Prevalência de marcadores sorológicos para hepatite e potenciais fatores associados em pacientes com diabetes mellitus

RESUMO

Objetivo:

estimar a prevalência de marcadores sorológicos para hepatite B e C em pacientes com diabetes mellitus e analisar potenciais fatores associados.

Método:

estudo transversal com 255 pacientes com diabetes mellitus. Elegeram-se variáveis demográficas, clínicas e comportamentos de risco para hepatite B e C. Investigou-se os marcadores HBsAg, Anti-HBc IgG, Anti-HBc IgM, Anti-HBs e Anti-HCV. Utilizou-se um questionário e coleta de sangue venoso e análise por estatística inferencial.

Resultados:

16,8% pacientes apresentaram marcador Anti-HBc total reagente, 8,2% Anti-HBs isolado e 75% foram não reagentes para todos os marcadores de hepatite B. Nenhum caso de HBsAg reagente foi encontrado, 3,3% dos pacientes apresentaram marcador anti-HCV reagente. A prevalência de infecção pregressa pelo vírus da hepatite B mostrou-se diretamente associado ao tempo de diabetes mellitus, e a prevalência de infecção pelo vírus da hepatite C não teve associação com as variáveis investigadas. A prevalência de infecção por hepatite B e C em pacientes com diabetes mellitus foi superior a nacional, 16,8% e 3,3% respectivamente.

Conclusão:

os resultados sugerem que pacientes com diabetes sejam uma população de maior vulnerabilidade às hepatites B e C, ensejando à adoção de medidas preventivas de sua ocorrência.

Descritores:
Diabetes Mellitus; Hepatite B; Hepatite C; Cobertura Vacinal; Hepatopatias; Enfermagem

ABSTRACT

Objective:

to estimate the prevalence of serological markers for hepatitis B and C in patients with diabetes mellitus and analyze potential associated factors.

Method:

a cross-sectional study with 255 patients with diabetes mellitus. Demographic, clinical, and risk behavior factors for hepatitis B and C were selected. The markers HBsAg, Anti-HBc IgG, Anti-HBc IgM, Anti-HBs, and Anti-HCV were investigated. A questionnaire and venous blood collection and inferential statistical analysis were used.

Results:

16.8% of the patients had a total reactive Anti-HBc marker, 8.2% an isolated Anti-HBs, and 75% were non-reactive for all hepatitis B markers. No case of reactive HBsAg was found and 3.3% of the patients had a reactive anti-HCV marker. The prevalence of prior hepatitis B virus infection was directly associated with the time of diabetes mellitus and the prevalence of hepatitis C virus infection was not associated with the investigated variables. The prevalence of hepatitis B and C infection in patients with diabetes mellitus was higher when compared to the national, with values of 16.8% and 3.3%, respectively.

Conclusion:

the results suggest that patients with diabetes are a population of higher vulnerability to hepatitis B and C, leading to the adoption of preventive measures of their occurrence.

Descriptors:
Diabetes Mellitus; Hepatitis B; Hepatitis C; Immunization Coverage; Liver Diseases; Nursing

RESUMEN

Objetivo:

estimar la prevalencia de marcadores serológicos para la hepatitis B y C en pacientes con diabetes mellitus y analizar potenciales factores asociados.

Método:

estudio transversal con 255 pacientes con diabetes mellitus. Se eligieron variables demográficas, clínicas y comportamientos de riesgo para hepatitis B y C. Se investigaron los marcadores HBsAg, Anti-HBc IgG, Anti-HBc IgM, Anti-HBs y Anti-HCV. Se utilizó un cuestionario, colecta de sangre venosa y análisis por estadística inferencial.

Resultados:

16,8% de los pacientes presentaron marcador Anti-HBc total reactivo, 8,2% Anti-HBs aislado y 75% fueron no reactivos para todos los marcadores de hepatitis B. Ningún caso de HBsAg reactivo fue encontrado, 3,3% de los pacientes presentaron marcador anti-HCV reactivo. La prevalencia de infección previa por el virus de la hepatitis B se mostró directamente asociado al tiempo de diabetes mellitus, y la prevalencia de infección por el virus de la hepatitis C no tuvo asociación con las variables investigadas. La prevalencia de infección por hepatitis B y C en pacientes con diabetes mellitus fue superior al nacional, 16,8% y 3,3% respectivamente.

