Open-access Itinerário terapêutico de gestantes durante a COVID-19: um olhar a partir dos sistemas de cuidado*

Objetivo: compreender o itinerário terapêutico de mulheres que vivenciaram o período gravídico durante a pandemia da COVID-19.

Método: estudo descritivo e exploratório com abordagem qualitativa, desenvolvido com 16 mulheres que gestaram durante a COVID-19. Utilizou-se como referencial teórico o Modelo de Sistemas de Cuidado à Saúde, proposto por Arthur Kleinman. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas, as quais foram audiogravadas, transcritas na íntegra e submetidas à análise de conteúdo proposta por Bardin e ao software IRaMuTeQ.

Resultados: participaram do estudo mulheres com idades que variaram de 20 a 47 anos. A maioria das participantes era da raça/cor branca e casada. A partir da análise de conteúdo, emergiram três categorias: 1 - Principais redes de apoio durante a gestação ― subsistema familiar; 2 - O acompanhamento durante a gestação ― subsistema profissional; e 3 - A espiritualidade como suporte terapêutico ― subsistema cultural.

Conclusão: notou-se que os caminhos percorridos por gestantes em busca do cuidado em saúde, durante a pandemia da COVID-19, tornaram-se ainda mais difíceis, estando permeados por dúvidas e incertezas trazidas pela doença, bem como pelas novas configurações de rotinas e atendimentos adotados pelos serviços de saúde.

Descritores:
COVID-19; Cuidado Pré-Natal; Gestação; Itinerário Terapêutico; Modelos de Assistência à Saúde; Saúde da Mulher


Destaques:

(1) O itinerário terapêutico foi influenciado diante das mudanças impostas aos serviços. (2) O medo da contaminação impôs dificuldades na busca pelos cuidados em saúde. (3) O sistema de cuidados à saúde possibilitou entender as principais redes de apoio. (4) A espiritualidade foi suporte diante das dificuldades impostas pela pandemia.

Objective: to understand the therapeutic itinerary of women who experienced the gestational period during the COVID-19 pandemic.

Method: a descriptive and exploratory study with a qualitative approach, conducted with 16 women who were pregnant during COVID-19. The theoretical framework used was the Health Care Systems Model proposed by Arthur Kleinman. Semi-structured interviews were conducted, which were audio recorded, fully transcribed, and submitted to content analysis as proposed by Bardin and to the IRaMuTeQ software.

Results: the study included women whose ages ranged from 20 to 47 years. Most participants were White and married. Content analysis yielded three categories: 1- Main support networks during pregnancy ― family subsystem; 2- Follow-up during pregnancy ― professional subsystem; and 3- Spirituality as therapeutic support ― cultural subsystem.

Conclusion: it was observed that the paths taken by pregnant women seeking healthcare during the COVID-19 pandemic became even more challenging, being permeated by doubts and uncertainties brought about by the disease, as well as by new configurations of routines and services adopted by healthcare providers.

Descriptors:
COVID-19; Prenatal Care; Pregnancy; Therapeutic Itinerary; Healthcare Models; Women’s Health


Highlights:

(1) The therapeutic itinerary was influenced by the changes imposed on services. (2) Fear of contamination created difficulties in seeking healthcare. (3) The healthcare system made it possible to understand the main support networks. (4) Spirituality served as support in the face of the difficulties imposed by the pandemic.

Objetivo: comprender el itinerario terapéutico de las mujeres que transitaron el embarazo durante la pandemia de COVID-19.

Método: estudio descriptivo y exploratorio con enfoque cualitativo, desarrollado con 16 mujeres que transitaron su embarazo durante la COVID-19. Se utilizó como marco teórico el Modelo de Sistemas de Atención de Salud, propuesto por Arthur Kleinman. Se realizaron entrevistas semiestructuradas, grabadas en audio, transcriptas en su totalidad y sometidas al análisis de contenido propuesto por Bardin y al software IRaMuTeQ.

Resultados: participaron en el estudio mujeres cuyas edades oscilaron entre 20 y 47 años. La mayoría de los participantes eran blancas y casadas. Del análisis de contenido surgieron tres categorías: 1- Principales redes de apoyo durante el embarazo ― subsistema familiar; 2- Seguimiento durante el embarazo ― subsistema profesional; y 3- La espiritualidad como soporte terapéutico ― subsistema cultural.

Conclusión: se observó que los caminos recorridos por las embarazadas en búsqueda de atención sanitaria durante la pandemia de COVID-19 se volvieron aún más difíciles, atravesados por dudas e incertidumbres generadas por la enfermedad, así como por las nuevas configuraciones de rutinas y cuidados que adoptaron los servicios de salud.

Descriptores:
COVID-19; Atención Prenatal; Embarazo; Ruta Terapéutica; Modelos de Atención de Salud; Salud de la Mujer


Destacados:

(1) El itinerario terapéutico se vio influenciado por los cambios impuestos a los servicios de salud. (2) El miedo al contagio dificultó la búsqueda de atención sanitaria. (3) El sistema sanitario permitió conocer las principales redes de apoyo. (4) La espiritualidad sirvió de soporte ante las dificultades que impuso la pandemia.

