operários, 1 estudante e 1 estava desempregado. Predominou o sexo masculino, representado por 10 sujeitos. A média de idade foi 54 anos e, em relação à escolaridade, 11 possuíam o ensino fundamental. Esses dados foram importantes, porque possibilitaram apreender que os participantes apresentavam baixo nível socioeconômico e cultural.

Categoria de análise

A análise foi realizada com a ajuda do referencial teórico estruturado no modelo de Donabedian, baseado na estrutura, processo e resultado(5). Dessa forma, da categoria estrutura emergiram os aspectos tangíveis, da categoria processo emergiram as subcategorias: acesso, cuidado, processo de trabalho e tratamento e da categoria resultado emergiram as subcategorias: resolutividade e estratégias na busca da agilização das ações de saúde. Esses dados são apresentados no Tabela 1, de acordo com os seus significados, apreendidos na análise e interpretação das frases temáticas.

Cabe ressaltar que esses resultados apresentados são pertinentes a essa população estudada.

No tocante à estrutura, os aspectos tangíveis se relacionaram às deficiências das instalações, como se pode constatar.

Precisa pintar e arrumar as janelas, as do nosso quarto estavam todas quebradas (Natal).

Também foi citada a limpeza do ambiente e houve opiniões contraditórias.

Eu achei a limpeza boa, a faxineira limpa toda hora, é bem cuidado (Iara).

O banheiro das mulheres é muito ruim, tem que tomar banho cinco horas da manhã, se passar das seis horas não dá para tomar não. As faxineiras limpam, mas tem hora que não tem condições de usar (Ana).

Quanto à manutenção das condições dos banheiros, foi apontada como insatisfatória, com unanimidade entre os participantes.

O chuveiro perto do canto e o do fundo eram os únicos que esquentavam mais, todos dão choque na tomada, tem que pegar com toalha (Natal).

Em relação aos recursos humanos, os usuários perceberam a carência do quadro de pessoal.

Fui muito bem tratado, não resta dúvida, os enfermeiros capacitados, atenciosos, só que acho pequeno o número de enfermeiros pela quantidade de pacientes, eles dividem lá acho que quatro quartos para cada dois deles, então ali tem uma hora que não sobra tempo para eles, eles ficam fatigados, às vezes está na hora do medicamento, daí a pouco é aquela correria (Ronaldo).

A avaliação da estrutura incluiu ainda a habilidade técnica da equipe de enfermagem e o saber fazer. A habilidade técnica relacionou-se ao desempenho técnico e ao comportamento do cuidador. O desempenho técnico envolveu a maneira de administrar uma medicação injetável, puncionar uma veia, a forma de realizar um banho de leito.

Percebi que eles são capacitados pela maneira como fazem o serviço, o modo de dar uma injeção, colocar um soro, enfim, o que é o básico do "enfermeiro", dentro dos padrões deles ali, eles fazem tudo perfeito, percebi isso (Ronaldo).

O comportamento do cuidador envolveu os atributos do cuidador, como ilustra a fala de Iara.

Ah, eu vi eles cuidando daquela senhora com carinho, dar o banhozinho nela na cama, molhando o pano com sabonete, passando de levinho, uma funcionária passa, a outra seca com aquele cuidado e, na hora de trocá-la, era aquele cuidado, virando-a, eu achei isso uma coisa muito bonita (Iara).

Essas falas demonstraram que a avaliação do desempenho dos profissionais ficou na dimensão técnica e de maneira muito limitada, porque eles não tinham conhecimento científico suficiente para avaliar se um cuidado era bem feito, ou não, e na dimensão humana através da relação que se estabeleceu entre esses e os profissionais que cuidaram de sua saúde.

A alimentação foi considerada boa para a maioria e citaram a apresentação da comida, o modo de preparo e a quantidade, como aspectos positivos.

Embora os dados demonstrassem que a estrutura da enfermaria fosse precária, expressos por condições mínimas que poderiam ser melhoradas e que fariam a diferença no atendimento, percebeu-se conformismo na atitude dos participantes. Acredita-se que isso se deve ao baixo nível socioeconômico e cultural dos mesmos. Entretanto, pensar em qualidade e na humanização do cuidado implica também pensar nas condições do ambiente, incluindo investimentos para a recuperação das instalações físicas das instituições e renovação de equipamentos e aparelhagens tecnológicas, visando melhor infra-estrutura(13).

A categoria Processo permitiu a conformação das subcategorias: acesso, cuidado, processo de trabalho e tratamento.

Os dados evidenciaram que a maioria dos participantes manifestou satisfação em relação ao acesso, exemplificado na fala de Iara, do grupo A.

Cheguei às 6h30 da manhã, na hora já foi feita a minha internação, eram umas 6h50 e eu já estava dentro do quarto, pra mim não teve nenhum problema na internação, não me perguntaram nada (Iara).

Em relação ao cuidado, os dados expressaram que, na opinião dos usuários, o cuidado deve ir além do procedimento e consiste na tomada da essência humana e da valorização de suas necessidades mais essenciais. As atitudes do cuidador, segundo as falas, devem ser permeadas pelos atributos: calor humano, carinho, amor, dedicação.