Conclusión:

los resultados sugieren que pacientes con diabetes son una población de mayor vulnerabilidad a las hepatitis B y C, lo que da lugar a la adopción de medidas preventivas de su ocurrencia.

Descriptores:
Diabetes Mellitus; Hepatitis B; Hepatitis C; Cobertura de Vacinación; Hepatopatías; Enfermería

Introdução

A literatura internacional mostra surtos de infecção pelo vírus da hepatite B (HBV) e vírus da hepatite C (HCV) em instituições hospitalares, ambulatoriais e de longa permanência. Os casos de infecção têm-se mostrado mais frequentes em pacientes com diabetes mellitus (DM) do que naqueles sem a doença, sugerindo que os pacientes com DM sejam potencialmente mais susceptíveis à infecção pelo HBV e HCV em decorrência dos procedimentos relacionados ao tratamento e controle da doença, em especial o monitoramento da glicemia capilar^1-8.

Estes surtos acontecem quando as normas de controle de infecção durante o monitoramento da glicemia capilar são negligenciadas, tais como, o compartilhamento de canetas lancetadoras, lancetas e de glicosímetros sem o adequado processo de desinfecção, devido à transmissão de microrganismos pelo sangue. O HBV e o HCV podem sobreviver em superfícies, tais como, canetas lancetadoras, lancetas e glicosímetros, em média de cinco a sete dias, mesmo na ausência de sangue visível. Durante este período, o vírus pode ocasionar infecção, caso ele atinja a circulação sanguínea de uma pessoa susceptível^9-10.

Há evidências de que a gravidade e a letalidade relacionadas à infecção pelo HBV e HCV são maiores em pacientes com DM, do que naqueles sem a doença. Estudos mostram que em pacientes infectados pelo HBV e HCV, a presença do DM pode acelerar a progressão da doença hepática, levar a cirrose, carcinoma hepatocelular e óbito^11-12. Também a infecção pelo HBV e HCV pode influenciar negativamente o controle glicêmico de pacientes com DM, aumentando o risco de hiperglicemia^13-15.

No entanto, no Brasil, há escassez de estudos no que se refere ao comportamento das hepatites B e C em pacientes com DM. Quanto a hepatite C, foram identificados quatro estudos em pacientes com DM^16-18. Um deles mostrou alta prevalência de hepatite C em pacientes com diabetes mellitus tipo 2 (DM2) quando comparados aos doadores de sangue sem DM ⁽¹⁶. Outro estudo também encontrou alta prevalência de hepatite C em pacientes com DM2¹⁸. Por outro lado, estudos não identificaram diferença na prevalência da hepatite C em pacientes com e sem DM¹⁴ e casos de hepatite C nos pacientes com DM2 investigados¹⁷.

Estudo realizado sobre a ocorrência das hepatites mostrou a magnitude da prevalência das Infecções pelos Vírus das Hepatites A, B e C nas macrorregiões brasileiras e representou um grande passo no enfrentamento das hepatites no Brasil¹⁹. No entanto, desconhece-se o comportamento da doença em indivíduos com DM e fatores de risco relacionados à infecção nesta população.

Diante do exposto, ao considerar o crescimento expressivo da prevalência de DM no município de Ribeirão Preto-SP, que passou de 12,1% em 1997 para 15,1% em 2006, o impacto da infecção pelo HBV e HCV na morbidade e mortalidade, agravados pelo DM; que os pacientes com DM constituem população de risco aumentado para hepatite B e C, este estudo teve como objetivo estimar a prevalência de marcadores sorológicos para hepatite B e C em pacientes com DM e, analisar potenciais fatores de risco relacionados. Acredita-se que o estudo proposto possa fornecer subsídios para conhecer a magnitude do problema e, avançar na produção do conhecimento sobre hepatite B e C e DM. Esse estudo pode representar o surgimento de uma nova temática de investigação que poderá conduzir outros estudos, traduzindo-se em qualidade das informações em saúde e, por conseguinte, melhoria da rede de atenção à saúde.