Introdução

Em 11 de março de 2020, foi decretada pela Organização Mundial da Saúde uma nova pandemia, causada pelo novo coronavírus, denominado Severe Acute Respiratory Syndrome Coronavírus 2 (SARS-CoV-2), responsável por causar a doença COVID-19(1). Devido à gravidade e à rápida disseminação da doença, foram definidos grupos de risco, sendo um deles o grupo das gestantes(2). Embora a maioria das gestantes diagnosticadas com COVID-19 tenha apresentado quadros clínicos leves a moderados, nota-se aumento do risco de complicações maternas diante da presença de comorbidades associadas, como distúrbios hipertensivos e obesidade(3).

O risco de mortalidade materna é 22 vezes maior em gestantes infectadas pela COVID-19, em regiões com menor acesso a serviços de saúde e quando os serviços integrais de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) não estão disponíveis(4).

A mortalidade materna em gestantes com COVID-19 pode estar relacionada a fatores socioeconômicos, dificuldades no acesso aos serviços de saúde e falhas na organização do sistema, agravadas pela superlotação hospitalar. Por outro lado, locais com assistência obstétrica bem estruturada e disponibilidade adequada de recursos para UTI materna apresentam índices mais baixos de mortalidade(4).

A gestação provoca diversas alterações fisiológicas no corpo da mulher, incluindo modificações na postura, metabolismo e nos sistemas cardiovascular, sanguíneo e urinário. Também ocorrem mudanças no débito cardíaco, na concentração e elevação de certas substâncias, além de adaptações nos sistemas respiratório, digestório e endócrino. Nos órgãos genitais, transformações são observadas na vulva, vagina e útero. Além disso, há implicações clínicas associadas às alterações cardiovasculares, sanguíneas, urinárias, respiratórias, digestivas e endócrinas(5).

Com a chegada da COVID-19, os serviços de saúde necessitaram reorganizar o processo de trabalho, articulando estratégias de controle, prevenção da doença e fortalecimento de toda a rede de saúde, a fim de proporcionar ao usuário segurança e o apoio necessário(6).

O Ministério da Saúde (MS) recomenda a realização de no mínimo seis consultas ao longo do pré-natal. No entanto, a partir das novas medidas sanitárias para controle do vírus, visando preservar a gestante da exposição e risco de contaminação na unidade de saúde, as consultas presenciais passaram a ter um espaçamento maior que o preconizado anteriormente(7).

Visando diminuir a circulação dos usuários nos ambientes e dar continuidade ao cuidado rotineiro nas unidades de saúde, os atendimentos de teleconsulta associados aos presenciais foram uma estratégia utilizada no acompanhamento das gestantes no pré-natal. As gestantes que apresentavam sintomas da COVID-19 também eram monitoradas. Esta medida foi avaliada constantemente pela equipe, considerando os protocolos de recomendações das entidades de saúde(8).

Mesmo em situações complexas, como em uma pandemia, torna-se importante proporcionar acesso à informação de qualidade durante o período gestacional, para a plena vivência desse processo e autonomia diante das escolhas que envolvem o ciclo gravídico-puerperal. Além disso, neste contexto, é indispensável oferecer uma assistência individualizada e que valorize, também, seus aspectos psicossociais. E, para melhor compreensão da experiência dessas futuras mães, torna-se necessário saber os caminhos percorridos por elas na busca de cuidados para resolução dos seus problemas de saúde durante a COVID-19(9), sendo este processo definido como Itinerário Terapêutico (IT).

O conceito de IT ganhou importância quando o psiquiatra e antropólogo Arthur Kleinman deu ênfase à influência cultural nas escolhas do doente relativas ao percurso de cuidado, sendo este denominado modelo teórico dos Sistemas de Cuidados à Saúde. Este modelo refere-se aos locais onde os indivíduos buscam soluções para seus problemas de saúde, classificados em três subsistemas: familiar, profissional e cultural(10-11).

Nesse contexto, os Itinerários Terapêuticos (ITs) representam uma estratégia de pesquisa que permite compreender os percursos, dinâmicas e relações estabelecidas pelas pessoas em sua busca por cuidados em saúde. Os ITs configuram-se como um conjunto de interações e práticas construídas pelos grupos sociais para ampliar as possibilidades de acesso e assistência à saúde(11).

A velocidade com que a pandemia da COVID-19 se disseminou pelo mundo foi devastadora, atingindo diversos públicos e faixas etárias, tornando-se grave especialmente para a população mais vulnerável, como as gestantes. As dificuldades de acesso aos serviços e o isolamento de seus núcleos de apoio trazem às gestantes dificuldades de saúde físicas e mentais que podem afetar a ela e ao feto. Expõem as necessidades e fragilidades, como também exacerbam desigualdades sociais, sanitárias e econômicas, tornando-se necessário compreender as demandas nos âmbitos pessoais, culturais e de saúde, para que se possa promover uma assistência de saúde integral e que ocorra de forma efetiva. Em face disso, emergiu a seguinte questão: Qual o itinerário terapêutico percorrido por gestantes durante a pandemia da COVID-19?

Neste contexto, o objetivo foi compreender o itinerário terapêutico de mulheres que vivenciaram o período gravídico durante a pandemia da COVID-19.

