Ação da auriculoacupuntura em pessoas com dor crônica na coluna vertebral: ensaio clínico randomizado¹

RESUMO

Objetivos:

avaliar a ação da auriculoacupuntura na incapacidade e na temperatura tissular de pessoas com dor crônica na coluna vertebral.

Método:

ensaio clínico com amostra de 110 pessoas, randomizadas em três grupos: Tratado, Placebo e Controle. Os instrumentos de avaliação foram o Questionário de Incapacidade de Rolland Morris e uma câmera termográfica, aplicados antes da primeira sessão de tratamento, uma semana após e 15 dias após (follow up) à quinta sessão de auriculoacupuntura. Na análise dos dados, aplicaram-se os testes Kruskal-Wallis, Student-Newman-Keuls e Wilcoxon.

Resultados:

houve redução significativa da incapacidade nos grupos Tratado e Placebo entre as avaliações inicial e final (p<0,05) e entre as avaliações inicial e follow up (p<0,05). Na avaliação final, o grupo Tratado apresentou melhora da incapacidade se comparado ao Placebo e ao Controle (p<0,05). Houve aumento na temperatura média tissular da região dorsal entre as avaliações inicial e follow up no Tratado e Controle (p<0,05). Entre as avaliações final e follow up no Tratado e Placebo (p<0,05).

Conclusão:

a auriculoacupuntura foi eficaz para reduzir a incapacidade e aumentar a temperatura tissular em pessoas com dor crônica na coluna vertebral. Registro Brasileiro de Ensaios Clínicos (RBR-5X69X2).

Descritores:
Dor Crônica; Dor nas Costas; Acupuntura Auricular; Reabilitação; Terapias Complementares; Enfermagem

ABSTRACT

Objectives:

to assess the action of ear acupuncture on disability and tissue temperature in people with chronic pain in the spinal column.

Method:

a clinical trial with a sample of 110 people, randomized into three groups: Treatment, Placebo and Control. The assessment instruments were the Rolland Morris Disability Questionnaire (RMDQ) and a thermographic camera, administered before the first treatment session, one week after and 15 days after (follow-up) the fifth session of ear acupuncture. In the analysis of the data, the Kruskal Wallis, Student-Newman Keuls and Wilcoxon tests were applied.

Results:

there was a significant reduction in disability in the Treatment and Placebo groups between the initial and final assessments (p<0.05) and between the initial assessments and follow-up (p<0.05). In the final assessment, the Treatment group presented improvement of disability when compared with the Placebo and Control groups (p<0.05). There was an increase in mean tissue temperature of the dorsal region between the initial and follow-up assessments in Treatment and Control groups (p<0.05), and between the final assessments and follow-up in the Treatment and Placebo groups (p<0.05).

Conclusion:

ear acupuncture was efficacious in reducing disability and increasing tissue temperature in people with chronic pain in the spinal column. Brazilian Register of Clinical Trials (RBR-5X69X2).

Descriptors:
Chronic Pain; Back Pain; Acupuncture, Ear; Rehabilitation; Complementary Therapies; Nursing

RESUMEN

Objetivos:

evaluar la acción de la auriculoacupuntura en la incapacidad y en la temperatura del tejido de personas con dolor crónico en la columna vertebral.

Método:

ensayo clínico con muestra de 110 personas, asignadas aleatoriamente en tres grupos: Tratado, Placebo y Control. Los instrumentos de evaluación fueron el Cuestionario de Incapacidad de Rollad Morris y una cámara termográfica, aplicados antes de la primera sesión de tratamiento, una semana después y quince días después (follow up) de la quinta sesión de auriculoacupuntura. En el análisis de los datos se aplicaron las pruebas Kruskal-Wallis, Student-Newman Keuls y Wilcoxon.