Método

Estudo transversal, realizado em uma unidade de saúde de nível secundário um município do estado de São Paulo, Brasil. A população de estudo foi constituída por 314 pacientes com DM tipo 1 e 2, que compareceram em pelo menos uma consulta no período de julho a dezembro de 2014. Foram considerados elegíveis todos os paciente com diagnóstico de DM tipo 1 e 2, registrados em prontuário de saúde, de ambos os sexos, com idade igual ou superior a 18 anos e que compareceram à consulta médica no período de julho a dezembro de 2014. Foram excluídos sete pacientes por limitações auditivas ou cognitivas que impossibilitaram responder às questões do instrumento e 17, devido à dificuldade de estabelecer contato pelo pesquisador. Desta forma 290 pacientes com DM foram convidados a participar do estudo, sendo que 35 recusaram. Os principais motivos referidos para a recusa foram à falta de tempo para responder o questionário, falta de interesse em participar do estudo devido já ter participado de outros projetos de pesquisa e indisponibilidade para a coleta de sangue. A amostra de conveniência foi constituída por 255 pacientes com DM que compareceram à consulta médica no período de coleta de dados e atenderam aos critérios de inclusão. Esse valor (n=255) representa 88% dos pacientes convidados a participar do estudo, 81% da população de estudo e 39% dos pacientes com DM atendidos, em 2014, na referida unidade. As variáveis explanatórias foram: demográficas (sexo, idade e escolaridade) e clínicas (tempo de DM, uso de insulina, monitoramento da glicemia capilar, intervenções médicas, cirúrgicas, diagnósticas e terapêuticas, situações e comportamentos de risco para hepatite B e C) e os desfechos foram infecção pelo HBV e pelo HCV.

Para este estudo foi elaborado pela pesquisadora o questionário Ocorrência de Marcadores Sorológicos para Hepatite B e C em Pacientes com Diabetes Mellitus tendo como base o questionário para adolescentes e adultos utilizado no Inquérito Nacional da Prevalência das Infecções pelo Vírus da hepatite A, B e C²⁰, a experiência do pesquisador com pacientes com DM e extensa revisão da literatura sobre o tema^7-8,19-23. O questionário foi composto por 96 questões subdivididas em cinco partes: Identificação (11 questões); Variáveis demográficas (quatro questões); Variáveis clínicas (51 questões); Variáveis comportamentais (24 questões); Resultados de exames de sorologia para hepatite B e C (seis questões).

O instrumento de coleta de dados foi submetido a pré-teste com dez pacientes a fim de identificar possíveis ajustes na sequência das questões, testar a abordagem ao paciente, bem como estimar o tempo de aplicação do questionário. Para a coleta de dados a pesquisadora contou com a colaboração de uma aluna de Iniciação Cientifica previamente capacitada a fim de padronizar a coleta de dados. Após a aplicação do pré-teste o questionário foi mantido, sem necessidade de ajustes quanto à forma e conteúdo. Os dez pacientes foram incluídos na amostra final do estudo. A coleta de dados foi realizada no período de julho a dezembro de 2014.

Dos 255 pacientes, 226 compareceram à unidade para a coleta de sangue, 19 realizaram a coleta no domicílio, 10 pacientes recusaram realizar a coleta de sangue. Desta forma 245 pacientes realizaram a coleta de sangue. Os principais motivos para a recusa foram à falta de tempo e a desistência em participar desta fase da coleta de dados.

A análise estatística dos dados foi realizada utilizando o programa STATA 11.0 (Statacorp LP, College Station, Estados Unidos). A descrição dos dados demográficos e clínicos foram apresentados por meio de estatística descritiva, considerando todos os pacientes que participaram do estudo (n=255). A análise sorológica para hepatite B, dos paciente que realizaram a coleta de sangue (n=245) permitiu avaliar a presença dos marcadores HBsAg, anti-HBc IgG, anti-HBc IgM e anti-HBs. Devido os marcadores HBsAg e anti-HBc IgM por terem se apresentado não reagentes para todos os pacientes para efeitos de análise e apresentação dos dados, considerou-se o marcador Anti-HBc total como equivalente ao Anti-HBc IgG. A análise sorológica para hepatite C permitiu avaliar a presença do marcador anti-HCV. Resultado reagente para este marcador foi considerada infecção pelo HCV. A análise univariada das possíveis associações entre as variáveis demográficas e clínicas e a infecção pelo HBV e HCV foi determinada pelos testes de Qui-quadrado corrigido por Pearson ou Teste exato de Fisher bicaudal e Wilcoxon. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa nº CAAE 24638213.2.0000.5393

Resultados

As características demográficas e clínicas dos 255 (100%) pacientes investigados estão descritas na Tabela 1.

