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Saúde cardiovascular em população residente nas capitais brasileiras 1 1 Apoio financeiro do Ministério da Saúde, Brasil, convênio nº 188.

Resumo

Objetivo:

estimar a prevalência das métricas de saúde cardiovascular ideal em nível populacional, segundo sexo, idade, escolaridade e região de moradia.

Método:

estudo transversal que utilizou dados de 41.134 participantes do Sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico. A avaliação da saúde cardiovascular ideal considerou quatro fatores comportamentais: não fumar; apresentar índice de massa corporal menor do que 25 kg/m2; realizar atividade física; consumir frutas e hortaliças cinco ou mais vezes por dia, e dois fatores clínicos: não referir diagnóstico de diabetes e de hipertensão arterial. A soma dos fatores resultou em um escore que variou de zero (pior saúde cardiovascular) a seis (saúde cardiovascular ideal) fatores em níveis ideais.

Resultados:

considerando os seis fatores, somente 3,4% da população estudada apresentou níveis ideais de saúde cardiovascular e a maioria dos participantes (57,6%) apresentou três ou quatro fatores ideais. As mulheres apresentaram maior prevalência de saúde cardiovascular ideal (3,8% vs. 2,9% dos homens) (p < 0,0001).

Conclusão:

os achados deste estudo são condizentes com o elevado risco de mortalidade por doenças cardiovasculares, observado para a população brasileira, e podem contribuir para a melhor compreensão do cenário da saúde cardiovascular na população urbana do país.

Descritores:
Saúde; Sistema Cardiovascular; Fatores Epidemiológicos; Inquéritos Epidemiológicos; Promoção da Saúde

Resume

Objective:

to estimate the prevalence of ideal cardiovascular health indicators in the Brazilian population, according to gender, age, education and region of residence.

Method:

cross-sectional study that used data from 41,134 participants of the Surveillance System of Risk and Protective Factors for Chronic Diseases by Telephone Survey (Vigitel). The ideal cardiovascular health assessment considers four behavioral factors: not smoking; body mass index less than 25 kg/m2; practicing physical activity, eating fruits and vegetables five or more times per day; and two clinical factors (no diagnosis of diabetes or hypertension). The sum of factors at ideal levels results in a score ranging from zero (worse cardiovascular health) to six (ideal cardiovascular health).

Results:

considering the six factors, only 3.4% of the studied population presented ideal levels of cardiovascular health, with the majority of participants (57.6%) presenting three or four ideal factors. Women had higher prevalence of ideal cardiovascular health (3.8% versus 2.9% for men) (p < 0.0001).

Conclusion:

the findings of this study are consistent with the elevated risk of mortality from cardiovascular disease, observed in the Brazilian population. This may contribute to a better understanding of the scenario of cardiovascular health in the urban population of the country.

Descriptors:
Health; Cardiovascular System; Epidemiologic Factors; Health Surveys; Health Promotion

Resumen

Objetivo:

estimar la prevalencia de los indicadores de salud cardiovascular ideal en el ámbito poblacional, según sexo, edad, escolaridad y región de residencia.

Método:

estudio transversal que utilizó datos de 41.134 participantes del Sistema de Vigilancia de Factores de Riesgo y Protección para Enfermedades Crónicas por Encuesta Telefónica. La evaluación de la salud cardiovascular ideal consideró cuatro factores comportamentales: no fumar; presentar índice de masa corporal menor que 25 kg/m2; realizar actividad física y consumir frutas y hortalizas cinco o más veces por día; y dos factores clínicos (no referir diagnóstico de diabetes y de hipertensión arterial). La suma de los factores resultó en un puntaje que varió de cero (peor salud cardiovascular) a seis (salud cardiovascular ideal) factores en niveles ideales.

Resultados:

considerando los seis factores, solamente 3,4% de la población estudiada presentó niveles ideales de salud cardiovascular y la mayoría de los participantes (57,6%) presentó tres o cuatro factores ideales. Las mujeres presentaron mayor prevalencia de salud cardiovascular ideal (3,8% versus 2,9% de los hombres) (p < 0,0001).

Conclusión:

los hallazgos de este estudio son coherentes con el elevado riesgo de mortalidad por enfermedades cardiovasculares, observado para la población brasileña y pueden contribuir para comprender mejor el escenario de salud cardiovascular en la población urbana del país.

Descriptores:
Salud; Sistema Cardiovascular;Factores Epidemiológicos; Encuestas Epidemiológicas; Promoción de la Salud

Introdução

As altas prevalências das doenças cardiovasculares (DCV) são consequências das alterações nos hábitos de vida da população11 World Health Organization (WHO). [Internet]. Global Atlas on cardiovascular disease prevention and control. Geneva; 2011. 156 p. Acesso 12 maio 2015. Disponível em: whqlibdoc.who.int/publications/2011/9789241564373_eng.pdf?ua=1.
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e esses agravos, em 2010, estavam entre os 20 maiores responsáveis por anos de vida potencialmente perdidos por morte prematura ajustados por incapacidade (Disability Adjusted Life Years - DALYs) no Brasil22 Institute for Health Metrics and Evaluation (IHME). Global Burden of Disease (GBD) Profile: Brazil. Seattle WA: IHME; 2013. Disponível em: http://www.healthmetricsandevaluation.org/gbd/country-profiles.. A dieta inadequada, a hipertensão, o consumo de álcool, o excesso de peso e o fumo, são, nesta ordem, os cinco principais fatores de risco para essas doenças22 Institute for Health Metrics and Evaluation (IHME). Global Burden of Disease (GBD) Profile: Brazil. Seattle WA: IHME; 2013. Disponível em: http://www.healthmetricsandevaluation.org/gbd/country-profiles..

