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Eficácia e segurança da vacina brasileira contra hepatite B em recém-nascidos

Eficiencia y seguridad de la vacuna brasilera contra hepatitis B en recién-nacidos

Resumos

OBJETIVO: Analisar a eficácia e segurança de vacina recombinante contra hepatite B em recém-nascidos. MÉTODOS: O estudo foi conduzido em hospital geral do município de Guarulhos, SP, entre 2002 e 2005. A vacina recombinante contra hepatite B do Instituto Butantan (VrHB-IB) foi analisada em dois ensaios clínicos. Em ambos os ensaios, os recém-nascidos foram alocados aleatoriamente ao grupo experimental ou controle (vacina de referência). Os recém-nascidos receberam três doses das vacinas, uma em até 24 h após o nascimento e as subseqüentes 30 e 180 dias após. No primeiro ensaio 538 recém-nascidos completaram o protocolo e no segundo ensaio, 486. Considerou-se critério de equivalência a diferença na soroproteção inferior a 5%. RESULTADOS: A soroproteção no primeiro ensaio (anti HBs > 10mUI/ml) foi de 92,5% (247/267) no grupo experimental, comparada a 98,5% (267/271) no grupo controle (p = 0,001). Com este resultado, a VrHB-IB não atingiu o critério de equivalência estabelecido. Após o aumento da concentração de antígeno na vacina para 25¼g, a soroproteção no segundo ensaio foi de 100% no grupo experimental e 99,2% no grupo controle. Nenhum evento adverso grave foi registrado. CONCLUSÕES: A vacina VrHB-IB modificada foi considerada equivalente à vacina de referência e seu uso recomendado à vacinação de recém-nascidos.

Vacinas contra Hepatite B; Recém-Nascido; Eficácia; Ensaio Clínico; Hepatite B


OBJETIVO: Analizar la eficiencia y seguridad de vacuna recombinante contra hepatitis B en recién-nacidos. MÉTODOS: El estudio fue conducido en hospital general del municipio de Guarulhos, Sureste de Brasil, entre 2002 y 2005. La vacuna recombinante contra hepatitis B del Instituto Butantan (VrHB-IB) fue analizada en dos ensayos clínicos. En ambos ensayos, los recién-nacidos fueron distribuidos aleatoriamente en el grupo experimental o control (vacuna de referencia). Los recién-nacidos recibieron tres dosis de las vacunas, una en máximo 24 h posterior al nacimiento y las subsecuentes 30 y 180 días posteriores. En el primer ensayo 538 recién-nacidos completaron el protocolo y en el segundo ensayo, 486. Se consideró criterio de equivalencia la diferencia en la seroprotección inferior a 5%. RESULTADOS: La seroprotección en el primer ensayo (anti HBs ³ 10mUI/mL) fue de 92,5% (247/267) en el grupo experimental, comparada con 98,5% (267/271) en el grupo control (p=0,001). Con este resultado, la VrHB-IB no alcanzó el criterio de equivalencia establecido. Posterior al aumento de la concentración del antígeno en la vacuna a 25mg, la seroprotección en el segundo ensayo fue de 100% en el grupo experimental y 99,2% en el grupo control. Ningún evento adverso grave fue registrado. CONCLUSIONES: La vacuna VrHB-IB modificada fue considerada equivalente a la vacuna de referencia y su uso recomendado en la vacunación de recién-nacidos.


OBJECTIVE: To analyze the efficacy and safety of a recombinant Hepatitis B vaccine in newborns. METHODS: The study was carried out in a general hospital in the city of Guarulhos, Southeastern Brazil, between 2002 and 2005. The recombinant Hepatitis B vaccine from Instituto Butantan (VrHB-IB) was tested in two clinical trials. In both trials, newborns were randomly allocated to the experimental or control (reference vaccine) groups. Newborns were given three doses of vaccine, one up to 24 hours after birth and the other two 30 and 180 days later. In the first trial, 538 newborns completed the immunization protocol, and 486 in the second. Vaccines were considered equivalent when seroprotection difference was below 5%. RESULTS: Seroprotection in the first trial (anti-HBs > 10mUI/ml) was 92.5% (247/267) in the experimental group, compared to 98.5% (267/271) in the control (p = 0.001). With this result, VrHB-IB did not fulfill the pre-established criterion for equivalence. After increasing the concentration of antigen in the vaccine to 25¼g, seroprotection reached 100% in the experimental group and 99.2% in the control. No severe adverse effects were recorded. CONCLUSIONS: The reformulated VrHB-IB is considered equivalent to the reference vaccine, and its use is recommended in newborns.