Resultados:

hubo reducción significativa de la incapacidad en los grupos Tratado y Placebo, entre las evaluaciones inicial y final (p<0,05) y entre las evaluaciones inicial y follow up (p<0,05). En la evaluación final, el grupo Tratado presentó mejoría de la incapacidad si comparado al Placebo y al Control (p<0,05). Hubo aumento en la temperatura media del tejido de la región dorsal entre las evaluaciones inicial y follow up en el Tratado y Control (p<0,05), y entre las evaluaciones final y follow up en el Tratado y Placebo (p<0,05).

Conclusión:

la auriculoacupuntura fue eficaz en reducir la incapacidad y en aumentar la temperatura del tejido en personas con dolor crónico en la columna vertebral. Registro Brasileño de Ensayos Clínicos (RBR-5X69X2).

Descriptores:
Dolor Crónico; Dolor de Espalda; Acupuntura Auricular; Rehabilitación; Terapias Complementarias; Enfermería

Introdução

A dor é caracterizada como resposta do organismo a uma agressão ou a qualquer transtorno patológico. Quando se torna crônica, é considerada uma patologia em si e possui prevalência elevada em todo o mundo, principalmente quando acomete a região lombar¹.

A gravidade e a cronicidade da dor nas costas estão associadas a graves limitações funcionais². Em pessoas com distúrbios do sistema musculoesquelético, especialmente nos membros inferiores e na região lombar, a mobilidade física prejudicada é uma das consequências mais frequentes³, o que gera sério comprometimento na rotina cotidiana das pessoas, resultando em elevado grau de dependência^3-4.

Avaliar a dor crônica e suas consequências, assim como seu tratamento, é um grande desafio; uma vez que se trata de fenômeno subjetivo, torna-se importante investir em estudos nos quais se possa não só investigar a intensidade da dor, como também sua implicação na vida das pessoas.

O Questionário de Incapacidade de Rolland Morris (QIRM)⁵ é um dos instrumentos mais utilizados para avaliar a incapacidade de realizar atividades de vida diária em pessoas com dor crônica em geral⁶. Esse questionário permite avaliação adequada dos tratamentos e da evolução dos pacientes com dor crônica, por quantificar as limitações induzidas por ela, em ambas as funções, física e mental⁵.

Além da abordagem comportamental, comumente utilizada nas investigações sobre a dor crônica, é necessário identificar aspectos fisiológicos envolvidos no processo de reconhecimento das condições neuromusculares dolorosas. Nesse sentido, a alteração na temperatura tissular é importante aspecto a ser avaliado, considerando que a mesma reflete a energia cinética das moléculas individuais, conforme recrutamento simultâneo de mecanismos de retenção ou perda de calor⁷.

A pele representa um sistema eficiente de controle de calor. A condução de calor para esse órgão é controlada pelo grau de vasoconstrição das arteríolas que suprem os plexos venosos cutâneos com sangue. Essa vasoconstrição está sob controle da eferência simpática do sistema nervoso autônomo e ocorre em resposta a mudanças nas temperaturas centrais do corpo e do ambiente⁸. Assim, variações na temperatura cutânea podem refletir mudanças internas, particularmente na atividade do músculo esquelético.

Portanto, outra abordagem indicada para avaliar as condições dolorosas, que amplia os recursos de mensuração das mesmas, é a termografia infravermelha, que consiste em um exame de imagem comprovadamente seguro, não invasivo, indolor e que não requer contato com nenhuma região do corpo⁹.

O tratamento da dor crônica é complexo e longo, gera dependência dos serviços de saúde e custos financeiros elevados, além de mudanças nos diversos aspectos sociais, físicos e emocionais vivenciados durante o mesmo. Desse modo, é consensual a necessidade de se investir em terapêuticas integrativas e complementares que possibilitem a desmedicalização e sejam de baixo custo¹⁰. Contudo, essas terapias descritas e recomendadas para uso na prática clínica, devem ser testadas por meio de estudos clínicos controlados.

