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Prevalência do tabagismo em funcionários de um hospital universitário

Resumos

Este é um estudo transversal, e teve como objetivo identificar a prevalência do tabagismo em funcionários de um hospital universitário do Sul do Brasil. A coleta de dados ocorreu no ano 2008, durante exame periódico de saúde dos funcionários, por meio de questionário, de acordo com a condição tabágica dos mesmos. A amostra ficou constituída por 1.475 sujeitos, desses, 979 (66,4%) eram não fumantes, 295 (20%) ex-fumantes e 201 (13,6%) fumantes. O predomínio de fumantes está entre funcionários com menor nível de instrução e entre aqueles que exerciam atividades em cargos administrativos. Identificou-se, entre os fumantes, dependência leve, desejo e grau de motivação elevados para cessar o tabagismo, sendo o principal motivo a preocupação com a saúde. Assim, considerando-se a motivação dos funcionários para parar de fumar, recomenda-se aproveitar esse momento para realizar trabalho de educação em saúde e apoio profissional específico, para que o processo de cessação do tabagismo ocorra.

Prevalência; Saúde do Trabalhador; Abandono do Uso de Tabaco


This cross-sectional study aimed to identify the prevalence of smoking among employees of a university hospital in Southern Brazil. Data collection happened in 2008, during the periodic health exam, using a questionnaire, according to the smoking status of the employees. The sample consisted of 1,475 subjects, in which 979 (66.4%) were non-smokers, 295 (20%) former smokers and 201 (13.6%) smokers. Smoking was more prevalent among employees with lower education levels and among professionals in administrative positions. Among smokers, low dependence was identified, as well as desire and high degree of motivation to stop smoking, with health concerns as the main reason. Thus, taking into account the motivation of smokers to stop smoking, this is an appropriate time for health education and specific support to employees in the process of smoking cessation.

Prevalence; Occupational Health; Tobacco Use Cessation


Estudio transversal con objetivo de identificar a prevalencia del tabaquismo en funcionarios de un hospital universitario del sur de Brasil. La recolección de datos ocurrió en el año de 2008, durante el examen periódico de salud de los funcionarios, por medio de cuestionario de acuerdo con la condición de fumador de los mismos. La muestra se constituyó de 1.475 sujetos, de estos 979 (66,4%) no fumaban, 295 (20%) ex-fumantes y 201 (13,6%) fumantes. El predominio de fumantes está entre funcionarios con menor nivel de instrucción y entre los que ejercían actividades en cargos administrativos. Se identificó entre los fumantes, dependencia leve, deseo y grado de motivación elevado para cesar el tabaquismo, siendo el principal motivo la preocupación con la salud. Así, considerándose la motivación de los funcionarios para parar de fumar, se recomienda aprovechar este momento para realizar un trabajo de educación en salud y de apoyo profesional específico para que el proceso de cesación del tabaquismo ocurra.

Prevalencia; Salud Laboral; Cese del Uso de Tabaco


ARTIGO ORIGINAL

IEnfermeira, Doutor em Ciências Médicas, Professor Adjunto, Escola de Enfermagem, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, RS, Brasil. E-mail: isabel.echer@terra.com.br

IIAlunas do curso de Graduação em Enfermagem, Escola de Enfermagem, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, RS, Brasil. E-mail: Ana Paula - anacorrea@hotmail.com, Stephani - tekinha_amanda@hotmail.com

IIIEnfermeira, Doutor em Ciências, Professor Adjunto, Escola de Enfermagem, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, RS, Brasil. E-mail: fatimalucena@terra.com.br

IVMédica, Doutor em Ciências Médicas, Professor Associado, Faculdade de Medicina, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, RS, Brasil. E-mail: mknorst@hcpa.ufrgs.br

Endereço para correspondência

RESUMO

Este é um estudo transversal, e teve como objetivo identificar a prevalência do tabagismo em funcionários de um hospital universitário do Sul do Brasil. A coleta de dados ocorreu no ano 2008, durante exame periódico de saúde dos funcionários, por meio de questionário, de acordo com a condição tabágica dos mesmos. A amostra ficou constituída por 1.475 sujeitos, desses, 979 (66,4%) eram não fumantes, 295 (20%) ex-fumantes e 201 (13,6%) fumantes. O predomínio de fumantes está entre funcionários com menor nível de instrução e entre aqueles que exerciam atividades em cargos administrativos. Identificou-se, entre os fumantes, dependência leve, desejo e grau de motivação elevados para cessar o tabagismo, sendo o principal motivo a preocupação com a saúde. Assim, considerando-se a motivação dos funcionários para parar de fumar, recomenda-se aproveitar esse momento para realizar trabalho de educação em saúde e apoio profissional específico, para que o processo de cessação do tabagismo ocorra.