Método

Delineamento do estudo

Estudo descritivo e exploratório com abordagem qualitativa, utilizando o referencial teórico do Modelo de Sistemas de Cuidados à Saúde proposto por Arthur Kleinman(10).

Esse referencial teórico aborda os locais onde os indivíduos buscam soluções para os seus problemas de saúde, e o mesmo é composto por três subsistemas: familiar, profissional e cultural (o profissional, constituído pelas práticas formais de exercício da medicina, como biomedicina e homeopatia; o popular, composto pelos cuidados caseiros e o autocuidado; ou o folk, que corresponde a práticas místicas e religiosas de cuidados)(10-11).

Com a finalidade de garantir a qualidade e transparência da redação, foi aplicado o guia Consolidated Criteria for Reporting Qualitative Research (COREQ).

Cenário e período de coleta de dados

Foi realizado um sorteio aleatório, no qual dez Unidades Básicas de Saúde (UBS) foram selecionadas para a coleta de dados. Ela aconteceu entre junho e outubro de 2023, por meio de entrevista semiestruturada.

O contato com as participantes se deu mediante a disponibilização dos dados pelos serviços de saúde e pelo contato direto com as mulheres que tinham consultas agendadas e se encaixavam no período selecionado na pesquisa. A partir do aceite, foram agendados o dia e horário conforme a disponibilidade da participante, e as entrevistas foram realizadas pela enfermeira pesquisadora, nas residências, ou em espaços cedidos pelas UBS conforme a preferência da participante, sempre garantindo sua total privacidade.

Participantes e critérios de seleção

Participaram do estudo mulheres que gestaram durante a pandemia da COVID-19, residentes no município de Maringá, cidade localizada no interior do Paraná, Brasil, e que pertenciam a uma das 34 UBS do município.

O processo de identificação dessas mulheres aconteceu por meio do sistema das UBS, realizando-se uma busca por todas as crianças nascidas no período pandêmico. Dessas, consideraram-se aquelas nas quais o período gestacional materno tivesse acontecido entre março de 2020 e junho de 2021, sendo este período considerado devido ao início da pandemia no Brasil e ao afrouxamento das medidas restritivas contra a COVID-19 no Brasil(12), respectivamente.

Os critérios de inclusão foram: mulheres que gestaram no período de março de 2020 a junho de 2021, cadastradas nas UBS selecionadas no momento da entrevista e que iniciaram o pré-natal na rede pública, independentemente do local de residência no momento da gestação. Foram excluídas mulheres com idade inferior a 18 anos e aquelas com algum déficit cognitivo que impossibilitasse a compressão das perguntas da entrevista.

Instrumento e procedimentos para a coleta de dados

Antes de iniciar cada entrevista, efetuou-se a leitura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), solicitando a permissão para a gravação, além de fornecer dados sobre a pesquisa e esclarecer possíveis dúvidas.

As entrevistas foram realizadas por uma enfermeira pesquisadora com experiência prévia na pesquisa científica e, para conduzir as entrevistas, utilizou-se a seguinte questão norteadora: “Conte-me como foi para você gestar durante a pandemia da COVID-19”. Somada a esta, houve questões de apoio previamente delimitadas pela pesquisadora, que estavam relacionadas à descoberta da gestação, às medidas restritivas impostas ás gestantes, às dificuldades/facilidades encontradas no acesso aos serviços de saúde, e com relação aos serviços de saúde frequentados durante a pandemia, entre outros aspectos relacionados à gestação e ao período pandêmico. Essas questões foram inseridas a fim de atingir o objetivo do estudo; também foi aplicado um questionário sociodemográfico, com questões como: idade, raça/cor, quantidade de filhos, e renda para conhecer melhor as características das participantes.

Não houve recusas para a participação do estudo e o número final de participantes foi definido durante as entrevistas em que se chegou à saturação teórica: diante da similaridade dos significados durante as entrevistas e não havendo mais novas informações, a coleta de dados foi interrompida e o número de participantes estabelecido(13).

Tratamento e análise dos dados

Todas as entrevistas foram gravadas e, posteriormente, transcritas na íntegra, tendo duração média de 22 minutos. O material foi codificado com o auxílio do software IRaMuTeQ, sendo os resultados tratados por meio da análise temática proposta por Bardin(14). Neste processo estiveram envolvidas três pesquisadoras que realizaram a análise de forma independente. Não houve conflitos na compreensão dos resultados. O corpus para análise foi realizado após a transcrição literal, adaptação linguística e estruturação padronizada dos textos, garantindo assim a confiabilidade dos dados.

A análise de conteúdo foi dividida em três etapas: 1) o reconhecimento de todo o material seguido de sistematização e codificação dos dados; 2) a agregação dos dados brutos em unidades homogêneas que facilitam a descrição e caracterização do conteúdo, organizando-os, então, em unidades de sentido; 3) a inferência sobre dados previamente presentes na literatura a respeito da temática, associada aos resultados encontrados(15).