Dentre os recursos terapêuticos atualmente descritos como integrativos, complementares e holísticos, utilizados para o tratamento e controle da dor crônica, a Auriculoacupuntura (AA) tem se destacado. Baseada nos preceitos da Medicina Tradicional Chinesa (MTC), essa terapia utiliza a estimulação de pontos auriculares, a fim de harmonizar a função dos órgãos e das vísceras do corpo humano¹¹. A AA possui, então, aspectos preventivos e curativos, além de promover o alívio de sinais e sintomas de diferentes doenças.

Contudo, as evidências científicas centradas nos efeitos da AA sobre a dor crônica na coluna vertebral ainda são limitadas devido ao pequeno número de estudos envolvendo a temática, bem como às falhas metodológicas apontadas nos mesmos¹².

O objetivo neste estudo consistiu, portanto, em avaliar a ação da AA sobre a incapacidade e a temperatura tissular em pessoas com dor crônica na coluna vertebral.

Método

Trata-se de ensaio clínico randomizado controlado¹³, do tipo paralelo e mascarado, realizado entre junho de 2015 e março de 2016, em uma universidade de Minas Gerais, Brasil. A população foi constituída de 535 pessoas que aguardavam a realização de tratamento na clínica de fisioterapia da instituição.

O rastreamento da amostra de voluntários com queixa álgica da coluna vertebral foi realizado via telefone. Sendo assim, da população inicial, 149 pessoas foram suprimidas, por apresentarem outros tipos de dor.

Para seleção da amostra, foram estabelecidos como critérios de inclusão: (1) faixa etária entre 18 e 80 anos; (2) presença de dor crônica na coluna vertebral há três meses ou mais¹⁴, de qualquer origem; (3) autorrelato de intensidade da dor ≥4, em uma escala numérica de dor de 11 pontos¹⁵ e (4) disponibilidade de horário para as sessões de AA. E como critérios de exclusão: (1) indivíduos que possuíam infecção, inflamação ou ferimento no pavilhão auricular; (2) alergia ao metal ou à fita microporosa; (3) realização de terapêutica energética prévia até três meses anteriores à realização da intervenção; (4) estar em tratamento fisioterapêutico; (5) uso contínuo de medicação para alívio da dor; (6) recusa em receber o tratamento auricular por meio de agulhas e (7) gestantes.

Foi realizado cálculo amostral a partir de um pré-teste com 15 pessoas (5 por grupo), por meio dos softwares GPower, versão 3.1, e BioEstat, versão 5.0. Adotou-se um poder de teste de 90%, um tamanho de efeito médio (0,5) e nível de significância de 5%, resultando na necessidade de 30 indivíduos por grupo. A fim de evitar perdas amostrais, o cálculo foi corrigido em 20%¹⁶. A população elegível obtida foi de 110 indivíduos, sendo que 83 concluíram o estudo (Figura 1), com perda de 27 (24,54%) indivíduos.

Figura 1
Fluxograma dos participantes envolvidos no estudo. Alfenas, MG, Brasil, 2016

Os voluntários foram randomizados em três braços de estudos: grupo Tratado (n=37), grupo Placebo (n=36) e grupo Controle (n=37). A randomização foi feita em quatro blocos, com aproximadamente 27 pessoas por bloco, por um pesquisador externo ao estudo, usando o software R (versão 3.1.1). Cada número da sequência aleatória gerado foi colocado em um envelope opaco e entregue ao intervencionista na primeira sessão de intervenção.

As avaliações foram realizadas em três momentos pelos mesmos investigadores treinados: antes da primeira sessão de AA, uma semana após a quinta sessão, e em um período de seguimento (follow up) de 15 dias.

O perfil sociodemográfico e clínico foi determinado pelas seguintes variáveis: idade, sexo, tempo e causa da dor. O QIRM foi utilizado para avaliar a interferência da dor nas atividades de vida diária¹⁷.

O QIRM possui 24 itens com pontuação total que varia de zero (nenhuma incapacidade) a 24 (incapacidade grave) e mensura itens relacionados ao impacto da dor nas funções fisiológicas (como deambulação e movimento, sono e repouso, apetite), psicológicas (irritação e mau humor) e sociais (interação com outras pessoas, atividades domésticas e laborais)⁵. Esse instrumento foi traduzido, adaptado e validado para a versão brasileira¹⁷ e possui adequadas propriedades psicométricas⁶.

