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Notas sobre o "efeito de presença" da representação

Notes on the "effects of presence"of representation

Notes sur "l'effet de presence"representation

Resumos

Nossa intenção neste trabalho é discutir teoricamente a representação política e radicalizá-la a ponto de combiná-la com a noção weberiana de dominação. Isso requer, desde já, que partamos do pressuposto de que estamos diante de um tipo - e de um efeito - muito particular de representação: a representação carismática associada ao que chamaremos de seu "efeito de presença". Nossa proposta é, portanto, explicar as razões que levam o representado, devoto ou apóstolo a seguir cegamente um líder carismático. Assim, em um primeiro momento, discutiremos a idéia lato sensu de representação - o "estar em lugar de" - e a necessária distinção entre representante e representado. Após isso, analisaremos a possibilidade de tratar, a partir da perspectiva weberiana, a dominação carismática como um tipo particular de representação, chamada por Weber de "representação apropriada". Por fim, trataremos especificamente, a partir da noção de "supplément", de Derrida, do "efeito de presença" da representação e da explicação do carisma pela perspectiva do representado.

representação política; suplemento; carisma; efeito de presença de representação


The goal of this paper is to develop a theoretical discussion of political representation and radicalize it to the point where it can be fused with with Weber's notion of domination. This requires beginning from the premise that we are facing a particular type - and effect- of representation: charismatic representation associated with what we can refer to as its "effect of presence". Our proposal thus becomes that of explaining the blind faith of those who are represented by, or are devotees or followers of a charismatic leader. Thus, we will begin with a idea of representation lato sensu - that of "being in someone else's place" - and the necessary distinction between the one whom represents and the one who is represented. This will be followed by the analysis of the possibility of dealing, from a Weberian perspective, of charismatic representation as a particular type of representation, which Weber refers to as "appropriate representation". Lastly, we will deal specifically with the "effects of presence" of representation and of the explanation of charisma from the point of view of those who are represented, through the use of Derrida's notion of "supplément".

political representation; supplement; charisma; the "effects of presence" of representation


Dans ce travail, nous envisageons discuter théoriquement de la représentation politique. En l'approfondissant, nous l'articulerons avec la notion de domination de Weber. Cela exige que nous ayons comme présupposé le fait que nous faisons face à un type - et à un effet - très particulier de représentation: la représentation charismatique associée à ce que nous appelerons son «effet de présence». Nous proposons donc d'expliquer les raisons qui mènent le représenté, dévot ou apôtre, à suivre aveuglement un leader charismatique. Ainsi, dans un premier moment, nous discuterons de l'idée lato sensu de représentation - l'être à la place de» - et l'importante différence entre représentant et représenté. Ensuite, nous analyserons la possibilité de traiter, à partir de la perspective de Weber, la domination charismatique comme un type particulier de représentation, appelé par Weber «représenetation appropriée». Enfin, nous aborderons, à partir de la notion de «supplément» de Derrida, «l'effet de présence» de la représentation et de l'explication du charisme du point de vue du représenté.

représentation politique; supplément; charisme; effet de présence de représentation


DOSSIÊ TEORIA POLÍTICA

Notas sobre o "efeito de presença" da representação1 1 Artigo apresentado no I Simpósio Universidade de São Paulo-Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro de Pós-Graduação em Teoria Política, realizado na Universidade de São Paulo em setembro de 2003, sob o título "O efeito de presença: a representação e a Representação".

Notes on the "effects of presence"of representation

Notes sur "l'effet de presence"representation

Daniel de Mendonça

RESUMO

Nossa intenção neste trabalho é discutir teoricamente a representação política e radicalizá-la a ponto de combiná-la com a noção weberiana de dominação. Isso requer, desde já, que partamos do pressuposto de que estamos diante de um tipo – e de um efeito – muito particular de representação: a representação carismática associada ao que chamaremos de seu "efeito de presença". Nossa proposta é, portanto, explicar as razões que levam o representado, devoto ou apóstolo a seguir cegamente um líder carismático. Assim, em um primeiro momento, discutiremos a idéia lato sensu de representação – o "estar em lugar de" – e a necessária distinção entre representante e representado. Após isso, analisaremos a possibilidade de tratar, a partir da perspectiva weberiana, a dominação carismática como um tipo particular de representação, chamada por Weber de "representação apropriada". Por fim, trataremos especificamente, a partir da noção de "supplément", de Derrida, do "efeito de presença" da representação e da explicação do carisma pela perspectiva do representado.

Palavras-chave: representação política; suplemento; carisma; efeito de presença de representação.

ABSTRACT

The goal of this paper is to develop a theoretical discussion of political representation and radicalize it to the point where it can be fused with with Weber's notion of domination. This requires beginning from the premise that we are facing a particular type – and effect- of representation: charismatic representation associated with what we can refer to as its "effect of presence". Our proposal thus becomes that of explaining the blind faith of those who are represented by, or are devotees or followers of a charismatic leader. Thus, we will begin with a idea of representation lato sensu – that of "being in someone else's place" – and the necessary distinction between the one whom represents and the one who is represented. This will be followed by the analysis of the possibility of dealing, from a Weberian perspective, of charismatic representation as a particular type of representation, which Weber refers to as "appropriate representation". Lastly, we will deal specifically with the "effects of presence" of representation and of the explanation of charisma from the point of view of those who are represented, through the use of Derrida's notion of "supplément".

Keywords: political representation; supplement; charisma; the "effects of presence" of representation.