Posteriormente, foi realizada a triangulação dos dados, combinando diferentes estratégias de análise para reforçar a validade dos achados. Entre elas, utilizou-se a análise de similitude, baseada na teoria dos grafos, que possibilita identificar coocorrências entre palavras e suas conexões no corpus textual. Esse tipo de análise auxilia na compreensão da estrutura do conteúdo, permitindo visualizar padrões comuns e especificidades do material, o que fortalece a interpretação dos dados(15-16).

Aspectos éticos

O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa sob o Parecer n.º 4.886.085 (Certificado de Apresentação de Apreciação Ética - CAAE: 39060120.1.3004.0104) e todas as participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), de acordo com a Resolução n.º 466/12 do Conselho Nacional de Saúde. Para assegurar o anonimato das participantes, os nomes das entrevistadas foram substituídos por nomes de flores.

Resultados

Participaram do estudo 16 mulheres com idades que variaram de 20 a 47 anos. A maioria das participantes era da raça/cor branca (56,3%), casada (68,8%) e multípara (62,5%), com renda que variou entre um e cinco salários-mínimos, sendo que a maioria ganhava entre um e dois salários (56,3%).

Por meio da triangulação dos dados, observou-se a similitude das palavras em sua estrutura, núcleo central e no sistema periférico dos conteúdos das ementas analisadas, sendo identificados três principais eixos organizadores voltados aos caminhos percorridos por gestantes durante a busca por cuidados no período pandêmico, conforme a Figura 1.

Figura 1-
Similitude de palavras extraídas das ementas do itinerário terapêutico de gestantes durante a pandemia da COVID-19. Maringá, PR, Brasil, 2023

A partir da leitura extenuante e da triangulação dos dados, percebeu-se que a experiência das mulheres que vivenciaram a gestação durante a pandemia foi marcada por uma trajetória árdua pela busca de cuidado, tendo sido possível a construção de três categorias, descritas a seguir.

Principais redes de apoio durante a gestação- subsistema familiar

A palavra “estar” se relaciona intimamente à gestação, “estar grávida”, descobrindo-se que, ao perceber a gravidez, as mulheres procuraram seus familiares ou pessoas próximas. Dessa forma, a primeira busca por cuidado se deu ao dividir com alguém a notícia da gestação, na perspectiva, mesmo que inconsciente, de encontrar afeto, apoio, conforto e companhia para trilhar todo o trajeto da gestação num tempo de tamanha incerteza, como foi o da pandemia da COVID-19.

Meu marido, estava junto comigo quando eu fiz o teste, então descobrimos juntos. (Tulipa). Eu falei primeiro com a minha mãe, e aí depois ela me orientou a procurar o posto de saúde. (Azaleia). A primeira pessoa foi minha sobrinha, liguei para ela chorando [...]. (Violeta).

A presença familiar durante a gestação foi prejudicada pelas restrições impostas para reduzir a contaminação, seja durante as consultas, seja pela sensação de redução no apoio recebido ao longo da gestação. As experiências das gestantes na procura pelos serviços de saúde junto de seus familiares foram alteradas devido às adversidades trazidas pela pandemia da COVID-19.

Minha mãe só chegou quando eu fui ganhar o bebê. Sem a pandemia, as minhas irmãs e a minha mãe poderiam ter vindo, mas aí fecharam tudo, não podia viajar. Então, acho que sem a pandemia eu teria tido um apoio maior. (Lírio). Minha família queria me acompanhar e não podia muito, aí eu tinha que escolher entre meu marido ou algum outro familiar. (Gardênia). A minha família como um todo é bem participativa, em alguns pontos. Bem acolhedora. Mas, por conta da pandemia, a gente precisou se afastar. (Margarida).

Além do suporte emocional provido pela família, durante a pandemia as gestantes necessitaram de apoio financeiro devido às restrições impostas, as quais modificaram o dia a dia de trabalho, estando muitas gestantes afastadas do exercício profissional por serem grupo de risco para a COVID-19.

As minhas tias me ajudaram em tudo, em questão de comida, eu tive um apoio bem grande, até um certo apoio financeiro. (Rosa). A gente passou um período financeiramente terrível, não tinha um suporte financeiro. Eu estava sem salário e ele estava desempregado [...] pedi cesta básica porque tinha que criar as crianças pequenas. (Hortênsia). As gestantes não podiam trabalhar, e isso me abalou muito. (Margarida).

As mulheres procuraram também amigos, ou pessoas com as quais se sentiam próximas, ou pela ausência de seus familiares ou, ainda, por se sentirem mais confortáveis na presença de seus amigos.

Então, eu falei primeiro para uma amiga minha, a gente conversou muito e a gente chorou junto.Parentes eu não tenho muito aqui, mas das amizades eu tive apoio total. (Orquídea). Meus professores me ajudaram bastante também. Eu tinha uma professora que eu tirava muita dúvida com ela, ela me ajudou muito. (Gardênia).

A participação familiar, bem como de um amigo próximo, durante a gestação, torna a experiência mais leve e mais tranquila, e o apoio pode acontecer tanto no suporte emocional como financeiro. É perceptível que as mulheres desejam sentir-se mais seguras e confortáveis na presença de um indivíduo de seu convívio habitual, durante o período gestacional.