Tabela 1
Distribuição dos pacientes com DM^* segundo as variáveis demográficas e clínicas. Ribeirão Preto, SP, Brasil, 2014

Variáveis demográficas		n	%
Sexo
	Masculino	85	33,3
	Feminino	170	66,7
Idade
	Mediana (p25-p75)	63 (55-71)
Escolaridade
	Não alfabetizado	9	3,5
	Alfabetização de adultos	2	0,8
	1ª a 4ª série Fundamental Incompleto	51	20,0
	1ª a 4ª série Fundamental Completo	69	27,1
	5ª a 8ª série Fundamental Incompleto	26	10,2
	5ª a 8ª série Fundamental Completo	31	12,2
	Ensino Médio incompleto	8	3,1
	Ensino Médio completo	39	15,3
	Superior incompleto	10	3,9
	Superior completo	10	3,9
Tempo de DM* (anos)
	Mediana (p25-p75)	10 (4-20)
Uso de insulina
	Não	105	41,2
	Sim	150	58,8
Monitoramento da glicemia capilar
	Não	65	25,5
	Sim	190	74,5

• ^*
  DM - Diabetes mellitus

Dos 245 (100%) que compareceram para a coleta de sangue, 41 (16,8%) apresentaram marcador correspondente à infecção pregressa com cura espontânea, 20 (8,2%) soroconversão por vacinação e 184 (75%) susceptibilidade à infecção. Nenhum caso de hepatite B aguda ou crônica foi encontrado. Portanto, a prevalência de infecção pregressa pelo HBV encontrada em pacientes com DM foi de 16,8%.

A Tabela 2 mostra os resultados obtidos da análise univariada de infecção pregressa pelo HBV segundo as variáveis demográficas e clínicas. Infecção pregressa apresentou associação direta com a idade (p=0,014) e tempo de DM (p=0,043). Não se obteve associação significativa para as outras variáveis.

Tabela 2
Distribuição dos pacientes com DM^* com e sem hepatite B pregressa segundo as variáveis demográficas e clínicas do DM^*. Ribeirão Preto, SP, Brasil, 2014

Variáveis		Anti-HBc† Total					p
		(-)			(+)
		n	%		N	%
	Total	204	83,2		41	16,8
Sexo
	Masculino	63	30,9		17	41,5
	Feminino	141	69,1		24	58,5	0,187‡
Idade
	Mediana (p25-p75)	62,8 (55,2-69,3)			68,4 (58,9-75,2)		0,014§
Escolaridade
	Não alfabetizado	6	2,9		3	7,3
	Alfabetização de Adultos	1	0,5		1	2,4
	1ª a 4ª Fundamental Incompleto	40	19,6		9	22,0
	1ª a 4ª Fundamental Completo	57	28,0		8	19,5
	5ª a 8ª Fundamental Incompleto	19	9,3		6	14,6
	5ª a 8ª Fundamental Completo	25	12,3		4	9,8
	Ensino Médio Incompleto	8	3,9		-	-
	Ensino Médico Completo	31	15,2		7	17,1
	Superior Incompleto	8	3,9		2	4,9
	Superior Completo	9	4,4		1	2,4	0,521II
	Tempo de DM* (anos)
	Mediana (p25-p75)	10 (4-19)			12 (10-23)		0,043II
Uso de insulina
	Não	82	40,2		19	46,3
	Sim	122	59,8		22	53,7	0,466‡
Monitoramento da glicemia capilar
	Não	51	25,0		10	24,4
	Sim	153	75,0		31	75,6	0,934‡

• ^*
  DM - Diabetes mellitus;^†Anti-HBc - Anticorpo (IgM ou IgG) contra o antígeno do núcleo do vírus da hepatite B; ^‡Teste Qui-quadrado corrigido por Pearson; ^§Teste de Wilcoxon;^||Teste exato de Fisher bicaudal

A Tabela 3 apresenta à análise univariada de infecção pregressa segundo as variáveis relacionadas à história de intervenções médicas, cirúrgicas, diagnósticas e terapêuticas e situações e comportamentos de risco para hepatite B. Os resultados mostram associação entre infecção pregressa e relato de contato domiciliar com caso de hepatite B (p=0,001), trabalho como policial (p=0,016) e maior número de parceiros sexuais ao longo da vida (p=0,004).