RÉSUMÉ

Dans ce travail, nous envisageons discuter théoriquement de la représentation politique. En l'approfondissant, nous l'articulerons avec la notion de domination de Weber. Cela exige que nous ayons comme présupposé le fait que nous faisons face à un type – et à un effet – très particulier de représentation: la représentation charismatique associée à ce que nous appelerons son «effet de présence». Nous proposons donc d'expliquer les raisons qui mènent le représenté, dévot ou apôtre, à suivre aveuglement un leader charismatique. Ainsi, dans un premier moment, nous discuterons de l'idée lato sensu de représentation – l'être à la place de» - et l'importante différence entre représentant et représenté. Ensuite, nous analyserons la possibilité de traiter, à partir de la perspective de Weber, la domination charismatique comme un type particulier de représentation, appelé par Weber «représenetation appropriée». Enfin, nous aborderons, à partir de la notion de «supplément» de Derrida, «l'effet de présence» de la représentation et de l'explication du charisme du point de vue du représenté.

Mots-cles: représentation politique; supplément; charisme; effet de présence de représentation.

Ora, o suplemento, aqui, é ao mesmo tempo a oportunidade da humanidade e a origem

de sua perversão.

Jacques Derrida

I. INTRODUÇÃO

Max Weber, ao estabelecer as bases fundamentais do tipo ideal de dominação carismática, permitiu-nos a compreensão de fenômenos sociais, religiosos e políticos provocados por líderes capazes de serem adorados por multidões. Embora seja perfeitamente possível lançar mão dessa categoria weberiana para analisar movimentos sociais, políticos ou mesmo religiosos que hodiernamente ocorrem, por exemplo, no Oriente Médio, na África ou mesmo no Brasil, não é nosso interesse fazer aqui qualquer análise sociológica tendo por parâmetro o tipo ideal de dominação carismática. Apesar disso, é digno de nota que, no caso brasileiro, o tipo ideal carismático pode demonstrar plenamente seu potencial heurístico se aplicado às análises sociológico-políticas que tenham por objeto os inúmeros movimentos religiosos organizados no país, cujos líderes e profetas são venerados, ou por pequenos grupos de adeptos ou mesmo por multidões capazes de lotar estádios de futebol.

O carisma, portanto, é um fenômeno socio-lógico-político extremamente relevante de ser compreendido em cada uma de suas incontáveis manifestações. Tal importância revela-se a partir de vários estudos promovidos nas mais diversas áreas que comportam as Ciências Humanas (Antropologia, Sociologia, Ciência Política, Psicologia, Comunicação Social). Esse fenômeno, além de amplamente estudado, é analisado a partir de uma série de perspectivas teóricas. Não é nosso papel, muito menos nossa pretensão, fazer uma retrospectiva dos estudos teóricos sobre o carisma.

Neste trabalho buscaremos ressaltar a importância que essa categoria weberiana tem para a análise política cotidiana em países como o Brasil. Nesse sentido, restringiremos nosso debate à problematização do conceito, buscando aplicar-lhe uma nova dimensão compreensiva que, acreditamos, auxiliará aqueles que o utilizam para o entendimento de acontecimentos sociais relevantes, tanto para o domínio da Sociologia como para o da Ciência Política.

Nesse sentido, nossa intenção neste artigo é discutir teoricamente a representação política a ponto de combiná-la com a noção weberiana de dominação, para daí apresentarmos uma outra dimensão de análise do tipo ideal de dominação carismática. Isso requer, desde já, que partamos do pressuposto de que estamos diante de um tipo – e de um efeito – muito particular de representação: a representação carismática associada ao que chamaremos de seu "efeito de presença". Nossa proposta é, portanto, explicar as razões que levam o representado, devoto ou apóstolo a seguir cegamente um líder carismático.

Aparentemente essa explicação parece já ter sido dada no âmbito das Ciências Sociais quando Max Weber elaborou o tipo ideal de "dominação carismática", uma forma especial de dominação que se legitima a partir de uma "devoção afetiva à pessoa do senhor e a seus dotes sobrenaturais (carisma) e, particularmente: a faculdades mágicas, revelações ou heroísmo, poder intelectual ou de oratória" (WEBER, 1999, p. 134-135).

Entretanto, entendemos que a justificativa weberiana do carisma é apenas unilateral, ou seja, ao mesmo tempo em que explica o ponto de vista do dominante (líder), omite as razões do dominado. Assim, discutir esse tipo de dominação, ou de representação, em nosso texto, requer inicialmente realizarmos uma necessária inversão em relação à forma como o tema comumente tem sido debatido em nossos círculos. Enfatizando: quando se fala de carisma, de dominação carismática, fala-se sobremaneira do ponto de vista do "representante", de seus poderes mágicos, oratórios, sobrenaturais. Entretanto, muito pouco se diz em Teoria Política acerca das razões por que o "representado" adere cegamente a tal tipo de dominação. Eis, portanto, o tema central do nosso debate.

Para explicarmos o que acontece do lado do dominado a ponto de ele legitimar a dominação ou a representação carismática do representante ou do dominador2 2 Queremos deixar muito claro aqui que operamos com as idéias de dominação e de representação como análogas, uma vez que o dominante é sempre um representante legitimado pelo dominado, como veremos na segunda seção deste trabalho. , formularemos, desde já, a hipótese central deste artigo: a legitimidade da dominação carismática está no fato de que, quando ocorre, o dominado é incapaz de fazer a distinção entre seus interesses e os interesses de seu líder ou representante. Esse tipo de dominação borra, a partir do ponto de vista do próprio dominado, a fronteira existente entre ele e seu dominador. Em uma palavra: estamos diante do que chamaremos e trataremos de "o efeito de presença" da representação.