Para a avaliação da temperatura tissular das regiões cervical, torácica e lombar, foram captadas imagens por uma câmera termográfica (E-60 bx, ESTÔNIA) com resolução 320x240 (76.800 pixels), na faixa espectral do infravermelho longo (7-13 μm) para estudo dinâmico (60 Hz), e de lentes com resolução de 25ºx19º. Esse instrumento foi posicionado horizontalmente à distância de 3 metros do paciente e verticalmente a 1 metro do chão. Para essa avaliação, a sala foi previamente climatizada a 20°C por 20 minutos¹⁸.

Para a realização da foto termográfica¹⁸, os voluntários permaneceram 15 minutos em repouso e, para captura da imagem, foram mantidos em posição ortostática, com a região das costas desnuda e os braços cruzados ao longo do tórax. Foram fixados marcadores de isopor com fita dupla face nos seguintes pontos, previamente padronizados, para auxiliar na avaliação das imagens¹⁹: região cervical (processo mastoide, bilateralmente; ao nível de C7, bilateralmente); região torácica (acrômio, bilateralmente; extremidade livre da 12ª costela, bilateralmente); região lombar (extremidade livre da 12ª costela, bilateralmente; espinha ilíaca, bilateralmente). As imagens termográficas foram analisadas pelo software FLIR Tools, versão 5.2.15161.1001.

Para definir o melhor esquema terapêutico de tratamento, foi criado protocolo de intervenção de AA baseado nas recomendações do Standards for Reporting Interventions in Clinical Trials of Acupuncture²⁰, por meio do qual foram definidos o tempo de tratamento, o número de sessões, os dispositivos e os pontos de aplicação. O mesmo foi submetido a um processo de avaliação por cinco acupunturistas com mais de dez anos de experiência na área e, em seguida, foi testado em um pré-teste.

O tratamento de AA, nos grupos Tratado e Placebo, foi realizado por meio de agulhas auriculares semipermanentes, esterilizadas e descartáveis, tamanho 0,20x1,5 milímetros, marca Complementar Agulhas®. Foi realizada previamente a antissepsia do pavilhão auricular com algodão e álcool etílico 70%. Em seguida, a localização dos pontos auriculares foi confirmada com o dispositivo localizador Acu-Treat (DongBang®); e as agulhas foram inseridas e fixadas com micropore antialérgico bege.

Os pontos auriculares, para o grupo Tratado, foram distribuídos de acordo com o equilíbrio energético e segundo os padrões da MTC, e aplicados na seguinte ordem: Shenmen (TF4); Rim (CO10); Nervo Simpático (AH6a); pontos de reestabelecimento do equilíbrio energético, correspondente a um órgão e uma víscera; Vértebras Cervicais (HA13), Vértebras Torácicas (AH11) e/ou Vértebras Lombares (AH9), a depender do local da dor²¹.

No grupo Placebo foi aplicado um único ponto, denominado “Olho” (LO5). Esse ponto, situado no centro do lobo auricular²¹, encontra-se distante dos pontos aplicados no grupo Tratado, e não possui relação com o foco de observação.

Ambos os grupos receberam cinco sessões de AA, uma vez por semana, durante um mês e meio, com alternância do pavilhão auricular a cada sessão. Esse tempo foi definido com base na experiência dos acupunturistas que avaliaram o esquema de tratamento proposto, bem como nos resultados obtidos no pré-teste. Todo o procedimento foi realizado por um profissional especialista em acupuntura, com experiência na área há mais de três anos²⁰.

Os indivíduos que foram alocados para o grupo Controle, durante o período de avaliação, não receberam nenhuma orientação e não foram submetidos a nenhuma intervenção.