A American Heart Association (AHA) propõe métricas para avaliar a saúde cardiovascular das populações por meio da presença simultânea de sete fatores, sendo quatro comportamentais: ausência de fumo, prática de atividade física regularmente, índice de massa corporal (IMC) <25 kg/m2 e dieta saudável; e três fatores clínicos: colesterol <200 mg/dl, pressão arterial <120/80 mmHg e glicemia de jejum <100 mg/dl33 Lloyd-Jones DM Hong Y Labarthe D Mozaffarian D Appel LJ Van Horn L et al. Defining and setting national goals for cardiovascular health promotion and disease reduction: The American Heart Association's Strategic Impact Goal through 2020 and beyond. Circulation. 2010;2(121):586-613. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.109.192703.
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. Estudos indicam que a presença de seis a sete desses fatores em níveis ideais foi associada à redução de 70 a 89% na incidência de doenças cardiovasculares, comparado aos grupos que atingem nenhum ou apenas um deles33 Lloyd-Jones DM Hong Y Labarthe D Mozaffarian D Appel LJ Van Horn L et al. Defining and setting national goals for cardiovascular health promotion and disease reduction: The American Heart Association's Strategic Impact Goal through 2020 and beyond. Circulation. 2010;2(121):586-613. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.109.192703.
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4 Folsom AR Yatsuya H Nettleton JA Lutsey PL Cushman M Rosamond WD. Community prevalence of ideal cardiovascular health by the American Heart Association definition and relationship with cardiovascular disease incidence. J Am Coll Cardiol. 2011;57:1690-6. doi: 10.1016/j.jacc.2010.11.041.
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-55 Younus A Aneni EC Spatz ES Osondu CU Roberson L Ogunmoroti O et al. A systematic review of the prevalence of ideal cardiovascular health in the US and the Non-US population. Mayo Clin Proc. 2016; 91(5):649-70. doi: 10.1016/j.mayocp.2016.01.019.
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.

Assim, investigações epidemiológicas que permitem avaliar a saúde cardiovascular da população são essenciais para o direcionamento de políticas públicas promotoras de hábitos de vida saudável11 World Health Organization (WHO). [Internet]. Global Atlas on cardiovascular disease prevention and control. Geneva; 2011. 156 p. Acesso 12 maio 2015. Disponível em: whqlibdoc.who.int/publications/2011/9789241564373_eng.pdf?ua=1.
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. No Brasil, o Sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), monitora, desde 2006, os fatores de risco na população brasileira residente nas capitais66 Ministério da Saúde (BR). [Internet]. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância de Doenças e Agravos não Transmissíveis e Promoção de Saúde. Vigitel Brasil 2012: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico - Brasília: Ministério da Saúde; 2013. 136 p. Acesso 12 maio 2015. Disponível em: http://www.abeso.org.br/uploads/downloads/74/553a2473e1673.pdf..Neste contexto, o Vigitel constitui-se em uma base de dados potencialmente adequada para essa avaliação, ainda que a maioria dos fatores seja autorreferidos.

Dessa forma, neste estudo, o objetivo foi estimar a prevalência das métricas de saúde cardiovascular ideal em âmbito populacional, segundo sexo, idade, escolaridade e região de moradia.

Método

Trata-se de um estudo transversal que analisou dados dos participantes do Sistema Vigitel, coletados em 2012. O Sistema Vigitel avalia, por meio de entrevista telefônica, os fatores de risco e proteção de doenças crônicas não transmissíveis em pessoas de 18 ou mais anos, residentes nas capitais dos 26 estados brasileiros e do Distrito Federal. Informações mais detalhadas sobre o sistema Vigitel estão descritos em publicação prévia66 Ministério da Saúde (BR). [Internet]. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância de Doenças e Agravos não Transmissíveis e Promoção de Saúde. Vigitel Brasil 2012: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico - Brasília: Ministério da Saúde; 2013. 136 p. Acesso 12 maio 2015. Disponível em: http://www.abeso.org.br/uploads/downloads/74/553a2473e1673.pdf..

Em 2012, no conjunto das 27 cidades, foram entrevistados 45.448 indivíduos. Neste estudo, foram excluídas as mulheres grávidas (n = 317), as que não sabiam se estavam grávidas (n = 42) e os participantes que não apresentaram dados de peso ou altura, da mesma maneira que não souberam informar diagnóstico prévio de hipertensão e/ou diabetes (n = 3.955), totalizando 41.134 indivíduos.