Hepatitis B Vaccines; Infant, Newborn; Efficacy; Clinical Trial; Hepatitis B


ARTIGOS ORIGINAIS

Eficácia e segurança da vacina brasileira contra hepatite B em recém-nascidos

Eficiencia y seguridad de la vacuna brasilera contra hepatitis B en recién-nacidos

Expedito José de Albuquerque LunaI; José Cássio de MoraesII; Lygia SilveiraII; Hilda Souza Neves SalinasIII

IInstituto de Medicina Tropical de São Paulo. Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil

IIDepartamento de Medicina Social. Faculdade de Ciências Médicas. Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil

IIIHospital Geral de Guarulhos. Guarulhos, SP, Brasil

Correspondência | Correspondence Correspondência | Correspondence: Expedito José de Albuquerque Luna Instituto de Medicina Tropical de São Paulo Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar 47005403-000 São Paulo, SP E-mail: expedito_luna@uol.com.br

RESUMO

OBJETIVO: Analisar a eficácia e segurança de vacina recombinante contra hepatite B em recém-nascidos.

MÉTODOS: O estudo foi conduzido em hospital geral do município de Guarulhos, SP, entre 2002 e 2005. A vacina recombinante contra hepatite B do Instituto Butantan (VrHB-IB) foi analisada em dois ensaios clínicos. Em ambos os ensaios, os recém-nascidos foram alocados aleatoriamente ao grupo experimental ou controle (vacina de referência). Os recém-nascidos receberam três doses das vacinas, uma em até 24 h após o nascimento e as subseqüentes 30 e 180 dias após. No primeiro ensaio 538 recém-nascidos completaram o protocolo e no segundo ensaio, 486. Considerou-se critério de equivalência a diferença na soroproteção inferior a 5%.

RESULTADOS: A soroproteção no primeiro ensaio (anti HBs > 10mUI/ml) foi de 92,5% (247/267) no grupo experimental, comparada a 98,5% (267/271) no grupo controle (p = 0,001). Com este resultado, a VrHB-IB não atingiu o critério de equivalência estabelecido. Após o aumento da concentração de antígeno na vacina para 25¼g, a soroproteção no segundo ensaio foi de 100% no grupo experimental e 99,2% no grupo controle. Nenhum evento adverso grave foi registrado.

CONCLUSÕES: A vacina VrHB-IB modificada foi considerada equivalente à vacina de referência e seu uso recomendado à vacinação de recém-nascidos.

Descritores: Vacinas contra Hepatite B. Recém-Nascido. Eficácia. Ensaio Clínico. Hepatite B, prevention & control.

RESUMEN

OBJETIVO: Analizar la eficiencia y seguridad de vacuna recombinante contra hepatitis B en recién-nacidos.

MÉTODOS: El estudio fue conducido en hospital general del municipio de Guarulhos, Sureste de Brasil, entre 2002 y 2005. La vacuna recombinante contra hepatitis B del Instituto Butantan (VrHB-IB) fue analizada en dos ensayos clínicos. En ambos ensayos, los recién-nacidos fueron distribuidos aleatoriamente en el grupo experimental o control (vacuna de referencia). Los recién-nacidos recibieron tres dosis de las vacunas, una en máximo 24 h posterior al nacimiento y las subsecuentes 30 y 180 días posteriores. En el primer ensayo 538 recién-nacidos completaron el protocolo y en el segundo ensayo, 486. Se consideró criterio de equivalencia la diferencia en la seroprotección inferior a 5%.

RESULTADOS: La seroprotección en el primer ensayo (anti HBs ³ 10mUI/mL) fue de 92,5% (247/267) en el grupo experimental, comparada con 98,5% (267/271) en el grupo control (p=0,001). Con este resultado, la VrHB-IB no alcanzó el criterio de equivalencia establecido. Posterior al aumento de la concentración del antígeno en la vacuna a 25mg, la seroprotección en el segundo ensayo fue de 100% en el grupo experimental y 99,2% en el grupo control. Ningún evento adverso grave fue registrado.

CONCLUSIONES: La vacuna VrHB-IB modificada fue considerada equivalente a la vacuna de referencia y su uso recomendado en la vacunación de recién-nacidos.