Eu vou colocar aqui uma coisa que dá vontade de falar, porque tem muita gente que acha que o hospital é um lugar frio, que as pessoas estão trabalhando ali, cuidando só por obrigação e o que eu vi lá foi muito diferente, eu vi ali gente humana cuidando de seres humanos, com carinho, com amor, sabe eu fiquei sensibilizada, de ver pessoas que estão ali ganhando para fazer um trabalho, mas eles não estão fazendo aquele trabalho ali só por obrigação, vi carinho, dedicação dos enfermeiros, cuidando dos pacientes (Iara).

Como se percebe, esses cuidados de respeito para com o outro demonstraram ser importantes na satisfação do atendimento, porque resgatam a humanização e não aparecem como rejeição aos aspectos técnicos, mas como uma forma criativa, intuitiva e afetiva que compõe o lado profissional da enfermagem, reforçando a definição de que a enfermagem é uma profissão que integra a ciência e a arte no cuidado do ser humano(14).

Essa atitude requer um processo reflexivo acerca dos valores e princípios que norteiam a prática profissional, pressupondo, além de tratamento e cuidado digno, solidário e acolhedor, uma nova postura ética.

O cuidado também foi relacionado ao gênero na enfermagem, como se pôde constatar.

Fui muito bem tratado, adorei as meninas e os rapazes, só que eu vou confessar uma coisa, na minha opinião, as mulheres cuidam um pouquinho melhor que os enfermeiros, com mais carinho (Natal).

A prática do cuidar na história da enfermagem sempre esteve relacionada à figura feminina e essa questão, na instituição, se torna ainda mais presente devido à presença de religiosas no contexto hospitalar, o que resgata a vocação na enfermagem, orientada pelo ideal de servir.

O processo, representado pela subcategoria processo de trabalho, foi elaborado a partir da análise dos dados obtidos das falas dos usuários nos grupos e da observação participante, e pode-se dizer que essa última constituiu importante instrumento de análise, permitindo apreender a organização do trabalho na instituição, servindo de referência para balizar as informações trazidas pelos usuários, estabelecer comparações e realizar reflexão crítica sobre a realidade concreta do campo empírico.

Pôde-se apreender, assim, que a organização do trabalho segue o modelo funcional da abordagem científica da administração, numa concepção de trabalho hegemônica e racional. O trabalho não ocorre em equipe, cada profissional é responsável pelas suas atividades. O trabalho é parcelado e perde sua articulação com o processo de trabalho, representado por um conjunto de práticas rotineiras, repetitivas e mecanizadas. Ocorre de modo a garantir a realização da atividade médica e determina a relação de poder e autoridade do médico em relação aos demais profissionais.

Além dessa divisão técnica da equipe de enfermagem, há a divisão do trabalho dos enfermeiros em funções administrativa e assistencial, e como há um enfermeiro em cada turno de trabalho na unidade, essa ocorre na direção principalmente da função administrativa, onde ele coordena o trabalho realizado pela equipe de enfermagem e se articula entre as ordens médicas e a transmissão dessas informações aos auxiliares e técnicos de enfermagem.

A maioria dos registros de enfermagem é feita pelos auxiliares e técnicos de enfermagem, e a sistematização de enfermagem ainda não foi implantada na unidade. As normas e rotinas encontram-se padronizadas num manual de enfermagem. O trabalho com essas características e com sobrecarga de atividades não oferece condições para que os trabalhadores possam exercer suas funções de forma mais humanizada.

Os próprios trabalhadores freqüentemente se queixavam das condições de trabalho, como se pôde evidenciar pela fala expressa de um dos técnicos de enfermagem, em caráter de desabafo.

Tem hora que você está atendendo um usuário ou fazendo medicação e tem familiar de outro pedindo para trocá-lo, o serviço é tanto, que tem hora que você não sabe o que fazer, às vezes acho que vou ficar louca, porque se fica alguma atividade sem fazer para o serviço noturno, os funcionários do plantão reclamam, às vezes saio tão nervosa do trabalho que não consigo nem dormir à noite de cansaço e preocupação.

A falta de pessoal e a sobrecarga de trabalho da equipe de enfermagem também foram apreendidas pelos usuários e apontadas nos grupos, como pôde ser constatado.

Fui muito bem tratado, não resta dúvida, os enfermeiros capacitados, atenciosos, só que acho pequeno o número de enfermeiros pela quantidade de pacientes, eles dividem lá acho que quatro quartos para cada dois deles, então ali tem uma hora, entendeu, que não sobra tempo para eles, eles ficam fatigados, às vezes está na hora do medicamento, daí a pouco é aquela correria, às vezes até deixa de fazer alguma coisa (Ronaldo).

Outro aspecto importante que merece ser ressaltado diz respeito à falta de flexibilidade das rotinas de enfermagem. Em todo ambiente hospitalar, as ações de enfermagem são dirigidas por rotinas que, em geral, são rígidas e inflexíveis e que dificultam ainda mais a adaptação do usuário nesse contexto.