A saúde cardiovascular foi avaliada conforme proposto pela American Heart Association (AHA33 Lloyd-Jones DM Hong Y Labarthe D Mozaffarian D Appel LJ Van Horn L et al. Defining and setting national goals for cardiovascular health promotion and disease reduction: The American Heart Association's Strategic Impact Goal through 2020 and beyond. Circulation. 2010;2(121):586-613. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.109.192703.
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, com algumas adaptações. Das sete métricas preconizadas, foram avaliadas seis, sendo quatro fatores comportamentais (tabagismo, índice de massa corporal - IMC-, atividade física e consumo de frutas e hortaliças) e dois fatores clínicos (diabetes e hipertensão arterial). Além disso, neste estudo os fatores foram autorreferidos e não foi incluído o fator clínico dislipidemia, por não ser avaliado pelo Vigitel de 2010 a 2012. Outra adaptação diz respeito à dieta, que neste estudo foi avaliada a partir do consumo de frutas e hortaliças, por meio do questionário de consumo alimentar do Vigitel, mais simplificado do que o proposto pela AHA33 Lloyd-Jones DM Hong Y Labarthe D Mozaffarian D Appel LJ Van Horn L et al. Defining and setting national goals for cardiovascular health promotion and disease reduction: The American Heart Association's Strategic Impact Goal through 2020 and beyond. Circulation. 2010;2(121):586-613. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.109.192703.
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.

Os seis fatores foram classificados em ideal (1) e ruim (0), sendo considerados como ideal as seguintes condições: não fumar (nunca fumou); apresentar IMC <25 kg/m2; realizar atividade física (>150 minutos semanais de atividade física de intensidade leve ou moderada ou >75 minutos semanais de atividade física de intensidade vigorosa em todos os domínios); consumir frutas, legumes e verduras (exceto batata, mandioca e inhame) cinco ou mais vezes por dia, em cinco ou mais dias por semana, e não autorreferir diagnóstico médico anterior de diabetes e hipertensão arterial. Ao final, a saúde cardiovascular foi avaliada a partir da soma desses seis fatores, que variou de zero (pior saúde cardiovascular) a seis (saúde cardiovascular ideal). Posteriormente, os quatro fatores comportamentais foram agrupados, conforme proposto pela AHA33 Lloyd-Jones DM Hong Y Labarthe D Mozaffarian D Appel LJ Van Horn L et al. Defining and setting national goals for cardiovascular health promotion and disease reduction: The American Heart Association's Strategic Impact Goal through 2020 and beyond. Circulation. 2010;2(121):586-613. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.109.192703.
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. Assim, os indivíduos podem ter entre zero e quatro fatores comportamentais em níveis ideais.

Os dados foram analisados no módulo survey do pacote estatístico Statistical Software for Professional (Stata), versão 14, levando em consideração os pesos utilizados pelo Vigitel e, por conseguinte, a representatividade da amostra. As análises descritivas consistiram no cálculo das prevalências de cada fator individualmente e em conjunto. As prevalências também foram calculadas segundo o sexo (masculino, feminino), idade (18 a 34, 35 a 54, 55 ou mais anos), escolaridade (0-8, 9-11, 12 ou mais anos de estudo) e região de moradia (Centro-Oeste, Sul, Sudeste, Nordeste, e Norte), sendo as diferenças estatísticas avaliadas por meio do teste qui-quadrado de Pearson (p < 0,05). Ao final, foram estimadas as associações entre as variáveis sociodemográficas (idade, escolaridade e região de moradia) e a saúde cardiovascular, para homens e mulheres, usando como medida de associação a Razão de Prevalência (RP) com seus intervalos de 95% de confiança (IC 95%), obtidos por meio da Regressão de Poisson com variância robusta77 Coutinho Leticia MS Scazufca Marcia Menezes Paulo R. Métodos para estimar razão de prevalência em estudos de corte transversal. Rev Saúde Pública. 2008;42(6): 992-8. doi: 10.1590/S0034-89102008000600003.
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. Para esta análise específica, considerou-se como saúde cardiovascular ideal o total de cinco a seis fatores em níveis ideais e também, para a soma de comportamentos ideais, o total de três a quatro fatores comportamentais em níveis ideais55 Younus A Aneni EC Spatz ES Osondu CU Roberson L Ogunmoroti O et al. A systematic review of the prevalence of ideal cardiovascular health in the US and the Non-US population. Mayo Clin Proc. 2016; 91(5):649-70. doi: 10.1016/j.mayocp.2016.01.019.
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.

Por se tratar de um inquérito telefônico, o consentimento livre e esclarecido foi substituído pelo consentimento verbal, obtido por ocasião dos contatos telefônicos com os entrevistados. O Vigitel foi aprovado pelo Comitê Nacional de Ética em Pesquisa, do Ministério da Saúde, sob parecer número 749/2006 e registro no 13.081. Não foram solicitados dados de identificação dos entrevistados, garantindo-se a confidencialidade e o sigilo das informações.

Resultados

Foram incluídos neste estudo 41.134 indivíduos, com idade média (±EP) de 41 anos (±0,15). A distribuição do sexo foi similar; 48,4% eram do sexo masculino.

Ao analisar os fatores de saúde cardiovascular individualmente, observou-se que a dieta obteve o menor nível de adequação, somente 23,6% da população brasileira apresentou a dieta em nível ideal, seguido da atividade física (35,2%) e IMC (48,6%) (Figura 1).

Figura 1
Distribuição dos fatores de saúde cardiovascular na população estudada - Sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico. Brasil, 2012

Ainda considerando os fatores individualmente, verificou-se que as mulheres apresentaram melhores resultados para alguns fatores: não fumantes (73,2%); IMC normal (52%) e dieta adequada (28,8%), enquanto os homens apresentaram maior prevalência de níveis ideais para atividade física (42,1%), pressão arterial (78,3%) e diabetes (93,3%) (Tabela 1).