Tal forma de tratar do tema da representação não é nada estranha a outras áreas das humanidades. Barthes (1984), pela Teoria da Linguagem, por exemplo, claramente discute esse "borrar" na fronteira da representação quando trata do tema da fotografia e de sua respectiva ilusão de presença produzida pela imagem. Derrida (1999), na filosofia desconstrucionista, como veremos mais detalhadamente a seguir, analisa o papel do perigo do suplemento da escrita em relação à fala.

Neste artigo não pretendemos tratar especificamente de tais abordagens teórico-filosóficas que, apesar de inspiradoras, escapam do debate sobre a representação política. Contudo, é importante destacar que nossa noção de "efeito de presença" da representação é tributária dessas perspectivas. Quando for pontualmente importante, faremos referência a uma ou outra categoria desses autores. Assim, em um primeiro momento, discutiremos a idéia lato sensu de representação – o "estar em lugar de" – e a necessária distinção entre representante e representado. Após isso, analisaremos a possibilidade de tratar, a partir da perspectiva weberiana, a dominação carismática como um tipo particular de representação, chamada por Weber de "representação apropriada". Por fim, trataremos especificamente, a partir da noção de "suplemento" de Derrida, do "efeito de presença" da representação e da explicação do carisma pela perspectiva do representado.

II. A REPRESENTAÇÃO: A PRESENÇA DA AUSÊNCIA

A representação, tomada em seu sentido mais amplo e trivial, refere-se à idéia de "estar em lugar de", ou seja, representar é anunciar o paradoxo da presença de uma ausência3 3 Corinne Enaudeau caracteriza com precisão o paradoxo da representação: "o teatro concentra no cenário o paradoxo da representação. Representar é substituir um ausente, dar-lhe presença e confirmar a ausência. De uma parte, transparência da representação: ela borra-se perante o que mostra. Gozo de sua eficácia: é como se a coisa estivesse ali. Mas, de outro lado, opacidade: a representação só se apresenta a si mesma, apresentase representando a coisa, eclipsa-a e suplanta-a, duplica sua ausência. Decepção por tê-la deixado presa na sombra, inclusive o júbilo por ter ganho com a troca: a arte supera a natureza, completa-a e realiza-a" (ENAUDEAU, 1999, p. 27). . Tal acontecimento, no âmbito do político, deve necessariamente ser entendido a partir da noção de mediação.

Dessa forma, a mediação é a possibilidade da representação. Entre o representado e seus interesses interpõe-se, portanto, o representante e sua legitimidade mediadora. O que parece relevante afirmar neste ponto é que a relação de mediação ocorre entre duas identidades particulares. Ambas são particulares (representante e representado) pois guardam em si necessidades que lhes são próprias, idiossincráticas e que, não raramente, podem estar inicialmente dissociadas. Ocorre que, no momento em que uma identidade passa a representar a outra, seus interesses convergem para um ponto em comum (ou vários pontos em comum) e nesse sentido surge a mediação.

Expliquemos melhor este ponto a partir de um exemplo hipotético. Imaginemos um grupo de mulheres que há anos reivindica do poder público municipal uma creche estatal para que elas possam deixar seus filhos em local seguro enquanto vão trabalhar. No período eleitoral, surge um candidato a Vereador que assume a reivindicação dessas mães como uma de suas plataformas eleitorais. Indiquemos, pois, para facilitar ainda mais nosso exemplo, que esse hipotético candidato a Vereador seja líder sindical dos comerciários da cidade. Inicialmente, sua candidatura foi o resultado de uma reunião da categoria que resolveu indicá-lo para que, no parlamento municipal, pudesse ser o representante dos trabalhadores do comércio. Ocorre que, ao longo da sua campanha política, como afirmamos, esse candidato assume a bandeira das mães e acaba por tornar-se também um candidato confiável para essas mulheres.

Acima dissemos que a mediação apresenta-se como um importante elemento a ser considerado quando estamos diante da representação. Afirmamos também que a mediação é uma relação que ocorre entre duas identidades com interesses particulares e que não necessariamente possuem conexões prévias entre si. Neste ponto, parece-nos que o exemplo da relação de representação que se estabeleceu entre o candidato e o grupo de mães pode ser elucidativo. Dessa forma, a representação tem a característica de estabelecer a relação entre duas particularidades: a mediadora e a mediada. A mediadora (candidato) propõe-se a ser a porta-voz, a representante da mediada (grupo de mães). Ocorre que o ato da mediação é o momento em que uma particularidade (candidato) assume a condição de representar outra particularidade (grupo de mães) perante uma instância (poder público municipal), em que a mediada far-se-á ausente. Nesse momento, estamos diante de uma importante conseqüência: a identidade representante deixa sua mera condição inicial de líder sindical para tornar-se também líder do grupo de mães. Essa conseqüência é a tendência à universalização da identidade do representante, ou seja, o candidato a Vereador não representa mais a sua identidade original, pois alarga (universaliza) a sua possibilidade de representação. Essa identidade deixa de representar a sua mera particularidade e torna-se capaz de representar outra identidade que inicialmente não estava a ela conectada. Esse sentido de representação apresenta-se suficientemente claro na Teoria do Discurso de Ernesto Laclau (2000, p. 56): "nós já sabemos o que são estas formas de representação: particularidades que, sem cessarem de ser particularidades, assumem a função da representação universal. Isso é o que está na origem das relações hegemônicas".