O acompanhamento pré-natal – subsistema profissional

As palavras “ir” e “fazer” transmitem a procura pelos serviços de saúde, sendo este essencial para uma gestação saudável. Diante disso, é recomendado o início do pré-natal o mais precocemente possível, para acompanhamento e avaliação materno-fetal, que devem ser completos, sendo realizadas no mínimo seis consultas e suprindo todas as necessidades que possam surgir durante a gestação.

Eu fui com o meu atual esposo, aí eu já vim para esse mesmo postinho e eu já dei início no pré-natal. Aí eu tomava remédio para a depressão, e eu fui encaminhada pro alto risco. (Rosa). Eu demorei uns dias para conseguir vir aqui fazer, dar início a esse pré-natal. Até porque eu tive um aborto na minha primeira gestação, então eu preferi fazer um ultrassom primeiro, para ter certeza que tinha um bebê, para depois vir aqui começar o pré-natal. E aí eu fiz todo o pré-natal pelo posto. (Antúrio).

O bom atendimento pré-natal gera vínculo entre a equipe de saúde e a gestante, possibilitando um bom relacionamento e facilitando o processo de cuidado. Tal proximidade irá beneficiar não somente a gestação, mas também o período de puerpério, no qual as necessidades de saúde permanecem em evidência.

Eu tive um cuidado mais especial pelo fato de ter gestação de risco. Então eu fiquei indo em duas unidades de saúde. No postinho e uma outra unidade que eu não me lembro o nome. Só que eles me atendiam muito bem lá e eles me examinavam. Eu tinha bastante cuidado lá. (Petúnia). Fui muito bem atendida, muito bem preparada, tive suporte de psiquiatra, psicólogo, [...] quando eu vim fazer o pré-natal eles já me encaminharam, e daí foi supertranquilo. Tive o suporte dos dois, o psiquiatra e o psicólogo. (Orquídea).

Diante de um momento delicado como a pandemia da COVID-19, os serviços de saúde precisaram se adaptar para atender às necessidades que emergiram; dentre elas está a falta de consultas médicas.

Só tive a minha primeira consulta com eles, só passava pela triagem, não tinha médico pra atender por conta da COVID [...] eles marcavam para ter o acompanhamento, só que, daí, quando chegava lá no posto, os médicos estavam no UPA atendendo. Por conta da COVID. Porque era muita demanda e, daí, eles tinham que sair do posto para ir atender. (Gérbera). Durante a pandemia, não tinham tantas consultas disponíveis, tinha muita gente precisando, então era difícil conseguir. E para vir sempre tinha que ter cuidado, porque tinha gente pra fazer pré-natal, mas também tinha outros atendimentos, então a gente não sabia do risco que a gente tava correndo. (Azaleia).

Além da redução da oferta de consultas médicas, a oferta de exames também foi afetada. A dificuldade de acesso a exames durante a gestação é um problema para acompanhar o desenvolvimento gestacional e coloca em risco o binômio. Ademais, alguns exames devem ser realizados respeitando a idade gestacional, e a ausência desses exames afeta a procura pelo cuidado, modificando os trajetos percorridos por gestantes na busca por cuidados em saúde.

Eu abri o pré-natal e comecei a fazer os exames também, mas os exames eu não consegui pelo posto, aí acabei fazendo no particular. (Azaleia). Eu fiz um ultrassom particular. Você esperar pelo SUS demorava mais. E o acompanhamento pré-natal eu fiz no postinho mesmo. (Lavanda).

De fato, as modificações impostas pela pandemia da COVID-19 alteraram o fluxo de atendimentos no acompanhamento pré-natal, desde os mais simples, como as vacinas, até os mais complexos, como o parto. A procura por cuidado se alterou, influenciada pela disponibilidade dos serviços de saúde em atender as gestantes, o que foi vivenciado de forma diferente por cada mulher.

Eu consegui fazer as vacinas pelo SUS tranquilamente, mas não foi assim com aquela rapidez dos dias normais. [...] no SUS você tem que agendar, e tem uma demanda de gestantes. No dia do parto, no caso, eu ia ser atendida pelo plantonista. Então eu optei pelo plano de saúde, por eu conseguir ter essa facilidade da escolha do profissional que iria me acompanhar. (Girassol). Na minha primeira gestação eu fiz tudo no particular, mas, se eu fosse ter outro filho e eu tivesse a opção de escolher, eu escolhia o público. Eu fui muito melhor atendida aqui. Mesmo com a pandemia. (Begônia).

Outro fator relevante foi a contaminação das gestantes e a busca dessas por cuidados médicos.

No sétimo mês eu peguei COVID. A gente ficou bem assustado, com medo de acontecer alguma coisa com o bebê, de eu ter sintomas mais graves, de qual remédio que eu poderia tomar, por estar grávida, eu tinha a limitação de ficar tomando medicamento. Mas, daí, eu fiz a minha consulta obstétrica, o médico me recomendou alguns remédios mais sintomáticos mesmo. (Gardênia).