O mascaramento foi aplicado aos investigadores do estudo e ao analista dos resultados²², que desconheciam em que grupo cada voluntário tinha sido alocado.

Os dados coletados foram tabulados no Microsoft Office Excel®, versão 2013, por dois pesquisadores independentes, e sua consistência, testada. Para a análise estatística, foram utilizados os softwares Statistical Package for the Social Sciences, versão 23.0, e BioEstat, versão 5.0.

Os dados foram analisados por Intenção de Tratar (ITT), por meio da repetição dos valores da última avaliação. Para as variáveis sociodemográficas e clínicas, foram utilizados os testes de qui-quadrado e Kruskal-Wallis. Para a avaliação interclasse, foram utilizados o teste de Kruskal-Wallis, seguido do teste Student-Newman-Keuls, quando necessário. Já para a avaliação intraclasse, foi utilizado o teste de Wilcoxon emparelhado. O nível de significância adotado foi de 5%.

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CAAE n.º 43818115.6.0000.5142/Parecer n.º 1.041.266). Antes de iniciar o estudo, foi assegurado aos participantes o direito de receber o tratamento ao final do período de seguimento, a fim de cumprir os preceitos éticos e melhorar a adesão. Assim, ao final do estudo, os voluntários dos grupos Placebo e Controle receberam as mesmas sessões de AA às quais o grupo Tratado foi submetido.

Resultados

Participaram do estudo 110 indivíduos com dor crônica na coluna vertebral. A comparação entre os grupos, de acordo com as variáveis sociodemográficas e clínicas, apontou homogeneidade entre eles e, consequentemente, adequação do processo de randomização, conforme demonstrado na Tabela 1.

Tabela 1
Caracterização da amostra quanto à idade, sexo, tempo e causas da dor (N=110). Alfenas, MG, Brasil, 2016

Variáveis		Grupos			Valor p
		Tratado (n=37)	Placebo (n=36)	Controle (n=37)
Idade (x*±dp†)	(anos)	47,5±13,9	51,0±14,9	46,2±15,7	0,272‡
Sexo (%§)	Masculino	18,9	25,0	18,9	0,763||
	Feminino	81,1	75,0	81,1
Tempo de dor (x*±dp†)	(meses)	47,5±13,9	51,0±14,9	46,2±15,7	0,850‡
Causas da dor (%§)	Alterações posturais	16,2	44,4	16,2	0,057||
	Osteoartrite	35,1	41,6	16,2

• *Média; †Desvio-padrão; ‡teste Kruskal-Wallis; §porcentagem; ||teste qui-quadrado.

Ao avaliar o impacto da intervenção auricular sobre a incapacidade decorrente da dor, por meio do QIRM, verificou-se que reduções estatisticamente significativas foram obtidas para os grupos Tratado e Placebo entre as avaliações inicial e final, e inicial e follow up. E, na análise interclasse, na avaliação final, o grupo Tratado passou a diferenciar-se dos demais, com menor incapacidade, conforme demonstrado na Tabela 2.

Tabela 2
Análises intraclasse e interclasse da incapacidade, expressa em mediana (média±desvio-padrão) e intervalo de confiança de 95%, nos três grupos e em três momentos (N=110). Alfenas, MG, Brasil, 2016

Grupos	Avaliações
	Inicial	Final	Follow up
Tratado (n=37)	12,0*† (11,8±5,8) 9,8-13,7	4,0*‡ (6,6±6,3) 4,4-8,8	6,0† (7,5±6,7) 5,3-9,7
Placebo (n=36)	12,5*† (12,8±7,0) 10,4-15,2	8,0* (9,9±7,2) 7,5-12,4	9,5† (10,1±7,7) 7,4-12,7
Controle (n=37)	11,0 (10,2±5,5) 8,4-12,1	11,0 (11,1±6,2) 9,0-13,1	11,0 (10,2±6,9) 8,6-13,2

• *p<0,05 entre avaliações inicial e final (Wilcoxon); †p<0,05 entre avaliações inicial e follow up (Wilcoxon); ‡p<0,05 análise interclasse (Kruskal-Wallis, seguido de Student-Newman-Keuls).