Descritores: Prevalência; Saúde do Trabalhador; Abandono do Uso de Tabaco.

Introdução

O tabagismo é a principal causa de morte evitável no mundo. Dados apontam prevalência de um terço de fumantes na população adulta mundial, isto é, cerca de 1 bilhão e 200 milhões de tabagistas(1).

O tabaco é agente causador de problemas relacionados à saúde, devido aos altos índices de morbimortalidade por câncer, doenças cardiovasculares, cerebrovasculares e respiratórias, o que constitui desafio não só para os serviços de saúde, mas, também, para o desenvolvimento econômico, social e ambiental(2-3).

Ao fumar, o indivíduo inala cerca de 4.700 substâncias, entre elas a nicotina, o monóxido de carbono, o alcatrão, agrotóxicos e substâncias radioativas. A nicotina causa dependência, potencializando os efeitos negativos dos componentes da fumaça do cigarro e aumentando o risco de doenças(4). O tabaco é responsável pela morte de 4,9 milhões de pessoas por ano, no mundo, em torno de 10 mil óbitos por dia. Caso a tendência do seu consumo persista, estatísticas revelam que, até 2030, esse número duplicará, chegando a 10 milhões de pessoas(5).

Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, de 2008, mostraram que 17,5% das pessoas com 15 anos ou mais são fumantes, o que corresponde ao total de 25 milhões. Entre as regiões do Brasil, o maior percentual encontra-se na Região Sul, que é de 19%(6).

A Lei nº9.294, de 1996, proíbe o uso de qualquer produto fumígeno derivado do tabaco em recinto coletivo privado ou público, com exceção de locais destinados a essa finalidade. A Portaria Interministerial nº1.498, de 2002, recomenda às instituições de saúde e de ensino a implantação de programas de ambientes livres da exposição tabágica ambiental(7). No Estado de São Paulo, recentemente, foi aprovada lei que proíbe fumar em ambientes fechados de uso coletivo, como bares, restaurantes, casas noturnas e outros estabelecimentos comerciais. Também foram proibidos fumódromos em ambientes de trabalho e em áreas reservadas para fumantes em restaurantes(8). Essas medidas têm contribuído para o declínio do uso do tabaco(9).

Por sua vez, as campanhas de esclarecimento ainda são insuficientes para promover mudança política, cultural e social relacionada ao comportamento de fumar. Além disso, intervenções para interromper o uso de tabaco não estão integradas às rotinas dos serviços de saúde devido a vários fatores, como a falta de tempo disponível para acrescentar ações assistenciais mais específicas e a percepção de alguns profissionais de saúde de que os tratamentos para dependência de nicotina são pouco efetivos(4,10).

Sabendo-se que o tabagismo traz agravos à saúde e que o hospital é espaço de prevenção e tratamento a esse problema, teve-se, aqui, como objetivo identificar a prevalência de tabagismo entre funcionários de um hospital universitário do Sul do Brasil, com vistas a criar espaços para aprofundar discussões sobre a promoção da saúde e o desenvolvimento de programas e intervenções, dirigidos aos trabalhadores da saúde, visando coibir o seu início e promover o abandono do tabagismo.

Métodos

Este é um estudo transversal, realizado em hospital universitário do Sul do Brasil, de atenção múltipla, voltada à assistência, ensino e pesquisa. A população foi constituída pelos funcionários da instituição (4.100 pessoas), incluindo todas as categorias profissionais.

Tomando-se como base estudo anterior(11); o tamanho amostral mínimo calculado foi de 1.154 funcionários, com margem de erro de 2% e índice de confiança de 98%. No entanto, fizeram parte da amostra 1.475 funcionários.