A gestante, ao estar contaminada pelo SARS-CoV-2, pode apresentar desde sintomas gripais leves, como febre e tosse, até mais graves, como sintomas respiratórios, necessitando de cuidados médicos especializados. Além disso, a pandemia e o medo do contágio trouxeram repercussões psicológicas devido às restrições e incertezas impostas a essas mulheres. Assim, o itinerário terapêutico de mulheres que tiveram COVID-19 no período gestacional variou conforme a gravidade da doença e a disponibilidade dos serviços de saúde, visto que naquele momento muitas vezes havia um percurso pré-estabelecido.

Eu estava com 37 semanas, eu fiquei internada na maternidade um pouco. Para verificar os batimentos cardíacos do bebê por conta da COVID-19. Estava tudo ok. Eles me mandaram pra casa. Eu fiquei tomando medicamento em casa. (Petúnia). Foi uma gravidez sadia, até 35 semanas [...] na quarta-feira eu fiz um teste. E deu positivo. Eu já senti um pouco de dificuldade de respirar. Mas eu achava comum. [...] eu tive a parada cardíaca, duas bactérias hospitalar, 45 dias entubada, 4 meses e meio de traqueostomia, 95% do pulmão afetado, e 53 dias no hospital. (Magnólia).

É possível perceber que as dificuldades impostas pela pandemia da COVID-19 reduziram o acesso aos serviços de saúde, conferindo muitas fragilidades a um acompanhamento pré-natal de qualidade, uma vez que as mulheres realizaram menos consultas e exames. Consequentemente, tiveram oportunidades reduzidas para a educação em saúde e detecção precoce de possíveis problemas gestacionais.

A espiritualidade como suporte terapêutico – subsistema cultural

Observou-se que as gestantes recorreram a suas crenças espirituais durante este período pandêmico, sendo este um suporte terapêutico para se sentirem fortalecidas quanto à contaminação e às adversidades impostas pela COVID-19.

Eu sempre botei minha saúde em nome de Deus. Então, para mim, foi sempre firme na presença de Deus. No entanto, eu peguei a COVID, e fiquei para morrer. Mas Deus ali foi conforto, me curou. (Petúnia). Foi o que a gente fez aqui em casa, oramos, e estava propício a qualquer coisa, porque muita gente morreu, né, muita pessoa morreu, então a gente não sabia o que estava por vir. (Hortênsia).

A espiritualidade das mulheres teve um papel importante em proporcionar ânimo e coragem para que elas procurassem os serviços de atendimento pré-natal em meio à pandemia. A religiosidade permitiu acreditar que a gestação aconteceria de forma saudável, mesmo durante o período pandêmico.

A fé em Deus de ter a proteção e de necessitar, porque eu sabia que precisava, [...] eu precisava de uma ajuda profissional. (Magnólia). Foi uma coisa que eu achava que nunca mais ia engravidar, então, foi uma surpresa boa. Eu falei assim: não foi planejado por mim, mas foi planejado por Deus, porque ele sabia que eu precisava dele. (Orquídea).

Percebe-se que a gestação estava relacionada a um planejamento maior, que a pandemia influenciou, e os desejos maternos não poderiam ser realizados.

No meu dia que eu fui fazer o meu parto, eu estava na esperança que eu ia conseguir filmar o meu parto, era um sonho que eu tinha de poder filmar [...] eu liguei para o fotógrafo que eu tinha contratado, a gente tinha já deixado tudo certo, caso o hospital liberasse, ele iria entrar, [...] mas o hospital negou a entrada dele por conta do aumento de casos, [...] eu não consegui realizar esse desejo, que eu tinha muita vontade de filmar todo o meu parto, de ter as fotos de um profissional para eu poder eternizar. Então a pandemia, ela saiu do normal, e eu não consegui realizar alguns desejos que eu tinha, eu precisei me ausentar de muitos lugares que eu gostaria de ter ido durante a minha gestação. (Margarida).

As experiências ao longo do caminho percorrido foram múltiplas, demonstrando-se boas e ruins, a depender da vivência de cada gestante.

Discussão

Este estudo proporcionou a compreensão dos efeitos da pandemia de COVID-19 na dinâmica da busca do cuidado durante o período gestacional. Os achados indicam que a COVID-19 provocou alterações na dinâmica dos serviços de saúde, assim como na rede de apoio às gestantes, impactando alterações no IT vivenciado por elas.

Mesmo diante de tantas adversidades, foi possível observar a procura das mulheres pelo cuidado, tanto por meio dos serviços de saúde, como no âmbito familiar e cultural, o que demonstra certa capacidade adaptativa e a resiliência delas.

A procura das gestantes pelo apoio familiar, um elemento fundamental nas entrevistas, está vinculada à rede de apoio social, composta por pessoas significativas para elas, que oferecem suporte e reforço nas estratégias de enfrentamento diante das situações da vida. Essa rede inclui a família extensa, amigos, colegas de trabalho, relações comunitárias, serviços de saúde e até crenças religiosas ou políticas, englobando tanto as relações mais íntimas quanto as ocasionais(17-18).

Seguindo essa perspectiva, Kleinman(19) explica em sua teoria que os Sistemas de Cuidados à Saúde são fundamentados nas relações interpessoais, onde tudo está interligado. Pacientes, profissionais de saúde, doença e tratamento fazem parte desse contexto assistencial. As crenças e atitudes individuais são moldadas pelos papéis culturais. O autor destaca ainda que, para compreender as escolhas individuais, é essencial considerar as influências externas que afetam o Sistema de Cuidados à Saúde, como fatores ambientais, incluindo geografia, clima, demografia, questões sociais, poluição e o desenvolvimento agrícola e industrial(19).