INTRODUÇÃO

A infecção pelo vírus da hepatite B constitui um importante problema de saúde pública no Brasil. Algumas regiões do País são reconhecidas como bolsões hiperendêmicos, como a Amazônia Ocidental e algumas microrregiões dos estados do Espírito Santo, Paraná, Santa Catarina e Mato Grosso. Com a introdução do programa de vacinação universal já se observa uma redução importante na prevalência da infecção crônica em algumas dessas áreas.3

Desde o final da década de 1980 as vacinas disponíveis são produzidas por técnicas de biologia molecular, nas quais o antígeno vacinal é obtido pela técnica do DNA recombinante.

A vacina recombinante contra a hepatite B é altamente imunogênica e protetora. Considera-se uma resposta protetora quando a vacina induz a formação de anticorpos contra o HBsAg (anti-HBs) em níveis >10 mUI/ml em ensaio imunoenzimático. Uma série completa de três ou quatro doses da vacina de hepatite B tem induzido uma resposta protetora em mais de 90% dos adultos e em mais de 95% das crianças e adolescentes saudáveis. A maioria dos esquemas de vacinação recomenda três doses (administradas a zero, um e seis meses), ou quatro (em zero, um, dois e 12 meses). As primeiras doses induzem anticorpos detectáveis contra o HBsAg em torno de 70% a 85% dos indivíduos vacinados, mas os níveis de anticorpos são relativamente baixos (50-300 mUI/ml). A dose final induz uma resposta adequada em torno de 90% dos adultos e em mais de 95% das crianças, com aumento dos níveis de anticorpos de 1.000 - 3.000 mUI/ml nos adultos, e geralmente maior que 5.000 mUI/ml nas crianças.4

Estudos realizados nos Estados Unidos demonstraram a segurança da vacina de hepatite B, baseando-se numa avaliação realizada após o uso de 12 milhões de doses da vacina administradas em crianças menores de um ano. Os efeitos colaterais são similares entre todas as vacinas licenciadas. Dor e hiperemia no sítio de injeção são os efeitos adversos mais comuns (15%-20%) provavelmente relacionados ao produto adjuvante da vacina, o hidróxido de alumínio. Aproximadamente 15,0% dos indivíduos vacinados experimentam um ou mais sintomas sistêmicos leves e de resolução espontânea, como cefaléia, febre e/ou fadiga, geralmente 24 a 48 h após a vacinação.2,10

O Programa Nacional de Imunizações (PNI) do Ministério da Saúde iniciou em 1992 a incorporação da vacinação contra hepatite B em estratégia de campanhas nas regiões do País consideradas hiperendêmicas. A partir de 1998, a vacina recombinante contra hepatite B foi incorporada ao programa de vacinação universal de menores de um ano em todo o País.

O Instituto Butantan em São Paulo, SP, desenvolveu uma vacina contra hepatite B (VrHB-IB) obtida por tecnologia de DNA recombinante. O desenvolvimento de uma vacina utilizando técnicas de biologia molecular configura mais um passo em direção à auto-suficiência na produção de imunobiológicos no País contribuindo para a redução das importações e do preço dos produtos, além de garantir o suprimento para os programas de vacinação universal.

A vacina VrHB-IB contém partículas de HBsAg altamente purificadas produzidas pela levedura recombinante, Hansenula polymorpha, e é formulada com o adjuvante hidróxido de alumínio, inicialmente com 20 μg e posteriormente com 25 μg do antígeno por mililitro de diluente. Estudos preliminares, utilizando 10 μg/dose, em esquema de zero, um e seis meses, aplicada em voluntários adultos saudáveis, mostraram que a VrHB-IB não induziu efeitos adversos significativos e a soroconversão foi de 95,3%.1 Posteriormente, verificou-se que a vacina levava a uma menor resposta imunogênica em indivíduos acima de 45 anos, com soroconversão de 70%, em comparação aos 100% no grupo etário de 18 a 25 anos. Além disso, diferenças no título geométrico médio de anticorpos induzido pelas doses de 10 e 20 μg, levaram os autores a considerar a necessidade de aumentar a concentração antigênica na vacina.5 A VrHB-IB foi licenciada para uso no País em 1998, e desde 2003 vem sendo amplamente utilizada pelo PNI.

Em ensaios de eficácia realizados posteriormente, a eficácia da VrHB-IB foi considerada equivalente à vacina de referência em crianças de um a 11 anos de idade, "menos imunogênica, mas aceitável para uso em recém-nascidos, adolescentes e adultos jovens" e significativamente menos imunogênica em adultos entre 31 e 40 anos.6 Diante destes resultados, o produtor alterou a concentração de antígeno na vacina, de 20 para 25μg/ml. Considerou-se então necessária a realização de novos ensaios de eficácia da vacina, não apenas enfocando o grupo no qual a diferença de imunogenicidade foi maior, os adultos, mas também os recém-nascidos (RN), grupo alvo prioritário do PNI.