Tabela 1
Distribuição dos fatores de saúde cardiovascular, segundo sexo - Sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico. Brasil, 2012

Ao analisar o conjunto das métricas (Figura 2), verificou-se que 3,4% da população brasileira apresentou saúde cardiovascular ideal (todos os seis fatores em nível ideal) e, em relação à soma dos comportamentos, apenas 3,9% da população alcançou os quatro fatores em níveis ideais (Figura 2 - A). Além disso, nesta mesma figura observa-se que 19,7% e 22,5% da população apresentaram, respectivamente, cinco a seis fatores em nível recomendado, e três a quatro comportamentos em nível ideal.

Figura 2
Soma das métricas de saúde cardiovascular e soma dos comportamentos, na população total e segundo sexo - Sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico. Brasil, 2012

Em relação à soma dos seis fatores, segundo o sexo, as mulheres apresentaram maior prevalência de saúde cardiovascular ideal (p < 0,0001) (Figura 2 - B e C). O mesmo foi observado para a soma dos comportamentos (p < 0,0001). As mulheres também apresentaram maior prevalência de cinco a seis fatores (20,3%) e de três a quatro comportamentos em níveis ideais (24,0%).

Ao analisar a prevalência segundo as características sociodemográficas, observou-se que independente do sexo, os indivíduos com maior escolaridade, mais jovens e residentes em capitais da região Centro-Oeste apresentaram as maiores prevalências de saúde cardiovascular (cinco a seis fatores em níveis ideais). Os homens residentes nas capitais da região Sul também apresentaram maior prevalência de saúde cardiovascular ideal. Achados similares foram observados para a prevalência de três a quatro comportamentos em níveis ideais (Tabela 2).

Tabela 2
Razão de prevalência e IC95% para número de fatores ideais, segundo sexo - Sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico. Brasil, 2012

Observou-se, ainda, que a menor escolaridade associou-se à menor prevalência de saúde cardiovascular ideal, independente do sexo (RP = 0,28; IC 95% 0,23-0,33 para mulheres e RP = 0,27; IC 95% 0,21-033 para homens), comparada com o maior nível de escolaridade. Além disso, as faixas etárias mais avançadas se associaram à menor prevalência de saúde cardiovascular ideal, em ambos os sexos quando comparados com os da faixa etária mais jovem. Os indivíduos de 35-54 anos tiveram prevalência de cinco a seis fatores em níveis ideais de cerca de 40% menor para mulheres e 70% menor para os homens e na faixa de 55 anos ou mais, 65% menor para as mulheres e 76% menor para os homens. Em relação às regiões de moradia, para as mulheres, morar em capitais de todas as regiões se associou à menor prevalência de saúde cardiovascular ideal, comparado com a região Centro-Oeste, sendo as prevalências mais baixas nas regiões Nordeste e Norte (RP = 0,77; IC 95%: 0,70-0,86 e RP = 0,80; IC 95% 0,71-0,90, respectivamente). No caso dos homens, morar nas regiões Sudeste e Nordeste associou-se a uma prevalência cerca de 15% menor de cinco a seis fatores ideais, comparado com aqueles que moram na região Centro-Oeste. Resultados similares foram encontrados ao avaliar os fatores sociodemográficos e a soma dos comportamentos (três a quatro comportamentos em níveis ideais) (Tabela 2).

Discussão

O presente estudo, realizado com amostra probabilística de adultos das 27 capitais brasileiras, demonstrou que a população apresentou baixos níveis de saúde cardiovascular em nível ideal, com melhor desempenho nas mulheres, indivíduos mais jovens, com maior nível de escolaridade e moradores de capitais da região Centro-Oeste do país. Estes resultados são condizentes com as altas taxas de anos de vida potencialmente perdidos ajustados por incapacidade (DALYs) e elevado risco de mortalidade por doenças cardiovasculares observado na população brasileira11 World Health Organization (WHO). [Internet]. Global Atlas on cardiovascular disease prevention and control. Geneva; 2011. 156 p. Acesso 12 maio 2015. Disponível em: whqlibdoc.who.int/publications/2011/9789241564373_eng.pdf?ua=1.
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-22 Institute for Health Metrics and Evaluation (IHME). Global Burden of Disease (GBD) Profile: Brazil. Seattle WA: IHME; 2013. Disponível em: http://www.healthmetricsandevaluation.org/gbd/country-profiles..