A coleta de dados ocorreu no período de janeiro a dezembro de 2008, durante a realização do exame de saúde periódico dos funcionários, no Serviço de Medicina Ocupacional do hospital. A pesquisa foi divulgada na instituição e o convite para fazer parte do estudo foi reiterado aos funcionários antes da consulta. Para aqueles que concordaram em participar, foram explicados os objetivos da pesquisa e questionada a sua condição tabágica, isto é, se eram não fumantes, ex-fumantes ou fumantes, para a escolha do questionário a ser aplicado. Considerou-se não fumante a pessoa que nunca fumou e/ou que apenas experimentou o fumo, mas não se tornou fumante, ex-fumante, a pessoa que já fumou regularmente e não fuma mais há seis meses (o termo ex-fumante é utilizado, neste estudo, com o significado de fumantes em abstinência) e fumante a pessoa que fuma regularmente um ou mais cigarros por dia. Cada funcionário respondeu apenas um questionário, de acordo com a sua condição tabágica, depois colocou em um envelope fechado sem identificação.

Os questionários continham perguntas relacionadas ao tabagismo ativo e passivo, dependência da nicotina, doenças associadas ao tabagismo, motivação para parar de fumar ou continuar fumando e dados sociodemográficos.

Os critérios de inclusão foram ser funcionário da instituição, concordar em preencher o questionário da pesquisa e ter 18 anos ou mais. Excluíram-se os funcionários que não preencherem o questionário no momento do exame periódico.

Para o grupo de fumantes, a dependência de nicotina foi avaliada por meio da escala de Fargeström(12); a qual classifica a dependência dos fumantes de acordo com as seguintes pontuações: 0-2 pontos = dependência muito baixa, 3-4 pontos = dependência baixa, 5 pontos = dependência média, 6-7 pontos = dependência elevada e 8-10 pontos = dependência muito elevada. Também foi avaliado o grau de motivação dos fumantes para parar de fumar, em que zero significa não estar motivado e 10 motivação máxima.

Os dados foram analisados pela estatística descritiva, com o auxílio do Statistical Package for the Social Sciences, versão 16. Foram aplicados os testes qui-quadrado de Pearson, exato de Fisher e regressão logística. Toda associação e diferença com valor p<0,005 foi considerada estatisticamente significativa. Os percentuais apresentados se baseiam nas respostas válidas, uma vez que algumas questões dos questionários não foram preenchidas.

O projeto do estudo foi aprovado pela Comissão de Pesquisa e Comitê de Ética da Instituição, sob nº07-010. A devolução do questionário preenchido formalizou o consentimento do sujeito em participar do estudo. Foi garantido o anonimato, o uso das informações exclusivamente para fins de pesquisa e o direito de desistir de participar do estudo a qualquer momento.

Resultados

Participaram do estudo 1.475 funcionários (35,9% do total da instituição), sendo 1.049 (71,2%) do sexo feminino. Entre os participantes, 979 (66,4%) eram não fumantes, 295 (20%), ex-fumantes, e 201 (13,6%), fumantes (Tabela 1).

Avaliou-se a associação entre a situação tabágica (não fumante, ex-fumante e fumante) e variáveis como sexo, idade, nível de instrução, tipo de atividade profissional, horário de trabalho e presença ou ausência de doenças associadas ao tabagismo. Observou-se diferença significativa (p<0,001) na média de idade nos três grupos de indivíduos analisados, sendo a menor média observada no grupo de não fumantes. Do mesmo modo, o nível de instrução diferiu significativamente nos três grupos (p<0,001), observando-se maior escolaridade nos indivíduos não fumantes.

Na associação entre atividade profissional e condição tabágica (p=0,027), observou-se maior prevalência de não fumantes entre os participantes que ocupavam cargos assistenciais e, de fumantes, no grupo que exercia cargos administrativos. Não houve associação entre as variáveis sexo e turno de trabalho e situação tabágica (p>0,005). O convívio com fumantes não variou entre o grupo de não fumantes ou ex-fumantes (p=0,320).

A presença de doenças associadas ao tabagismo foi informada por 278 (18,9%) funcionários, sendo mais frequentes no grupo dos ex-fumantes (p=0,008). As principais doenças referidas pelos participantes foram: circulatórias, 124 (8,4%), respiratórias, 99 (6,7%), psiquiátricas, 17 (1,1%), e gastrointestinais, 17 (1,1%). No estudo da relação entre presença de doenças e condição tabágica, observou-se tendência para aumento de doenças circulatórias no grupo de ex-fumantes, embora sem significado estatístico.

Na análise logística multivariada, os fatores associados à situação tabágica também foram a idade e o nível de instrução (p<0,001).