Evidentemente que o ato da representação não é em absoluto um momento de presença efetiva do representado. Pelo contrário, como já afirmamos acima, o representante anuncia indubitavelmente a sua ausência. O representante, portanto, tem a legitimidade de representar a si próprio e a identidade ausente (representado). Contudo, tal ação não ocorre sem problemas. Vejamos o porquê disso a partir do nosso exemplo.

Digamos que o candidato a Vereador tenha conseguido eleger-se. Nada mais justo, nesse caso, que o grupo de mães comece, desde o primeiro dia do seu mandato, a cobrar atitudes claras desse parlamentar acerca da "prometida" creche municipal. Possivelmente ele, visando a manter o apoio desse grupo social, invista ações em junto ao Executivo municipal no intuito de criar a creche. Contudo, parece razoável afirmarmos que a tarefa de um Vereador excede em muito os interesses, tanto do grupo de mães, como os de sua própria categoria profissional. Um Vereador posiciona-se acerca dos assuntos da municipalidade em geral: essa é a sua tarefa pública. Do contrário, sua atividade seria privada aos interesses de determinados grupos – o que, no limite, além de antiético, é ilegal. Por outro lado, não é raro notar-se que interesses particulares de grupos representados não são plenamente efetivados4 4 Acerca da não-efetivação de demandas particulares no âmbito político, veja artigo de nossa autoria que discute, a partir da noção de agonismo, a necessidade da permanente luta dos movimentos sociais para a conquista e manutenção de seus direitos, mesmo após a publicação de uma norma jurídica que formalmente assegura tais prerrogativas às identidades (MENDONÇA, 2002). . A razão para essa não-efetivação é a mesma: o Vereador está no âmbito de uma casa parlamentar, que é um dos poderes municipais e que, juntamente com o Executivo, deve dar conta da cidade como totalidade; muitas vezes, a demanda particular fica preterida em função de um "interesse público" que não abrange tal demanda representada pelo Vereador, mesmo que ele ardorosamente lute junto às instâncias deliberativas municipais pela sua efetiva implementação.

Por um lado, é um ato de ingenuidade política a crença extremada desse grupo de mães de que, mesmo que o Vereador realmente dedique extrema atenção à demanda, a creche transforme-se necessariamente em uma realidade, ao menos em um curto espaço de tempo. Por outro lado, devese ressaltar que é, ao mesmo tempo, legítimo que o pólo representado requeira uma solução na idêntica medida da demanda, pois esse é o sentido que se busca com a representação: um representante realmente identificado com a questão de quem está ausente. Bobbio (1997, p. 46) identifica esse tipo de representação como "delegada", ou seja, o representante é "simplesmente um portavoz, um legado, um embaixador, de seus representados, e, portanto, o seu mandato é extremamente limitado e revogável ad nutum". Esse é um tipo de representação ideal; nas palavras de Laclau: "A representação é o processo no qual o outro – o representante – 'substitui' e ao mesmo tempo 'encarna' o representado. As condições de uma perfeita representação parecem estar dadas quando a representação é um processo direto de transmissão da vontade do representado quando o ato de representação é totalmente transparente em relação a esta vontade. Isto pressupõe que a vontade esteja plenamente constituída e que o papel do representante se esgote nesta função de intermediação. Desta forma, a opacidade inerente a toda substituição e encarnação devem ser reduzidas a um mínimo: o corpo em que a encarnação tem lugar deve ser quase invisível"5 5 As citações de passagens de trabalhos originalmente escritos em línguas estrangeiras (inglês, francês e espanhol) foram traduzidas livremente pelo autor para uso exclusivo neste artigo. (LACLAU, 1996, p. 172).

As condições para uma "perfeita representação" não são evidentemente satisfeitas na lógica da disputa política, uma vez que o próprio ato de representar de um parlamentar, como é o caso do nosso hipotético Vereador, não está restrito ao grupo representado, uma vez que o Vereador, na medida do possível, é representante de toda a municipalidade. A representação política é, portanto, sempre falha; jamais a vontade do representado é satisfeita integralmente, porque o universo da representação é sempre complexo e resultante de disputas políticas de múltiplos interesses para recursos, como se sabe, sempre escassos.

Apesar de esse universo da representação política ser falho, ou seja, a resposta do representante não ser dada na idêntica medida da demanda do representado, parece haver um tipo de representação em que essa falha, mesmo continuando a existir de fato, deixa de ser percebida pelo representado. Nesse momento, estamos diante da dominação carismática e de seu "efeito de presença", que induz uma perigosa ilusão por parte do representado: nesse tipo de representação, o dominado é incapaz de fazer distinção entre os seus interesses e os interesses do líder ou representante. Tal dominação borra, eclipsa, a partir do ponto de vista do próprio dominado, a fronteira existente entre ele próprio e seu dominador. Em uma palavra: estamos diante do que chamamos de "o efeito de presença" da representação, de que trataremos posteriormente. Porém, precisamos antes estabelecer bases mais sólidas que nos legitimem afirmar que a dominação carismática weberiana possa ser concebida como um tipo especial de representação.