Tabela 3
Distribuição dos pacientes com DM^* com e sem hepatite B pregressa segundo a história de intervenções médicas, cirúrgicas, diagnósticas e terapêuticas e situações e comportamentos de risco para hepatite B. Ribeirão Preto, SP, Brasil, 2014

Variáveis		Anti-HBc† Total
		(-)			(+)		p
		n	%		N	%
	Total	204	83,2		41	16,8
História de intervenções‡
	Internação	132	64,7		27	65,8	0,888§
	Cirurgia	161	16,3		33	80,5	0,822§
	Transfusão de sangue/derivados	40	19,6		4	9,8	0,181II
	Tratamento odontológico	162	79,4		29	70,7	0,221§
	Endoscopia	75	36,8		14	34,2	0,750§
	Hemodiálise	3	1,5		-	-	1,000II
Situações e comportamentos de risco‡
	Contato domiciliar com caso de hepatite B	3	1,5		6	14,6	0,001II
	Contato sexual com caso de hepatite B	1	0,5		-	-	1,000II
	Compartilhamento de objetos perfurocortantes	84	41,2		13	31,7	0,258II
	Tatuagem	8	3,9		1	2,4	1,000II
	Piercing	4	2,0		-	-	1,000II
	Profissional da saúde	19	9,3		4	9,8	1,000II
	Trabalho como policial	1	0,5		3	7,3	0,016‡
	Trabalho como agente penitenciário/carcereiro	1	0,5		-	-	1,000II
	Trabalhador na coleta lixo doméstico/hospitalar	7	3,4		1	2,4	1,000II
	Trabalho como manicure/pedicuro/podólogo	11	5,4		1	2,4	0,696II
	Drogas fumadas	3	1,5		1	2,4	0,522II
	Drogas cheiradas	2	1,0		1	2,4	0,424II
	Uso de preservativo	16	7,8		2	4,9	1,000II
	Doença sexualmente transmissível	30	14,7		8	19,5	0,438II
	Número de parceiros sexuais ao longo da vida Mediana (p25-p75)	1 (1-3,5)			3 (1-10)		0,004¶
Frequência de consumo de bebida alcoólica (últimos três meses)
	Nenhum	153	75,0		29	70,7
	Uma vez/mês	19	9,3		4	9,8
	Duas a três vezes/mês	15	7,4		3	7,3
	Um a dois dias/semana	13	6,4		2	4,9
	Três a quatro dias/semana	1	0,5		3	7,3
	Quase todos os dias	2	1,0		-	-
	Todos os dias	1	0,5		-	-	0,202‡

• *DM - Diabetes mellitus; ^†Anti-HBc - Anticorpo (IgM ou IgG) contra o antígeno do núcleo do vírus da hepatite B; ^‡Categorias não mutuamente exclusivas; ^§Teste Qui-quadrado corrigido por Pearson; ^||Teste exato de Fisher bicaudal; ^¶Teste de Wilcoxon

As variáveis explanatórias incluídas na análise de regressão logística foram aquelas que exibiram possível associação com o desfecho (p≤0,20). Dentre as variáveis incluídas no modelo, tempo de doença permaneceu diretamente associado à infecção pregressa após a análise multivariada, sendo que o tempo de DM aumenta o risco de hepatite B em aproximadamente 4% a cada ano de diagnóstico da doença. Também, o trabalho como policial se mostrou associado à infecção (Tabela 4).