Os ITs dizem respeito aos cuidados à saúde que cada pessoa adota, sendo moldados pelas relações interpessoais. As escolhas de cuidados são influenciadas por três setores: a família, que exerce maior poder na definição do itinerário terapêutico; a cultura, que inclui profissionais não oficialmente reconhecidos, mas que compartilham as crenças sociais e valores culturais dos indivíduos; e os profissionais da saúde, que têm uma influência mais limitada, ao tenderem a priorizar o aspecto biológico no cuidado(19).

Além disso, a teoria enfatiza a pluralidade do cuidado, argumentando que os indivíduos transitam entre os setores de cuidado (familiar, cultural e profissional) revelando a combinação de diferentes formas de cuidado, reforçando que o itinerário terapêutico não é linear e pode incluir tratamentos formais e informais de forma simultânea(19).

O apoio social desempenha um papel crucial na prevenção da depressão pós-parto, evidenciando a importância de se dar atenção à qualidade da rede de apoio às gestantes durante o ciclo gravídico-puerperal. Nesse processo, não são somente a família, mas também os serviços de saúde, amigos e parceiros que assumem responsabilidades no suporte às mulheres nesse período(20).

Nessa perspectiva, o objetivo da assistência pré-natal é garantir o desenvolvimento saudável da gestação, do parto e do puerpério, sem comprometer a saúde da mãe e do bebê. Isso envolve uma abordagem que considera também os aspectos psicossociais, além de atividades educativas e preventivas. Esse objetivo é uma responsabilidade compartilhada entre o médico e o enfermeiro(8).

O profissional de saúde deve desenvolver um vínculo saudável com a gestante e sua família. Ao incentivar que essa rede de apoio compareça às consultas de acompanhamento pré-natal, tem-se em vista que é nesses momentos que as dúvidas são esclarecidas e há a possibilidade de todos se sentirem mais tranquilos e seguros com o processo gestacional(21).

A enfermagem assume uma responsabilidade no cuidado à saúde dessas mulheres, ao desenvolver ações educativas pautadas na individualidade, integralidade, autocuidado e empoderamento feminino capacitando-as para tomar suas próprias decisões e contribuindo para sua independência quanto às demandas de saúde, estimulando-a a tornar-se corresponsável pelo próprio cuidado(22).

Contudo, devido à pandemia de coronavírus, foi necessário realizar adaptações na atenção às gestantes, visando preservar a saúde tanto dessa população quanto dos profissionais de saúde envolvidos. Por apresentarem alterações fisiológicas no sistema imunológico, cardiorrespiratório e na coagulação, as gestantes em qualquer fase da gestação e as puérperas passaram a ser classificadas como parte do grupo de risco para a COVID-19, com maior chance de agravamento do quadro infeccioso, demandando, portanto, cuidados mais intensivos(23).

Esses cuidados são necessários devido à alta transmissibilidade da doença, que ocorre por meio de gotículas respiratórias expelidas quando uma pessoa infectada tosse ou espirra, inaladas por indivíduos próximos. Também pode ocorrer através do contato pessoal, próximo ou com superfícies contaminadas, seguido do toque na boca, nariz e/ou olhos(1).

Em resposta a essa situação, as autoridades de saúde implementaram medidas, visando reduzir a propagação do vírus, enfatizando a importância de manter a higiene das mãos, usar máscaras, reorganizar os atendimentos nos serviços de saúde e adotar o isolamento social(24).

Por outro lado, o isolamento social, como forma prevenir a propagação da COVID-19, pôde fazer emergir sentimentos de solidão, uma vez que afastava a mulher de sua rede de apoio, que a auxiliava nas tarefas domésticas, orientação e suporte emocional(25). Estudo realizado em 2020 revelou que as mulheres grávidas durante a pandemia de COVID-19 relataram níveis mais elevados de angústia e sintomas psiquiátricos em comparação às mulheres avaliadas antes da pandemia, com uma evolução para quadros de depressão e ansiedade. Os autores concluíram que a escassez de informações claras e confiáveis poderia agravar o risco de sofrimento psicológico e psicossocial entre essas gestantes(26).

Implementar ferramentas de rastreio do risco de depressão na gravidez pode ser um passo importante para conhecer melhor as necessidades em saúde mental de mulheres inseridas na assistência pré-natal de risco habitual. Sabe-se que, muitas vezes, a saúde mental é negligenciada e, atrelado a isso, há que se considerar a dificuldade de acesso à assistência especializada nessa área na atenção primária à saúde(27).

Em tempos de pandemia, a inovação e a criatividade passaram a fazer parte do cotidiano do profissional de saúde que, diariamente, enfrentava novos desafios. Foi preciso lançar mão de estratégias de adaptação para cumprir os calendários de saúde já existentes e que, nesse momento, precisavam ser executados de algum modo(28).