III. Elementos da representação carismática

Neste ponto, estabeleceremos a relação entre representação e dominação para chegarmos à especificidade da dominação carismática e torná-la sinônima do que chamamos de representação carismática. Para tanto, utilizaremos o referencial conceitual weberiano disposto em Economia e sociedade (WEBER, 2000). É claro que é dispensável a apresentação das categorias centrais e introdutórias da Sociologia de Max Weber, uma vez que há muito são de domínio do público das Ciências Sociais. Feita essa breve observação preliminar, comecemos pelo sentido que Weber dá à dominação.

Diferentemente de poder que, para Weber, é um conceito "sociologicamente amorfo", a dominação lato sensu é a "probabilidade de encontrar obediência a uma ordem de determinado conteúdo" (idem, p. 33). Dessa forma, o dominador é aquele que possui legitimidade de comando, que é evidentemente aceito pelo dominado. Partindo dessa idéia geral de dominação, Weber construiu três tipos puros calcados em diferentes legitimidades. É assim que a dominação racional-legal está fundada na lei; que a tradicional, na tradição, no costume, e a carismática, no carisma. Detenhamo-nos somente nessa última, que é central ao nosso argumento.

Assim, a dominação carismática tem seu fundamento, ou legitimidade, nos poderes sobrenaturais ou extracotidianos do líder. Um líder religioso, por exemplo, adquire carisma quando é capaz de demonstrar dons racionalmente inexplicáveis, como a produção de um "milagre". A adesão ao líder carismático, portanto, dá-se a partir da prova de que ele é capaz de produzir algum ato extraordinário e magnífico que causa impacto naqueles que serão seus adeptos. Um político pode ser carismático a partir de sua capacidade discursivo-oratória e de liderança das massas. É nesse sentido que o demagogo, para Weber, é um tipo puro de liderança carismática. Conforme Weber, a adesão a um líder carismático é "uma entrega crente e inteiramente pessoal nascida do entusiasmo ou da miséria e esperança" (idem, p. 159).

A partir do acima exposto, em que sentido a dominação carismática pode ser entendida como representação política? Para respondermos a essa questão, passemos à formulação que Weber dá à representação. Nas palavras do autor: "Por representação entendemos primordialmente a situação [...] na qual as ações de determinados membros da associação (representantes) são imputadas aos demais ou devem ser consideradas por estes como vigentes de modo 'legítimo' e 'vinculante', como de fato ocorre" (idem, p. 193; sem grifos no original).

A partir do conceito de representação acima exposto – que não apresenta qualquer contradição com a idéia geral de representação que utilizamos neste trabalho, mas, ao contrário, enfatiza ainda mais a idéia da presença da ausência –, Weber indica-nos que as ações tomadas pelos representantes geram reflexos ao conjunto dos seus representados. Assim, uma atitude insana de um líder político carismático totalitário de declarar guerra contra um país vizinho gera reflexos diretos e imediatos em relação à população nacional. Tal forma de representação é chamada por Weber de "representação apropriada", uma vez que, mesmo sendo uma atitude de magnitude drástica a declaração de uma guerra, sua postulação é realizada pelo líder carismático que, em virtude de seu carisma, tem a "apropriação" da representação e das atitudes que geram reflexos em toda a população. Nas palavras do autor: "Representação apropriada. O dirigente (ou membro do quadro administrativo) tem por apropriação o direito de representação. Nesta forma, ela é muito antiga e encontra-se em associações de dominação patriarcais e carismáticas (carismático-hereditário, carismáticas de cargo) de caráter muito diverso" (ibidem).

Dessa forma, podemos com segurança falar de representação carismática. Trata-se, segundo Weber, de um tipo particular de representação "apropriada", tomada pelo líder a partir de uma legitimidade extracotidiana e, portanto, fora do comum (Weber afirma também que a dominação carismática possui características revolucionárias).

Notemos que ainda não mencionamos a explicação, do ponto de vista do dominado, para que este adira cegamente ao carisma de determinada liderança. As razões expostas por Weber estão unicamente fundadas na pessoa do líder. Nesse sentido, queremos, portanto, explorar o conceito weberiano de carisma e explicá-lo do ponto de vista do dominado. Para tanto, trataremos da noção de "supplément" de Derrida e, de nossa proposição, introduziremos a categoria que chamaremos de "efeito de presença" da representação carismática.

IV. O "EFEITO DE PRESENÇA" DA REPRESENTAÇÃO CARISMÁTICA

O "efeito de presença" é característico da representação carismática. É ele que explica a devoção do dominado, a partir de seu próprio ponto de vista, na relação de dominação. Por princípio, entendamos o sentido filosófico de devoção: "(Etimologicamente, devotar significa consagrar ou sacrificar um ser em relação a um poder sobrenatural) [...] Em seu sentido mais forte, é o ato de sacrificar sua vida ou seus interesses mais urgentes a uma pessoa, uma coletividade ou a uma causa julgada de alto valor" (LALANDE, 1991, p. 225).

Assim, a força que exerce o líder sobre seus devotos na representação carismática é tamanha que, no limite, pode significar a abdicação da própria vida por quem a legitima. Contudo, o elemento que nos parece fundamental é a "alienação da vontade" do dominado (auto-alienação) pela vontade do líder. Essa auto-alienação anuncia-nos que a vontade do dominado passa a não mais ter um sentido em si, pois é substituída pela vontade do líder. Esta última, como já fizemos referência, é inicialmente particular. Entretanto, no momento do exercício do carisma, ela deixa de ser meramente particular, pois universaliza-se em torno de seus séquitos.