Tabela 4
Modelo de regressão logística para Hepatite B pregressa. Ribeirão Preto, SP, Brasil, 2014

Variáveis*	OR† (IC‡95%)	p	Erro-padrão
Sexo feminino	0,74 (0,32-1,71)	0,487	0,31
Idade	1,02 (0,99-1,06)	0,143	0,01
Tempo de DM§	1,04 (1,00-1,08)	0,024	0,01
Contato domiciliar hepatite B	0,97 (0,85-1,10)	0,658	0,06
Trabalho como policial	13,82 (1,27-149,94)	0,031	16,81
Parceiros sexuais ao longo da vida	1,00 (0,99-1,00)	0,927	0,001
Consumo de bebida alcoólica	1,04 (0,75-1,44)	0,806	0,17
Transfusão de sangue/derivados	0,55 (0,17-1,72)	0,309	0,32

• ^*
  Foram incluídas as que exibiram p≤0,20 na análise univariada. Cada variável foi ajustada para as outras sete; ^†OR - Odds ratio; ^‡IC - Intervalo de confiança; ^§DM - Diabetes mellitus

Dos 245 pacientes investigados, oito (3,3%) apresentaram marcador anti-HCV reagente. Portanto, a prevalência de infecção pelo HCV encontrada em pacientes com DM foi de 3,3%. Não houve associação significativa entre as variáveis demográficas e clínicas investigadas e infecção pelo HCV.

Discussão

Ao comparar os resultados obtidos aos do inquérito de base populacional realizado, no Brasil, constata-se que a prevalência de exposição ao HBV encontrada (16,8%) foi superior à nacional (11,6%) na população geral de 20 a 69 anos. Quanto à prevalência de infecção aguda ou crônica a prevalência encontrada foi inferior à nacional, de 0,6%¹⁹. Esse resultado sugere que a prevalência de exposição ao HBV seja maior em indivíduos com DM que naqueles sem a doença⁵.

A prevalência de infecção pregressa curada e de marcador de imunidade vacinal encontrados foram superiores a estudo realizado na Espanha²⁴. Por outro lado, estudos realizados na Polônia e na Turquia mostraram valores duas vezes maiores^25-27. Outros estudos também encontram prevalência superior^16,25-29.

A associação de exposição ao HBV e maior tempo de DM encontrada podem ser interpretados como risco acumulativo de exposição ao vírus provavelmente atribuído ao manejo da doença, já que por si só, o DM não evolui para hepatite B ou C. A associação de exposição ao HBV e maior tempo de DM foi relatada em estudo na Polônia²⁶ na Turquia²⁸ e na Nigéria³⁰. Por outro lado, estudo realizado na Itália, não encontrou associação de infecção e tempo de DM²⁷.

Em concordância a outro estudo²⁷, o presente estudo também não encontrou a associação da infecção pelo HBV e as variáveis demográficas, as relacionadas ao uso de insulina, monitoramento da glicemia capilar e história de intervenções médicas, cirúrgicas, diagnósticas e terapêuticas. Cabe informar, que a maioria dos pacientes investigados realizava o monitoramento da glicemia capilar no domicilio e surtos de infecção pelo HBV relatados na literatura foram em pacientes institucionalizados e em serviços de saúde submetidos a monitoramento assistido da glicemia capilar sem as devidas práticas de controle de infecção^1-2,4,6.

A prevalência de infecção pelo HCV foi de 3,3% superior à prevalência nacional para a população geral de 20 a 69 anos que foi de 1,6%^24,27 e aos estudos nacionais com populações específicas tais como de surdos, militares do sexo masculino e trabalhadores da coleta de resíduos domésticos^31-33. Por outro lado estudo que investigou a prevalência de infecção pelo HCV em pacientes idosos na região sul do Brasil, encontrou prevalência de 2,2%³⁴.

A prevalência de hepatite C nos pacientes investigados em nosso estudo também foi superior a encontrada em três estudos nacionais com pacientes DM^16-17. A diferença na prevalência encontrada pode ser atribuída à composição da amostra quanto à faixa etária. A idade avançada é considerada como fator de risco para a exposição à infecção pelo HCV^20-21. O tempo de DM encontrada nesses estudos também foi inferior ao encontrado em nosso estudo, o que pode também justificar a diferença na prevalência encontrada.

Por outro lado, um estudo realizado na região sul do Brasil mostrou que a prevalência foi quatro vezes maior nos pacientes com DM2 em atendimento ambulatorial¹⁸. Deve-se considerar que o tempo de DM dos pacientes ambulatoriais investigados é superior aos do nosso estudo, o que pode ter contribuído para a maior prevalência da infecção.