Quanto à contaminação materna pelo coronavírus, existem registros de que as gestantes estão mais propensas a apresentar pré-eclâmpsia, diabetes gestacional e hipertensão, e síndrome HELLP(29). Outro estudo demonstrou uma associação entre a infecção materna e desfechos fetais, tais como: parto prematuro, sofrimento fetal, baixo peso ao nascer, asfixia, ruptura prematura de membranas, coagulação intravascular disseminada e até morte fetal(30).

As complicações decorrentes da gestação podem levar à hospitalização, o que, embora promova sensação de segurança e proteção, também desperta, para a gestante, sentimentos de angústia, dor, raiva, tristeza e medo oriundos da quebra de rotina e das intervenções e procedimentos realizados(31).

O subsistema profissional, formado pelos serviços e profissionais de saúde, é organizado burocraticamente e com aprendizado e treinamento formal, sendo legalmente reconhecido, atraindo a sociedade por sua influência e capacidade de cura(11).

Em relação aos aspectos culturais, a religião possui forte influência sobre a qualidade de vida em diferentes fases da vida, tornando-se relevante para promover saúde e prevenir agravos na população(32). A dimensão espiritual no cuidado à saúde durante a gestação é um recurso fundamental para promover a autonomia, segurança e conforto, além de favorecer o fortalecimento do vínculo materno-fetal. A espiritualidade, assim, é um fenômeno que atribui significado a cada fase da vida, enquanto também confere propósito à própria existência humana(33).

Ao buscar tanto o cuidado formal quanto o informal, diminui-se a distância entre esses sistemas, possibilitando práticas de cuidado que sejam multiculturais e significativas. Isso permite uma abordagem integral da saúde, que considera o cuidado cultural, ressaltando que, dessa forma, novos conhecimentos podem emergir, contribuindo para a transformação das práticas em saúde(34).

As limitações do estudo se referem ao viés de memória das participantes entrevistadas devido ao tempo transcorrido entre a gestação e a coleta de dados para a pesquisa. Entretanto, ressalta-se que a gravidez se trata de um período muito marcante para a mulher e que, atrelada à pandemia, um evento histórico, possivelmente pouca ou nenhuma situação deve ter sido esquecida.

Os achados deste estudo são de extrema relevância, dadas as inúmeras alterações impostas aos serviços de saúde no período pandêmico, sendo algumas mantidas após a pandemia, como foi o caso das teleconsultas.

Além disso, os resultados poderão contribuir para a prática profissional daqueles que assistem à gestante no pré-natal, melhorando a sua compreensão acerca dos caminhos percorridos na busca pelo cuidado, bem como da necessidade de inclusão e aceitação dos familiares e aspectos culturais durante todo o acompanhamento pré-natal.

Conclusão

O itinerário terapêutico percorrido por gestantes em busca do cuidado em saúde durante a pandemia da COVID-19 foi configurado em três subsistemas: familiar, profissional e cultural. As mulheres procuraram suporte primeiramente em suas famílias, na busca por afeto, carinho, orientação e apoio, e na sequência foram ao encontro do suporte profissional, sendo esse encontrado na Atenção Primária à Saúde, principal porta de entrada para o cuidado, durante todo o período gestacional, parto e puerpério. Muitas mulheres também abordaram, no contexto cultural, as crenças como instrumento de fortalecimento para o cuidado, ocorrendo de forma associada aos demais subsistemas.

Com a vivência da gestação durante a pandemia da COVID-19, os caminhos percorridos para a busca de cuidado foram ainda mais difíceis para essas gestantes, estando permeados por dúvidas e incertezas, além de uma nova configuração de rotinas e atendimentos adotados pelos serviços de saúde.

Muitas gestantes enfrentaram dilemas sobre procurar serviços de saúde durante a pandemia, logo, urge garantir o acesso contínuo aos cuidados pré-natais. Acredita-se que o presente estudo possa provocar a reflexão acerca da importância do cuidado individualizado e holístico para a gestante, buscando compreender e respeitar suas crenças e forma de viver, seu entendimento, angústias e necessidades momentâneas, a fim de qualificar a assistência pré-natal, especialmente em situações de adversidades, como foi a pandemia da COVID-19.

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  • *
    Artigo extraído da dissertação de mestrado “Experiência de mulheres em gestar em tempos de pandemia da covid-19”, apresentada à Universidade Estadual de Maringá, Maringá, PR, Brasil. Apoio financeiro da Fundação Araucária, processo nº PPSUS Edição 2020/2021 - Chamada Pública 11/2020 FA/PR, Brasil. O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) - Código de Financiamento 001, Brasil.
  • Como citar este artigo
    Cargnin AVE, Piran CMG, Fonseca BS, Lehmkuhl CSF, Merino MFGL, Zilly A, et al. Therapeutic itinerary of pregnant women during COVID-19: a perspective based on healthcare systems. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2025;33:e4629 [cited]. Available from: . https://doi.org/10.1590/1518-8345.7623.4629

Editado por

  • Editora Associada:
    Sueli Aparecida Frari Galera

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Jul 2025
  • Data do Fascículo
    2025

Histórico

  • Recebido
    30 Jul 2024
  • Aceito
    02 Abr 2025
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