O presente estudo teve por objetivo analisar a eficácia e segurança da vacina recombinante contra hepatite B em recém-nascidos.

MÉTODOS

A segurança e eficácia da vacina contra hepatite B produzida pelo Instituto Butantan (VrHB-IB) em RN foram avaliadas em dois ensaios clínicos com duplo mascaramento e alocação aleatória dos participantes.

Os RN incluídos nos ensaios receberam três doses de vacina contra hepatite B, de 0,5 ml por via intramuscular, a primeira em até 24 h após o nascimento, a segunda 30 dias depois e a terceira 180 dias após a primeira. Os RN alocados ao grupo experimental receberam a VrHB-IB, e aqueles alocados ao grupo controle, da vacina de referência, a Engerix B®, do produtor Glaxo Smith Kline. Ambas as vacinas usadas no primeiro ensaio continham 20 μg/ml de antígeno. No segundo ensaio foi utilizada a nova formulação da VrHB-IB, contendo 25μg/ml. Em cada um dos ensaios foi utilizado um único lote da vacina experimental, bem como da vacina controle.

O primeiro ensaio foi realizado nos anos de 2002 e 2003, e o segundo em 2004 e 2005. Todos os RN cujo parto foi realizado em um hospital geral, localizado em Guarulhos, SP, eram, em princípio, elegíveis para participação. Foram excluídos os RN filhos de mães portadoras do HBsAg e de sorologia reagente para o HIV e para sífilis; prematuros (idade gestacional < 37 semanas); baixo peso (< 2000g); portadores de malformações congênitas, doenças genéticas ou outras condições clínicas graves; Apgar < 7 no 1º minuto ou <8 no 5º minuto e RN submetidos à exsanguíneo-transfusão ou imunoglobulina intravenosa.

Os futuros pais eram abordados pela equipe do estudo após a admissão hospitalar para o parto. Nessa entrevista, o estudo era apresentado e era feito o convite para participação e, caso aceitassem, uma nova entrevista era realizada após o parto na qual o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido era lido e discutido com os pais e por eles assinado, e também pelo representante da equipe do estudo no caso de aceitação em participar do estudo. Os RN incluídos no estudo eram vacinados dentro das primeiras 24 horas de vida e seu retorno para acompanhamento agendado. A equipe do estudo se propôs a acompanhar os RN durante o primeiro ano de vida.

Ao ser admitido no estudo o RN recebia o número seqüencial correspondente à ordem de entrada no estudo. Os números seqüenciais foram previamente sorteados, com probabilidade de independente de 50% para cada número. Apenas o profissional responsável pelo sorteio e alocação dos números seqüenciais aos grupos teve acesso a esta informação. Nenhum dos profissionais responsáveis pelo acompanhamento dos RN, nem pelos ensaios laboratoriais, teve acesso à informação sobre a randomização. Os frascos das vacinas foram velados de forma a impedir sua identificação.

Os ensaios de equivalência caracterizam-se como ensaios de não inferioridade da vacina,10 nos quais se busca mostrar que a proporção de sujeitos que apresenta a resposta imunogênica desejada com a nova vacina não é inferior àquela do grupo controle, para além de um determinado limite de não inferioridade pré estabelecido. Nos dois ensaios a diferença aceita como não inferior foi de 5%. Tomando como referência a imunogenicidade da vacina controle em estudo realizado no Brasil (98,5%),8 foi feito o cálculo de tamanho da amostra necessário para detectar uma diferença de até 5%, com nível de significância de 0,05 e poder de 80%. Calculou-se o tamanho de 258 indivíduos em cada grupo do estudo. Acrescendo-se 20% para compensar possíveis perdas, chegou-se ao número de 610 indivíduos, divididos eqüitativamente entre o grupo experimental e o grupo controle.