Estudos internacionais que investigaram a prevalência de exposição ao HCV em pacientes com DM em ambulatório ou hospital, encontraram prevalência inferior^7,24,30, semelhantes^23,28 e superiores^{8,22,25,27,29)} em relação aos nossos resultados.

Desde a década de 90 estudos têm mostrado maior prevalência de hepatite C em pacientes com DM quando comparados aqueles sem a doença^7-8,16,23,27. Ao comparar a prevalência de hepatite C em pacientes com DM encontrada em nosso estudo (3,3%) e a prevalência observada na população geral brasileira (1,4%)¹⁹, também observamos maior prevalência de infecção em pacientes com DM.

No entanto, no presente estudo, apesar de termos encontrado prevalência de infecção pelo HCV superior à da população brasileira, não observamos associação de infecção pelo HCV e as variáveis demográficas, as relacionadas ao uso de insulina, monitoramento da glicemia capilar e história de intervenções médicas, cirúrgicas, diagnósticas e terapêuticas em concordância aos estudos nacionais^16-18.

Outros estudos relatados na literatura internacional encontraram como variáveis associadas à infecção apenas fatores de risco reconhecidos para hepatite C, tais como, história de transfusão sanguínea, compartilhamento de instrumentos perfuro cortantes, múltiplos parceiros sexuais e alteração nos níveis de enzimas hepáticas^{16,18,23,25,29}.

Estudo realizado, na França, encontrou diferença significativa na prevalência de infecção pelo HCV em pacientes com (3,1%) e sem DM (0,04%). Entretanto a hipótese de que o tipo de tratamento para o DM, as internações anteriores e o uso de caneta lancetadora para o monitoramento da glicemia capilar estejam associados à infecção pelo HCV em pacientes com DM não foi confirmada³⁵.

Esses resultados levam a suposição de que a infecção pelo HCV pode apresentar-se como um fator de risco para o desenvolvimento de DM como investigado em outros estudos^36-37. Estudos mostram que a infecção por HCV é acompanhada por defeitos na via de sinalização de insulina no fígado que pode contribuir para a resistência à insulina e DM³⁷. Entretanto os mecanismos de resistência à insulina induzida pelo HCV ainda são parcialmente compreendidos^14,38. Outro estudo mostra que a inflamação hepática é um possível fator de risco para o pré-diabetes no contexto da infecção pelo HCV³⁹.

Em síntese, ao considerar, a maior prevalência de exposição ao HBV encontrada e sua relação com tempo de DM, sugere-se o aprofundamento de novas investigações relacionadas no manejo do diabetes que possam contribuir para a infecção pelo HBV. A ausência de associação de infecção pelo HCV e as variáveis estudadas pode ser atribuída ao número relativamente baixo de infectados. Essa investigação é pioneira no Brasil, e oferece subsídios para comparações com futuros estudos e avanço no conhecimento da temática.

Este estudo oferece subsídios para conhecer a magnitude do problema e avançar na produção do conhecimento sobre hepatite B e C e DM. O estudo pode gerar novas temáticas de investigação, traduzindo-se em qualidade das informações em saúde e, por conseguinte, qualificação do cuidado de enfermagem.

Conclusão

A prevalência de infecção pelo HBV em pacientes com DM foi de 16,8%, superior à nacional e mostrou-se diretamente associado ao tempo de DM. Nenhum caso de hepatite B aguda ou crônica foi encontrado. A prevalência de infecção pelo HCV foi de 3,3%, superior à nacional e não teve associação com as variáveis demográficas e clínicas investigadas. Outros estudos precisam ser desenvolvidos a fim de investigar essas questões e aprofundar o conhecimento da relação entre hepatite C e DM na população nacional, visando à adoção oportuna de medidas preventivas.

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  Artigo extraído de tese de doutorado “Ocorrência de marcadores sorológicos para hepatite B e C em pacientes com diabetes mellitus de uma Unidade Básica de Saúde Distrital”, apresentada à Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OPAS/OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, Ribeirão Preto, SP, Brasil.

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  2018

Histórico

• Recebido
  19 Abr 2018
• Aceito
  10 Set 2018