O líder cria a vontade alheia, pois o alheio torna-se alheio à própria vontade. Eclipsa-a na vontade do líder. Sacrifica-se por, devota-se a, identifica-se plenamente com aquilo que lhe é estranho, cuja positividade é diversa da sua positividade. O devoto não faz mais diferença entre o que ele e o líder desejam, pois a vontade passa a ser a do líder6 6 Em relação à vontade ser do líder e não do dominado, Weber é muito claro: "Nenhum profeta jamais considerou que sua qualidade dependesse da opinião da multidão a seu respeito; nenhum rei eleito ou duque carismático jamais tratou os oponentes ou indiferentes senão como prevaricadores: quem não participou de uma expedição militar de um líder cujos componentes foram recrutados de maneira formalmente voluntária ficou exposto, no mundo inteiro, ao escárnio dos outros" (WEBER, 2000, p. 159). . Essa é a característica mais perigosa do carisma: o "efeito de presença" da representação, ou seja, quando o representando acha-se plenamente identificado com o representante. De maneira acrítica, ele próprio assassina sua identidade. Vejamos, portanto, as conseqüências desse perigoso "efeito de presença" da representação, a partir da noção de "suplemento" de Derrida.

O perigo do "efeito de presença" já vem de certa forma sendo anunciado em outro domínio das humanidades. Derrida, em Gramatologia, enfatizou fortemente o perigo do suplemento escritura em relação à fala. É a partir dessa proposição derridiana e de sua transposição à Teoria Política que buscaremos caracterizar o "efeito de presença" da dominação carismática. Antes, contudo, precisamos estabelecer o que entendemos como sendo o perigo desse "efeito".

O perigo do "efeito de presença" deve ser compreendido estritamente em relação ao representado: este auto-anula sua identidade no ato da representação, no momento em que está sofrendo a dominação carismática. Sua identidade é, assim, "eclipsada" pela identidade do representante em um processo de auto-alienação. Contudo, esse desaparecimento da identidade não é, de fato, um desaparecimento verdadeiro, mas um "efeito de presença" desse tipo muito especial de representação que é o carisma. Um efeito perigoso, pois exerce-se em e, ao mesmo tempo, é exercido pela figura do próprio representado. O que ocorre com o representado é um processo de produção de uma imagem que indica um sinal de existência. Contudo, essa é tão-somente uma imagem e, como tal, não é a própria existência, pois tem uma natureza independente e suplementar à essência do objeto projetado. Uma imagem no espelho, por exemplo, indica a existência daquilo ou de quem ela projeta, mas não a sua essência.

Nesse sentido, o "efeito de presença" tem de real somente a aparência. Uma aparência que faz da representação, ou seja, o momento de "estar em lugar de", uma plena identificação do ausente. O "efeito de presença" é análogo ao que Jean Baudrillard (1991) designa "simular", ou seja, um fingir ter o que não se tem. No caso do "efeito de presença" no momento da representação, estamos diante de uma simulação que o representante faz da presença do representado e que o último pode até, no limite de uma auto-alienação, estar plenamente identificado àquele que é a presença de sua ausência (o representante).

A fotografia exerce esse efeito de presença ao anunciar uma imagem. Ela representa, suplementa, eterniza um momento único, mas não uma essência. Ela identifica uma imagem, mas nunca sem reconhecer que tal imagem está contaminada pela lente sobredeterminada da câmera do fotógrafo. A fotografia é um recorte arbitrário; é a construção de um mundo, de personagens representados nesse mundo (BARTHES, 1984). Contudo, não pode ser o mundo, pois a representação fotográfica é o seu próprio congelamento, a sua mortificação e não necessariamente a prova da sua existência. É o recorte arbitrário de um mundo sensível, infinito em movimento e em produção de sentido, mas que no momento da representação fotográfica passa a ser localizado em restritos tempo e espaço, contingentes e instantâneos.

Ao "efeito de presença" não se deixa de anunciar, como já enfatizamos, um perigoso suplemento, no sentido de Derrida. Tal perigo está na possibilidade de crer-se que o suplemento simula o que somente deveria "aparentemente" representar, em um ato em que a representação produz um efeito de identificação. Todavia, o perigo do suplemento não está na crença do efeito de presença do representante que, no limite, é o que ele sempre busca. O perigo do suplemento está na auto-alienação do representado no momento em que toma sua imagem em uma foto como se fosse ele mesmo e não a mera representação de sua imagem.

Em Gramatologia, Derrida apresenta a noção de suplemento como aquilo que está "em lugar de", ou seja, aquilo que exerce uma função de representação. Contudo, o ato de representar para Derrida é ao mesmo tempo um ato de "acrescentar-se", como a escritura faz em relação à fala: "A fala, sendo natural ou ao menos a expressão natural do pensamento, a forma de instituição ou de convenção mais natural para significar o pensamento, a escritura a ela se acrescenta, a ela se junta como uma imagem ou uma representação. Neste sentido, ela não é natural. Faz derivar na representação e na imaginação uma presença imediata do pensamento à fala. Este recurso não é somente "esquisito", ele é perigoso. É a adição de uma técnica, é uma espécie de ardil artificial e artificioso para tornar a fala presente quando ela está, na verdade, ausente" (DERRIDA, 1999, p. 177).