Estudos conduzidos em cidades dos Estados Unidos, Europa e China encontraram valores de prevalência de saúde cardiovascular em nível ideal ainda mais baixos que os mostrados neste estudo (respectivamente, 1,0%, 1,0% e 0,5%)88 Crichton GE Elias MF Robbins MA. Cardiovascular health and arterial stiffness: the Maine-Syracuse Longitudinal Study. J Hum Hypertens. 2014;28(7): 444-9. doi:10.1038/jhh.2013.131.
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9 Shay CM Ning H Allen NB Carnethon MR Chiuve SE Greenlund KJ et al. Status of Cardiovascular Health in US Adults Prevalence Estimates From the National Health and Nutrition Examination Surveys (NHANES) 2003-2008. Circulation. 2012;125:45-56. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.111.035733.
https://doi.org/10.1161/CIRCULATIONAHA.1...
-1010 Zeng Q Dong SY Song ZY Zheng YS Wu HY Mao LN. Ideal cardiovascular health in Chinese urban population. Int J Cardiol. 2013;167(5):2311-7. doi: 10.1016/j.ijcard.2012.06.022.
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, embora uma revisão sistemática de 50 estudos conduzidos no mundo, mostrou uma grande variação dessa prevalência, oscilando entre 0,3 a 15%, com os piores resultados em países em desenvolvimento (0,3 a 4%)55 Younus A Aneni EC Spatz ES Osondu CU Roberson L Ogunmoroti O et al. A systematic review of the prevalence of ideal cardiovascular health in the US and the Non-US population. Mayo Clin Proc. 2016; 91(5):649-70. doi: 10.1016/j.mayocp.2016.01.019.
https://doi.org/10.1016/j.mayocp.2016.01...
.

As prevalências observadas neste trabalho devem ser interpretadas com cautela. Uma explicação para as diferenças observadas poderia ser em função de ter sido considerado o diagnóstico referido de diabetes e hipertensão, uma vez que alterações bioquímicas e clínicas podem estar presentes em indivíduos sem o diagnóstico confirmado da doença. Esta possível subestimação da presença de diabetes e hipertensão é reforçada pela análise dos fatores comportamentais. Sabidamente, sedentarismo, dieta inadequada e peso excessivo são fatores de risco para ambas as patologias investigadas neste estudo11 World Health Organization (WHO). [Internet]. Global Atlas on cardiovascular disease prevention and control. Geneva; 2011. 156 p. Acesso 12 maio 2015. Disponível em: whqlibdoc.who.int/publications/2011/9789241564373_eng.pdf?ua=1.
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-22 Institute for Health Metrics and Evaluation (IHME). Global Burden of Disease (GBD) Profile: Brazil. Seattle WA: IHME; 2013. Disponível em: http://www.healthmetricsandevaluation.org/gbd/country-profiles.,1111 Lachat C Otchere S Roberfroid D Abdulai A Seret FMA Milesevic J et al. Diet and Physical Activity for the Prevention of Noncommunicable Diseases in Low and Middle-Income Countries: A Systematic Policy Review. PLoS Med. 2013;10(6):e1001465. doi: 10.1371/journal.pmed.1001465.
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-1212 Lim SS Vos T Flaxman AD Danae G Shibuya K Adair-Rohan H et al. A comparative risk assessment of burden of disease and injury attributable to 67 risk factors and risk factor clusters in 21 regions 1990-2010: a systematic analysis for the Global Burden of Disease Study 2010. Lancet. 2012;380(9859):2224-60. doi: 10.1016/S0140-6736(12)61766-8.
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.

Cabe ressaltar que, nos estudos citados acima, foram avaliados sete fatores e não seis, como neste. Pesquisa que utilizou estratégia similar e avaliou as mesmas seis métricas autorreferidas demonstrou que menos de um em cada 10 adultos canadenses (9,4%) apresentaram saúde cardiovascular ideal de 2003 a 20111313 Maclagan LC Park J Sanmartin C Mathur KR Roth D Manuel DG et al. The CANHEART health index: a tool for monitoring the cardiovascular health of the Canadian population. CMAJ. 2014;186(3):180-7. doi: 10.1503/cmaj.131358.
https://doi.org/10.1503/cmaj.131358...
.

Avaliando somente os fatores comportamentais, a dieta apresentou menor prevalência de adequação, seguida pela atividade física, peso corporal e tabagismo, corroborando o recente relatório sobre a carga global de doenças, que apontou a dieta inadequada como o principal fator de risco para DALYs22 Institute for Health Metrics and Evaluation (IHME). Global Burden of Disease (GBD) Profile: Brazil. Seattle WA: IHME; 2013. Disponível em: http://www.healthmetricsandevaluation.org/gbd/country-profiles., o que assinala a necessidade de melhoria deste indicador na população.