A comparação do padrão tabágico entre os grupos de ex-fumantes e fumantes evidenciou diferenças no tempo de uso do fumo (p<0,001). Já o número de cigarros consumidos por dia (p=0,603), nos dois grupos de indivíduos, e idade de início da prática tabágica (p=0,039) não variou significativamente (Tabela 2).

Avaliando a idade de início do fumo em anos (OR=1,12; IC 95%: 1,07; 1,18) e tempo do uso do fumo em anos (OR=1,12; IC 95%: 1,09; 1,14), em modelo ajustado, verificou-se que essas duas variáveis estão associadas ao fato de ser fumante.

Os fumantes foram questionados sobre o seu posicionamento em relação ao abandono do tabaco. Quarenta e um indivíduos (21%) referiram que não pensavam em parar de fumar nos próximos seis meses, 52 (26,7%) se diziam motivados a parar de fumar nos próximos seis meses, 27 (13,8%) tinham pretensão de parar no próximo mês e 70 (35,9%) haviam parado de fumar, mas recaíram e 11 (2,6%) não responderam essa questão.

A dependência de nicotina dos fumantes foi analisada por meio da escala de Fargeström(12). Destaca-se que 122 (61%) apresentavam dependência de nicotina muito baixa (0-2 pontos), 44 (21,9%) dependência baixa (3-4 pontos), 10 (4,9%) dependência média (5 pontos), 19 (9,7%) dependência elevada (6-7 pontos) e 5 (2,4%) dependência muito elevada (8-10 pontos). Em relação à disposição dos fumantes de largar o tabaco, 157 (78,5%) responderam afirmativamente enquanto 43 (21,5%) não querem parar.

A motivação para parar de fumar, em escala de 0 a 10, ficou em 5,6 em média (±3) (Figura 1). Observou-se que 51 profissionais (26,4%) apresentaram média de cinco pontos na escala de motivação para parar de fumar e 32 (16,6%), oito pontos. Destaca-se que 21 (10,9%) apresentaram motivação máxima para parar de fumar (10 pontos) e 31 (16,6%) não estavam motivados (0 ponto).


Os motivos apontados pelos dispostos a parar de fumar foram: preocupação com a saúde, 54 (34%), conhecimento dos malefícios do tabaco, 29 (18%), influência de pessoas queridas, 14 (9%), prejuízos na saúde, 16 (10%), qualidade de vida, 14 (9%), e outras 30 (19%), como vergonha do cheiro, questão financeira, servir de exemplo para outros fumantes pararem de fumar, gravidez, morte relacionada ao cigarro de familiares ou amigos, trabalhar em ambiente em que é proibido fumar.

Como principais fatores para não parar de fumar estavam a falta de vontade, 11 (26%), dificuldade no processo do abandono, 9 (21%), pequena quantidade de cigarros fumados, 7 (16%), a satisfação ao fumar, 7 (16% e outras, 9 (21%), como não querer sentir os sintomas da abstinência, negar a dependência e não aceitar o cigarro como ameaça à saúde.

Discussão

A maioria da amostra estudada foi de mulheres com idade média de 43 anos. O predomínio do sexo feminino se deve ao fato de o campo de estudo ser uma instituição de saúde na área da enfermagem, profissão que agrega grande número de mulheres. Resultados semelhantes também foram encontrados em outros estudos(13). Entretanto, o que é importante é o fato de que o sexo não foi variável determinante para o hábito de fumar ou não.

A prevalência do tabagismo na instituição foi de 13,6%, menor que a do Brasil, em que 17,5% das pessoas acima de 15 anos são fumantes, e, também, menor do que a da Região Sul, onde, atualmente, 19% da população fuma(6). É possível que esse percentual esteja relacionado à proibição do fumo no local de trabalho e ao fato de os trabalhadores fumantes precisarem se deslocar para locais específicos para essa prática, deixando momentaneamente suas atividades, o que nem sempre é possível. No entanto, não se pode desconsiderar esse percentual, embora mais baixo do que os demais, uma vez que se trata de pessoas que trabalham na área da saúde.

Encontrou-se diferença significativa entre a média de idade e o grupo de ex-fumantes (45 anos) e de não fumantes (42 anos) (p<0,001). Alguns estudos apontam a maior concentração de fumantes na faixa de 20 a 49 anos(14). Embora a diferença seja significativa, a média de idade dos grupos fica em torno de 43 anos, tratando-se, portanto, de pessoas jovens em plena atividade profissional.