Houve aumento estatisticamente significativo na temperatura tissular média da região dorsal, obtida por meio da termografia infravermelha, na análise intraclasse (inicial e follow up/final e follow up), conforme demonstrado na Tabela 3. Na análise interclasse, os grupos não se diferenciaram entre si.

Tabela 3
Análises intraclasse e interclasse da temperatura tissular média da região dorsal, expressa em mediana (média±desvio-padrão) e intervalo de confiança de 95%, nos três grupos e em três momentos (N=110). Alfenas, MG, Brasil, 2016

Grupos	Avaliações
	Inicial	Final	Follow up
Tratado (n=37)	30,4* (30,5±0,7) 30,2-30,7	30,2† (30,1±1,3) 29,6-30,5	30,9*† (30,8±0,3) 30,5-31,1
Placebo (n=36)	30,4 (30,4±0,9) 30,1-30,7	30,2† (30,1±1,2) 29,7-30,5	30,8† (30,6±0,8) 30,3-30,9
Controle (n=37)	30,3* (30,1±1,0) 29,8-30,5	30,3 (30,2±1,3) 29,7-30,6	30,7* (30,5±1,3) 30,1-30,9

• *p<0,05 entre avaliações inicial e follow up (Wilcoxon); †p<0,05 entre avaliações final e follow up (Wilcoxon).

Discussão

A dor crônica na coluna vertebral é incapacitante, principalmente na região lombar²³. Em vários estudos^19,24 tem sido demonstrado que o nível de incapacidade varia proporcionalmente à intensidade e ao limiar de dor, geram limitações nas atividades diárias (como dificuldades de vestir-se, sentar, levantar, andar e levantar objetos), mudanças no sono, preocupações constantes, além de absenteísmo no trabalho²⁵. Logo, é necessário identificar intervenções que possam reduzir a incapacidade de pessoas com dor crônica na coluna vertebral. Nesse contexto, o presente estudo corrobora a auriculoacupuntura como método eficiente em minimizar tal incapacidade.

A melhora clínica na incapacidade provocada pelos processos dolorosos é obtida se a pontuação do QIRM reduz em 30% a linha de base, enquanto a dor na coluna vertebral é classificada como melhor em uma escala de avaliação global²⁶. Os voluntários deste estudo, que receberam o protocolo de AA para dor crônica na coluna vertebral, tiveram redução de 66,66% do nível de incapacidade na avaliação final, quando comparada com a inicial. Efeito esse que perdurou durante 15 dias, momento de avaliação follow up, em que a redução de 50% nos níveis de incapacidade foi observada.

Igualmente, outros pesquisadores^27-28 têm constatado melhora da capacidade funcional lombar com tratamento realizado com AA. Para a MTC, a dor lombar é manifestação sindrômica relacionada às alterações energéticas de órgãos como os rins. Assim, a estimulação desse e de outros pontos auriculares com indicação tranquilizante e analgésica, como ora realizado, reflete em todo organismo, ajudando a restabelecer o equilíbrio energético do corpo como um todo²⁹.

No grupo Placebo, a redução da incapacidade foi inferior àquela dos voluntários que receberam o tratamento, demonstrando que AA verdadeira é significativamente mais eficaz que o tratamento simulado, o que corrobora os resultados de estudos^27-28 em que também se demonstrou que a pontuação de incapacidade no QIRM diminuiu mais no grupo que recebeu a intervenção verdadeira, se comparada à do grupo placebo.

Os efeitos no grupo Placebo não podem, contudo, ser desconsiderados. Esses efeitos podem ser explicados devido aos possíveis efeitos psicológicos que podem aparecer por conta das expectativas dos voluntários em relação à terapia, o que é denominado “efeito placebo”³⁰. De fato, estudos apontam que a dor influencia muitas dimensões, de aspectos físicos a fatores psicológicos^31-32.