Em vários estudos, a dieta foi o fator comportamental de pior desempenho55 Younus A Aneni EC Spatz ES Osondu CU Roberson L Ogunmoroti O et al. A systematic review of the prevalence of ideal cardiovascular health in the US and the Non-US population. Mayo Clin Proc. 2016; 91(5):649-70. doi: 10.1016/j.mayocp.2016.01.019.
https://doi.org/10.1016/j.mayocp.2016.01...
,88 Crichton GE Elias MF Robbins MA. Cardiovascular health and arterial stiffness: the Maine-Syracuse Longitudinal Study. J Hum Hypertens. 2014;28(7): 444-9. doi:10.1038/jhh.2013.131.
https://doi.org/10.1038/jhh.2013.131...
,1010 Zeng Q Dong SY Song ZY Zheng YS Wu HY Mao LN. Ideal cardiovascular health in Chinese urban population. Int J Cardiol. 2013;167(5):2311-7. doi: 10.1016/j.ijcard.2012.06.022.
https://doi.org/10.1016/j.ijcard.2012.06...
,1313 Maclagan LC Park J Sanmartin C Mathur KR Roth D Manuel DG et al. The CANHEART health index: a tool for monitoring the cardiovascular health of the Canadian population. CMAJ. 2014;186(3):180-7. doi: 10.1503/cmaj.131358.
https://doi.org/10.1503/cmaj.131358...
. Existem políticas públicas que tentam responder ao cenário encontrado e estão consolidadas em diversas estratégias, tais como a Política Nacional de Alimentação e Nutrição, o Guia Alimentar para População Brasileira e o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. Entretanto, ainda são encontrados obstáculos para promoção de uma alimentação saudável em âmbito populacional, como disponibilidade e preços dos alimentos saudáveis, além de acesso a informação. Estudo realizado com dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) no Brasil, apontou que a redução de 1% no preço de frutas e hortaliças ocasionaria o aumento em 0,79% o consumo dos mesmos, principalmente em extratos de menor poder aquisitivo1414 Claro RM Monteiro CA. Family income food prices and household purchases of fruits and vegetables in Brazil. Rev Saúde Pública. 2010;44(6):1-6. doi: 10.1590/S0034-89102010000600005.
https://doi.org/10.1590/S0034-8910201000...
. O incremento no consumo desses alimentos também está relacionado à produção, à estocagem, ao processamento local de frutas e verduras e à presença concomitante de programas de educação alimentar, orientando a população a consumir esses alimentos1111 Lachat C Otchere S Roberfroid D Abdulai A Seret FMA Milesevic J et al. Diet and Physical Activity for the Prevention of Noncommunicable Diseases in Low and Middle-Income Countries: A Systematic Policy Review. PLoS Med. 2013;10(6):e1001465. doi: 10.1371/journal.pmed.1001465.
https://doi.org/10.1371/journal.pmed.100...
.

Ainda, em relação aos fatores comportamentais, a atividade física se constitui em importante fator para prevenção e controle das doenças cardiovasculares11 World Health Organization (WHO). [Internet]. Global Atlas on cardiovascular disease prevention and control. Geneva; 2011. 156 p. Acesso 12 maio 2015. Disponível em: whqlibdoc.who.int/publications/2011/9789241564373_eng.pdf?ua=1.
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,1212 Lim SS Vos T Flaxman AD Danae G Shibuya K Adair-Rohan H et al. A comparative risk assessment of burden of disease and injury attributable to 67 risk factors and risk factor clusters in 21 regions 1990-2010: a systematic analysis for the Global Burden of Disease Study 2010. Lancet. 2012;380(9859):2224-60. doi: 10.1016/S0140-6736(12)61766-8.
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. A inatividade física e atividade física insuficiente foram responsáveis por aproximadamente 3,2 milhões de mortes e 2,8% dos DALYs na população mundial1212 Lim SS Vos T Flaxman AD Danae G Shibuya K Adair-Rohan H et al. A comparative risk assessment of burden of disease and injury attributable to 67 risk factors and risk factor clusters in 21 regions 1990-2010: a systematic analysis for the Global Burden of Disease Study 2010. Lancet. 2012;380(9859):2224-60. doi: 10.1016/S0140-6736(12)61766-8.
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. No Brasil, o programa Academia da Saúde (2011), do Ministério da Saúde, objetivou, dentre outros aspectos, promover locais públicos com infraestrutura, equipamentos e profissionais qualificados para a orientação da atividade física, da mesma maneira que ações de promoção a saúde, como tentativas de promover a atividade física e melhorar a saúde da população.

Quanto ao IMC maior do que 25 kg/m2, observa-se uma associação com o maior risco de doenças cardiovasculares11 World Health Organization (WHO). [Internet]. Global Atlas on cardiovascular disease prevention and control. Geneva; 2011. 156 p. Acesso 12 maio 2015. Disponível em: whqlibdoc.who.int/publications/2011/9789241564373_eng.pdf?ua=1.
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. O excesso de peso e suas doenças associadas são um problema em constante ascensão no Brasil e no mundo e apresenta-se como um desafio para os gestores de saúde, devido ao seu impacto na qualidade de vida das populações1515 Ministério da Saúde (BR). [Internet]. Plano de Ações Estratégicas para Enfrentamento das DCNT no Brasil 2011-2022. Brasília (DF): Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Análise de Situação de Saúde. Coordenação Geral de Doenças e Agravos Não Transmissíveis; Ministério da Saúde; 2011. 160 p. Acesso 14 junho 2015. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/plano_acoes_enfrent_dcnt_2011.pdf.
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. A intervenção na dupla carga de doença requer a melhora do padrão alimentar e o aumento da atividade física1111 Lachat C Otchere S Roberfroid D Abdulai A Seret FMA Milesevic J et al. Diet and Physical Activity for the Prevention of Noncommunicable Diseases in Low and Middle-Income Countries: A Systematic Policy Review. PLoS Med. 2013;10(6):e1001465. doi: 10.1371/journal.pmed.1001465.
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,1515 Ministério da Saúde (BR). [Internet]. Plano de Ações Estratégicas para Enfrentamento das DCNT no Brasil 2011-2022. Brasília (DF): Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Análise de Situação de Saúde. Coordenação Geral de Doenças e Agravos Não Transmissíveis; Ministério da Saúde; 2011. 160 p. Acesso 14 junho 2015. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/plano_acoes_enfrent_dcnt_2011.pdf.
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.