O marcador sorológico de eficácia vacinal (variável de desfecho) consistiu na detecção de anticorpos anti-HBs, em títulos iguais ou superiores a 10 mUI/ml. As dosagens foram realizadas em amostras coletadas nos tempos T 180 (cinco meses após a segunda dose de vacina, e imediatamente antes da aplicação da terceira dose) e T 210 (um mês após a terceira dose). Além disto, foi feita uma coleta de sangue da mãe, no momento do parto, para avaliação dos critérios de elegibilidade. As amostras coletadas, centrifugadas e aliquotadas pela unidade de investigação foram processadas pelo laboratório do hospital estudado. As amostras das mães dos RN foram analisadas para marcadores sorológicos da hepatite B (HBsAg e anti-HBc), HIV e sífilis. As segundas e terceiras amostras de todos os participantes foram analisadas para os marcadores sorológicos da hepatite B (HBsAg, anti-HBs e anti-HBc). As análises foram feitas pelos testes imunoenzimáticos (ELISA), utilizando os reagentes comerciais dos laboratórios DiaSorin e Access (Access® AbHBsII, Beckman Coulter), este último para as dosagens do anti-HBs. No primeiro ensaio os testes laboratoriais de anti-HBs foram realizados pelo Instituto Adolfo Lutz (IAL) e pelo Instituto Evandro Chagas (IEC), e no segundo ensaio, pelo Instituto Oswaldo Cruz. No primeiro ensaio os testes laboratoriais foram processados simultaneamente, pelos laboratórios envolvidos (IAL e IEC), utilizando reagentes comerciais distintos (DiaSorin no IAL e Access no IEC). No segundo ensaio, uma sub-amostra de 65 voluntários foi retestada no IEC.

Em relação à segurança da vacina, registrou-se qualquer evento adverso atribuível à vacina após a data de vacinação. Foi feito o monitoramento ativo dos eventos adversos nas primeiras 72 horas após a vacinação, pela visita ao RN e à mãe durante o período de internação hospitalar, após a primeira dose, e por telefone após as demais. No período posterior a 72 horas, o monitoramento foi feito de forma passiva, pelo relato da mãe ou responsável e pelo questionamento na ocasião do retorno para puericultura e vacinação.

Foram incluídos no estudo apenas os RN que cumpriram todas as etapas previstas no protocolo de seguimento. As perdas distribuíram-se de forma eqüitativa entre os grupos experimental e controle, em ambos os ensaios (Tabela 1). No primeiro ensaio, dos 630 RN, 84,6% concluíram todas as etapas do protocolo. No segundo, dos 590 RN aleatorizados, 82,2% concluíram o protocolo de seguimento. As principais razões de perda de seguimento foram: falta aos atendimentos agendados e não localização da família no endereço fornecido, a vacinação contra hepatite B fora da unidade de investigação do projeto, e o desligamento a pedido da família. Não se observaram diferenças entre os RN que descontinuaram o acompanhamento e aqueles que concluíram o seguimento até a última etapa prevista em relação a nenhuma das variáveis estudadas.

Foram comparadas as proporções de soroproteção e das médias geométricas dos títulos de anticorpos anti-HBs entre o grupo experimental e o grupo controle. Foi feito o cálculo da diferença entre proporções e seus intervalos com 95% de confiança.10,11 Foi feita a análise univariada de possíveis cofatores que poderiam interferir no desfecho. Foram também comparadas as freqüências de eventos adversos entre os dois grupos, após cada dose de vacina. Na análise dos dados foram utilizados os softwares Epi Info e SPSS 13.0.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Irmandade de Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (1º ensaio: Parecer nº. 061/01; 2º ensaio: Parecer nº. 221/03).

RESULTADOS

A Tabela 2 apresenta a distribuição dos grupos experimental e controle segundo algumas variáveis no momento da inclusão no estudo. Nos dois ensaios os grupos se distribuíram de forma eqüitativa por relação às variáveis estudadas, não havendo diferenças significativas entre os grupos, mostrando o sucesso da estratégia de randomização.

No primeiro ensaio, a diferença de eficácia entre a VrHB-IB e a vacina de referência foi de 6% (Tabela 3), superior ao limite estabelecido de 5% de equivalência entre as vacinas, porém este valor está contido no intervalo com 95% de confiança da diferença entre as proporções. Além desta variável, nenhuma outra covariável apresentou associação com o desfecho. No segundo ensaio não houve diferença na eficácia das duas vacinas (Tabela 4). De forma semelhante ao primeiro ensaio, não se verificou associação entre nenhuma das covariáveis estudadas e a variável de desfecho.

Ainda no primeiro ensaio, as médias geométricas dos títulos de anticorpos nos grupos experimental e controle foram respectivamente 420,8 e 1769,9 mUI/ml. No segundo ensaio, as médias foram 2616 e 10051 mUI/ml, respectivamente. As diferenças foram significativas em ambos os ensaios. No primeiro ensaio, o coeficiente de correlação intraclasse entre os resultados das sorologias (títulos de anticorpos) realizadas pelos dois laboratórios participantes, utilizando kits comerciais distintos, foi de 0,878 (IC 95%: 0,856; 0,897). No segundo ensaio, o coeficiente de correlação intraclasse entre os dois laboratórios, utilizando o mesmo kit comercial, foi de 0,992 (IC 95%: 0,959; 0,997).