Assim, o suplemento escritura7 7 Segundo Derrida, o conceito de escritura compreende e excede o de linguagem. A linguagem, segundo o autor, deve ser entendido como "ação, movimento, pensamento, reflexão, consciência, inconsciente, experiência, afetividade etc.". A escritura compreende todos esses elementos mas acrescenta "não apenas os gestos físicos da inscrição literal, pictográfica, ou ideográfica, mas também a totalidade do que a possibilita; e a seguir, além da face significante, até mesmo a face significada; e, a partir daí, tudo o que pode dar lugar a uma inscrição em geral, literal ou não, e mesmo que o que ela distribui no espaço não pertença à ordem da voz: cinematográfica, coreografia, sem dúvida, mas também 'escritura' pictural, musical, escultural etc. Também se poderia falar em escritura atlética e, com segurança ainda maior, se pensarmos nas técnicas que hoje governam estes domínios, em escritura militar ou política[...]" (DERRIDA, 1999, p. 10-11). acrescenta-se à fala como um excesso, mas um excesso permitido para tomar o lugar da última. O suplemento, portanto, é exterior ao que suplementa. Não é complementação, pois está, segundo Derrida, "fora da positividade à qual se ajunta, estranho ao que, para ser por ele substituído, deve ser distinto dele" (idem, p. 178).

O perigo do suplemento está no lugar que ele toma: ele toma a identidade do representado pela sua; simula um desaparecimento do representado pela sua presença. Ele faz-nos crer na total impossibilidade de expressão do representado. É como se o suplemento fosse o próprio representado. Ora, mas se ele fosse o próprio representado, seria desnecessária a existência do suplemento, da representação. O suplemento é outra identidade, "fora da positividade a qual se ajunta", mas que perigosamente confunde-a com a sua própria positividade. O perigo do suplemento não é propriamente a representação que exerce, mas o "efeito de presença" da representação, que é, ao mesmo tempo, a alienação e a auto-alienação do representado, ou do suplementado. Nas palavras de Derrida: "A escritura é perigosa desde que a representação quer nela se dar pela presença e o signo pela própria coisa. E há uma necessidade fatal, inscrita no próprio funcionamento do signo; em que o substituto faça esquecer sua função de vicariância e se faça passar pela plenitude de uma fala cuja carência e enfermidade ele, no entanto, só faz suprir" (idem, p. 177; sem grifos no original).

Diante do exposto, pergunta-se: qual é o perigo do "efeito de presença" na representação política? Em que momento podemos perceber a sua ocorrência? Por que é relevante para a Teoria Política seu conhecimento? Para encaminharmos um esboço de resposta a tais questionamentos, volte-mos à noção de dominação carismática de Weber.

Max Weber, quando estabelece a dominação carismática, apresenta como justificativa a adesão irracional que o dominado devota ao seu líder. O fundamento, necessário a esse tipo de dominação, portanto, está no carisma, nos poderes discursivos e/ou sobrenaturais da liderança. Já mencionamos a característica de representação que a dominação exerce: o dominador está no lugar de quem ele domina ou representa perante um terceiro ou instância de que o representado está ausente. Contudo, o que Weber deixa em aberto é a forma como opera o "carisma" em si, o que explica a devoção. Ele toma tais categorias como dadas, como se elas se auto-explicassem. Omite a natureza subjetiva da devoção, toma-a como um fato consumado. Talvez a razão de tal omissão esteja no fato de ela não ser propriamente uma explicação sociológica para Weber, mas de um outro domínio do saber humano. Entretanto, como o próprio Weber afirmava, não nos basta a explicação da ação social apenas pelo seu sentido atual ou imediato. É preciso conhecer também as razões subjetivas que levam o ator a praticar a ação. Esse é o sentido da Sociologia weberiana: é o sentido mesmo da compreensão explicativa (verstehen).

Nossa hipótese explicativa para a dominação carismática é o "efeito de presença" da representação. Fala-se do poder de sedução de um líder carismático, mas não se explica o que realmente acontece com o dominado para esse aceitar tal liderança. Retomemos, portanto, nosso caminho até aqui para apoiarmos a comprovação dessa hipótese central. Faremos isso a partir da seguinte enumeração:

1. Qualquer representação política presume uma falha constitutiva, ou seja, o representante não traduz plenamente a demanda do seu representado.

2. A dominação carismática pode ser entendida como um tipo particular de representação, uma vez que a ação do líder produz efeitos sobre seus representados, ou liderados.

3. O carisma, como representação, gera a alienação da vontade do dominado, que passa a tomar como sua a vontade de seu líder em um ato de devoção.

4. Essa alienação de vontade traduz a medida do "efeito de presença" da representação, que é a ilusão de que o representado satisfaz plenamente a sua vontade no momento da dominação carismática.

5. Dizemos que se trata de uma ilusão uma vez que, como vimos, na representação carismática estamos diante não da vontade do dominado, mas de uma vontade construída e implementada pelo líder carismático.

Vejamos, por fim, o perigo prático que a representação carismática pode acarretar ao pluralismo democrático.

É pacífico que a democracia deve pressupor a existência do pluralismo ideológico e de interesses. Ora, o "efeito de presença" da representação carismática pode representar justamente o oposto desse princípio, uma vez que anuncia o fim do pluralismo e o princípio de uma unicidade, no limite, totalitária. Se a única vontade que pode ser enunciada é a do líder e não a de seus liderados, não estamos mais diante de diferentes, mas de um único objeto com uma essência pré-conhecida e definida. A adesão pura e simples ao líder carismático é o atestado de óbito da identidade. O mais grave disso é que se trata de um suicídio, uma vez que o "efeito de presença" da representação só pode ser produzido pelo próprio dominado.