O tabagismo, por sua vez, é um preocupante problema de saúde pública, uma vez que não fumar auxilia a prevenir doenças, como as cardiovasculares11 World Health Organization (WHO). [Internet]. Global Atlas on cardiovascular disease prevention and control. Geneva; 2011. 156 p. Acesso 12 maio 2015. Disponível em: whqlibdoc.who.int/publications/2011/9789241564373_eng.pdf?ua=1.
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,1616 World Health Organization (WHO). Report on the Global Tobacco Epidemic 2008: The MPOWER package. Geneva; 2008. Disponível em: www.who.int/tobacco/global_report/2015/en/.
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. A alta prevalência desse fator em nível ideal, também encontrada em outros estudos55 Younus A Aneni EC Spatz ES Osondu CU Roberson L Ogunmoroti O et al. A systematic review of the prevalence of ideal cardiovascular health in the US and the Non-US population. Mayo Clin Proc. 2016; 91(5):649-70. doi: 10.1016/j.mayocp.2016.01.019.
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, decorre dos inúmeros esforços bem sucedidos dos programas de prevenção à iniciação do hábito de fumar e cessação do tabagismo no País. A maior prevalência de tabagismo entre homens envolve aspectos históricos e culturais1717 Pereira JC Barreto SM Passos VMA. O Perfil de Saúde Cardiovascular dos Idosos Brasileiros Precisa Melhorar: Estudo de Base Populacional. Arq Bras Cardiol. 2008;91(1):1-10. doi: 10.1590/S0066-782X2008001300001.
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. Além disso, as proporções mais expressivas de tabagistas são encontradas entre as pessoas com menor escolaridade1818 Monteiro CA Cavalcante TM Moura EC Claro RM Szwarcwald CL. Population-based evidence of a strong decline in the prevalence of smokers in Brazil (1989-2003). Bull World Health Organ. 2007;85(7):527-534. doi: 10.1590/S0042-96862007000700010.
https://doi.org/10.1590/S0042-9686200700...
.

A maior prevalência de níveis ideais de saúde cardiovascular no sexo feminino, também foi encontrado em um estudo canadense, no qual 12,8% da população feminina apresentou indicadores de saúde cardiovascular em nível ideal, e apenas 6,1% nos homens(1313 Maclagan LC Park J Sanmartin C Mathur KR Roth D Manuel DG et al. The CANHEART health index: a tool for monitoring the cardiovascular health of the Canadian population. CMAJ. 2014;186(3):180-7. doi: 10.1503/cmaj.131358.
https://doi.org/10.1503/cmaj.131358...
. Entre indivíduos mais jovens e com maior escolaridade também encontrou-se melhor saúde cardiovascular, condizente com outros estudos de base populacional e pode estar relacionada, por exemplo, à maior prática de atividade física em indivíduos desses grupos66 Ministério da Saúde (BR). [Internet]. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância de Doenças e Agravos não Transmissíveis e Promoção de Saúde. Vigitel Brasil 2012: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico - Brasília: Ministério da Saúde; 2013. 136 p. Acesso 12 maio 2015. Disponível em: http://www.abeso.org.br/uploads/downloads/74/553a2473e1673.pdf.,1919 Florindo AA Hallal PC Moura EC Malta DC. Prática de atividades físicas e fatores associados em adultos Brasil 2006. Rev Saúde Pública. 2009; 43(2):65-73. doi: 10.1590/S0034-89102009000900009.
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.

Além disso, o risco de diabetes e hipertensão arterial aumenta com a idade1717 Pereira JC Barreto SM Passos VMA. O Perfil de Saúde Cardiovascular dos Idosos Brasileiros Precisa Melhorar: Estudo de Base Populacional. Arq Bras Cardiol. 2008;91(1):1-10. doi: 10.1590/S0066-782X2008001300001.
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. Estudo de coorte de base populacional desenvolvido com 2164 adultos entre 18 e 30 anos no baseline, demonstrou que depois de 25 anos, 80,3% da população piorou a saúde cardiovascular ao longo do estudo. Os autores demonstraram que o IMC adequado e não fumar foram fatores protetores para perda do nível ideal de saúde cardiovascular, independente de sexo e etnia2020 Gooding HC Shay CM Ning H Gillman MW Chiuve SE Reis JP et al. Optimal Lifestyle Components in Young Adulthood Are Associated With Maintaining the Ideal Cardiovascular Health Profile Into Middle Age. J Am Heart Assoc. 2015;4(11). doi: 10.1161/JAHA.115.002048.
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.