Quanto à reatogenicidade das vacinas, as famílias relataram aumento de eventos adversos da primeira a terceira dose, em ambos os ensaios. As reações locais predominaram dentre os eventos referidos após a primeira dose. Após a segunda e terceira doses, predominaram os relatos de choro/ irritabilidade e febre baixa. Quase a totalidade dos eventos adversos foi observada nas primeiras 72 horas após a administração da vacina. A terceira dose foi aplicada concomitantemente à vacina tríplice. Não se observaram reações adversas graves em nenhum dos ensaios. Apenas após a terceira dose no primeiro ensaio observou-se uma freqüência de eventos adversos significativamente maior em um dos grupos (VrHB-IB). Após as doses anteriores no primeiro ensaio, bem como após nenhuma das doses do segundo, não se observaram diferenças na freqüência dos eventos adversos entre as duas vacinas (Tabela 5).

DISCUSSÃO

Após o aumento na concentração de antígeno para 25 µg/ml, a VrHB-IB apresentou imunogenicidade praticamente idêntica à vacina utilizada enquanto padrão, tendo induzido altos títulos de anticorpos na maioria dos voluntários (97,5% com títulos superiores a 100mUI/ml). Nos dois ensaios, a hipótese nula de não inferioridade não pode ser rejeitada.

A VrHB-IB mostrou perfil de reatogenicidade e segurança semelhante à vacina de referência. A maioria dos eventos adversos registrados consistiu em reações locais e febre de baixa intensidade. Apenas em um dos momentos analisados, depois da terceira dose no primeiro ensaio observou-se uma diferença significativa na freqüência de eventos adversos entre as duas vacinas. Considerando-se que foram eventos leves, e que este achado não se repetiu, possivelmente se deveu ao acaso. A administração concomitante da vacina tríplice com a terceira dose da vacina contra hepatite B poderia ser responsável pela maior freqüência de eventos adversos após esta dose, mas não pelo diferencial entre as vacinas. De forma semelhante aos relatos acerca das demais vacinas recombinantes contra hepatite B, não se observaram eventos adversos de maior gravidade.7

Um grande número de fatores pode influenciar os resultados dos ensaios de vacinas recombinantes contra hepatite B, como por exemplo, as diferenças de formulação e no processo de produção da vacina, os distintos esquemas de vacinação, a idade de vacinação, os sítios de aplicação da vacina, a vacinação concomitante com outras vacinas, os diferentes ensaios laboratoriais para aferir os resultados; as diferenças entre as populações estudadas, dentre outros. Assim, a comparação dos resultados dos diferentes estudos deve ser feita com cautela.

Os resultados ora apresentados permitem o acompanhamento de uma parte da trajetória de desenvolvimento da VrHB-IB. O primeiro ensaio, em conjunto aos resultados descritos por Martins et al,6 levaram à alteração na concentração de antígeno da vacina, e os resultados do ensaio subseqüente confirmaram o esperado incremento na imunogenicidade do produto. Os presentes resultados em RN, reforçados por outro ensaio, conduzido simultaneamente em uma amostra de adultos pela mesma equipe, permitem concluir que a VrHB-IB apresenta desempenho idêntico à vacina de referência, podendo ser amplamente utilizada no controle desta importante endemia do País.9

AGRADECIMENTOS

Às equipes dos Institutos Adolfo Lutz, Evandro Chagas e Oswaldo Cruz pela realização dos testes imunoenzimáticos.

Recebido: 26/5/2008

Revisado: 17/2/2009

Aprovado: 18/8/2009

Pesquisa financiada por Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP, Processo nº 01/12298-7), Ministério da Saúde/FUNASA (contrato nº 24/2001), Ministério da Saúde (convênio nª 136/2004)

Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA, Processo nº ED-10541/2002) e Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo (TA 003/2003).

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  • Correspondência | Correspondence:
    Expedito José de Albuquerque Luna
    Instituto de Medicina Tropical de São Paulo
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      18 Dez 2009
    • Data do Fascículo
      Dez 2009

    Histórico

    • Recebido
      26 Maio 2008
    • Revisado
      17 Fev 2009
    • Aceito
      18 Ago 2009
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