Já vai naquela dificuldade tomar um banho, leva um choque, cai aquele mundo de água gelada, ah, espera aí, está abusando, vai dar uma gripe brava, porque com esse frio chega a "enfermeira" e fala bom-dia, a hora que fala aquele "bom-dia" (Fabrício).

Percebeu-se, ainda, que os sujeitos conseguiram identificar entre os profissionais de saúde, prioritariamente o médico e a equipe de enfermagem. Na opinião deles, o atendimento médico foi considerado satisfatório por unanimidade, ressaltando a pontualidade do atendimento como fator importante.

O atendimento médico foi muito bom, a doutora é muito boa, muito atenciosa, ia de manhã e à noite me ver (Ana).

Eu gostei muito da pontualidade do meu médico, todo dia sete, sete e meia ele estava lá me vendo, querendo saber como eu estava, todo dia, não falhou nenhum dia, era um dos primeiros a chegar todo dia (Natal).

Quanto ao atendimento de enfermagem, os participantes demonstraram certa desinformação e confusão em relação à categoria profissional. Quando se referiram ao enfermeiro, na realidade estavam se referindo aos profissionais de nível médio.

Teve os enfermeiros, o padre, a irmã também (Natal).

Tem enfermeiro padrão que toma conta da área da enfermagem, as irmãs que passam pra ver se precisa de alguma coisa (Naldo).

Essas falas permitem supor que essa situação pode decorrer do fato de o enfermeiro não ocupar seu espaço como agente terapêutico e por não colocar o usuário como centro de sua abordagem.

Ainda na categoria processo, a avaliação do tratamento foi considerada positiva.

O meu atendimento foi excelente, a minha doutora não ficou nem um dia sem passar visita, ia até duas vezes por dia (Iara).

Pra mim teve muito bom, me trataram muito bem, o médico ia duas ou três vezes por dia me visitar, não tenho nada que me reclamar (Álvaro).

Os medicamentos foram bons, melhorei (Márcio).

O resultado dos serviços de saúde é o efeito dos programas e intervenções sobre a saúde dos usuários e, segundo as falas dos sujeitos dos grupos, pode-se constatar que a maioria deles demonstrou satisfação com os resultados do atendimento.

Eu posso resumir assim, internei, fiz o tratamento, foi ótimo, saí, não tenho do que reclamar, o objetivo foi atendido (Fabrício).

Fiquei satisfeito porque cheguei carregado e saí andando. Ainda estou com dor, mas é assim mesmo, não sara, só vai passar lá para outubro, depois que passar esse inverno (Jair).

Os usuários também demonstraram satisfação com a agilização da resolutividade das ações de saúde.

Eu fiquei satisfeito com a internação porque adiantou todos os meus exames (Márcio).

Quando você interna, aí faz logo os exames, mas marcando, demora dois, três meses e depois demora mais dois, três meses para procurar lá, eu não sei porque isso se já está pronto, porque a demora para procurar o Raio X dois, três meses (Álvaro).

A organização do SUS requer o controle e avaliação das redes assistenciais através do monitoramento da oferta de consultas médicas e da realização de exames complementares e laboratoriais, garantindo a qualidade e a resolutividade necessárias para o adequado funcionamento dos serviços de saúde(15).

Essas falas, entretanto, demonstraram que a rede pública do município não está organizada para a adequação da oferta de serviços de saúde ágeis e resolutivos para a população, sendo que a internação foi usada em alguns casos para agilização dos exames.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Apreendeu-se, pelas falas dos participantes, que eles apontaram elementos significativos os quais expressaram sua satisfação com o atendimento recebido, durante o período de internação, e que traduziram a qualidade do atendimento, desvelando a interface da satisfação e da qualidade.

Os resultados obtidos permitiram concluir, entretanto, que esses usuários exercitaram muito pouco os seus direitos de serem atendidos pelos serviços públicos, colocando-se numa situação de submissão frente à instituição, como se estivessem recebendo dessa um favor e não a entendendo como um direito seu de saúde. A forma de olhar o cuidado numa perspectiva mais ampliada levou a pesquisadora, partindo de sua vivência de observadora do campo empírico, a considerar que a forma de organização do processo de trabalho do hospital não tem como meta o alcance da qualidade da assistência.

Gerenciar um serviço de saúde, voltado para qualidade das ações de saúde, exige o deslocamento do foco de atenção centrado na doença, para a produção de saúde centrada no sujeito, o trabalho não pode ser fragmentado, individualizado e hegemônico. O hospital não contempla as considerações da 9ª Conferência Nacional de Saúde, que recomenda que os modelos assistenciais não devam ficar limitados à assistência individual e curativa, mas devem contemplar programas os quais visem o trabalho em grupos, as ações de educação em saúde, a formação permanente do pessoal e a garantia de condições de trabalho favoráveis a todos os profissionais de saúde.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Recebido em: 21.7.2006

Aprovado em: 4.6.2007

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Dez 2007
  • Data do Fascículo
    Out 2007

Histórico

  • Recebido
    21 Jul 2006
  • Aceito
    04 Jun 2007
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