De acordo com estudo em países de alta renda, as doenças crônicas não transmissíveis tendem a ser mais frequentes nos estratos da população com menor escolaridade, o que tem se tornado realidade também nos países de média e baixa renda2121 Monteiro CA Conde WL Castro IRR. A tendência cambiante da relação entre escolaridade e risco de obesidade no Brasil (1975 - 1997). Cad Saúde Pública. 2003;19(1): 67-75.doi:10.1590/S0102-311X2003000700008.
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. A exemplo, indivíduos com maior escolaridade praticam mais atividade física, pois inúmeras barreiras, inclusive socioeconômicas, podem contribuir para um estilo de vida sedentário, que por sua vez diminuem a saúde cardiovascular2222 Ford ES Caspersen CJ. Sedentary behaviour and cardiovascular disease: a review of prospective studies. Int J Epidemiol. 2012;41(5):1338-53. doi: 10.1093/ije/dys078.
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. De acordo com dados do estudo Carga Global de Doenças 2010, a inatividade física e atividade física insuficiente foram responsáveis por aproximadamente 3,2 milhões de mortes e 2,8% dos anos de vida potencialmente perdidos por morte prematura ajustado por incapacidade no mundo1212 Lim SS Vos T Flaxman AD Danae G Shibuya K Adair-Rohan H et al. A comparative risk assessment of burden of disease and injury attributable to 67 risk factors and risk factor clusters in 21 regions 1990-2010: a systematic analysis for the Global Burden of Disease Study 2010. Lancet. 2012;380(9859):2224-60. doi: 10.1016/S0140-6736(12)61766-8.
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. O número reduzido de indivíduos fisicamente ativos em todo o mundo2323 Hallal PC Andersen LB Bull FC Guthold R Haskell W Ekelund U et al. Global physical activity levels: surveillance progress pitfalls and prospects. Lancet. 2012;380 (9838): 247-57. doi: 10.1016/S0140-6736(12)60646-1.
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ocorre, parcialmente, devido à falta de orientação e de locais adequados para realização de atividades.

Por fim, neste estudo, residentes de capitais da região Centro-Oeste e os homens residentes na região Sul apresentaram as maiores prevalências de saúde cardiovascular ideal sendo os piores resultados encontrados nas regiões Norte e Nordeste. Estudo publicado em 2015 sobre a carga de doença no Brasil e suas regiões, demonstrou maior carga de doença, incluindo as crônicas, no Norte e Nordeste do País. Isto pode ser consequência de piores condições de vida e de acesso mais restrito aos serviços de saúde nessas regiões2424 Leite IC Valente JG Schramm JMA Daumas RP Rodrigues RN Santos MF et al. Burden of disease in Brazil and its regions 2008. Cad Saúde Pública. 2015; 31(7):1551-64. doi: 10.1590/0102-311X00111614.
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, corroborando as baixas prevalências de saúde cardiovascular ideal encontradas nessas regiões, neste estudo.

Algumas limitações devem ser consideradas no presente estudo. Em primeiro lugar, trata-se de um trabalho realizado a partir de informações autorreferidas - aspectos inerentes aos inquéritos telefônicos -, porém de fácil execução em grandes amostras populacionais. Cabe ressaltar que o uso de dados autorreferidos tem sido amplamente utilizado em estudos epidemiológicos como um método aceitável e válido2525 Short VL Gamble A Mendy V. Racial Differences in Ideal Cardiovascular Health Metrics Among Mississippi Adults 2009 Mississippi Behavioral Risk Factor Surveillance System. Prev Chronic Dis. 2013;21;10:E194. doi: 10.5888/pcd10.130201.
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. A dislipidemia não foi incluída neste estudo por não ser avaliada no questionário do Vigitel entre 2010 e 2012. Estudo prévio também apresentou essa limitação, o que não impediu a avaliação conjunta das métricas1313 Maclagan LC Park J Sanmartin C Mathur KR Roth D Manuel DG et al. The CANHEART health index: a tool for monitoring the cardiovascular health of the Canadian population. CMAJ. 2014;186(3):180-7. doi: 10.1503/cmaj.131358.
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. Outra limitação refere-se à adaptação do fator comportamental dieta que, neste trabalho, foi obtido a partir de um questionário de consumo alimentar mais simplificado do que o proposto pela AHA33 Lloyd-Jones DM Hong Y Labarthe D Mozaffarian D Appel LJ Van Horn L et al. Defining and setting national goals for cardiovascular health promotion and disease reduction: The American Heart Association's Strategic Impact Goal through 2020 and beyond. Circulation. 2010;2(121):586-613. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.109.192703.
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. Cabe ainda ressaltar, que os indivíduos que informaram ser ex-fumantes foram incluídos na categoria fumante. Por fim, ressalta-se que a atividade física também foi avaliada por questão mais simplificada do que a proposto pela AHA, o que pode levar a superestimação.

Apesar das potenciais limitações, existem poucos estudos populacionais com representatividade urbana que estimaram a prevalência dos fatores de saúde cardiovascular ideal em países de renda média e baixa.

Conclui-se que uma baixa proporção dos adultos das capitais brasileiras apresentou fatores de saúde cardiovascular em nível ideal, com diferenças entre os sexos, idade e nível de escolaridade. Apesar das mulheres, dos mais jovens, dos mais escolarizados e dos residentes da região Centro-Oeste terem apresentado melhor saúde cardiovascular, a prevalência ainda foi considerada muito baixa. De forma geral, os resultados encontrados indicam impacto negativo sobre os DALYs e a carga global de doenças, reduzindo a longevidade e aumentando as incapacidades ao longo da vida.

Os achados deste estudo podem contribuir para a melhor compreensão do cenário da saúde cardiovascular na população urbana brasileira e orientar a implementação de diferentes abordagens de prevenção e, principalmente, promoção da saúde, tanto individuais quanto coletivas, além da criação de políticas públicas de intervenção eficazes e da ampliação de programas orientados para a qualidade de vida nas cidades, a fim de que os indivíduos alcancem níveis ideais dos fatores de saúde cardiovascular.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2017

Histórico

  • Recebido
    01 Dez 2015
  • Aceito
    23 Set 2016
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