Um "homem-bomba" abdica de sua própria vida na ilusão de que está a serviço de sua vontade, que é a mesma vontade de um ente superior. Seu suicídio e seus assassinatos são reflexos da sua devoção, de um "efeito de presença" que anuncia certamente não a sua própria e original vontade, que está eclipsada, mas a sua cega assunção à vontade do líder e aos perigos do carisma.

BAUDRILLARD, J. 1991. Simulacros e simulação. Lisboa : Relógio d'Água.

BOBBIO, N. 1997. O futuro da democracia : uma defesa das regras do jogo. 6ª ed. Rio de Janeiro : Paz e Terra.

DERRIDA, J. 1999. Gramatologia. 2ª ed. São Paulo : Perspectiva.

ENAUDEAU, C. 1999. La paradoja de la representación. Buenos Aires : Paidós.

LACLAU, E. 1996. Emancipación y diferencia. Buenos Aires : Ariel.

_____. 2000. Identity and Hegemony : The Role of Universality in the Constitution of Political Logics. In : BUTLER, J.; LACLAU, E. & ZIZEK, S. (eds.). Contingency, Hegemony, Universality : Contemporary Dialogues on the Left. London : Verso.

LALANDE, A. 1991. Vocabulaire technique et critique de la philosophie. 17ª ed. Paris : PUF.

MENDONÇA, D. 2002. Para além da lei : agonismo como princípio de ação dos movimentos sociais. Civitas, Porto Alegre, ano 2, n. 1, p. 55-68, jun.

WEBER, M. 1999. Os três tipos puros de dominação legítima. In : COHN, G. (org.). Weber : Sociologia. 7ª ed. São Paulo : Ática

_____. 2000. Economia e sociedade : fundamentos da Sociologia compreensiva. 3ª ed. Brasília : UNB.

Recebido em 19 de novembro de 2003

Aprovado em 27 de julho de 2004

Daniel de Mendonça (ddmendonca@terra.com.br; daniel@seama.edu.br; ddmendonca@bol.com.br) é doutorando em Ciência Política na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e Coordenador do curso de Direito da Faculdade SEAMA.

  • BARTHES, R. 1984. A câmara clara : nota sobre a fotografia. Rio de Janeiro : Nova Fronteira.
  • 1
    Artigo apresentado no I Simpósio Universidade de São Paulo-Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro de Pós-Graduação em Teoria Política, realizado na Universidade de São Paulo em setembro de 2003, sob o título "O efeito de presença: a representação e a Representação".
  • 2
    Queremos deixar muito claro aqui que operamos com as idéias de dominação e de representação como análogas, uma vez que o dominante é sempre um representante legitimado pelo dominado, como veremos na segunda seção deste trabalho.
  • 3
    Corinne Enaudeau caracteriza com precisão o paradoxo da representação: "o teatro concentra no cenário o paradoxo da representação. Representar é substituir um ausente, dar-lhe presença e confirmar a ausência. De uma parte, transparência da representação: ela borra-se perante o que mostra. Gozo de sua eficácia: é como se a coisa estivesse ali. Mas, de outro lado, opacidade: a representação só se apresenta a si mesma, apresentase representando a coisa, eclipsa-a e suplanta-a, duplica sua ausência. Decepção por tê-la deixado presa na sombra, inclusive o júbilo por ter ganho com a troca: a arte supera a natureza, completa-a e realiza-a" (ENAUDEAU, 1999, p. 27).
  • 4
    Acerca da não-efetivação de demandas particulares no âmbito político, veja artigo de nossa autoria que discute, a partir da noção de agonismo, a necessidade da permanente luta dos movimentos sociais para a conquista e manutenção de seus direitos, mesmo após a publicação de uma norma jurídica que formalmente assegura tais prerrogativas às identidades (MENDONÇA, 2002).
  • 5
    As citações de passagens de trabalhos originalmente escritos em línguas estrangeiras (inglês, francês e espanhol) foram traduzidas livremente pelo autor para uso exclusivo neste artigo.
  • 6
    Em relação à vontade ser do líder e não do dominado, Weber é muito claro: "Nenhum profeta jamais considerou que sua qualidade dependesse da opinião da multidão a seu respeito; nenhum rei eleito ou duque carismático jamais tratou os oponentes ou indiferentes senão como prevaricadores: quem não participou de uma expedição militar de um líder cujos componentes foram recrutados de maneira formalmente voluntária ficou exposto, no mundo inteiro, ao escárnio dos outros" (WEBER, 2000, p. 159).
  • 7
    Segundo Derrida, o conceito de escritura compreende e excede o de linguagem. A linguagem, segundo o autor, deve ser entendido como "ação, movimento, pensamento, reflexão, consciência, inconsciente, experiência, afetividade etc.". A escritura compreende todos esses elementos mas acrescenta "não apenas os gestos físicos da inscrição literal, pictográfica, ou ideográfica, mas também a totalidade do que a possibilita; e a seguir, além da face significante, até mesmo a face significada; e, a partir daí, tudo o que pode dar lugar a uma inscrição em geral, literal ou não, e mesmo que o que ela distribui no espaço não pertença à ordem da voz: cinematográfica, coreografia, sem dúvida, mas também 'escritura' pictural, musical, escultural etc. Também se poderia falar em escritura atlética e, com segurança ainda maior, se pensarmos nas técnicas que hoje governam estes domínios, em escritura militar ou política[...]" (DERRIDA, 1999, p. 10-11).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Jul 2005
    • Data do Fascículo
      Nov 2004
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