Fumantes e ex-fumantes têm menor nível de instrução, pesquisas que revelam que os anos de educação formal influenciam na menor probabilidade de se tornar ou se manter um fumante(15-16) corroboram esse fato. É provável que mais anos de estudo favoreçam maior conscientização sobre os prejuízos que o cigarro causa à saúde e os benefícios de não fumar e, por isso, indivíduos com maior escolaridade evitem a prática tabágica.

Não houve diferença entre não fumantes, ex-fumantes e fumantes e o turno de trabalho, contrariando a hipótese de que trabalhadores do horário noturno fumam mais do que os do diurno. Entre funcionários de uma indústria, também foi verificado que o comportamento de risco para a saúde, como o tabagismo, era variável pouco associada ao horário de trabalho(15).

A maioria dos funcionários informou não possuir doenças associadas ao tabagismo e, quando presentes, essas foram mais frequentes entre os ex-fumantes. Nesse grupo houve tendência para o aumento de doenças cardiovasculares. Resultado semelhante foi encontrado em estudo envolvendo pacientes com diagnóstico de infarto agudo do miocárdio(17); o que leva a inferir que a presença de doenças pode interferir positivamente para o abandono do fumo, em razão do conhecimento da possibilidade de agravamento da situação de saúde, pelos efeitos deletérios do tabagismo. Sabendo-se disso, os profissionais da saúde devem incentivar para que os fumantes cessem o comportamento tabágico antes de se ter comprometimento da saúde e não somente após.

A média de idade do início do uso do tabaco foi em torno dos 18 anos, semelhante a outros estudos que demonstram que o início do uso de cigarro ocorre na adolescência(18-20). Apesar das campanhas de conscientização para a promoção e prevenção da saúde, em relação aos malefícios do cigarro, sabe-se que ainda hoje o tabaco é instrumento de curiosidade e afirmação entre os jovens. O estereótipo de quebrar regras, do proibido, da sensação de liberdade ainda atrai muitos adolescentes para experimentarem o cigarro e, muitas vezes, se tornarem dependentes.

Não houve diferença significativa no número de cigarros consumidos por dia entre ex-fumantes e fumantes. Esse fato pode servir de estímulo para os que ainda não pararam de fumar, uma vez que pessoas que consumiam, em média, o mesmo número de cigarros por dia se tornaram ex-fumantes, o que significa que eles também podem conseguir mudar essa condição.

Em 82,9% dos fumantes a dependência da nicotina foi baixa ou muito baixa e em percentual menor a dependência foi elevada ou muito elevada. Embora a maior parte dos profissionais tenha referido dependência leve de nicotina, o que pressupõe menor dificuldade no processo de cessação do tabagismo, identificou-se, aqui, um grupo com maior dependência. Esses indivíduos podem se beneficiar de acompanhamento profissional e uso de medicamentos, visando enfrentar a síndrome de abstinência com menor sofrimento(4).

Evidenciou-se que os funcionários que trabalham na área assistencial fumam menos do que aqueles da área administrativa. O que provavelmente explique essa diferença é o fato de que a proibição do fumo, no local de trabalho, leva os fumantes a se afastarem momentaneamente das suas atividades para fumar em lugar específico, o que nem sempre é possível, na rotina hospitalar assistencial. Já os funcionários da área administrativa têm maior facilidade de se afastar das tarefas do trabalho para a prática do tabagismo nos fumódromos do hospital, visto não estarem, na maioria das vezes, envolvidos diretamente com pacientes. Resultados semelhantes foram encontrados por meio de outros estudos, que apontaram maior prevalência de fumantes entre profissionais de outras áreas do que entre aqueles com formação ou atuação na área da saúde(16,19). É possível que esses usem menos o cigarro por estarem mais cientes dos problemas advindos do uso do tabaco em relação a outros profissionais e/ou, também, por conviverem com pacientes com problemas de saúde associados ao seu uso, além das restrições severas de uso do fumo nesses ambientes.

Quando comparado o tempo de uso do fumo entre ex-fumantes e fumantes, verificou-se que os que conseguiram parar de fumar utilizaram o cigarro por menos tempo. Esse achado sugere que o tempo de consumo pode influenciar negativamente no abandono do fumo e que a dependência da nicotina pode aumentar com o tempo de uso. Isso pode estar associado ao fato de os fumantes sentirem maior dificuldade para deixar de fumar por terem mais anos de fumo e, portanto, serem mais dependentes.