O protocolo utilizado neste estudo promoveu o alívio da dor crônica na coluna vertebral e, consequentemente, perfil microcirculatório melhorado na área afetada, o que pode ser altamente desejável para o restabelecimento das condições dolorosas crônicas. Alguns autores³³, que já analisaram os padrões de temperatura da pele nos distúrbios musculoesqueléticos, também encontraram aumento de temperatura no local acometido pela dor, durante o tratamento de desordem temporomandibular.

As mudanças de temperatura em regiões específicas do corpo podem indicar alterações fisiológicas³⁴⁾ e ser utilizadas como parâmetro na avaliação das condições dolorosas. Portanto, a termografia infravermelha é um método adequado para estudos nos quais o objetivo é investigar tais fenômenos, por fornecer imagens da distribuição da temperatura da pele do corpo, que é condicionada pelas atividades da microcirculação³⁵.

Em casos de lesões crônicas, como, por exemplo, nas disfunções miofasciais, áreas hiporradiantes podem ser detectadas em imagens infravermelhas. Isso acontece porque tais condições podem gerar maior atividade muscular em repouso, o que resulta em aumento da pressão intramuscular e, consequentemente, maior compressão mecânica dos vasos sanguíneos dos músculos da região afetada; ao longo do tempo, o menor suprimento de sangue leva à redução na temperatura da pele^36-37.

Contudo, especificamente para a dor crônica na coluna vertebral, nenhuma evidência disponível foi encontrada na literatura relatando possíveis efeitos clínicos de AA na temperatura da pele, tornando os presentes resultados pioneiros na investigação desse fenômeno.

A AA constitui, portanto, recurso terapêutico de fácil aplicação, baixo custo e com relativa ausência de efeitos coletarais, que auxilia no restabelecimento da saúde como um todo²⁹. Além disso, é passível de ser aplicada, em caráter multiprofissional, em todos os níveis de atenção à saúde. Nesse cenário, ao evidencir a alta prevalência de pessoas com dorsalgia crônica¹⁾ e os impactos negativos que ela causa sobre suas vidas^2-4, a AA se torna mais uma ferramenta de intervenção que pode ser facilmente implementada na prática clínica do enfermeiro, de forma a auxiliar a reabilitação dessas pessoas e, dessa forma, melhorar a qualidade de suas vidas.

Como possíveis limitações deste estudo, pode-se considerar a desistência de alguns voluntários nos grupos Tratado e Placebo devido ao desconforto causado pela inserção e permanência das agulhas semipermanentes no pavilhão auricular. Acredita-se, ainda, que o fato de os voluntários do grupo Controle terem ficado por período considerável de tempo recebendo somente as avaliações pode ter causado maior perda nesse grupo, apesar de ter sido assegurado a eles o direito de receber a intervenção ao final do período de seguimento. Além disso, a intervenção realizada de forma individualizada, fortemente recomendada pela MTC, dificulta a utilização dos mesmos pontos auriculares, embora tenham sido alcançados resultados satisfatórios e estatisticamente significativos dessa forma.

Ademais, sugerem-se novos estudos, em diferentes contextos, para melhor comprovação desses resultados, além de investigar a ação da AA sobre outras variáveis comportamentais e fisiológicas da dor crônica relacionada ao sistema musculoesquelético.

Conclusão

Houve diferença estatisticamente significativa entre os grupos e ao longo do tempo em relação à incapacidade física e, em relação à temperatura tissular, essa diferença se deu no tempo de seguimento. Tais achados demonstram que a AA é intervenção passível de ser implementada na prática clínica do enfermeiro, a fim de auxiliar o tratamento e, consequentemente, a reabilitação de pessoas com dor crônica na coluna vertebral. Espera-se que os resultados deste estudo estimulem o uso desse recurso terapêutico pelos enfermeiros em suas atividades assistenciais.

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  2018

Histórico

• Recebido
  07 Mar 2018
• Aceito
  11 Jul 2018