Em relação à motivação para o abandono do tabagismo, destaca-se que 36% dos indivíduos fumantes da amostra já fizeram várias tentativas para parar de fumar, mas recaíram. Estudo entre profissionais de saúde revela que cerca de 80% deles já realizaram várias tentativas de abandonar o tabaco(18). Isso mostra que, embora as pessoas estejam motivadas a cessar o tabagismo, esse processo pode ser difícil, exigindo ajuda profissional e abordagem intensiva da dependência química e psicológica do cigarro.

Entre os principais motivos citados para o abandono do tabagismo estavam a preocupação com a saúde, o conhecimento dos malefícios do tabaco e a influência de pessoas queridas. Outros investigadores também referem que a maioria gostaria de deixar de fumar e de reduzir o consumo e apontam, como motivos, a vontade do indivíduo/determinação, mas também a influência de outras pessoas, como profissionais, familiares, amigos e meios de comunicação social e a regulamentação do uso do fumo(9,21).

Isso reforça a ideia de que a motivação para a mudança é multifatorial e ocorre de forma diferente para cada indivíduo, envolvendo, além da sua vontade, o contexto e momento de vida. Por isso, no acompanhamento do fumante, é fundamental identificar a sua motivação para cessar o tabagismo, assim como a existência ou não de rede de apoio social, como estratégias para intervir de maneira mais eficaz.

Entre os fatores apontados para não parar de fumar está a falta de vontade de largar o cigarro, o prazer de fumar e a dificuldade do processo de abandono. As sensações de prazer, o alívio do estresse e o hábito também são arrolados pela literatura entre os principais motivos que impedem o indivíduo deixar de fumar(16). Observa-se que os principais motivos pontuados pelos fumantes, para não parar de fumar, estão atrelados à dependência química da nicotina, principal responsável pela dificuldade de cessação. Esse ponto reforça a necessidade de esses indivíduos serem acompanhados por profissionais de saúde capacitados para facilitar o processo de abandono, para que, de fato, ele aconteça.

Este estudo apresentou algumas limitações como o fato de que os dados dos participantes foram coletados por instrumento respondido pelos mesmos, na sua perspectiva, o que pode ter a influência de alguns fatores, como a falha da memória ou mesmo a negação do dado real. A avaliação desses participantes, por profissionais de saúde, poderia acrescentar informações e permitir o delineamento de estratégias de intervenção apropriadas para a abordagem do tabagismo. Outra limitação foi a participação voluntária, o que pode ter subestimado a taxa de fumantes, pois essa não foi confirmada por meio de mensurações biológicas, o que pode ter gerado viés na proporção entre os grupos estudados.

Conclusões

A prevalência do tabagismo na instituição foi menor do que a existente no Brasil, no Rio Grande do Sul e em Porto Alegre, possivelmente pelo fato de que o fumo é proibido no ambiente hospitalar de forma contundente, além de que os profissionais que trabalham na área da saúde possuem maior acesso às informações sobre as consequências do fumo para o organismo.

A maior prevalência de fumantes está entre os funcionários de cargos administrativos e entre aqueles de menor nível de instrução, o que leva a inferir que os que trabalham diretamente na assistência aos pacientes e os que possuem mais anos de estudo possuam maior conhecimento sobre os benefícios à saúde em não fumar.

A maioria dos fumantes se mostrou disposta e motivada a parar de fumar, o que demonstra a importância em se aproveitar esse momento, por meio de programas específicos, para auxiliá-los na cessação do tabagismo. Isso ainda se torna mais importante quando se considera o fato de que são trabalhadores de uma instituição destinada a promover, prevenir e restaurar a saúde.

Diante do exposto, considera-se que esse conhecimento é relevante à elaboração de programas educativos institucionais de intervenção em saúde, especialmente concebidos para esse grupo, com vistas a contribuir para o bem-estar e a saúde dos funcionários e, por conseguinte, sua qualidade de vida.

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  • Prevalência do tabagismo em funcionários de um hospital universitário

    Isabel Cristina EcherI; Ana Paula Almeida CorrêaII; Amália de Fátima LucenaIII; Stephani Amanda Lukasewicz FerreiraII; Marli Maria KnorstIV
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      28 Mar 2011
    • Data do Fascículo
      Fev 2011

    Histórico

    • Recebido
      02 Set 2010
    • Aceito
      22 Nov 2010
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